Você está em:
Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1860 > Janeiro
Janeiro
O Espiritismo em 1860A Revista Espírita inicia o terceiro ano e temos o prazer de dizer que o faz sob os mais favoráveis auspícios. Aproveitamos prazerosamente a ocasião para testemunhar aos leitores toda a nossa gratidão pelas provas de simpatia que diariamente recebemos. Só isto seria um encorajamento para nós, se não encontrássemos na natureza mesma e no objetivo de nossos trabalhos, uma larga compensação moral à fadiga consequente. A multiplicidade desses trabalhos, aos quais nos consagramos inteiramente, é tal que nos é materialmente impossível responder a todas as cartas de felicitações que nos chegam. Força é dirigirmo-nos coletivamente aos seus autores, rogando-lhes aceitem os nossos agradecimentos.
Essas cartas e as numerosas pessoas que nos honram, vindo conversar conosco sobre esses graves problemas, nos convencem mais e mais do progresso do Espiritismo verdadeiro, assim entendido o Espiritismo compreendido em todas as suas consequências morais. Sem ilusões quanto ao alcance do nosso trabalho, o pensamento de haver contribuído, lançando alguns grãos1 na balança, é para nós suave satisfação, porque esses poucos grãos terão servido para despertar a reflexão.
A prosperidade crescente da Revista é um indício da benevolência com que é acolhida. Só nos resta continuar nossa obra na mesma linha, pois recebe a consagração do tempo, sem nos afastarmos da moderação, da prudência e das conveniências que sempre nos orientaram. Deixando aos contraditores o triste privilégio das injúrias e do personalismo, não os seguiremos no terreno de uma controvérsia sem objetivo. Dizemos sem objetivo, porque ela não os levaria à convicção, e é uma perda de tempo discutir com gente que desconhece o abc daquilo de que fala. Só temos uma coisa a lhes dizer: Estudai primeiro, e veremos depois. Temos mais o que fazer do que falar a quem não quer ouvir. Aliás, que importa, em definitivo, a opinião contrária deste ou daquele? Terá essa opinião tão grande importância que possa deter a marcha natural das coisas? As maiores descobertas encontraram os mais rudes adversários, o que não as prejudicou. Deixamos, pois, a incredulidade zumbir em redor de nós e nada nos desviará da rota que nos é traçada pela própria gravidade do assunto que nos ocupa.
Dissemos que as ideias espíritas progridem. Com efeito, desde algum tempo, ganharam imenso terreno. Dir-se-ia que estão no ar. Certamente, não será ao zabumbar da grande e da pequena imprensa que isto se deve. Se progridem, apesar de tudo e contra tudo, e não obstante a má vontade encontrada em certas regiões, é que possuem suficiente vitalidade para se bastarem a si mesmas. Aquele que se der ao trabalho de aprofundar a questão do Espiritismo, nele encontrará uma satisfação moral tão grande; a solução de tantos problemas que inutilmente havia pedido às teorias vulgares; o desdobramento do futuro à sua frente de maneira tão clara, precisa e lógica, que verificará realmente ser impossível as coisas não se passarem assim, sendo de admirar não se tenha compreendido isto antes, pois um sentimento íntimo lhe dizia que assim deveria ser. Desenvolvida, a ciência espírita nada mais faz que formular, tirar da escuridão ideias já existentes em seu foro íntimo; daí por diante, o futuro lhe revela um objetivo claro, preciso, perfeitamente definido. Já não anda a esmo, pois vê o seu caminho. Não é mais esse futuro de felicidade ou desgraça que a sua razão não podia compreender e que, por isso mesmo, repelia. É um futuro racional, consequência das próprias leis da Natureza, capazes de suportar o mais severo exame. Por isso sente-se feliz e como que aliviado de um peso imenso, o da incerteza, porque a incerteza é um tormento. Malgrado seu, o homem sonda as profundezas do futuro e não pode deixar de vê-lo eterno. Compara-o à brevidade e à fragilidade da existência terrena. Se o futuro não lhe oferece nenhuma certeza, atordoa-se, verga-se ao presente e, para torná-lo mais suportável, nada recusa. É em vão que a consciência lhe fala do bem e do mal. Ele diz a si mesmo: O bem é aquilo que me faz feliz. Que motivo teria, então, para ver o bem alhures? Por que suportar privações? Ele quer ser feliz, e para ser feliz quer gozar; gozar do que os outros possuem. Ele quer ouro, muito ouro. A isso se apega como à sua vida, porque o ouro é o veículo de todos os prazeres materiais. Que lhe importa o bemestar de seu semelhante? O seu, antes de tudo. Quer satisfazer-se no presente, pois não sabe se poderá fazê-lo mais tarde, num futuro em que não acredita. Assim, torna-se ávido, invejoso, egoísta, e com todos esses prazeres, não é feliz porque o presente lhe parece muito curto.
Com a certeza do futuro, tudo para ele muda de aspecto: o presente é apenas efêmero; ele o vê escoar-se sem tristeza. É menos dado aos gozos terrenos, porque estes não lhe trazem senão uma sensação passageira, fugidia, que deixa o coração vazio. Aspira a uma felicidade mais duradoura e, consequentemente, mais real.
Onde poderá encontrá-la, senão no futuro? Mostrando-lhe, provando-lhe esse futuro, o Espiritismo o liberta do suplício da incerteza, e assim o torna feliz. Ora, aquilo que traz felicidade sempre encontra partidários.
Os adversários do Espiritismo atribuem sua propagação rápida a uma febre supersticiosa que se apodera da Humanidade, ao amor do maravilhoso. Mas, antes de mais nada, precisariam ser lógicos. Aceitaremos o seu raciocínio, se tal se pode chamar raciocínio, quando tiverem explicado claramente por que a febre atinge precisamente as classes esclarecidas da Sociedade, mais do que as ignorantes.
Quanto a nós, dizemos que é porque o Espiritismo apela ao raciocínio e não à crença cega que as classes esclarecidas o examinam, refletem e o compreendem. Ora, as ideias supersticiosas não suportam exame.
Aliás, todos vós que combateis o Espiritismo, o compreendeis? Estudastes, perscrutando seus detalhes, pesados maduramente em todas as suas consequências?
Não, mil vezes não. Falais do que não conheceis. Todas as vossas críticas ─ e não falo das tolas, vulgares e grosseiras diatribes, despidas de qualquer raciocínio e que não têm qualquer valor ─ falo das que têm pelo menos aparência de seriedade; todas as vossas críticas, ia dizendo, revelam a mais completa ignorância do assunto. Para criticar é necessário poder opor raciocínio a raciocínio, prova a prova. É isto possível, sem conhecimento profundo do assunto de que se trata? Que pensaríeis de quem pretendesse criticar um quadro, sem possuir, pelo menos em teoria, as regras do desenho e da pintura; discutir o mérito de uma ópera, sem saber música?
Sabeis a consequência de uma crítica ignorante? É ser ridícula e denotar falta de senso. Quanto mais elevada é a posição do crítico; quanto mais ele se põe em evidência, tanto mais seu interesse o obriga a ser circunspecto, para não vir a receber desmentidos, sempre fáceis de dar a quem quer que fale daquilo que não conhece.
Eis porque os ataques contra o Espiritismo têm tão pouco alcance e favorecem o seu desenvolvimento, em vez de detê-lo. Esses ataques são propaganda; provocam exame, e o exame só nos pode ser favorável, porque nos dirigimos à razão. Não há um artigo publicado contra esta doutrina que não nos tenha valido um aumento de assinaturas e de venda de obras. O do Sr. Oscar Comettant (vide o Siècle de 27 de outubro último, e nossa resposta na Revista de dezembro de 1859), produziu a venda, em poucos dias, na casa Ledoyen, de mais de cinquenta exemplares da famosa sonata de Mozart (que custa 2 fr., preço líquido, segundo a importante e espirituosa observação do Sr. Comettant). Os artigos do Univers, de 13 de abril e 28 de maio de 1859, (vide nossa resposta na Revista de maio e julho de 1859) fizeram esgotar-se o resto da primeira edição do Livro dos Espíritos, bem como de outros.
Mas voltemos a coisas menos materiais. Enquanto não opuserem ao Espiritismo senão argumentos dessa ordem, ele nada terá a temer.
Repetimos que a principal fonte do progresso das ideias espíritas está na satisfação que proporcionam aos que as aprofundam, e que nelas veem algo mais do que fútil passatempo. Ora, como, antes de tudo, todos querem a felicidade, não é de admirar se liguem a uma ideia que os torna felizes. Dissemos algures que, em se tratando de Espiritismo, o período da curiosidade passou, substituído pelo da razão e da filosofia. A curiosidade tem tempo certo. Decorrido esse tempo, troca-se o objetivo por um outro. Já o mesmo não se dá com quem se dirige ao pensamento sério e à razão. O Espiritismo progrediu principalmente a partir de quando foi melhor compreendido em sua essência íntima, e desde que se viu o seu alcance, pois toca na corda mais sensível do homem: a de sua felicidade, mesmo neste mundo.
Essa a causa de sua propagação; o segredo da força que o fará triunfar. Vós todos que o atacais, quereis um meio seguro de combatê-lo com sucesso? Eu vo-lo indico.
Substituí-o por algo melhor. Encontrai uma solução mais lógica para todas as questões que ele resolve. Dai ao homem outra certeza, que o torne mais feliz, mas compreendei bem o alcance do vocábulo certeza, porque o homem só aceita como certo aquilo que lhe parece lógico. Não vos contenteis em dizer que isto não o é, pois dizer é muito fácil. Provai, não pela negação, mas pelos fatos, que isto não é, jamais foi e não pode ser. Provai, enfim, que as consequências do Espiritismo não tornam o homem melhor pela prática da mais pura moral evangélica, moral muito elogiada, mas tão pouco praticada. Quando tiverdes feito isso, serei o primeiro a inclinar-me à vossa frente. Até lá, permiti que encare as vossas doutrinas, que são a negação de todo o futuro, como a fonte do egoísmo, verme que rói a Sociedade e, consequentemente, como um verdadeiro flagelo. Sim, o Espiritismo é forte, mais forte do que vós, porque se apoia nas bases mesmas da religião: Deus, a alma e as penas e recompensas futuras, baseadas no bem e no mal que se faz. Vós vos apoiais na incredulidade. Ele convida o homem à felicidade, à esperança, à verdadeira fraternidade. Vós lhe ofereceis o nada como perspectiva e o egoísmo como consolação. Ele tudo explica, vós nada explicais. Ele prova pelos fatos e vós nada provais. Como quereis que se vacile entre as duas doutrinas?
Em resumo, constatamos ─ e cada um vê e sente como nós ─ que o Espiritismo deu um passo imenso no ano que findou, e que esse passo é a garantia do que haverá de dar no ano que começa. Não só o número de seus partidários aumentou consideravelmente, mas uma notável mudança operou-se na opinião geral, mesmo entre os indiferentes. Diz-se que no fundo de tudo isto bem poderia haver algo; que não deve haver pressa em julgá-lo. Os que, por isso, dão de ombros, começam a temer o ridículo sobre si mesmos ao ligarem o próprio nome a um julgamento precipitado, que poderá ser desmentido. Assim, preferem calar-se e esperar. Sem dúvida, durante muito tempo haverá pessoas que, nada tendo a perder com a opinião da posteridade, procurarão denegri-lo, umas por leveza de caráter ou por estado de ânimo, outras por cálculo. Mas a gente se familiariza com a ideia de ir a Charenton2, pois iríamos em tão boa companhia, e esta piada de mau gosto, como tantas outras, torna-se um lugar comum que não abala, pois no fundo desses ataques vemos uma absoluta falta de raciocínio. A arma do ridículo, essa arma que dizem tão terrível, gasta-se evidentemente, e cai das mãos que a manejavam. Teria perdido o seu poder? Não, desde que não vibre golpes em falso. O ridículo só mata o que é ridículo em si, tendo de sério apenas a aparência, porque fustiga o hipócrita e lhe arranca a máscara. Aquilo que é realmente sério, só receberá golpes ligeiros e sairá sempre triunfante da luta. Vede se uma só das grandes ideias que foram atacadas na origem, pela turba ignorante e invejosa, caiu para não mais se erguer! Ora, o Espiritismo é uma das maiores ideias, porque toca na questão mais vital, a da felicidade do homem, e não se brinca impunemente com semelhante problema. Ele é forte porque tem suas raízes nas leis da Natureza e responde aos inimigos fazendo, desde o início, a volta ao mundo. Alguns anos mais, e seus detratores, impotentes para combatê-lo pelo raciocínio, encontrar-se-ão de tal modo divorciados da opinião, de tal modo isolados, que serão forçados a calar-se ou a abrir os olhos à luz.
O magnetismo perante a academia
Barrado na porta de entrada, o Magnetismo entrou pela janela, graças a um disfarce e a um outro nome. Em vez de dizer: Sou o magnetismo, o que provavelmente não lhe teria dado acolhida favorável, disse: Chamo-me hipnotismo (do grego hypnos, sono). Graças a esta senha, entrou, após vinte anos de paciência, mas não perdeu por esperar, pois soube fazer-se introduzir por uma das maiores sumidades. Teve o cuidado de evitar, na apresentação, o seu cortejo de passes, de sonambulismo, de visão à distância, de êxtases, que o teriam traído. Disse simplesmente: Sois bons e humanos; vosso coração sangra ao ver sofrer os vossos doentes; procurais um meio de suavizar a dor do paciente, cortado pelo vosso escalpelo; o que empregais, às vezes é muito perigoso. Eu vos trago um meio mais simples e que, em todo caso, não tem inconvenientes. Estava certo de ser ouvido, falando em nome da humanidade. E acrescentou, astucioso: Sou da família, pois devo a vida a um dos vossos. Pensava, não sem alguma razão, que essa origem não o prejudicaria.
Se vivêssemos ao tempo da Grécia, brilhante e poética, diríamos: O Magnetismo, filho da Natureza e de um simples mortal, foi proscrito do Olimpo porque tinha ferido os privilégios de Esculápio e marchado ao seu lado, gabando-se de poder curar sem o seu concurso. Vagou muito tempo pela Terra, onde ensinou aos homens a arte de curar por meios novos. Desvendou ao vulgo uma porção de maravilhas que, até então, tinham sido misteriosamente escondidas nos templos; mas aqueles cujos segredos havia revelado, desmascarando-lhes a charlatanice, perseguiram-no a pedradas, de tal sorte que foi, ao mesmo tempo, banido pelos deuses e maltratado pelos homens. Nem por isso deixou de continuar a espalhar seus benefícios, aliviando a Humanidade, certo de que um dia a sua inocência seria reconhecida; de que um dia lhe fariam justiça. Teve um filho, ao qual deu o nome de Hipnotismo, e cujo nascimento escondeu cuidadosamente, receoso de lhe atrair perseguições. Esse filho partilhou longamente de seu exílio, e durante esse tempo ele o instruía. Quando o julgou bem formado, disse-lhe:
─ Vai apresentar-te no Olimpo, mas guarda-te de dizer que és meu filho. Teu nome e um disfarce facilitarão a tua entrada. Esculápio te apresentará.
─ Como, meu pai?! Esculápio, teu mais encarniçado inimigo! Aquele que te proscreveu!
─ Ele mesmo te estenderá a mão!
─ Mas se me reconhecer, expulsar-me-á.
─ Ora! se te expulsar, voltarás para junto de mim e continuaremos nossa obra beneficente entre os homens, à espera de melhores dias. Mas fica tranquilo. Tenho muita esperança. Esculápio não é mau. Ele quer, antes de tudo, o progresso da Ciência, do contrário não seria digno de ser o deus da Medicina. Aliás, talvez eu tenha cometido algumas faltas para com ele. Ofendido por me ver denegrir, eu me exaltei e ataquei-o imprudentemente: Prodigalizei-lhe injúrias, insultei-o, vilipendiei-o e o chamei de ignorante. Ora, esse não é um meio adequado de tratar os homens e os deuses. Com seu amor-próprio ferido, irritou-se um instante contra mim. Não faças como eu, meu filho. Sê mais prudente e, sobretudo, mais polido. Se os outros não o forem para contigo, o erro será deles, e a razão, tua. Vai, meu filho, e lembra-te que não se apanham moscas com vinagre.
Assim falou o pai. Hipnotismo partiu timidamente para o Olimpo; o coração lhe batia forte, quando se apresentou à soleira da porta sagrada. Mas oh surpresa! O próprio Esculápio estende-lhe a mão e o introduz!
Assim, eis o Magnetismo em seu lugar. Que vai fazer? Oh! Não acrediteis na vitória definitiva; ainda estamos nas preliminares da paz. É uma primeira barreira derrubada, eis tudo. O passo é importante, sem dúvida, mas não penseis que os inimigos vão confessar-se vencidos. O próprio Esculápio, o grande Esculápio, que o reconheceu por seus traços de família, dificultaria enormemente sua defesa, pois seriam capazes de mandá-lo a Charenton. Vão dizer que é... alguma coisa... mas que seguramente não é magnetismo. Vá lá! Não vamos chicanear com as palavras. Será tudo o que quiserem, mas, enquanto se espera, é um fato que terá consequências.
Ora, eis as consequências. Inicialmente vão ocupar-se apenas do ponto de vista anestésico (do grego aisthesis, sensibilidade e a, privativo, isto é, privação geral ou parcial da faculdade de sentir) e isto por força da predominância das ideias materialistas, pois ainda há muita gente que teima, sem dúvida por modéstia, em rebaixar-se ao papel de grelha que, quando estragada, é atirada ao ferro velho, sem deixar vestígios! Assim, vão examinar o fato de todas as maneiras, ainda que por mera curiosidade. Vão estudar a ação das várias substâncias para produzir o fenômeno da catalepsia; depois, um belo dia, reconhecerão que basta pôr o dedo. Mas não é tudo. Observando o fenômeno da catalepsia, outros surgirão espontaneamente. Já foi notada a liberdade de pensamento durante a suspensão das faculdades orgânicas. Assim, o pensamento é independente dos órgãos. Há, pois, no homem, algo além da matéria. Ver-se-á a manifestação de faculdades estranhas: a vista adquirir uma amplitude insólita, transpondo os limites dos sentidos; todas as percepções deslocadas; numa palavra, é um vasto campo para a observação e não faltarão observadores. O santuário está aberto, e esperamos que dele jorre a luz, a menos que o celeste areópago não deixe a honra a mais ninguém.
Tenham nossos leitores a bondade de ver o notável artigo que o Sr. Victor Meunier, redator do Ami des Sciences, publicou sobre esse interessante assunto na Revista científica hebdomadária do Siècle de 16 de dezembro de 1859:
“O Magnetismo animal, levado à Academia pelo Sr. Broca; apresentado à ilustre Sociedade pelo Sr. Velpeau; experimentado pelos Srs. Follin, Verneuil, Faure, Trousseau, Denonvilliers, Nélaton, Azam, Ch. Robin, etc., todos cirurgiões dos hospitais, é a grande novidade do dia.
“As descobertas, como os livros, têm o seu destino. A de que vamos tratar não é nova. Ela data de uns vinte anos, e nem na Inglaterra, onde nasceu, nem na França, onde, no momento, não se ocupam de outra coisa, lhe faltou publicidade. Um médico escocês, o Dr. Braid, a descobriu e lhe consagrou um livro: Neurypnology or the rational of nervous sleep, considered in relation with animal magnetism[1]. Um célebre médico inglês, o Dr. Carpenter, analisou detidamente a descoberta do Dr. Braid no artigo sleep (sono) da Enciclopédia de Anatomia e Fisiologia de Tood (Cyclopedia of Anatomy andPhysiology). Um ilustre cientista francês, o Sr. Littré, reproduziu a análise do Dr. Carpenter na segunda edição do Manuel de Physiologie de J. Mueller. Enfim, nós mesmos consagramos um de nossos folhetins da Presse de 7 de julho de 1852 ao hipnotismo, nome dado pelo Dr. Braid ao conjunto de fatos de que se trata. A mais recente das publicações relativas ao assunto data, pois, de sete anos. E eis que, quando o julgavam esquecido, ele adquire esta imensa repercussão.
“Há no hipnotismo duas coisas: um conjunto de fenômenos nervosos, e o processo por meio do qual são produzidos.
“O processo empregado outrora, se não me engano pelo Abade Faria, é de grande simplicidade.
“Consiste em manter um objeto brilhante em frente aos olhos da pessoa com a qual se experimenta, a pequena distância da raiz do nariz, de modo que só o possa olhar enviesando os olhos para dentro; ela deve fixar os olhos sobre ele. A princípio as pupilas se contraem, depois se dilatam bastante e, em poucos instantes, produz-se o estado cataléptico. Levantando-se os membros do paciente, estes conservam a posição que se lhes dá. É apenas um dos fenômenos produzidos. Dos outros falaremos oportunamente.
“O Sr. Azam, professor substituto de clínica cirúrgica da Escola de Medicina de Bordéus, tendo repetido com sucesso as experiências do Dr. Braid, trocou ideias com o Dr. Paul Broca, que imaginou que as pessoas hipnotizadas talvez fossem insensíveis à dor das operações cirúrgicas. A carta que acaba de dirigir à Academia de Ciências é o resumo de suas experiências a respeito.
“Antes de tudo, devia ele assegurar-se da realidade do hipnotismo, o que conseguiu sem dificuldades.
“Visitando uma senhora de uns quarenta anos, algo histérica, e que estava acamada por ligeira indisposição, o Dr. Broca fazia de conta que queria examinar os olhos da paciente e lhe pedia que olhasse fixamente um frasquinho dourado que ele segurava a uns quinze centímetros da raiz do nariz. Ao cabo de três minutos os olhos ficaram um pouco vermelhos, os traços imóveis, as respostas lentas e difíceis, mas perfeitamente racionais. O Dr. Broca levantou o braço da doente e este se manteve na posição deixada; posicionou os dedos nas mais extremas situações e eles as conservaram; beliscou a pele em vários pontos, com certa força e, ao que parece, a paciente nada sentiu. Catalepsia, insensibilidade! O Dr. Broca não levou adiante a experiência, pois ela já lhe havia ensinado o que queria saber. Uma fricção sobre os olhos e uma insuflação de ar frio na fronte trouxeram a doente ao estado normal. Ela não tinha a menor lembrança do que se havia passado.
“Restava saber se a insensibilidade hipnótica resistiria à prova das operações cirúrgicas.
“Entre os doentes do Hospital Necker, no serviço do Dr. Follin, estava uma pobre senhora de 24 anos, vítima de extensa queimadura nas costas e nos dois membros direitos e de um abscesso extremamente doloroso. Os menores movimentos lhe eram um suplício. Esgotada pelo sofrimento e, de resto, muito pusilânime, essa infeliz pensava com terror na operação que se fazia necessária. Foi nela que, de acordo com o Dr. Follin, o Dr. Broca resolveu completar a prova do hipnotismo.
“Puseram-na num leito em frente à janela, prevenindo-a que ia dormir. Ao cabo de dois minutos suas pupilas se dilataram. Levantaram o braço esquerdo quase verticalmente acima do leito e ele ficou imóvel. No quarto minuto suas respostas são lentas e quase penosas, mas perfeitamente sensatas. Quinto minuto: o Dr. Follin belisca a pele do braço esquerdo e a doente não o acusa; nova picada mais funda, que produz sangue, e a mesma impassibilidade. Levantam o braço direito, que fica no ar. Então as cobertas são levantadas e os membros inferiores afastados, para deixar a descoberto a sede do abscesso. A doente consente e diz com tranquilidade que, sem dúvida, vão magoá-la. Aberto o abscesso, solta um grito fraco. Foi o único sinal de reação, e que durou menos de um segundo. Nem o menor tremor de músculos do rosto ou dos membros, nem uma agitação nos braços, sempre elevados verticalmente acima do leito. Os olhos um pouco injetados estavam largamente abertos e o rosto tinha a imobilidade de uma máscara...
“Levantado, o pé esquerdo fica suspenso. Tiram o objeto brilhante, uma luneta, e persiste a catalepsia. Pela terceira vez picam o braço esquerdo, o sangue borbulha e a operada nada sente. Há 13 minutos o braço guarda a posição que lhe foi dada.
“Enfim, uma fricção nos olhos e uma insuflação de ar fresco despertam a jovem senhora quase que subitamente. Relaxados, os braços e a perna esquerda tombam imediatamente sobre a cama. Ela esfrega os olhos, retoma a consciência, de nada se lembra e se admira de que a tenham operado. A experiência tinha durado de 18 a 20 minutos. O período de anestesia, de 12 a 15.
“Tais são, em resumo, os fatos essenciais relatados pelo Dr. Broca à Academia de Ciências. Já não são mais isolados. Um grande número de cirurgiões de nossos hospitais tiveram a honra de repeti-los, e o fizeram com sucesso. O objetivo do Dr. Broca e de seus ilustres colegas era, e deveria ser, cirúrgico. Esperemos que, como meio de provocar a insensibilidade, tenha o hipnotismo todas as vantagens dos agentes anestésicos, sem lhes ter os inconvenientes. Mas a Medicina não é do nosso domínio e, para não sair de suas atribuições, nossa Revista não deve considerar o fato senão sob o ponto de vista fisiológico.
“Depois de haver reconhecido a veracidade do Dr. Braid sobre o ponto essencial, certamente ter-se-á que verificar tudo o que diz respeito a este estado singular, ao qual se dá o nome de hipnotismo. Os fenômenos que ele lhe atribui podem ser assim classificados:
“Exaltação da sensibilidade. O olfato é levado a um grau de sensibilidade pelo menos igual ao que se observa nos animais de melhor olfato. A audição também se torna muito penetrante. O tacto adquire, sobretudo em relação à temperatura, uma incrível delicadeza.
“Sentimentos sugeridos. Ponde o rosto, o corpo ou os membros do paciente na atitude que convém à expressão de um sentimento particular e logo se desperta o estado mental correspondente. Assim, colocada no alto da cabeça a mão do hipnotizado, ele se retesa espontaneamente, inclinando o corpo para trás; sua atitude é a do mais puro orgulho. Se nesse momento se lhe curvar a cabeça para a frente, dobrando levemente o corpo e os membros, o orgulho é substituído pela mais profunda humildade. Afastando levemente os cantos da boca, como no riso, logo se produz uma disposição alegre. O mau humor sobrevém imediatamente quando se faz as sobrancelhas convergirem para baixo.
“Ideias provocadas. Levante-se a mão do paciente acima da cabeça; dobrem-se os dedos sobre a palma, e é suscitada a ideia de subir, de se balançar ou de puxar uma corda. Se, ao contrário, se dobrarem os dedos, deixando o braço pendente, provoca-se a ideia de levantar um peso. Se os dedos forem fechados e o braço levado à frente, como para dar um soco, é sugerida a ideia de lutar boxe. (A cena se passa em Londres)..
“Acréscimo de força muscular. Se se quiser suscitar uma força extraordinária num grupo de músculos, basta sugerir ao paciente a ideia da ação que reclama essa força e lhe assegurar que pode realizá-lo com a maior facilidade, caso queira. Diz o Dr. Carpenter: ‘Vimos um paciente hipnotizado pelo Dr. Braid, notável pela pobreza de desenvolvimento muscular, levantar com o dedo mínimo um peso de quatorze quilos e girá-lo em volta da cabeça, certo de que o peso era leve como uma pluma.’
Limitamo-nos, por hoje, à indicação deste esquema. Aos fatos a palavra; as reflexões virão depois.
[1] Neuripnologia ou o fundamento do sono nervoso, considerado em relação com o magnetismo animal. N. do T.
Se vivêssemos ao tempo da Grécia, brilhante e poética, diríamos: O Magnetismo, filho da Natureza e de um simples mortal, foi proscrito do Olimpo porque tinha ferido os privilégios de Esculápio e marchado ao seu lado, gabando-se de poder curar sem o seu concurso. Vagou muito tempo pela Terra, onde ensinou aos homens a arte de curar por meios novos. Desvendou ao vulgo uma porção de maravilhas que, até então, tinham sido misteriosamente escondidas nos templos; mas aqueles cujos segredos havia revelado, desmascarando-lhes a charlatanice, perseguiram-no a pedradas, de tal sorte que foi, ao mesmo tempo, banido pelos deuses e maltratado pelos homens. Nem por isso deixou de continuar a espalhar seus benefícios, aliviando a Humanidade, certo de que um dia a sua inocência seria reconhecida; de que um dia lhe fariam justiça. Teve um filho, ao qual deu o nome de Hipnotismo, e cujo nascimento escondeu cuidadosamente, receoso de lhe atrair perseguições. Esse filho partilhou longamente de seu exílio, e durante esse tempo ele o instruía. Quando o julgou bem formado, disse-lhe:
─ Vai apresentar-te no Olimpo, mas guarda-te de dizer que és meu filho. Teu nome e um disfarce facilitarão a tua entrada. Esculápio te apresentará.
─ Como, meu pai?! Esculápio, teu mais encarniçado inimigo! Aquele que te proscreveu!
─ Ele mesmo te estenderá a mão!
─ Mas se me reconhecer, expulsar-me-á.
─ Ora! se te expulsar, voltarás para junto de mim e continuaremos nossa obra beneficente entre os homens, à espera de melhores dias. Mas fica tranquilo. Tenho muita esperança. Esculápio não é mau. Ele quer, antes de tudo, o progresso da Ciência, do contrário não seria digno de ser o deus da Medicina. Aliás, talvez eu tenha cometido algumas faltas para com ele. Ofendido por me ver denegrir, eu me exaltei e ataquei-o imprudentemente: Prodigalizei-lhe injúrias, insultei-o, vilipendiei-o e o chamei de ignorante. Ora, esse não é um meio adequado de tratar os homens e os deuses. Com seu amor-próprio ferido, irritou-se um instante contra mim. Não faças como eu, meu filho. Sê mais prudente e, sobretudo, mais polido. Se os outros não o forem para contigo, o erro será deles, e a razão, tua. Vai, meu filho, e lembra-te que não se apanham moscas com vinagre.
Assim falou o pai. Hipnotismo partiu timidamente para o Olimpo; o coração lhe batia forte, quando se apresentou à soleira da porta sagrada. Mas oh surpresa! O próprio Esculápio estende-lhe a mão e o introduz!
Assim, eis o Magnetismo em seu lugar. Que vai fazer? Oh! Não acrediteis na vitória definitiva; ainda estamos nas preliminares da paz. É uma primeira barreira derrubada, eis tudo. O passo é importante, sem dúvida, mas não penseis que os inimigos vão confessar-se vencidos. O próprio Esculápio, o grande Esculápio, que o reconheceu por seus traços de família, dificultaria enormemente sua defesa, pois seriam capazes de mandá-lo a Charenton. Vão dizer que é... alguma coisa... mas que seguramente não é magnetismo. Vá lá! Não vamos chicanear com as palavras. Será tudo o que quiserem, mas, enquanto se espera, é um fato que terá consequências.
Ora, eis as consequências. Inicialmente vão ocupar-se apenas do ponto de vista anestésico (do grego aisthesis, sensibilidade e a, privativo, isto é, privação geral ou parcial da faculdade de sentir) e isto por força da predominância das ideias materialistas, pois ainda há muita gente que teima, sem dúvida por modéstia, em rebaixar-se ao papel de grelha que, quando estragada, é atirada ao ferro velho, sem deixar vestígios! Assim, vão examinar o fato de todas as maneiras, ainda que por mera curiosidade. Vão estudar a ação das várias substâncias para produzir o fenômeno da catalepsia; depois, um belo dia, reconhecerão que basta pôr o dedo. Mas não é tudo. Observando o fenômeno da catalepsia, outros surgirão espontaneamente. Já foi notada a liberdade de pensamento durante a suspensão das faculdades orgânicas. Assim, o pensamento é independente dos órgãos. Há, pois, no homem, algo além da matéria. Ver-se-á a manifestação de faculdades estranhas: a vista adquirir uma amplitude insólita, transpondo os limites dos sentidos; todas as percepções deslocadas; numa palavra, é um vasto campo para a observação e não faltarão observadores. O santuário está aberto, e esperamos que dele jorre a luz, a menos que o celeste areópago não deixe a honra a mais ninguém.
Tenham nossos leitores a bondade de ver o notável artigo que o Sr. Victor Meunier, redator do Ami des Sciences, publicou sobre esse interessante assunto na Revista científica hebdomadária do Siècle de 16 de dezembro de 1859:
“O Magnetismo animal, levado à Academia pelo Sr. Broca; apresentado à ilustre Sociedade pelo Sr. Velpeau; experimentado pelos Srs. Follin, Verneuil, Faure, Trousseau, Denonvilliers, Nélaton, Azam, Ch. Robin, etc., todos cirurgiões dos hospitais, é a grande novidade do dia.
“As descobertas, como os livros, têm o seu destino. A de que vamos tratar não é nova. Ela data de uns vinte anos, e nem na Inglaterra, onde nasceu, nem na França, onde, no momento, não se ocupam de outra coisa, lhe faltou publicidade. Um médico escocês, o Dr. Braid, a descobriu e lhe consagrou um livro: Neurypnology or the rational of nervous sleep, considered in relation with animal magnetism[1]. Um célebre médico inglês, o Dr. Carpenter, analisou detidamente a descoberta do Dr. Braid no artigo sleep (sono) da Enciclopédia de Anatomia e Fisiologia de Tood (Cyclopedia of Anatomy andPhysiology). Um ilustre cientista francês, o Sr. Littré, reproduziu a análise do Dr. Carpenter na segunda edição do Manuel de Physiologie de J. Mueller. Enfim, nós mesmos consagramos um de nossos folhetins da Presse de 7 de julho de 1852 ao hipnotismo, nome dado pelo Dr. Braid ao conjunto de fatos de que se trata. A mais recente das publicações relativas ao assunto data, pois, de sete anos. E eis que, quando o julgavam esquecido, ele adquire esta imensa repercussão.
“Há no hipnotismo duas coisas: um conjunto de fenômenos nervosos, e o processo por meio do qual são produzidos.
“O processo empregado outrora, se não me engano pelo Abade Faria, é de grande simplicidade.
“Consiste em manter um objeto brilhante em frente aos olhos da pessoa com a qual se experimenta, a pequena distância da raiz do nariz, de modo que só o possa olhar enviesando os olhos para dentro; ela deve fixar os olhos sobre ele. A princípio as pupilas se contraem, depois se dilatam bastante e, em poucos instantes, produz-se o estado cataléptico. Levantando-se os membros do paciente, estes conservam a posição que se lhes dá. É apenas um dos fenômenos produzidos. Dos outros falaremos oportunamente.
“O Sr. Azam, professor substituto de clínica cirúrgica da Escola de Medicina de Bordéus, tendo repetido com sucesso as experiências do Dr. Braid, trocou ideias com o Dr. Paul Broca, que imaginou que as pessoas hipnotizadas talvez fossem insensíveis à dor das operações cirúrgicas. A carta que acaba de dirigir à Academia de Ciências é o resumo de suas experiências a respeito.
“Antes de tudo, devia ele assegurar-se da realidade do hipnotismo, o que conseguiu sem dificuldades.
“Visitando uma senhora de uns quarenta anos, algo histérica, e que estava acamada por ligeira indisposição, o Dr. Broca fazia de conta que queria examinar os olhos da paciente e lhe pedia que olhasse fixamente um frasquinho dourado que ele segurava a uns quinze centímetros da raiz do nariz. Ao cabo de três minutos os olhos ficaram um pouco vermelhos, os traços imóveis, as respostas lentas e difíceis, mas perfeitamente racionais. O Dr. Broca levantou o braço da doente e este se manteve na posição deixada; posicionou os dedos nas mais extremas situações e eles as conservaram; beliscou a pele em vários pontos, com certa força e, ao que parece, a paciente nada sentiu. Catalepsia, insensibilidade! O Dr. Broca não levou adiante a experiência, pois ela já lhe havia ensinado o que queria saber. Uma fricção sobre os olhos e uma insuflação de ar frio na fronte trouxeram a doente ao estado normal. Ela não tinha a menor lembrança do que se havia passado.
“Restava saber se a insensibilidade hipnótica resistiria à prova das operações cirúrgicas.
“Entre os doentes do Hospital Necker, no serviço do Dr. Follin, estava uma pobre senhora de 24 anos, vítima de extensa queimadura nas costas e nos dois membros direitos e de um abscesso extremamente doloroso. Os menores movimentos lhe eram um suplício. Esgotada pelo sofrimento e, de resto, muito pusilânime, essa infeliz pensava com terror na operação que se fazia necessária. Foi nela que, de acordo com o Dr. Follin, o Dr. Broca resolveu completar a prova do hipnotismo.
“Puseram-na num leito em frente à janela, prevenindo-a que ia dormir. Ao cabo de dois minutos suas pupilas se dilataram. Levantaram o braço esquerdo quase verticalmente acima do leito e ele ficou imóvel. No quarto minuto suas respostas são lentas e quase penosas, mas perfeitamente sensatas. Quinto minuto: o Dr. Follin belisca a pele do braço esquerdo e a doente não o acusa; nova picada mais funda, que produz sangue, e a mesma impassibilidade. Levantam o braço direito, que fica no ar. Então as cobertas são levantadas e os membros inferiores afastados, para deixar a descoberto a sede do abscesso. A doente consente e diz com tranquilidade que, sem dúvida, vão magoá-la. Aberto o abscesso, solta um grito fraco. Foi o único sinal de reação, e que durou menos de um segundo. Nem o menor tremor de músculos do rosto ou dos membros, nem uma agitação nos braços, sempre elevados verticalmente acima do leito. Os olhos um pouco injetados estavam largamente abertos e o rosto tinha a imobilidade de uma máscara...
“Levantado, o pé esquerdo fica suspenso. Tiram o objeto brilhante, uma luneta, e persiste a catalepsia. Pela terceira vez picam o braço esquerdo, o sangue borbulha e a operada nada sente. Há 13 minutos o braço guarda a posição que lhe foi dada.
“Enfim, uma fricção nos olhos e uma insuflação de ar fresco despertam a jovem senhora quase que subitamente. Relaxados, os braços e a perna esquerda tombam imediatamente sobre a cama. Ela esfrega os olhos, retoma a consciência, de nada se lembra e se admira de que a tenham operado. A experiência tinha durado de 18 a 20 minutos. O período de anestesia, de 12 a 15.
“Tais são, em resumo, os fatos essenciais relatados pelo Dr. Broca à Academia de Ciências. Já não são mais isolados. Um grande número de cirurgiões de nossos hospitais tiveram a honra de repeti-los, e o fizeram com sucesso. O objetivo do Dr. Broca e de seus ilustres colegas era, e deveria ser, cirúrgico. Esperemos que, como meio de provocar a insensibilidade, tenha o hipnotismo todas as vantagens dos agentes anestésicos, sem lhes ter os inconvenientes. Mas a Medicina não é do nosso domínio e, para não sair de suas atribuições, nossa Revista não deve considerar o fato senão sob o ponto de vista fisiológico.
“Depois de haver reconhecido a veracidade do Dr. Braid sobre o ponto essencial, certamente ter-se-á que verificar tudo o que diz respeito a este estado singular, ao qual se dá o nome de hipnotismo. Os fenômenos que ele lhe atribui podem ser assim classificados:
“Exaltação da sensibilidade. O olfato é levado a um grau de sensibilidade pelo menos igual ao que se observa nos animais de melhor olfato. A audição também se torna muito penetrante. O tacto adquire, sobretudo em relação à temperatura, uma incrível delicadeza.
“Sentimentos sugeridos. Ponde o rosto, o corpo ou os membros do paciente na atitude que convém à expressão de um sentimento particular e logo se desperta o estado mental correspondente. Assim, colocada no alto da cabeça a mão do hipnotizado, ele se retesa espontaneamente, inclinando o corpo para trás; sua atitude é a do mais puro orgulho. Se nesse momento se lhe curvar a cabeça para a frente, dobrando levemente o corpo e os membros, o orgulho é substituído pela mais profunda humildade. Afastando levemente os cantos da boca, como no riso, logo se produz uma disposição alegre. O mau humor sobrevém imediatamente quando se faz as sobrancelhas convergirem para baixo.
“Ideias provocadas. Levante-se a mão do paciente acima da cabeça; dobrem-se os dedos sobre a palma, e é suscitada a ideia de subir, de se balançar ou de puxar uma corda. Se, ao contrário, se dobrarem os dedos, deixando o braço pendente, provoca-se a ideia de levantar um peso. Se os dedos forem fechados e o braço levado à frente, como para dar um soco, é sugerida a ideia de lutar boxe. (A cena se passa em Londres)..
“Acréscimo de força muscular. Se se quiser suscitar uma força extraordinária num grupo de músculos, basta sugerir ao paciente a ideia da ação que reclama essa força e lhe assegurar que pode realizá-lo com a maior facilidade, caso queira. Diz o Dr. Carpenter: ‘Vimos um paciente hipnotizado pelo Dr. Braid, notável pela pobreza de desenvolvimento muscular, levantar com o dedo mínimo um peso de quatorze quilos e girá-lo em volta da cabeça, certo de que o peso era leve como uma pluma.’
Limitamo-nos, por hoje, à indicação deste esquema. Aos fatos a palavra; as reflexões virão depois.
[1] Neuripnologia ou o fundamento do sono nervoso, considerado em relação com o magnetismo animal. N. do T.
Espírito de um lado, corpo do outro. Palestra com o Espírito de um vivo
O nosso ilustre colega, Sr. Conde de R... C... dirigiu-nos, em data de 23 de novembro último, a seguinte carta:
“Senhor Presidente:
“Ouvi dizer que médicos, entusiastas de sua arte e de contribuir para o progresso da Ciência, tornando-se úteis à Humanidade, legaram, por testamento, os seus corpos ao escalpelo das salas anatômicas. A experiência a que assisti, de evocação de unia pessoa viva (Sessão da Sociedade de 14 de outubro de 1859) não me pareceu muito instrutiva, por se tratar de uma coisa muito pessoal: pôr em comunicação um pai vivo com a filha morta. Pensei que aquilo que os médicos fizeram pelo corpo, um membro da Sociedade poderia fazer pela alma, ainda em vida, pondo-se à vossa disposição para um ensaio desse gênero. Talvez pudésseis, preparando de antemão as perguntas que desta vez nada teriam de pessoal, obter novos esclarecimentos sobre o fato do isolamento da alma e do corpo. Aproveitando uma indisposição que me retém em casa, venho oferecer-me como paciente para estudo, se quiserdes. Então, na próxima sexta-feira, se não houver nenhum contratempo, deitar-me-ei às nove horas e penso que às nove e meia podereis chamar-me, etc.”
Aproveitamos a oferta do Sr. Conde de R... C..., com tanto mais entusiasmo quanto, pondo-se à nossa disposição, pensávamos que seu Espírito se prestaria de boa vontade às nossas pesquisas. Por outro lado, sua instrução, a superioridade de sua inteligência ─ o que, diga-se de passagem, não impede seja um excelente espírita ─ e a experiência que adquiriu em viagens à volta do mundo, como capitão da marinha imperial, dava-nos o direito de esperar de sua parte uma apreciação mais criteriosa de seu estado. A espera não nos decepcionou. Em consequência, tivemos com ele as duas conversas que se seguem, a primeira a 25 de novembro e a segunda a 2 de dezembro de 1859.
Aproveitamos a oferta do Sr. Conde de R... C..., com tanto mais entusiasmo quanto, pondo-se à nossa disposição, pensávamos que seu Espírito se prestaria de boa vontade às nossas pesquisas. Por outro lado, sua instrução, a superioridade de sua inteligência ─ o que, diga-se de passagem, não impede seja um excelente espírita ─ e a experiência que adquiriu em viagens à volta do mundo, como capitão da marinha imperial, dava-nos o direito de esperar de sua parte uma apreciação mais criteriosa de seu estado. A espera não nos decepcionou. Em consequência, tivemos com ele as duas conversas que se seguem, a primeira a 25 de novembro e a segunda a 2 de dezembro de 1859.
(SOCIEDADE, 25 DE NOVEMBRO DE 1859)
1. Evocação. ─ Aqui estou.
2. ─ Neste momento tendes consciência do desejo manifestado, de ser evocado? ─ Perfeitamente.
3. ─ Em que lugar vos achais, aqui? ─ Entre vós e o médium.
4. ─ Vede-nos tão claramente como, quando em pessoa, assistis às nossas sessões? ─ Mais ou menos, mas um pouco velado. Ainda não durmo bem.
5. ─ Como tendes consciência de vossa individualidade aqui presente, quando o vosso corpo está no leito? ─ Neste momento o corpo me é simples acessório. Sou Eu que aqui estou.
OBSERVAÇÃO: Sou Eu que aqui estou é uma resposta notável. Para ele, o corpo não é a parte essencial do seu ser. A parte essencial é o Espírito, que constitui o Eu. O seu Eu e o seu corpo são duas coisas distintas.
6. ─ Podeis transportar-vos instantaneamente, e à vontade, daqui para a casa e vice-versa? ─ Sim.
7. ─ Indo para casa e vindo para cá, tendes consciência do trajeto que fazeis? Vedes os objetos que estão no caminho? ─ Poderia, mas negligencio fazê-lo, pois não há interesse.
8. ─ O estado em que vos encontrais é semelhante ao de um sonâmbulo? ─ Não inteiramente. Meu corpo dorme, isto é, está mais ou menos inerte. O sonâmbulo não dorme. Suas faculdades orgânicas estão modificadas, mas não aniquiladas.
2. ─ Neste momento tendes consciência do desejo manifestado, de ser evocado? ─ Perfeitamente.
3. ─ Em que lugar vos achais, aqui? ─ Entre vós e o médium.
4. ─ Vede-nos tão claramente como, quando em pessoa, assistis às nossas sessões? ─ Mais ou menos, mas um pouco velado. Ainda não durmo bem.
5. ─ Como tendes consciência de vossa individualidade aqui presente, quando o vosso corpo está no leito? ─ Neste momento o corpo me é simples acessório. Sou Eu que aqui estou.
OBSERVAÇÃO: Sou Eu que aqui estou é uma resposta notável. Para ele, o corpo não é a parte essencial do seu ser. A parte essencial é o Espírito, que constitui o Eu. O seu Eu e o seu corpo são duas coisas distintas.
6. ─ Podeis transportar-vos instantaneamente, e à vontade, daqui para a casa e vice-versa? ─ Sim.
7. ─ Indo para casa e vindo para cá, tendes consciência do trajeto que fazeis? Vedes os objetos que estão no caminho? ─ Poderia, mas negligencio fazê-lo, pois não há interesse.
8. ─ O estado em que vos encontrais é semelhante ao de um sonâmbulo? ─ Não inteiramente. Meu corpo dorme, isto é, está mais ou menos inerte. O sonâmbulo não dorme. Suas faculdades orgânicas estão modificadas, mas não aniquiladas.
9. Evocado o Espírito de uma pessoa viva, poderia indicar remédios, como um sonâmbulo? ─ Se os conhecer, ou se achar-se em contato com um Espírito que os conheça, sim; do contrário, não.
10. A lembrança de vossa existência corpórea está claramente presente em vossa memória? ─ Muito clara.
11. ─ Poderíeis citar uma de vossas ocupações mais importantes do dia? ─ Poderia, mas não o farei. Lamento ter proposto tal pergunta. (Ele havia pedido lhe fosse feita uma pergunta deste gênero, como prova).
12. ─ É como Espírito que lamentais terdes proposto a pergunta? ─ Como Espírito.
13.
─ Por que o lamentais?
─ Porque melhor compreendo o quanto é justo que, na
maior parte dos casos, seja vedado fazê-lo.
14.
─ Poderíeis descrever-nos o vosso quarto? ─
Certamente; e também o do porteiro.
15.
─ Então, tende a bondade de descrever um deles. ─
Eu disse que poderia, mas poder não é querer.
16.
─ Qual a doença que vos retém em casa?
─ A gota.
17.
─ Há um remédio para a gota? Se o conheceis,
poderíeis indicá-lo, pois prestaríeis um grande serviço. ─ Poderia, mas não o farei. O remédio
seria pior que o mal.
18.
─ Pior ou não, poderíeis indicá-lo, com a
condição de não fazer uso dele? ─ Há diversos, entre os quais o
cólquico.
OBSERVAÇÃO: Desperto, o Conde reconheceu jamais ter
ouvido falar no emprego dessa planta como específico antigotoso.
19.
─ No vosso estado atual, veríeis o perigo que
poderia correr um amigo e poderíeis ir em seu auxílio?
─ Poderia. Inspirá-lo-ia, se ele ouvisse a minha
inspiração, e ainda com mais proveito, se ele fosse médium.
20. ─ Desde que o evocamos por vossa vontade e que vos pondes à nossa disposição para estudos, tende a bondade de descrever, da melhor forma possível, de tal forma que possamos compreender, se possível, o estado em que vos achais agora.
─ Estou no mais feliz e satisfatório estado que se
possa experimentar. Algum dia tivestes um sonho em que o calor do leito leva a
crer que somos levemente embalados no ar, ou na crista de ondas tépidas, sem
preocupação com os movimentos; sem consciência dos membros pesados e incômodos,
a se moverem ou a se arrastarem; numa palavra, sem qualquer necessidade a
satisfazer, não sentindo o aguilhão da fome ou da sede? Estou neste estado
junto a vós, e só vos dei uma pequena amostra do que experimento.
21.
─ O estado atual do vosso corpo sofre alguma
modificação fisiológica, por força da ausência do Espírito? ─ De modo algum. Estou no estado a que chamais primeiro
sono, sono pesado e profundo que todos experimentamos, e durante o qual nos
afastamos do corpo.
OBSERVAÇÃO: O sono, que não era completo no começo da
evocação, estabeleceu-se pouco a pouco, por força do desprendimento do
Espírito, que deixa o corpo em profundo repouso.
22.
─ Se por um movimento brusco despertassem
instantaneamente o vosso corpo, enquanto vosso Espírito aqui está, o que
aconteceria? ─ Aquilo que é brusco para o homem é muito lento para o
Espírito, que sempre tem tempo de ser avisado.
23.
─ A felicidade que descrevestes e que desfrutais
no estado de liberdade, tem qualquer relação com as sensações agradáveis
experimentadas nos primeiros momentos da asfixia? O Sr. S..., que
involuntariamente teve a satisfação de experimentá-las, é quem vos dirige a
pergunta. ─ Ele não está inteiramente errado. Na morte por
asfixia há um instante análogo àquele de que ele fala, com a diferença de que o
Espírito perde a lucidez, enquanto aqui ela é consideravelmente aumentada.
24.
─ Vosso Espírito está ligado ao corpo por um
laço qualquer? ─ Sim, e disso tenho perfeita
consciência.
25.
─ A que podeis comparar esse laço?
─ A coisa alguma que conheçais. Teria para vós a
aparência de uma luz fosforescente, se pusésseis vê-lo, mas que não produz em
mim nenhuma sensação.
26.
─ A luz vos afeta da mesma maneira? Tem o mesmo
tom que vedes pelos olhos?
─ Absolutamente, porque os olhos me servem, de certo
modo, como janelas do cérebro.
27.
─ Percebeis os sons com a mesma distinção?
─ Mais distintamente, pois percebo
muitos que vos escapam.
28.
─ Como transmitis o pensamento ao médium?
─ Atuo sobre sua mão, para lhe dar uma direção, que
facilito por uma ação sobre o cérebro.
29.
─ Servi-vos das palavras do vocabulário que ele
tem na cabeça, ou indicais as palavras que ele deve escrever?
─ Uma coisa e outra, conforme a
conveniência.
29 (bis). ─ Se tivésseis por médium alguém que desconhecesse a
vossa língua e a dele vos fosse desconhecida, como, por exemplo, um chinês,
como poderíeis lhe fazer o ditado?
─ Isto seria mais difícil e talvez impossível. Em todo
o caso, só seria possível com uma flexibilidade e uma docilidade difíceis de
encontrar.
30.
─ Um Espírito cujo corpo estivesse morto
experimentaria a mesma dificuldade para se comunicar por um médium
completamente estranho à língua que falava em vida?
─ Talvez menor, posto sempre existisse. Posso
afirmar-vos que, conforme o caso, o Espírito dá ao médium as suas expressões,
ou emprega as dele.
31.
─ Vossa presença aqui fatiga o vosso corpo?
─ Absolutamente.
32.
─ Vosso corpo sonha?
─ Não. É justamente por isso que não se fatiga. A
pessoa de quem falais experimentava por seus órgãos impressões que se
transmitiam ao Espírito. Era isto o que a fatigava. Nada experimento de
semelhante.
OBSERVAÇÃO: Ele alude a uma pessoa de quem se falava no
momento e que, em semelhante situação, tinha dito que seu corpo se fatigava, e
havia comparado seu Espírito a um balão cativo, cujos arrancos abalam o poste
que o prende.
No dia seguinte, o Sr. Conde de R... C... contou que
tinha sonhado que se achava na Sociedade, entre nós e o médium. Evidentemente é
uma lembrança da evocação. É provável que no momento da pergunta não sonhasse,
pois respondeu negativamente. Também é possível, e mais provável, que sendo o
sonho uma lembrança da atividade do Espírito, na verdade não é o corpo que
sonha, pois o corpo não pensa. Ele, pois, respondeu negativamente, sem saber se
quando desperto seu Espírito se recordaria. Se o corpo tivesse sonhado enquanto
o seu Espírito estava ausente, o Espírito teria tido uma ação dupla. Ora, ele
não poderia estar simultaneamente na Sociedade e em sua casa.
33.
─ Vosso Espírito se acha no estado em que se
achará quando estiverdes morto?
─ Mais ou menos a mesma coisa, exceto
pelo laço que o prende ao corpo.
34.
─ Tendes consciência das existências anteriores?
─ Muito confusamente. Aí está uma diferença de que me
esquecia. Após o desprendimento completo que sucede à morte, as lembranças são
muito mais precisas. Atualmente são mais completas do que durante a vigília,
mas não suficientes para eu poder especificá-las de modo mais inteligível.
35.
─ Se, ao despertar, vos mostrassem vossa
escrita, teríeis consciência das respostas que acabais de dar?
─ Poderia identificar alguns de meus pensamentos, mas
muitos outros não encontrariam qualquer eco em meu pensamento, quando desperto.
36.
─ Poderíeis exercer sobre o corpo tão grande
influência, a ponto de despertá-lo? ─ Não.
37.
─ Poderíeis responder a uma pergunta mental? ─
Sim.
38.
─ Vede-nos espiritualmente ou fisicamente?
─ De um e de outro modo.
39.
─ Poderíeis ir visitar o irmão de vosso pai, que
disseram estar numa ilha da Oceania e, como marinheiro, precisar a posição da
ilha?
─ Não posso nada disso.
40.
─ Que pensais agora de vossa interminável obra e
de seu objetivo?
─ Penso que devo continuá-la, com o mesmo objetivo. É
tudo quanto posso dizer.
OBSERVAÇÃO: Ele havia pedido que fosse feita esta
pergunta, relativa a importante trabalho que iniciou, sobre a marinha.
41.
─ Ficaríamos encantados se quisésseis dirigir
algumas palavras aos vossos colegas, uma espécie de pequeno discurso. ─ Desde que tenho a oportunidade, aproveito-a para vos
afirmar, com base na minha fé sobre o futuro da alma, que a maior falta que
podem os homens cometer é procurar provas e mais provas. Isto é no máximo
perdoável aos homens que se iniciam no conhecimento do Espiritismo. Já não vos
repetiram milhares de vezes que é preciso crer porque se compreende e se ama a
justiça e a verdade, e que se déssemos satisfação a uma dessas perguntas
pueris, os que pretendessem fazê-la, a fim de se convencerem, não deixariam de
fazer outras no dia seguinte e que, infalivelmente, perderíeis um tempo
precioso, fazendo os Espíritos lerem a sorte? Eu o compreendo agora muito
melhor do que quando desperto, e vos posso dar um sábio conselho, para quando
quiserdes obter tais resultados. Dirigi-vos aos Espíritos batedores e às mesas
falantes que, não tendo nada melhor a dizer, podem ocupar-se de tais
manifestações. Perdoai a lição, mas eu tenho necessidade dela, como de outras,
e não me aborreço de dá-la a mim mesmo.
(SEGUNDA SESSÃO, A 2 DE DEZEMBRO DE 1859)
42.
Evocação. ─ Estou aqui.
43.
─ Dormis bem?
─ Não muito, mas isso ainda vai
acontecer.
44.
─ No caso particular em que vos encontrais,
julgais útil fazer a evocação em nome de Deus, como se fosse o Espírito de um
morto?
─ Por que não? Credes que por não
estar morto, Deus me seja indiferente?
45.
─ Se, no momento em que vos achais aqui, vosso
corpo recebesse uma picada, não bastante forte para vos despertar, mas
suficiente para o acusar, vosso Espírito a sentiria?
─ Meu corpo não a sentiria.
46.
─ Vosso Espírito teria consciência do fato?
─ Não teria a menor consciência; mas notai que me
falais de uma sensação leve e sem nenhuma importância, quer para o corpo, quer
para o Espírito.
47.
─ A propósito da luz, dissestes que a sentis
como se em vigília, desde que vossos olhos são como janelas por onde ela chega
ao cérebro. Compreendemo-lo para a luz percebida pelo corpo, mas neste momento
não é o vosso corpo que vê. Vedes ainda por um ponto circunscrito ou por todo o
ser?
─ É muito difícil explicar-vos. O Espírito percebe as
sensações sem a intermediação dos órgãos e não tem ponto circunscrito para
percebê-las.
48.
─ Insisto novamente em saber se os objetos e o
espaço que vos cerca têm para vós a mesma cor de quando estais desperto.
─ Para mim, sim, pois meus órgãos não me enganam. Mas
certos Espíritos encontrariam nisto grandes diferenças. Vós, por exemplo,
percebeis os sons e as cores de modo muito diferente.
49.
─ Percebeis os odores?
─ Também melhor do que vós.
50.
─ Fazeis distinção entre a luz e a obscuridade?
─ Distinção sim, mas para mim a obscuridade não é como
para vós. Nela vejo perfeitamente.
51.
─ Vossa vista penetra os corpos opacos?
─ Sim.
52.
─ Poderíeis ir a outro planeta? ─ Isto depende.
53.
─ De que depende? ─ Do planeta.
54.
─ A que planeta poderíeis ir?
─ Aos que estão no mesmo grau
evolutivo da Terra, ou parecido.
55.
─ Vedes os outros Espíritos?
─ Muitos e ainda.
OBSERVAÇÃO: Alguém que o conhece intimamente, e que
estava presente à sessão, disse que essa expressão lhe é muito familiar. Assim,
vê nisto, bem como em toda a sua forma da linguagem, uma prova de identidade.
56.
─ Vede-os aqui?
─ Sim.
57.
─ Como constatais sua presença? Por uma forma
qualquer? ─ Por sua forma própria, isto é, por seu perispírito.
58.
─ Vedes por vezes os vossos filhos e podeis
falar-lhes?
─ Vejo-os e lhes falo com muita
frequência.
59.
─ Dissestes: Neste momento o corpo me é simples
acessório. Sou
Eu que aqui estou.
Esse
Eu é circunscrito, limitado; tem
uma forma qualquer? Numa palavra, como vos vedes?
─ É sempre o perispírito.
60.
─ Então o perispírito é para vós um corpo?
─ Mas, sem dúvida.
61.
─ Vosso perispírito imita a forma do vosso corpo
material e vos parece que aqui estais com vosso corpo?
─ Sim para a primeira pergunta, e não para a segunda.
Tenho perfeita consciência de estar aqui apenas com meu corpo fluídico
luminoso.
48.
62. Poderíeis dar-me um soco? ─ Sim, mas não o
sentiríeis.
63.
─ Poderíeis fazê-lo de forma perceptível?
─ Isto é possível, mas não posso
fazê-lo aqui.
64.
─ Se, no momento em que estais aqui, vosso corpo
morresse subitamente, o que experimentaríeis?
─ Eu lá estaria antes.
65.
─ Ficaríeis desembaraçado mais prontamente do
que se morrêsseis em circunstâncias ordinárias?
─ Muito! Não entraria senão para
fechar a porta, depois de haver saído.
66.
─ Dissestes sofrer de gota. Não concordais com
vosso médico, aqui presente, que pretende seja um reumatismo nevrálgico? Que
pensais sobre isto?
─ Penso que desde que estais tão bem
informado, isto deve bastar.
67.
─ (O médico). Em que vos baseais para supor que
seja gota?
─ É a minha opinião. Talvez eu me engane,
principalmente se estais tão certo de não vos enganar.
68.
─ (O médico). Seria possível que houvesse uma
complicação de gota e de reumatismo.
─ Então ambos teríamos razão. Só
restaria nos abraçarmos.
Esta resposta provocou risos na
assistência.
69.
─ Ver-nos rindo vos faz rir?
─ Às gargalhadas. Não me escutais?
70.
─ Dissestes que o cólquico é um remédio eficaz
contra a gota. De onde vos veio essa ideia, se desperto não o sabíeis? ─ Eu o
usei outrora.
71.
─ Então foi em outra existência?
─ Sim, e me fez mal...
72.
─ Se vos fizessem uma pergunta indiscreta,
seríeis constrangido a respondê-la?
─ Oh! Esta é muito forte. Tentai.
73.
─ Assim tendes perfeito livre-arbítrio?
─ Mais do que vós.
OBSERVAÇÃO: Em muitas ocasiões a experiência provou que
o Espírito isolado do corpo tem sempre a sua vontade e só diz o que quer.
Compreendendo melhor o alcance das coisas, é ainda mais prudente e discreto do
que se desperto. Quando diz uma coisa, é que julga útil dizê-lo.
74.
─ Teríeis tido a liberdade de não vir quando vos
chamamos?
─ Sim, com o risco de sofrer as
consequências dessa atitude.
75.
─ Quais seriam essas consequências?
─ Se me recusar a ser útil aos meus semelhantes,
sobretudo quando tenho perfeita consciência de meus atos, sou livre, mas sou
punido.
76.
─ Que gênero de punição sofreríeis?
─ Seria preciso expor-vos o código de
Deus, e isto seria muito longo.
77.
─ Se neste momento alguém vos insultasse,
dizendo coisas que desperto não suportaríeis, qual o sentimento que
experimentaríeis?
─ O desprezo.
78.
─ Então não procuraríeis vingar-vos?
─ Não.
79.
─ Fazeis uma ideia da posição que ocupareis
entre os Espíritos, quando lá estiverdes completamente?
─ Não. Isto não é permitido.
80.
─ Credes que, no vosso estado atual, o Espírito
possa prever a morte do corpo?
─ Algumas vezes, pois se eu tivesse que morrer de
repente,
sempre teria tempo de a ele
voltar.
Conselho de família
Por certo, nossos leitores se lembram do artigo publicado em setembro último, sob o título de Uma Família Espírita. As comunicações seguintes são muito parecidas com aquela. Com efeito, são conselhos ditados numa reunião íntima, por um Espírito eminentemente superior e bondoso. Distinguem-se pelo encanto e pela doçura do estilo, pela profundeza dos pensamentos e, além disso, por nuanças de extrema delicadeza, apropriadas à idade e ao caráter das pessoas a quem eram dirigidas. O Sr. Rabache, negociante de Bordéus, que serviu de intermediário, teve a bondade de autorizar a sua publicação. Só podemos felicitar os médiuns que recebem coisas semelhantes. É uma prova de que têm simpatias felizes no mundo invisível.
Castelo de Pechbusque, novembro de 1859.
PRIMEIRA SESSÃO
Foi perguntado ao Espírito protetor da família, se podia dar alguns conselhos aos membros presentes. Ele respondeu:
Sim, que eles tenham confiança em Deus e busquem instruir-se nas verdades eternas e imutáveis que lhes ensina o livro divino da Natureza. Ele contém toda a lei de Deus, e os que sabem ler e compreender, seguem apenas o caminho verdadeiro da sabedoria. Que nada do que verão seja desprezado, pois cada coisa traz em si um ensinamento e deve, pelo uso do raciocínio, elevar a alma para Deus e dele aproximá-la. Em tudo quanto ferir a inteligência, procurem sempre distinguir o bem do mal: o primeiro, para praticá-lo; o segundo, para evitá-lo. Que antes de formular um julgamento, voltem sempre o pensamento para o ETERNO, que os guiará apenas ao bem, E NÃO OS ENGANARÁ JAMAIS.
SEGUNDA SESSÃO
Boa noite, meus filhos. Se me amais, procurai instruir-vos. Reuni-vos muitas vezes com esse pensamento, e ponde vossas ideias em comunhão. É um excelente meio, pois em geral só intercambiamos as coisas que julgamos boas. A gente se envergonha das más, assim, são guardadas em segredo ou só são comunicadas aos que queremos tornar cúmplices. Distinguem-se os bons dos maus pensamentos, porque os primeiros podem, sem receio, ser transmitidos a todo mundo, ao passo que os últimos não poderiam, sem perigo, ser comunicados senão a alguns. Quando vos vier um pensamento, para julgar de seu valor, perguntai-vos se podeis torná-lo público sem inconvenientes e se não produzirá nenhum mal. Se vossa consciência vo-lo autorizar, não temais, pois vosso pensamento é bom. Dai-vos bons conselhos mutuamente, e nisto só tendo em vista o bem daquele a quem os dais, e não o vosso. Vossa recompensa estará no prazer que experimentais em serdes úteis. A união dos corações é a mais fecunda fonte de felicidades. Se muitos homens são infelizes, é porque só procuram a felicidade para si mesmos. Ela lhes escapa precisamente porque julgam encontrá-la apenas no egoísmo. Digo a felicidade, e não a fortuna, porque, até aqui, esta última só tem servido como sustentáculo à injustiça, e o objetivo da existência é a justiça. Ora, se a justiça fosse praticada entre os homens, o mais afortunado seria aquele que realizasse maior número de boas obras. Se, pois, quiserdes tornar-vos ricos, meus filhos, praticai muitas ações boas. Pouco importa os bens do mundo. Não é a satisfação da carne que se deve buscar, mas a da alma. Aquela é efêmera; esta, eterna.
Chega por hoje. Meditai sobre estes conselhos e procurai pô-los em prática. Eis o caminho da salvação.
TERCEIRA SESSÃO Sim, meus filhos, eis-me aqui. Tende confiança em Deus, que jamais abandona os que fazem o bem. Aquilo que julgais um mal, com frequência só o é em relação às vossas concepções. Também, às vezes, o mal real vem apenas de um desânimo ocasionado por uma dificuldade, que a calma de espírito e a reflexão teriam evitado. Assim, refleti sempre e, como já vos disse, reportai tudo a Deus. Quando experimentais qualquer pesar, longe de vos abandonardes à tristeza, ao contrário, resisti e fazei todo esforço para triunfar, pensando que nada se obtém sem trabalho, e que muitas vezes o sucesso é acompanhado por dificuldades. Invocai o auxílio dos Espíritos benevolentes. Eles não podem, como vos ensinam, fazer boas obras em vosso lugar, nem obter algo de Deus para vós, pois é preciso que cada um conquiste, por si mesmo, a perfeição a que todos estamos destinados, mas podem inspirar-vos o bem, sugerir-vos conduta conveniente e ajudar-vos com seu concurso. Eles não se manifestam ostensivamente, mas no recolhimento. Escutai a voz da vossa consciência, lembrando-vos de meus conselhos precedentes. Confiança em Deus, calma e coragem.
QUARTA SESSÃO
Boa noite, meus filhos. Sim, é preciso continuar as sessões, até que um médium se manifeste, para substituir o que vai deixar-vos. Está cumprido o seu papel de iniciador entre vós. Continuai o que começastes, porque vós também servireis um dia à propagação da verdade que neste momento é proclamada no mundo inteiro pelas manifestações ditas dos Espíritos. Persuadi-vos, meus filhos, de que, em geral, o que se entende na Terra por Espírito, só é Espírito para vós. Depois que esse Espírito, ou alma, se separa da matéria grosseira que o envolve, para vós não tem mais corpo, porque vossos olhos materiais não mais o veem, mas continua sendo matéria para os mais elevados que ele. Para vós, minhas crianças, vou fazer uma comparação muito imperfeita, mas que, entretanto, vos poderá dar uma ideia da transformação a que impropriamente chamais morte. Imaginai uma lagarta, que vedes diariamente. Esgotado o tempo de sua existência nesse estado, ela se transforma em crisálida; passa algum tempo nesse estado e depois, chegado o momento, se despoja de seu envoltório e dá origem a uma borboleta, que voa. Ora, a lagarta, ao deixar sua natureza grosseira, representa o homem que morre. A borboleta representa a alma que se eleva. A lagarta arrasta-se no chão. A borboleta voa para o céu. Mudou de matéria, mas ainda é material. Se a lagarta raciocinasse, não veria a borboleta que, entretanto, teria saído da carapaça apodrecida da crisálida. Assim, o corpo não pode ver a alma, mas a alma, envolta em matéria, tem consciência de sua existência e o próprio materialista por vezes a sente interiormente. Então, seu orgulho o impede de concordar e ele fica com sua ciência sem crença, sem se elevar, até que, enfim, lhe chegue a dúvida. Então, nem tudo está acabado, porque nele a luta é maior, mas é apenas uma questão de tempo, porque, meus amigos, não vos esqueçais, todos os filhos de Deus foram criados para a perfeição. Felizes os que não perdem tempo pelo caminho. A eternidade é feita de dois períodos: o das provas, que poderia chamar-se de incubação, e o da eclosão, ou da entrada na vida verdadeira, que chamais de felicidade dos eleitos.
QUINTA SESSÃO
Meus caros filhos, vejo com satisfação que começais a refletir nos avisos e conselhos que vos dou. Sei que para o atual desenvolvimento de vossa inteligência há, simultaneamente, muito assunto para reflexão. Devo, porém, aproveitar a ocasião que se apresenta, pois em poucos dias esse meio não mais estará à minha disposição, e era necessário ferir a vossa imaginação, de maneira a vos sugerir o desejo de continuar as vossas sessões, até que algum de vós possa substituir o médium atual. Espero que estas poucas sessões, sobre as quais vos incito a meditar demoradamente, tenham sido suficientes para despertar vossa atenção e o desejo de aprofundar mais esse vasto assunto de investigações. Tomai como regra jamais procurar satisfazer uma vã curiosidade, mas vos instruirdes e vos aperfeiçoardes. É inútil vos preocupardes com a diferença que possa existir entre o que vos ensinarei e o que sabeis ou julgais saber. Cada vez que vos for dada uma instrução, perguntaivos se é justa e se corresponde às exigências da consciência e da equidade. Quando a resposta for afirmativa, não vos inquieteis em saber se está de acordo com o que vos tiver sido dito. Que vos importa isto! O importante é o justo, o consciencioso e o equitativo. Tudo quanto reúne estas condições é de Deus. Obedecer a uma boa consciência; só fazer coisas úteis; evitar tudo quanto, sem ser mau, não tem utilidade, eis o essencial, pois fazer algo de inútil já é fazer o mal. Evitai escandalizar, mesmo pelo vosso aperfeiçoamento. Circunstâncias há em que a simples visão de vossa mudança pode produzir um efeito pernicioso. Assim, por exemplo, a luz do dia não poderia, sem perigo, atingir de súbito os olhos de um homem encerrado num calabouço escuro. Então, que o vosso progresso não seja entregue à investigação, senão conforme vos aconselhar a sabedoria. Aperfeiçoaivos continuamente: somente no devido tempo permitireis que isto seja visto. Aqueles para quem escrevo este conselho o compreendem, sem que eu tenha de ser mais explícito. Sua consciência lhes dirá.
Coragem, pois, e perseverança! Estas são as únicas leis do sucesso.
OBSERVAVAÇÃO: O último conselho não poderia ter aplicação geral. É evidente que o Espírito teve um objetivo especial, como ele próprio disse. Do contrário, poderíamo-nos enganar quanto ao sentido e o alcance de suas palavras.
Castelo de Pechbusque, novembro de 1859.
PRIMEIRA SESSÃO
Foi perguntado ao Espírito protetor da família, se podia dar alguns conselhos aos membros presentes. Ele respondeu:
Sim, que eles tenham confiança em Deus e busquem instruir-se nas verdades eternas e imutáveis que lhes ensina o livro divino da Natureza. Ele contém toda a lei de Deus, e os que sabem ler e compreender, seguem apenas o caminho verdadeiro da sabedoria. Que nada do que verão seja desprezado, pois cada coisa traz em si um ensinamento e deve, pelo uso do raciocínio, elevar a alma para Deus e dele aproximá-la. Em tudo quanto ferir a inteligência, procurem sempre distinguir o bem do mal: o primeiro, para praticá-lo; o segundo, para evitá-lo. Que antes de formular um julgamento, voltem sempre o pensamento para o ETERNO, que os guiará apenas ao bem, E NÃO OS ENGANARÁ JAMAIS.
SEGUNDA SESSÃO
Boa noite, meus filhos. Se me amais, procurai instruir-vos. Reuni-vos muitas vezes com esse pensamento, e ponde vossas ideias em comunhão. É um excelente meio, pois em geral só intercambiamos as coisas que julgamos boas. A gente se envergonha das más, assim, são guardadas em segredo ou só são comunicadas aos que queremos tornar cúmplices. Distinguem-se os bons dos maus pensamentos, porque os primeiros podem, sem receio, ser transmitidos a todo mundo, ao passo que os últimos não poderiam, sem perigo, ser comunicados senão a alguns. Quando vos vier um pensamento, para julgar de seu valor, perguntai-vos se podeis torná-lo público sem inconvenientes e se não produzirá nenhum mal. Se vossa consciência vo-lo autorizar, não temais, pois vosso pensamento é bom. Dai-vos bons conselhos mutuamente, e nisto só tendo em vista o bem daquele a quem os dais, e não o vosso. Vossa recompensa estará no prazer que experimentais em serdes úteis. A união dos corações é a mais fecunda fonte de felicidades. Se muitos homens são infelizes, é porque só procuram a felicidade para si mesmos. Ela lhes escapa precisamente porque julgam encontrá-la apenas no egoísmo. Digo a felicidade, e não a fortuna, porque, até aqui, esta última só tem servido como sustentáculo à injustiça, e o objetivo da existência é a justiça. Ora, se a justiça fosse praticada entre os homens, o mais afortunado seria aquele que realizasse maior número de boas obras. Se, pois, quiserdes tornar-vos ricos, meus filhos, praticai muitas ações boas. Pouco importa os bens do mundo. Não é a satisfação da carne que se deve buscar, mas a da alma. Aquela é efêmera; esta, eterna.
Chega por hoje. Meditai sobre estes conselhos e procurai pô-los em prática. Eis o caminho da salvação.
TERCEIRA SESSÃO Sim, meus filhos, eis-me aqui. Tende confiança em Deus, que jamais abandona os que fazem o bem. Aquilo que julgais um mal, com frequência só o é em relação às vossas concepções. Também, às vezes, o mal real vem apenas de um desânimo ocasionado por uma dificuldade, que a calma de espírito e a reflexão teriam evitado. Assim, refleti sempre e, como já vos disse, reportai tudo a Deus. Quando experimentais qualquer pesar, longe de vos abandonardes à tristeza, ao contrário, resisti e fazei todo esforço para triunfar, pensando que nada se obtém sem trabalho, e que muitas vezes o sucesso é acompanhado por dificuldades. Invocai o auxílio dos Espíritos benevolentes. Eles não podem, como vos ensinam, fazer boas obras em vosso lugar, nem obter algo de Deus para vós, pois é preciso que cada um conquiste, por si mesmo, a perfeição a que todos estamos destinados, mas podem inspirar-vos o bem, sugerir-vos conduta conveniente e ajudar-vos com seu concurso. Eles não se manifestam ostensivamente, mas no recolhimento. Escutai a voz da vossa consciência, lembrando-vos de meus conselhos precedentes. Confiança em Deus, calma e coragem.
QUARTA SESSÃO
Boa noite, meus filhos. Sim, é preciso continuar as sessões, até que um médium se manifeste, para substituir o que vai deixar-vos. Está cumprido o seu papel de iniciador entre vós. Continuai o que começastes, porque vós também servireis um dia à propagação da verdade que neste momento é proclamada no mundo inteiro pelas manifestações ditas dos Espíritos. Persuadi-vos, meus filhos, de que, em geral, o que se entende na Terra por Espírito, só é Espírito para vós. Depois que esse Espírito, ou alma, se separa da matéria grosseira que o envolve, para vós não tem mais corpo, porque vossos olhos materiais não mais o veem, mas continua sendo matéria para os mais elevados que ele. Para vós, minhas crianças, vou fazer uma comparação muito imperfeita, mas que, entretanto, vos poderá dar uma ideia da transformação a que impropriamente chamais morte. Imaginai uma lagarta, que vedes diariamente. Esgotado o tempo de sua existência nesse estado, ela se transforma em crisálida; passa algum tempo nesse estado e depois, chegado o momento, se despoja de seu envoltório e dá origem a uma borboleta, que voa. Ora, a lagarta, ao deixar sua natureza grosseira, representa o homem que morre. A borboleta representa a alma que se eleva. A lagarta arrasta-se no chão. A borboleta voa para o céu. Mudou de matéria, mas ainda é material. Se a lagarta raciocinasse, não veria a borboleta que, entretanto, teria saído da carapaça apodrecida da crisálida. Assim, o corpo não pode ver a alma, mas a alma, envolta em matéria, tem consciência de sua existência e o próprio materialista por vezes a sente interiormente. Então, seu orgulho o impede de concordar e ele fica com sua ciência sem crença, sem se elevar, até que, enfim, lhe chegue a dúvida. Então, nem tudo está acabado, porque nele a luta é maior, mas é apenas uma questão de tempo, porque, meus amigos, não vos esqueçais, todos os filhos de Deus foram criados para a perfeição. Felizes os que não perdem tempo pelo caminho. A eternidade é feita de dois períodos: o das provas, que poderia chamar-se de incubação, e o da eclosão, ou da entrada na vida verdadeira, que chamais de felicidade dos eleitos.
QUINTA SESSÃO
Meus caros filhos, vejo com satisfação que começais a refletir nos avisos e conselhos que vos dou. Sei que para o atual desenvolvimento de vossa inteligência há, simultaneamente, muito assunto para reflexão. Devo, porém, aproveitar a ocasião que se apresenta, pois em poucos dias esse meio não mais estará à minha disposição, e era necessário ferir a vossa imaginação, de maneira a vos sugerir o desejo de continuar as vossas sessões, até que algum de vós possa substituir o médium atual. Espero que estas poucas sessões, sobre as quais vos incito a meditar demoradamente, tenham sido suficientes para despertar vossa atenção e o desejo de aprofundar mais esse vasto assunto de investigações. Tomai como regra jamais procurar satisfazer uma vã curiosidade, mas vos instruirdes e vos aperfeiçoardes. É inútil vos preocupardes com a diferença que possa existir entre o que vos ensinarei e o que sabeis ou julgais saber. Cada vez que vos for dada uma instrução, perguntaivos se é justa e se corresponde às exigências da consciência e da equidade. Quando a resposta for afirmativa, não vos inquieteis em saber se está de acordo com o que vos tiver sido dito. Que vos importa isto! O importante é o justo, o consciencioso e o equitativo. Tudo quanto reúne estas condições é de Deus. Obedecer a uma boa consciência; só fazer coisas úteis; evitar tudo quanto, sem ser mau, não tem utilidade, eis o essencial, pois fazer algo de inútil já é fazer o mal. Evitai escandalizar, mesmo pelo vosso aperfeiçoamento. Circunstâncias há em que a simples visão de vossa mudança pode produzir um efeito pernicioso. Assim, por exemplo, a luz do dia não poderia, sem perigo, atingir de súbito os olhos de um homem encerrado num calabouço escuro. Então, que o vosso progresso não seja entregue à investigação, senão conforme vos aconselhar a sabedoria. Aperfeiçoaivos continuamente: somente no devido tempo permitireis que isto seja visto. Aqueles para quem escrevo este conselho o compreendem, sem que eu tenha de ser mais explícito. Sua consciência lhes dirá.
Coragem, pois, e perseverança! Estas são as únicas leis do sucesso.
OBSERVAVAÇÃO: O último conselho não poderia ter aplicação geral. É evidente que o Espírito teve um objetivo especial, como ele próprio disse. Do contrário, poderíamo-nos enganar quanto ao sentido e o alcance de suas palavras.
As pedras de Java - Bruxelas, 9 de dezembro de 1859
Senhor Diretor,
Li na Revista Espírita o relato de Ida Pfeiffer sobre as pedras caídas em Java, na presença de um oficial superior holandês, com o qual estive muito ligado em 1817, pois foi ele que me emprestou suas pistolas e serviu de testemunha em meu primeiro duelo. Chamava-se Michiels, de Maestricht, e tornou-se general em Java. A carta que relatava o fato acrescentava que essa queda de pedras, na habitação isolada do distrito de Chéribon, não durou menos de doze dias, sem que as sentinelas postas pelo general tivessem algo descoberto, assim como ele também nada descobriu, durante o tempo em que lá ficou. Essas pedras, formadas de uma espécie de pedrapomes, pareciam criadas no ar, a alguns pés do forro. O general mandou encher vários cestos. Os habitantes vinham procurá-las para fazer amuletos e até remédios. O fato é muito conhecido em Java, pois se renova com frequência, principalmente as cusparadas de siry. Vários meninos foram perseguidos a pedradas em campo raso, mas não foram atingidos. Dir-se-ia tratar-se de Espíritos farsistas que se divertem em meter medo à gente. Evocai o Espírito do general Michiels e talvez vos explique o fato. O Dr. Vanden Kerkhove, que morou muito tempo em Java, me declarou, como vos afirmo, que vossa Revista é cada dia mais interessante, mais moralizadora e mais procurada em Bruxelas.
Aceitai, etc.
JOBARD
O conhecido caráter da Sra. Ida Pfeiffer e o cunho de veracidade que marca todos os seus relatos, não nos deixam a menor dúvida quanto à realidade do fenômeno em apreço, mas compreende-se toda a importância que lhe vem acrescentar a carta do Sr. Jobard, pela informação da principal testemunha ocular encarregada de verificar o fato, e que nenhum interesse tinha em fazê-lo acreditado se o tivesse considerado falso. Para começar, a natureza esponjosa dessa chuva de pedras poderia induzir a atribuir-lhe origem vulcânica ou aerolítica, o que levaria os céticos a dizerem que a superstição havia tomado o lugar de um fenômeno natural. Se tivéssemos apenas o testemunho dos javaneses, a suposição teria fundamento, e as pedras, caindo em campo raso, sem sombra de dúvida viriam em apoio a essa opinião. Mas o general Michiels e o Dr. Vanden Kerkhove não eram malaios, e sua afirmação certamente tem valor. A esta consideração, por si só muito forte, é preciso acrescentar que não caíam somente ao ar livre, mas numa sala onde parece que se formavam a alguma distância do forro. É o general que o afirma. Ora, não acreditamos que jamais se tenham visto aerólitos se formarem na atmosfera de uma sala. Admitindo a causa meteorológica ou vulcânica, o mesmo não se poderia dizer das cusparadas de siry, que os vulcões jamais vomitaram, pelo menos de que tenhamos tomado conhecimento. Afastada essa hipótese pela própria natureza dos fatos, resta saber como tais substâncias puderam ser formadas. A explicação está em nosso artigo de agosto de 1859, sobre o Mobiliário de Além-túmulo.
Li na Revista Espírita o relato de Ida Pfeiffer sobre as pedras caídas em Java, na presença de um oficial superior holandês, com o qual estive muito ligado em 1817, pois foi ele que me emprestou suas pistolas e serviu de testemunha em meu primeiro duelo. Chamava-se Michiels, de Maestricht, e tornou-se general em Java. A carta que relatava o fato acrescentava que essa queda de pedras, na habitação isolada do distrito de Chéribon, não durou menos de doze dias, sem que as sentinelas postas pelo general tivessem algo descoberto, assim como ele também nada descobriu, durante o tempo em que lá ficou. Essas pedras, formadas de uma espécie de pedrapomes, pareciam criadas no ar, a alguns pés do forro. O general mandou encher vários cestos. Os habitantes vinham procurá-las para fazer amuletos e até remédios. O fato é muito conhecido em Java, pois se renova com frequência, principalmente as cusparadas de siry. Vários meninos foram perseguidos a pedradas em campo raso, mas não foram atingidos. Dir-se-ia tratar-se de Espíritos farsistas que se divertem em meter medo à gente. Evocai o Espírito do general Michiels e talvez vos explique o fato. O Dr. Vanden Kerkhove, que morou muito tempo em Java, me declarou, como vos afirmo, que vossa Revista é cada dia mais interessante, mais moralizadora e mais procurada em Bruxelas.
Aceitai, etc.
JOBARD
O conhecido caráter da Sra. Ida Pfeiffer e o cunho de veracidade que marca todos os seus relatos, não nos deixam a menor dúvida quanto à realidade do fenômeno em apreço, mas compreende-se toda a importância que lhe vem acrescentar a carta do Sr. Jobard, pela informação da principal testemunha ocular encarregada de verificar o fato, e que nenhum interesse tinha em fazê-lo acreditado se o tivesse considerado falso. Para começar, a natureza esponjosa dessa chuva de pedras poderia induzir a atribuir-lhe origem vulcânica ou aerolítica, o que levaria os céticos a dizerem que a superstição havia tomado o lugar de um fenômeno natural. Se tivéssemos apenas o testemunho dos javaneses, a suposição teria fundamento, e as pedras, caindo em campo raso, sem sombra de dúvida viriam em apoio a essa opinião. Mas o general Michiels e o Dr. Vanden Kerkhove não eram malaios, e sua afirmação certamente tem valor. A esta consideração, por si só muito forte, é preciso acrescentar que não caíam somente ao ar livre, mas numa sala onde parece que se formavam a alguma distância do forro. É o general que o afirma. Ora, não acreditamos que jamais se tenham visto aerólitos se formarem na atmosfera de uma sala. Admitindo a causa meteorológica ou vulcânica, o mesmo não se poderia dizer das cusparadas de siry, que os vulcões jamais vomitaram, pelo menos de que tenhamos tomado conhecimento. Afastada essa hipótese pela própria natureza dos fatos, resta saber como tais substâncias puderam ser formadas. A explicação está em nosso artigo de agosto de 1859, sobre o Mobiliário de Além-túmulo.
Correspondência
Meu caro Senhor.
Acabo de ler vossa resposta ao Sr. Oscar Comettant, cujo artigo havia lido. Se esse folhetinista cético e canhestramente trocista não se convenceu pelas boas razões que lhe destes, poderia pelo menos reconhecer em vossa resposta a urbanidade do estilo, totalmente ausente da sua prosa. Os parênteses vulgares com que tinha temperado as evocações me pareciam do espírito de rabo vermelho; os lamentos com que lembrava os 2 francos que havia custado a sonata, bem mereciam que a Sociedade lhe votasse um auxílio de 2 francos. Pensais, meu caro senhor Allan Kardec, que eu seja um espírita muito ardente para ter deixado sem resposta um artigo em que era citado e posto em causa. Por minha vez, escrevi também ao Sr. Oscar Comettant. No dia seguinte à recepção de seu jornal, recebeu ele a seguinte carta:
Senhor,
Tive o prazer de ler vosso folhetim Variedades, de sexta-feira. Como me põe em causa, desde que sou citado nominalmente, peço licença para, a respeito, fazer algumas observações, que aceitareis assim como aceitei os espirituosos parênteses com que esmaltastes o relatório das evocações de Mozart e de Chopin. Que é o que quereis troçar com esse artigo humorístico? O Espiritismo? Cometeríeis um grande equívoco, crendo fazer-lhe a menor mossa. Na França, a princípio faz-se troça, depois se julga e só se concedem as honras das piadas às coisas verdadeiramente grandes e sérias, com a liberdade de concedê-las após o exame que merecem.
Se o Sr. Ledoyen é tão ávido e interesseiro quanto quereis fazer crer, deve ele vos ser reconhecido, por terdes querido, num folhetim de onze colunas, assegurar o sucesso de uma de suas mais modestas publicações. É a primeira vez que é publicado um artigo tão importante sobre o Espiritismo, num grande jornal. Vejo por esse artigo quase charivari, que o Espiritismo já é levado em consideração pelos próprios inimigos e, confidencialmente, vos direi que os Espíritos disseram que também se serviriam dos inimigos para o triunfo de sua causa. Assim, o melhor é vos manterdes em guarda, se não vos quiserdes transformar em apóstolo, malgrado vosso.
Não quereis ver no Espiritismo senão charlatanismo moral e comercial. Nós outros, futuros inquilinos de Charenton, nele encontramos a solução de muitos problemas contra os quais a Humanidade quebrava a cabeça há muitos séculos, a saber: o reconhecimento raciocinado de Deus em todas as suas obras materiais e espirituais; a imortalidade e a individualidade evidentes da alma, provadas pelas manifestações dos Espíritos; o conhecimento das leis da justiça divina, estudadas nas diversas encarnações dos Espíritos, etc., etc. Se nos déssemos ao trabalho de aprofundar um pouco esses assuntos, poderíamos ver que se acham acima de todos os sarcasmos e de todas as pilhérias. Por mais que nos considereis sonhadores e alucinados, todos diremos, em lugar do eppur si muove de Galileu: E contudo, Deus lá está!
Acabo de ler vossa resposta ao Sr. Oscar Comettant, cujo artigo havia lido. Se esse folhetinista cético e canhestramente trocista não se convenceu pelas boas razões que lhe destes, poderia pelo menos reconhecer em vossa resposta a urbanidade do estilo, totalmente ausente da sua prosa. Os parênteses vulgares com que tinha temperado as evocações me pareciam do espírito de rabo vermelho; os lamentos com que lembrava os 2 francos que havia custado a sonata, bem mereciam que a Sociedade lhe votasse um auxílio de 2 francos. Pensais, meu caro senhor Allan Kardec, que eu seja um espírita muito ardente para ter deixado sem resposta um artigo em que era citado e posto em causa. Por minha vez, escrevi também ao Sr. Oscar Comettant. No dia seguinte à recepção de seu jornal, recebeu ele a seguinte carta:
Senhor,
Tive o prazer de ler vosso folhetim Variedades, de sexta-feira. Como me põe em causa, desde que sou citado nominalmente, peço licença para, a respeito, fazer algumas observações, que aceitareis assim como aceitei os espirituosos parênteses com que esmaltastes o relatório das evocações de Mozart e de Chopin. Que é o que quereis troçar com esse artigo humorístico? O Espiritismo? Cometeríeis um grande equívoco, crendo fazer-lhe a menor mossa. Na França, a princípio faz-se troça, depois se julga e só se concedem as honras das piadas às coisas verdadeiramente grandes e sérias, com a liberdade de concedê-las após o exame que merecem.
Se o Sr. Ledoyen é tão ávido e interesseiro quanto quereis fazer crer, deve ele vos ser reconhecido, por terdes querido, num folhetim de onze colunas, assegurar o sucesso de uma de suas mais modestas publicações. É a primeira vez que é publicado um artigo tão importante sobre o Espiritismo, num grande jornal. Vejo por esse artigo quase charivari, que o Espiritismo já é levado em consideração pelos próprios inimigos e, confidencialmente, vos direi que os Espíritos disseram que também se serviriam dos inimigos para o triunfo de sua causa. Assim, o melhor é vos manterdes em guarda, se não vos quiserdes transformar em apóstolo, malgrado vosso.
Não quereis ver no Espiritismo senão charlatanismo moral e comercial. Nós outros, futuros inquilinos de Charenton, nele encontramos a solução de muitos problemas contra os quais a Humanidade quebrava a cabeça há muitos séculos, a saber: o reconhecimento raciocinado de Deus em todas as suas obras materiais e espirituais; a imortalidade e a individualidade evidentes da alma, provadas pelas manifestações dos Espíritos; o conhecimento das leis da justiça divina, estudadas nas diversas encarnações dos Espíritos, etc., etc. Se nos déssemos ao trabalho de aprofundar um pouco esses assuntos, poderíamos ver que se acham acima de todos os sarcasmos e de todas as pilhérias. Por mais que nos considereis sonhadores e alucinados, todos diremos, em lugar do eppur si muove de Galileu: E contudo, Deus lá está!
Peço-vos aceitar, etc.
Brion Dorgeval
Primeiro baixo da ópera-cômica do Teatro de Toulouse, ex-contratado do Sr. Carvalho.
OBSERVAÇÃO: Não é de nosso conhecimento que o Sr. Oscar Comettant tenha publicado esta resposta, bem como a nossa. Ora, atacar sem admitir a defesa não é uma guerra leal.
Bruxelas, 23 de dezembro de 1859
Meu caro colega,
Venho submeter-vos algumas reflexões etnográficas sobre o mundo dos Espíritos, com a intenção de restabelecer uma opinião muito generalizada, mas, a meu ver, muito errada, quanto ao estado do homem após a sua passagem para o mundo espiritual.
Imagina-se erroneamente que um imbecil, um ignorante, um bruto, imediatamente se torna um gênio, um sábio, um profeta, desde que deixou seu estojo. É um erro análogo ao de quem admitisse que um celerado, livre da camisa de força, irá tornar-se honesto; um bobo,esperto, e um fanático, racional, só porque transpuseram a fronteira.
Nada disso. Levamos conosco todas as nossas conquistas morais, o caráter, o conhecimento, os vícios e as virtudes. Não levamos o que se refere à matéria. Os coxos, os zarolhos e os corcundas não mais o são, mas os velhacos, os avarentos e os supersticiosos ainda o são. Não nos devemos admirar de ouvir Espíritos pedirem preces; desejarem que se façam as peregrinações que haviam prometido e até que se descubra o dinheiro que haviam escondido, com o fito de dá-lo à pessoa a quem o haviam destinado, e que a indiquem exatamente, desde que esteja encarnada.
Em suma, o Espírito que tinha um desejo, um plano, uma opinião, uma crença na Terra, quer vê-los realizados. Assim, Hahnemann exclamava: “Coragem, meus amigos, minha doutrina triunfa. Que satisfação para minha alma!”
Quanto ao Dr. Gall, sabeis o que ele pensa de sua ciência, bem como Lavater, Swedenborg e Fourier, o qual me disse que seus alunos haviam truncado a sua doutrina, querendo saltar a etapa do garantismo, que me felicita por continuar.
Numa palavra, todos os Espíritos que professavam uma religião, uma idolatria ou um cisma, por convicção, persistem nas mesmas crenças, até serem esclarecidos pelo estudo e pela reflexão. Tal é o assunto das minhas preocupações neste momento. É evidentemente um Espírito lógico que as dita, porque, há uma hora, eu só pensava em ir para a cama e acabar a leitura do excelente livrinho da Sra. Henry Gaugain sobre os piedosos preconceitos dos bretões contra as novas invenções.
Continuando vossos estudos, reconhecereis que o mundo de além-túmulo é uma imagem fotográfica deste, que, como sabeis, encerra Espíritos perversos como o diabo, e maus como os demônios. Não é de admirar que a gente simples se engane e interdite todo comércio com eles. Isto os priva da visita dos bons e grandes Espíritos, menos raros lá em cima do que aqui embaixo, pois os há de todos os tempos e em toda parte, e eles só nos querem dar bons conselhos e nos fazer o bem. Por outro lado, sabeis com que repugnância e com que cólera os maus respondem ao apelo forçado. Mas o maior e mais raro de todos os Espíritos, aquele que vem apenas três vezes durante a vida de um globo, o Espírito Divino, enfim o Espírito Santo, não atende a evocações dos pneumatólogos: vem quando quer ─ spiritus flat ubi vult ─ o que não quer dizer que não envie outros para lhe preparar o caminho.
A hierarquia é uma lei universal ─ tudo é como tudo ─ aliás como entre nós. O que mais retarda o progresso das boas doutrinas, que a perseguição não deixa avançar, é o falso respeito humano.
Meu caro colega,
Venho submeter-vos algumas reflexões etnográficas sobre o mundo dos Espíritos, com a intenção de restabelecer uma opinião muito generalizada, mas, a meu ver, muito errada, quanto ao estado do homem após a sua passagem para o mundo espiritual.
Imagina-se erroneamente que um imbecil, um ignorante, um bruto, imediatamente se torna um gênio, um sábio, um profeta, desde que deixou seu estojo. É um erro análogo ao de quem admitisse que um celerado, livre da camisa de força, irá tornar-se honesto; um bobo,esperto, e um fanático, racional, só porque transpuseram a fronteira.
Nada disso. Levamos conosco todas as nossas conquistas morais, o caráter, o conhecimento, os vícios e as virtudes. Não levamos o que se refere à matéria. Os coxos, os zarolhos e os corcundas não mais o são, mas os velhacos, os avarentos e os supersticiosos ainda o são. Não nos devemos admirar de ouvir Espíritos pedirem preces; desejarem que se façam as peregrinações que haviam prometido e até que se descubra o dinheiro que haviam escondido, com o fito de dá-lo à pessoa a quem o haviam destinado, e que a indiquem exatamente, desde que esteja encarnada.
Em suma, o Espírito que tinha um desejo, um plano, uma opinião, uma crença na Terra, quer vê-los realizados. Assim, Hahnemann exclamava: “Coragem, meus amigos, minha doutrina triunfa. Que satisfação para minha alma!”
Quanto ao Dr. Gall, sabeis o que ele pensa de sua ciência, bem como Lavater, Swedenborg e Fourier, o qual me disse que seus alunos haviam truncado a sua doutrina, querendo saltar a etapa do garantismo, que me felicita por continuar.
Numa palavra, todos os Espíritos que professavam uma religião, uma idolatria ou um cisma, por convicção, persistem nas mesmas crenças, até serem esclarecidos pelo estudo e pela reflexão. Tal é o assunto das minhas preocupações neste momento. É evidentemente um Espírito lógico que as dita, porque, há uma hora, eu só pensava em ir para a cama e acabar a leitura do excelente livrinho da Sra. Henry Gaugain sobre os piedosos preconceitos dos bretões contra as novas invenções.
Continuando vossos estudos, reconhecereis que o mundo de além-túmulo é uma imagem fotográfica deste, que, como sabeis, encerra Espíritos perversos como o diabo, e maus como os demônios. Não é de admirar que a gente simples se engane e interdite todo comércio com eles. Isto os priva da visita dos bons e grandes Espíritos, menos raros lá em cima do que aqui embaixo, pois os há de todos os tempos e em toda parte, e eles só nos querem dar bons conselhos e nos fazer o bem. Por outro lado, sabeis com que repugnância e com que cólera os maus respondem ao apelo forçado. Mas o maior e mais raro de todos os Espíritos, aquele que vem apenas três vezes durante a vida de um globo, o Espírito Divino, enfim o Espírito Santo, não atende a evocações dos pneumatólogos: vem quando quer ─ spiritus flat ubi vult ─ o que não quer dizer que não envie outros para lhe preparar o caminho.
A hierarquia é uma lei universal ─ tudo é como tudo ─ aliás como entre nós. O que mais retarda o progresso das boas doutrinas, que a perseguição não deixa avançar, é o falso respeito humano.
Há tempos teria triunfado o magnetismo se, em vez de dizer: o Sr. X., o Sr. N., se tivesse dado o nome e o endereço das pessoas para referências, como dizem os ingleses. Mas se diz: Quem é esse Sr. M., que se esconde? Aparentemente um mentiroso. E esse Sr. J.? Um trapaceiro. E o Sr. F.? Um farsista, ou antes, um ser no qual não se deve confiar, porque se oculta e se mascara apenas para fazer mal e mentir.
Hoje, que enfim as academias admitem o magnetismo e o sonambulismo, primos-irmãos do Espiritismo, é necessário que seus partidários se disponham a assinar com todas as letras. O medo do que dirão é um sentimento covarde e mau.
A ação de subscrever aquilo que se viu, aquilo em que se crê, não deve mais ser considerada como um traço de coragem. Deveis, pois, aconselhar os vossos adeptos a fazer o que sempre faço: assinar.
Hoje, que enfim as academias admitem o magnetismo e o sonambulismo, primos-irmãos do Espiritismo, é necessário que seus partidários se disponham a assinar com todas as letras. O medo do que dirão é um sentimento covarde e mau.
A ação de subscrever aquilo que se viu, aquilo em que se crê, não deve mais ser considerada como um traço de coragem. Deveis, pois, aconselhar os vossos adeptos a fazer o que sempre faço: assinar.
Jobard
OBSERVAÇÃO: Concordamos em todos os pontos com o Sr. Jobard. Inicialmente, suas observações sobre o estado dos Espíritos são perfeitamente exatas. Quanto ao segundo ponto, como ele aspiramos ao momento em que o medo do que dirão não deterá mais ninguém. Mas, que quereis? É preciso admitir a fraqueza humana. Uns começam, e o Sr. Jobard terá o mérito de ter dado o exemplo. Outros seguirão, tende certeza, quando virem que se pode pôr o pé para fora sem medo de ser mordido. Para tudo é preciso tempo. Ora, o tempo chega mais depressa do que pensa o Sr. Jobard. A reserva que temos na publicação dos nomes obedece a razões de conveniência, pelo que, até agora, nos felicitamos, mas enquanto esperamos, constatamos um progresso muito sensível na coragem de opinião. Diariamente vemos pessoas que há bem pouco tempo ousavam quando muito confessar-se espíritas, hoje o fazerem abertamente nas conversas, e sustentarem as teses de sua doutrina, sem absolutamente se preocuparem com os epítetos grosseiros com que as mimoseiam. É um passo imenso. O resto virá. Eu disse de começo: Mais alguns anos e ver-se-á uma nova mudança; em pouco tempo dar-se-á com o Espiritismo o mesmo que com o magnetismo. Ainda há pouco, só entre quatro paredes se ousava dizer que se era magnetizador. Hoje é um título que nos honra. Quando estiverem convencidos de que o Espiritismo não queima, declarar-se-ão espíritas sem mais medo do que quando se declaram frenologistas, homeopatas, etc. Estamos num momento de transição e as transições nunca se fazem bruscamente.
Boletim
Leitura da ata da sessão de 25 de novembro.
Pedidos de admissão:
Cartas do Sr. L. Benardacky, de São Petersburgo, e da Sra. Elisa Johnson, de Londres, que pedem para fazer parte da Sociedade como membros titulares.
Comunicações diversas:
Leitura de duas comunicações feitas ao Sr. Bouché, antigo reitor da Academia, médium escrevente, pelo Espírito da duquesa de Longueville, a respeito de uma visita que esta última lhe fez, como Espírito, em Port-Royal-des-Champs. Essas duas comunicações são notáveis pelo estilo e pela elevação dos pensamentos. Provam que certos Espíritos reveem com prazer os lugares onde viveram e que sentem o encanto da saudade. Sem dúvida, quanto mais desmaterializados, menos importância dão às coisas terrenas, mas alguns ainda se ligam a elas por muito tempo após a morte e parece que continuam, no mundo invisível, nas ocupações que tinham neste mundo, ou pelo menos demonstrando-lhes certo interesse.
Estudos:
1º. ─ Evocação do Sr. Conde Desbassyns de Richemont, falecido em junho de 1859, que há mais de dez anos professava ideias espíritas. A evocação confirma a influência dessas ideias sobre o desprendimento do Espírito após a morte.
2º. ─ Evocação da irmã Marta, falecida em 1824.
3º. ─ Segunda evocação do conde R... C..., membro da Sociedade, retido no leito por uma indisposição, seguida de perguntas que lhes são dirigidas sobre o isolamento momentâneo do Espírito do corpo, durante o sono. (Publicada neste número).
SEXTA-FEIRA, 9 DE DEZEMBRO (SESSÃO GERAL) Leitura da ata de 2 de dezembro.
Comunicações diversas:
O Sr. de la Roche dá notícia de notáveis comunicações ocorridas numa casa de Castelnaudary. Os fatos são relatados numa nota que precede o relato da evocação ocorrida e que será publicada.
Estudos:
1º. ─ Evocação do rei de Kanala (Nova Caledônia), já evocado a 28 de outubro, mas que então havia escrito com alguma dificuldade e prometera exercitar-se para escrever de modo mais legível. Dá curiosas explicações sobre a maneira de que se utilizou para aperfeiçoar-se. (Será publicada com a primeira evocação).
2º. ─ Evocação do Espírito de Castelnaudary. Ele se manifesta por sinais de
viva cólera, sem nada poder escrever. Quebra sete ou oito lápis, alguns dos quais são lançados violentamente sobre os assistentes, e sacode brutalmente o braço do médium. São Luís dá explicações interessantes sobre o estado e a natureza desse Espírito que, diz ele, é da pior espécie e está numa das mais infelizes situações. (Será publicada com todas as outras comunicações relativas ao assunto).
3º. ─ São obtidas simultaneamente, quatro comunicações espontâneas: a primeira, de São Vicente de Paulo, pelo Sr. Roze; a segunda, de Charlet, pelo Sr. Didier filho, continuação do trabalho iniciado pelo mesmo Espírito; a terceira, de Mélanchthon, pelo Sr. Colin; a quarta, de um Espírito que deu o nome de Mikaël, protetor das crianças, pela Sra. Boyer.
SEXTA-FEIRA, 16 DE DEZEMBRO DE 1859 (SESSÃO PARTICULAR) Leitura da ata.
Admissões:
São admitidos como membros titulares: o Sr. L. Benardacky, de São Petersburgo e a Sra. Elisa Johnson, de Londres, apresentados a 2 de dezembro.
Pedidos de admissão:
O Sr. Forbes, de Londres, oficial de engenharia, e a Sra. Forbes, de Florença, escrevem pedindo para fazer parte da Sociedade como titulares. Relatório e decisão adiados para 30 de dezembro.
Designação de seis comissários que deverão dividir o serviço das sessões gerais até 1.º de abril, sem necessidade de designar um para cada sessão. Terão, além disso, o encargo de assinalar as infrações que os ouvintes cometerem contra o regulamento por ignorarem as exigências da Sociedade, a fim de advertir os membros titulares que lhes houverem dado cartas de apresentação.
Por proposta do Sr. Allan Kardec, a Sociedade decide que o Boletim das sessões de ora em diante será publicado em suplemento da Revista, para que sua publicação não resulte em detrimento às matérias habituais do jornal. Como consequência dessa adição, cada número será aumentado em cerca de quatro páginas, cujas despesas ficarão a cargo da Sociedade.
O Sr. Lesourd propõe que quando houver cinco sessões num mês, a quinta seja de caráter particular, o que foi adotado. O mesmo membro propõe ainda que quando um novo membro for admitido, seja oficialmente apresentado aos outros membros da Sociedade, a fim de que não venha como um estranho, o que foi aceito.
O Sr. Thiry observa que muitos Espíritos sofredores pedem o auxílio da prece, para lhes abrandar as penas, mas, como podem ser perdidos de vista, propõe que em cada sessão o Presidente lhes lembre os nomes. (Adotado).
Comunicações diversas:
1º. ─ Carta do Sr. Jobard, de Bruxelas, confirmando com detalhes o fato das manifestações de Java, descritas pela Sra. Pfeiffer, publicadas na Revista de dezembro. Obteve-as do próprio general holandês, com quem estava ligado e que era encarregado de vigiar a casa onde as coisas se passavam e, consequentemente, testemunha ocular. Publicada neste número.
2º. ─ Leitura de uma comunicação do Espírito de Castelnaudary, obtida pelo Sr. e pela Sra. Forbes, ouvintes da última sessão. São fornecidos detalhes circunstanciados e interessantes sobre esse Espírito e sobre os acontecimentos ocorridos na casa em questão. Várias outras comunicações obtidas sobre o assunto serão reunidas às obtidas na Sociedade e publicadas quando tudo estiver completo. 3º. ─ Leitura de uma notícia sobre a Sra. Xavier, médium vidente. Essa senhora não vê os Espíritos quando quer. Eles se apresentam a ela espontaneamente, sem estar em sonambulismo nem em êxtase. Não obstante, em certos momentos, fica num estado particular que reclama a maior calma e recolhimento, de tal sorte que, interrogada quanto ao que vê, aquele estado se dissipa imediatamente e não vê mais nada. Como conserva uma lembrança completa de tudo, mais tarde pode dar conta do que viu. Foi assim que, entre outras, viu a Irmã Martha, no dia em que foi evocada e a descreveu de maneira a não deixar dúvidas quanto à sua identidade. Também viu, na última sessão, o Espírito de Castelnaudary, vestindo uma camisa rasgada, com um punhal na mão e com as mãos ensanguentadas, sacudir fortemente o braço do médium, durante as suas tentativas para escrever, bem como a cada vez que São Luís aparentemente lhe ordenava que escrevesse. Tinha uma espécie de sorriso estúpido nos lábios. Depois, ao lhe falarem de preces, parece que a princípio não compreendeu, mas logo depois da explicação dada por São Luís, caiu de joelhos.
O rei de Kanala lhe apareceu com a cabeça de um branco. Tinha olhos azuis, bigode e suíças brancos, mãos de negro, pulseiras de aço, um costume azul e o peito coberto por uma porção de objetos que ela não pôde distinguir. “Essa aparência, disse alguém, se deve a que entre a existência anterior, da qual falou, e a última, ele havia sido soldado na França, ao tempo de Luís XV. Era uma consequência de seu estado relativamente adiantado. Ele pediu para voltar entre sua gente, para ali fazer, como chefe, a introdução das ideias de progresso. A forma que tomou e a aparência meio selvagem e meio civilizada, são destinadas a vos mostrar, sob nova face, as que o Espírito pode dar ao perispírito, com um fim instrutivo e como indício dos vários estados por que passou.”
A Sra. X. viu ainda os Espíritos evocados virem responder à evocação e às perguntas que nada tinham de censurável quanto ao seu objetivo e, à ordem de São Luís, retirarem-se para que Espíritos presentes respondessem em seu lugar, quando as perguntas tomavam um caráter insidioso. “Devendo a maior boa-fé e a maior franqueza ditarem as perguntas, nenhum pensamento dissimulado nos escapa ─ acrescenta o Espírito interrogado a respeito pelo marido daquela senhora. Jamais procureis atingir o vosso objetivo por caminhos tortuosos, pois assim os perdereis infalivelmente”
Ela via uma coroa fluídica cingir a cabeça do médium, como a indicar os instantes em que era interdito aos Espíritos não chamados de se comunicarem, porque as respostas deveriam ser sinceras. Entretanto, desde que a coroa era retirada, via todos os Espíritos intrusos disputando o lugar que lhes deixavam.
Enfim, viu o Espírito do Sr. Conde de R... sob a forma de um coração luminoso invertido, preso a um cordão fluídico que vinha de fora. Foi dito que era para nos ensinar que o Espírito pode dar a seu perispírito a aparência que quiser. Depois, poderia ter havido o inconveniente, para ela, de encontrar-se perante um Espírito encarnado que tivesse visto como desprendido. Mais tarde, tal inconveniente terá diminuído ou desaparecido.
Estudos:
1º. ─ Evocação de Charlet.
2º. ─ Três comunicações espontâneas, recebidas simultaneamente: a primeira de Santo Agostinho, pelo Sr. Roze. Explica a missão do Cristo e confirma um ponto muito importante, explicado por Arago, sobre a formação do globo; a segunda, de Charlet, pelo Sr. Didier filho, continuação do trabalho começado; a terceira, de Joinville, que assina em ortografia antiga: Amy de Loys, pela senhorita Huet.
SEXTA-FEIRA, 23 DE DEZEMBRO DE 1859 (SESSÃO GERAL) Leitura da ata e trabalhos da sessão de 16 de dezembro.
Pedidos de admissão:
Cartas do Sr. Demange, negociante em Paris e do Sr. Soive, negociante em Paris, apresentados como membros titulares. Relatório e decisão adiados para a sessão de 30 de dezembro.
Comunicações diversas:
1º. ─ Leitura de uma evocação particular, feita pela Sra. B..., do Espírito que se comunicou espontaneamente por seu intermédio à Sociedade, sob o nome de Paul Miffet, no momento em que ia reencarnar-se. Essa evocação, que apresenta um interessante quadro da reencarnação e da situação física e moral do Espírito nos primeiros instantes de sua vida corporal, será publicada.
2º. ─ Carta do Sr. Paul Netz, sobre os fatos que determinaram a posse, pelos Chartreux, das ruínas do castelo de Vauvert, situado no bairro do Observatório de Paris, ao tempo de Luís IX. Diz-se que no castelo se passavam cenas diabólicas, que cessaram desde que os monges ali se instalaram. Interrogado a respeito, São Luís responde que tem perfeito conhecimento, mas que era uma charlatanice.
Estudos:
1º. ─ Perguntas e questões morais diversas, dirigidas a São Luís, sobre o estado dos Espíritos sofredores. Serão publicadas.
2º. ─ Evocação de John Brown.
3º. ─ Três comunicações espontâneas: a primeira, pelo Sr. Roze e assinada pelo Espírito de Verdade, com diversos conselhos à Sociedade; a segunda, de Charlet, pelo Sr. Didier filho, continuando o trabalho começado; a terceira, sobre os Espíritos que presidem às flores, pela Sra. B...
ALLANKARDEC
Pedidos de admissão:
Cartas do Sr. L. Benardacky, de São Petersburgo, e da Sra. Elisa Johnson, de Londres, que pedem para fazer parte da Sociedade como membros titulares.
Comunicações diversas:
Leitura de duas comunicações feitas ao Sr. Bouché, antigo reitor da Academia, médium escrevente, pelo Espírito da duquesa de Longueville, a respeito de uma visita que esta última lhe fez, como Espírito, em Port-Royal-des-Champs. Essas duas comunicações são notáveis pelo estilo e pela elevação dos pensamentos. Provam que certos Espíritos reveem com prazer os lugares onde viveram e que sentem o encanto da saudade. Sem dúvida, quanto mais desmaterializados, menos importância dão às coisas terrenas, mas alguns ainda se ligam a elas por muito tempo após a morte e parece que continuam, no mundo invisível, nas ocupações que tinham neste mundo, ou pelo menos demonstrando-lhes certo interesse.
Estudos:
1º. ─ Evocação do Sr. Conde Desbassyns de Richemont, falecido em junho de 1859, que há mais de dez anos professava ideias espíritas. A evocação confirma a influência dessas ideias sobre o desprendimento do Espírito após a morte.
2º. ─ Evocação da irmã Marta, falecida em 1824.
3º. ─ Segunda evocação do conde R... C..., membro da Sociedade, retido no leito por uma indisposição, seguida de perguntas que lhes são dirigidas sobre o isolamento momentâneo do Espírito do corpo, durante o sono. (Publicada neste número).
SEXTA-FEIRA, 9 DE DEZEMBRO (SESSÃO GERAL) Leitura da ata de 2 de dezembro.
Comunicações diversas:
O Sr. de la Roche dá notícia de notáveis comunicações ocorridas numa casa de Castelnaudary. Os fatos são relatados numa nota que precede o relato da evocação ocorrida e que será publicada.
Estudos:
1º. ─ Evocação do rei de Kanala (Nova Caledônia), já evocado a 28 de outubro, mas que então havia escrito com alguma dificuldade e prometera exercitar-se para escrever de modo mais legível. Dá curiosas explicações sobre a maneira de que se utilizou para aperfeiçoar-se. (Será publicada com a primeira evocação).
2º. ─ Evocação do Espírito de Castelnaudary. Ele se manifesta por sinais de
viva cólera, sem nada poder escrever. Quebra sete ou oito lápis, alguns dos quais são lançados violentamente sobre os assistentes, e sacode brutalmente o braço do médium. São Luís dá explicações interessantes sobre o estado e a natureza desse Espírito que, diz ele, é da pior espécie e está numa das mais infelizes situações. (Será publicada com todas as outras comunicações relativas ao assunto).
3º. ─ São obtidas simultaneamente, quatro comunicações espontâneas: a primeira, de São Vicente de Paulo, pelo Sr. Roze; a segunda, de Charlet, pelo Sr. Didier filho, continuação do trabalho iniciado pelo mesmo Espírito; a terceira, de Mélanchthon, pelo Sr. Colin; a quarta, de um Espírito que deu o nome de Mikaël, protetor das crianças, pela Sra. Boyer.
SEXTA-FEIRA, 16 DE DEZEMBRO DE 1859 (SESSÃO PARTICULAR) Leitura da ata.
Admissões:
São admitidos como membros titulares: o Sr. L. Benardacky, de São Petersburgo e a Sra. Elisa Johnson, de Londres, apresentados a 2 de dezembro.
Pedidos de admissão:
O Sr. Forbes, de Londres, oficial de engenharia, e a Sra. Forbes, de Florença, escrevem pedindo para fazer parte da Sociedade como titulares. Relatório e decisão adiados para 30 de dezembro.
Designação de seis comissários que deverão dividir o serviço das sessões gerais até 1.º de abril, sem necessidade de designar um para cada sessão. Terão, além disso, o encargo de assinalar as infrações que os ouvintes cometerem contra o regulamento por ignorarem as exigências da Sociedade, a fim de advertir os membros titulares que lhes houverem dado cartas de apresentação.
Por proposta do Sr. Allan Kardec, a Sociedade decide que o Boletim das sessões de ora em diante será publicado em suplemento da Revista, para que sua publicação não resulte em detrimento às matérias habituais do jornal. Como consequência dessa adição, cada número será aumentado em cerca de quatro páginas, cujas despesas ficarão a cargo da Sociedade.
O Sr. Lesourd propõe que quando houver cinco sessões num mês, a quinta seja de caráter particular, o que foi adotado. O mesmo membro propõe ainda que quando um novo membro for admitido, seja oficialmente apresentado aos outros membros da Sociedade, a fim de que não venha como um estranho, o que foi aceito.
O Sr. Thiry observa que muitos Espíritos sofredores pedem o auxílio da prece, para lhes abrandar as penas, mas, como podem ser perdidos de vista, propõe que em cada sessão o Presidente lhes lembre os nomes. (Adotado).
Comunicações diversas:
1º. ─ Carta do Sr. Jobard, de Bruxelas, confirmando com detalhes o fato das manifestações de Java, descritas pela Sra. Pfeiffer, publicadas na Revista de dezembro. Obteve-as do próprio general holandês, com quem estava ligado e que era encarregado de vigiar a casa onde as coisas se passavam e, consequentemente, testemunha ocular. Publicada neste número.
2º. ─ Leitura de uma comunicação do Espírito de Castelnaudary, obtida pelo Sr. e pela Sra. Forbes, ouvintes da última sessão. São fornecidos detalhes circunstanciados e interessantes sobre esse Espírito e sobre os acontecimentos ocorridos na casa em questão. Várias outras comunicações obtidas sobre o assunto serão reunidas às obtidas na Sociedade e publicadas quando tudo estiver completo. 3º. ─ Leitura de uma notícia sobre a Sra. Xavier, médium vidente. Essa senhora não vê os Espíritos quando quer. Eles se apresentam a ela espontaneamente, sem estar em sonambulismo nem em êxtase. Não obstante, em certos momentos, fica num estado particular que reclama a maior calma e recolhimento, de tal sorte que, interrogada quanto ao que vê, aquele estado se dissipa imediatamente e não vê mais nada. Como conserva uma lembrança completa de tudo, mais tarde pode dar conta do que viu. Foi assim que, entre outras, viu a Irmã Martha, no dia em que foi evocada e a descreveu de maneira a não deixar dúvidas quanto à sua identidade. Também viu, na última sessão, o Espírito de Castelnaudary, vestindo uma camisa rasgada, com um punhal na mão e com as mãos ensanguentadas, sacudir fortemente o braço do médium, durante as suas tentativas para escrever, bem como a cada vez que São Luís aparentemente lhe ordenava que escrevesse. Tinha uma espécie de sorriso estúpido nos lábios. Depois, ao lhe falarem de preces, parece que a princípio não compreendeu, mas logo depois da explicação dada por São Luís, caiu de joelhos.
O rei de Kanala lhe apareceu com a cabeça de um branco. Tinha olhos azuis, bigode e suíças brancos, mãos de negro, pulseiras de aço, um costume azul e o peito coberto por uma porção de objetos que ela não pôde distinguir. “Essa aparência, disse alguém, se deve a que entre a existência anterior, da qual falou, e a última, ele havia sido soldado na França, ao tempo de Luís XV. Era uma consequência de seu estado relativamente adiantado. Ele pediu para voltar entre sua gente, para ali fazer, como chefe, a introdução das ideias de progresso. A forma que tomou e a aparência meio selvagem e meio civilizada, são destinadas a vos mostrar, sob nova face, as que o Espírito pode dar ao perispírito, com um fim instrutivo e como indício dos vários estados por que passou.”
A Sra. X. viu ainda os Espíritos evocados virem responder à evocação e às perguntas que nada tinham de censurável quanto ao seu objetivo e, à ordem de São Luís, retirarem-se para que Espíritos presentes respondessem em seu lugar, quando as perguntas tomavam um caráter insidioso. “Devendo a maior boa-fé e a maior franqueza ditarem as perguntas, nenhum pensamento dissimulado nos escapa ─ acrescenta o Espírito interrogado a respeito pelo marido daquela senhora. Jamais procureis atingir o vosso objetivo por caminhos tortuosos, pois assim os perdereis infalivelmente”
Ela via uma coroa fluídica cingir a cabeça do médium, como a indicar os instantes em que era interdito aos Espíritos não chamados de se comunicarem, porque as respostas deveriam ser sinceras. Entretanto, desde que a coroa era retirada, via todos os Espíritos intrusos disputando o lugar que lhes deixavam.
Enfim, viu o Espírito do Sr. Conde de R... sob a forma de um coração luminoso invertido, preso a um cordão fluídico que vinha de fora. Foi dito que era para nos ensinar que o Espírito pode dar a seu perispírito a aparência que quiser. Depois, poderia ter havido o inconveniente, para ela, de encontrar-se perante um Espírito encarnado que tivesse visto como desprendido. Mais tarde, tal inconveniente terá diminuído ou desaparecido.
Estudos:
1º. ─ Evocação de Charlet.
2º. ─ Três comunicações espontâneas, recebidas simultaneamente: a primeira de Santo Agostinho, pelo Sr. Roze. Explica a missão do Cristo e confirma um ponto muito importante, explicado por Arago, sobre a formação do globo; a segunda, de Charlet, pelo Sr. Didier filho, continuação do trabalho começado; a terceira, de Joinville, que assina em ortografia antiga: Amy de Loys, pela senhorita Huet.
SEXTA-FEIRA, 23 DE DEZEMBRO DE 1859 (SESSÃO GERAL) Leitura da ata e trabalhos da sessão de 16 de dezembro.
Pedidos de admissão:
Cartas do Sr. Demange, negociante em Paris e do Sr. Soive, negociante em Paris, apresentados como membros titulares. Relatório e decisão adiados para a sessão de 30 de dezembro.
Comunicações diversas:
1º. ─ Leitura de uma evocação particular, feita pela Sra. B..., do Espírito que se comunicou espontaneamente por seu intermédio à Sociedade, sob o nome de Paul Miffet, no momento em que ia reencarnar-se. Essa evocação, que apresenta um interessante quadro da reencarnação e da situação física e moral do Espírito nos primeiros instantes de sua vida corporal, será publicada.
2º. ─ Carta do Sr. Paul Netz, sobre os fatos que determinaram a posse, pelos Chartreux, das ruínas do castelo de Vauvert, situado no bairro do Observatório de Paris, ao tempo de Luís IX. Diz-se que no castelo se passavam cenas diabólicas, que cessaram desde que os monges ali se instalaram. Interrogado a respeito, São Luís responde que tem perfeito conhecimento, mas que era uma charlatanice.
Estudos:
1º. ─ Perguntas e questões morais diversas, dirigidas a São Luís, sobre o estado dos Espíritos sofredores. Serão publicadas.
2º. ─ Evocação de John Brown.
3º. ─ Três comunicações espontâneas: a primeira, pelo Sr. Roze e assinada pelo Espírito de Verdade, com diversos conselhos à Sociedade; a segunda, de Charlet, pelo Sr. Didier filho, continuando o trabalho começado; a terceira, sobre os Espíritos que presidem às flores, pela Sra. B...
ALLANKARDEC
NOTA: A nova edição do Livro dos Espíritos aparecerá em janeiro.