MANIFESTAÇÕES ESPONTÂNEAS
A maior parte dos fenômenos de que acabamos de falar, principalmente dos pertinentes ao gênero das manifestações físicas e aparentes, podem produzir-se espontaneamente, isto é, sem que a vontade neles tenha qualquer participação. Nas outras circunstâncias podem ser provocados pela vontade de pessoas ditas médiuns, para isso dotadas de um poder especial.
As manifestações espontâneas nem são raras nem novas. Rara é a crônica local que não encerre algum relato desse gênero. Sem dúvida o medo exagerou os fatos, que tomaram, assim, proporções gigantescamente ridículas, ao passar de boca em boca. Devido ao trabalho da superstição, as casas onde eles se passaram foram consideradas assombradas pelo diabo. Daí todos os contos maravilhosos ou terríveis dos fantasmas. Por outro lado o embuste não perdeu tão bela ocasião para explorar a credulidade, muitas vezes em proveito pessoal. Aliás, é compreensível, mesmo quando reduzido à realidade, a impressão causada por fatos desse gênero sobre os caracteres fracos e predispostos pela educação a idéias supersticiosas. O mais seguro meio de prevenir os inconvenientes que poderiam ter os mesmos - já que se não poderia impedi-los - é dar a conhecer a verdade. As mais simples coisas tornam-se apavorantes quando se lhes desconhecem as causas. Uma vez familiarizados com os Espíritos e desde que aqueles a quem eles se manifestam não creiam ter às costas uma legião de demônios, aqueles não mais os temerão.
As manifestações espontâneas se produzem muito raramente em lugares isolados. É quase sempre em casas habitadas que elas ocorrem, isto pelo fato da presença de certas pessoas que, mau grado seu, exercem uma certa influência. Tais pessoas são verdadeiros médiuns que ignoram suas próprias faculdades e que, por isso, os chamamos médiuns naturais. Eles são para os outros médiuns aquilo que os sonâmbulos naturais são para os sonâmbulos magnéticos e igualmente dignos de serem observados. É por isso que aconselhamos àqueles que se ocupam com os fenômenos espíritas a colher todos os fatos desse gênero que chegarem ao seu conhecimento, mas sobretudo a constatar a sua realidade cuidadosamente, a fim de evitar se-jam vítimas de ilusões e de fraudes, o que conseguirão por meio de uma observação atenta.
Devemos manter-nos em guarda não só contra as histórias que podem ser marcadas de exageros, mas contra as nossas próprias impressões e não atribuir uma origem oculta a tudo quanto não se compreenda. Uma infinidade de causas muito simples e muito naturais podem produzir efeitos estranhos à primeira vista; e seria verdadeira superstição ver em toda parte Espíritos ocupados em derrubar móveis, quebrar louça e, enfim, suscitar mil e uma complicações domésticas que seria mais racional levar à conta de descuidos.
O que é preciso fazer em casos semelhantes é procurar a causa; e há cem probabilidades contra uma de encontrarmos uma explicação muito simples onde parecia tratar-se de um Espírito perturbador. Quando ocorre um fenômeno inexplicável, o primeiro pensamento que se deve ter é que o mesmo seja devido a uma causa material, por ser a mais provável, e não admitir a intervenção dos Espíritos senão com conhecimento de causa. Por exemplo, aquele que, sem se aproximar de ninguém, recebesse um sopro ou uma bengalada nas costas, como tem acontecido, não poderia duvidar da presença de um ser invisível.
De todas as manifestações espíritas as mais simples e as mais freqüentes são os ruídos e os golpes vibrados. Aqui, sobretudo, é que se deve temer a ilusão, pois uma porção de causas naturais os podem produzir: o vento que sopra, ou agita um objeto, um objeto que movemos sem nos apercebermos, um efeito acústico, um animal escondido, um inseto, etc., por vezes, mesmo, uma traquinada de mau gosto. Aliás os ruídos espíritas têm um caráter particular, e afetam um timbre e uma intensidade muito variados, que os tornam facilmente reconhecíveis e não permitem sejam confundidos com o estalo da madeira que se dilata, o crepitar do fogo ou o tic-tac monótono de um relógio. São golpes ora surdos, distintos, por vezes barulhentos, que mudam de lugar e se repetem sem aquela regularidade mecânica. De todos os meios de controle o mais eficaz, o que não deixa dúvidas quanto à sua origem, é a obediência à vontade. Se os golpes se fazem ouvir num lugar determinado, se respondem ao pensamento pelo número e pela intensidade, não é possível negar a existência de uma causa inteligente; mas a falta de obediência nem sempre é prova em contrário.
Admitamos agora que, por uma constatação minuciosa, se adquira a certeza de que os ruídos ou quaisquer outros efeitos sejam manifestações reais. Será razoável ficar apavorado? Certo que não. Porque, em qualquer caso, não poderia haver o menor perigo. Só as pessoas persuadidas de que é o diabo e que podem ser afetadas prejudicialmente, como as crianças a quem metem medo com o Lobo-mau ou com o Tutu-marambá. Em certas circunstâncias essas manifestações adquirem proporções e uma persistência desagradáveis - é bom reconhecer e despertam o natural desejo de nos desembaraçarmos delas. Torna-se necessária uma explicação a respeito.
Temos dito que as manifestações físicas têm por fim chamar a nossa atenção para alguma coisa e convencer-nos da presença de uma força superior ao homem. Temos dito também, que os Espíritos elevados não se ocupam dessas espécies de manifestações: eles se servem dos Espíritos inferiores para as produzir, assim como nós nos servimos dos criados para as tarefas grosseiras, e com o objetivo que acabamos de indicar. Atingido o objetivo, cessa a manifestação material, por não mais ser necessária. Um dos dois exemplos darão bem a compreender. No começo de meus estudos sobre o Espiritismo, estando uma noite ocupado com um trabalho do gênero, golpes foram ouvidos em torno de mim, durante quatro horas consecutivas. Era a primeira vez que tal me acontecia. Constatei que eles não eram devidos a nenhuma causa acidental, mas no momento não foi possível saber mais do que isto. Nessa época eu tinha oportunidade de ver com freqüência um excelente médium psicógrafo. No dia seguinte interroguei o Espírito que se comunicava por seu intermédio sobre a causa daqueles golpes.
- “Foi teu Espírito familiar”, respondeu-me ele, "que deseja falar-te”.
- E o que desejava dizer-me?
- "Podes perguntar tu mesmo, pois que aqui se acha”.
Tendo interrogado esse Espírito, ele se deu a conhecer sob um nome alegórico. (Vim a saber posteriormente, através de outros Espíritos, que é o de um ilustre filósofo antigo). Assinalou erros em meu trabalho, indicando-me as linhas onde os mesmos se acharam; deu-me úteis e sábios conselhos e acrescentou que estaria sempre comigo e viria ao meu apelo sempre que eu quisesse interrogá-lo. Com efeito, desde então esse Espírito jamais me deixou. Deu-me inúmeras provas de grande superioridade e sua intervenção
benévola e eficaz me foi manifesta tanto nos negócios da vida material quanto no que se refere às coisas metafísicas. Mas desde a nossa primeira conversa cessaram os golpes. Que queria ele realmente? Entrar em comunicação regular comigo. Para tanto era preciso advertir-me. Sem dúvida não foi ele em pessoa quem veio bater em minha casa; possivelmente mandou um emissário às suas ordens. Dada a advertência, depois explicada, estabeleceram-se relações regulares, os golpes tornaram-se inúteis e, por isso, cessaram.
Não se rufam os tambores para acordar os soldados, desde que eles já estejam de pé.
Um fato mais ou menos semelhante aconteceu a um de nossos amigos. Desde algum tempo em seu quarto soavam ruídos diversos, que se tornaram incômodos. Apresentando-se uma oportunidade de interrogar o Espírito de seu pai por um médium psicógrafo, ficou sabendo o que queriam, fez o que lhe era recomendado e desde então nada mais foi ouvido. É de notar-se que as pessoas que têm um meio regular de fácil comunicação com os Espíritos têm muito mais raramente manifestações desse gênero, o que é fácil de compreender-se.
Os Espíritos que se manifestam assim podem igualmente agir por conta própria. Por vezes são Espíritos sofredores que pedem assistência moral
[1]. Quando podem traduzir seu pensamento de maneira mais inteligível, pedem essa assistência segundo a forma que lhes era familiar em vida; ou que está nas idéias e nos hábitos daqueles a quem se dirigem, pois pouco importa essa forma, de vez que a intenção vem do coração.
Em resumo, o meio de fazer cessar essas manifestações importunas é procurar entrar em comunicação inteligente com o Espírito que vem perturbar-nos, a fim de saber quem seja ele e o que quer de nós. Satisfeito o seu desejo, ele rios deixa em paz. É como alguém que bate a uma porta até que lha abram.
- Mas, que fazer quando não se dispõe de um médium?
- Que faz o doente que não tem médico? Passa sem ele.
Aqui temos um outro recurso. O doente não pode fazer-se médico, mas em dez pessoas nove podem ser médiuns psicógrafos. Então é procurar tornar-se médium, desde que não encontre um na família. Em falta de um médium escrevente, pode interrogar-se o Espírito diretamente e ele responderá ainda por pancadas, isto é, pelo número de golpes convencionados. Voltaremos ao assunto nos capítulos seguintes.
Vide no vocabulário o verbete
Prece.