CAPÍTULO IX
ASSUNTOS DE ESTUDO
Quando se evocam parentes e amigos ou personagens célebres, a fim de comparar suas opiniões de além-túmulo com as que tinham em vida, por vezes fica-se embaraçado para sustentar a conversação, a menos que se caia na banalidade e nas coisas fúteis. Pode, pois, ser útil indicar a fonte em que podemos tomar os temas de observação, por assim dizer ilimitados.
Como se viu, o mundo espírita apresenta tantas variedades, do ponto de vista intelectual e moral quanto a humanidade. Devemos mesmo dizer que é muito maior, pois que, seja qual for a distância que separa os homens na Terra, do primeiro ao último elo, há Espíritos aquém e além desses mesmos elos. Para conhecer um povo é preciso vê-lo da base ao topo, estudá-lo em todas as fases da vida, sondar as suas ideias, perquirir os seus hábitos particulares, numa palavra fazer-lhe, por assim dizer, a dissecção moral. Só multiplicando as observações é que podemos descobrir as analogias e as anomalias, e firmar um julgamento por comparação. Quem poderá contar os volumes escritos sobre etnografia, antropologia e sobre o coração humano? Entretanto estamos ainda longe de tudo haver dito. O que se fez em relação ao homem pode ser feito em relação aos Espíritos. E este é o único meio de aprender a conhecer esse mundo, que nos interessa tanto mais quanto a morte, a que todos estamos sujeitos, a ele nos conduz pela própria força das coisas. Ora, esse mundo se nos revela pelas manifestações inteligentes dos Espíritos. Podemos, pois, interrogar os seus habitantes de todas as classes, já não somente sobre generalidades, mas sobre particularidades de sua existência de além-túmulo e por aí julgar o que nos espera conforme a nossa própria conduta na Terra. Até o presente a sorte que nos era reservada não nos era senão objeto de ensino teórico. As manifestações espíritas no-las mostram a nu, fazem-nos tocá-las e vê-las pelos mais surpreendentes exemplos, cuja realidade não poderia ser posta em dúvida por quem quer que lhes volte um olhar perscrutador. É a essa realidade que queremos dar os meios de constatar pela direção dos estudos.
Se a evocação dos homens ilustres, dos Espíritos superiores é eminentemente útil pelos ensinamentos que nos trazem, a dos Espíritos vulgares não o é menos, posto sejam eles incapazes de resolver questões de maior alcance. Por sua inferioridade eles mesmos se retratam e, quanto menor a distância que nos separa deles, mais aí encontramos correspondência com a nossa própria situação. É, pois, do mais alto interesse, sob o duplo ponto de vista psicológico e moral, estudar a posição dos que foram nossos contemporâneos, que partilharam ao nosso lado o caminho da vida, cujo caráter, aptidões, vícios e virtudes conhecemos, ainda que fossem criaturas muito obscuras. Nós os compreendemos melhor, porque estão em nosso nível; por vezes nos oferecem traços característicos do mais alto interesse; diremos ainda que é nesse círculo, de certo modo íntimo, que a identidade dos Espíritos se revela, sobretudo de maneira menos contestável. Como se vê, é uma mina inesgotável de observações, ainda que considerando apenas os homens cuja vida apresenta alguma particularidade em relação ao gênero de morte, à idade, às boas, ou más qualidades, à posição feliz ou infeliz na Terra, os hábitos, o estado mental, etc.
Com os Espíritos elevados o quadro dos estudos se amplia: além das questões psicológicas que têm um certo limite, é possível propor-lhe uma porção de problemas morais que se estendem ao infinito sobre todas as posições da vida, sobre a melhor conduta a ter nesta ou naquela circunstância, sobre os nossos deveres recíprocos, etc. O valor da instrução que se recebe sobre um assunto qualquer, moral, histórico, filosófico ou científico, depende inteiramente do estado do Espírito que se interroga. A nós cabe julgá-lo.
Além das perguntas propriamente ditas, podemos solicitar dos Espíritos superiores dissertações sobre determinados assuntos, ou por eles escolhidos numa lista que se lhes apresenta. Podemos, assim, tomar para texto as qualidades, os vícios e os desvios da sociedade, como a avareza, o orgulho, a preguiça, o ciúme, o ódio, a cólera, a caridade, a modéstia, etc. Espíritos um pouco menos elevados, mas inteligentes, podem tratar de maneira feliz assuntos menos sérios, mas não menos interessantes. Outros, enfim, podem, conforme a sua aptidão e a facilidade de execução que lhes ofereça o médium, ditar obras de fôlego.
A maneira de fazer as perguntas e as coordenar é, como acabamos de ver, uma coisa essencial. Sobre isto encontraremos numerosas aplicações nos artigos publicados na REVISTA ESPÍRITA, sob o título de Palestras Familiares de Além-Túmulo. Podem ser tomadas como exemplo da marcha a seguir nas relações que se queiram estabelecer com os Espíritos.