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Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1859 > Abril
Abril
Quadro da vida espíritaTodos nós, sem exceção, atingimos mais cedo ou mais tarde o termo fatal da vida. Nenhuma força nos poderia subtrair a essa necessidade, eis o que é positivo. Muitas vezes as preocupações do mundo nos desviam o pensamento daquilo que se passa além-túmulo, mas quando chega o momento supremo, são poucos os que não se perguntam em que se vão transformar, porque a ideia de deixar a existência sem uma possibilidade de retorno tem algo de pungente. Com efeito, quem poderia encarar com indiferença a ideia de uma separação absoluta e eterna de tudo quanto amou? Quem poderia ver sem assombro abrir-se à sua frente o imenso abismo do nada, em que iriam desaparecer para sempre todas as nossas faculdades e todas as nossas esperanças? “O que!? Depois de mim, o nada; nada mais que o vazio; tudo acabado irremediavelmente? Mais alguns dias e a minha lembrança se apagará da memória dos que sobreviverem a mim; em breve não restará nenhum traço de minha passagem pela Terra; o próprio bem que eu tiver feito será esquecido pelos ingratos a quem tiver beneficiado, e nada para compensar tudo isso; nenhuma outra perspectiva além de meu corpo a ser roído pelos vermes?!” Este quadro do fim de um materialista, traçado por um Espírito que tinha vivido esses pensamentos, não tem algo de horrível e de glacial? Ensina-nos a religião que não pode ser assim, e a razão o confirma. Mas essa existência futura, vaga e indefinida, nada tem que satisfaça ao nosso amor ao que é positivo. É isto que gera a dúvida em muitos. Vá lá que tenhamos uma alma. Mas o que é a nossa alma? Ela tem forma e aparência? É um ser limitado ou indefinido? Dizem uns que é um sopro de Deus; outros, que uma centelha; outros, uma parte do grande todo, o princípio da vida e da inteligência. Mas o que concluímos de tudo isto? Diz-se, ainda, que ela é imaterial. Mas uma coisa imaterial não poderia ter proporções definidas. Para nós isso não é nada. Ensina-nos ainda a religião que seremos felizes ou infelizes, conforme o bem ou o mal que tivermos feito. Mas qual é essa felicidade que nos espera no seio de Deus?
Será uma beatitude, uma contemplação eterna, sem outro objetivo além de cantar os louvores ao Criador? As chamas do inferno são uma realidade ou uma ficção? A própria Igreja o entende nesta última acepção; mas quais são os sofrimentos? Onde o lugar do suplício? Numa palavra, que é o que se faz ou se vê nesse mundo que nos espera a todos? Costuma-se dizer que ninguém voltou para nos dar informações. Isso é um erro, e a missão do Espiritismo é precisamente esclarecer-nos sobre esse futuro, fazendo-nos, por assim dizer, tocá-lo e vê-lo, não pelo raciocínio, mas pelos fatos. Graças às comunicações espíritas, já não se trata de uma presunção ou de uma probabilidade, sobre a qual cada um imagina à vontade e que os poetas embelezam com as suas ficções ou repletam de imagens alegóricas que nos enganam. É a própria realidade que se nos apresenta, pois são os próprios seres de além-túmulo que nos vêm descrever a sua situação e falar-nos do que fazem, permitindo-nos, por assim dizer, assistir a todas as peripécias de sua vida nova, e dessa maneira mostrar-nos a sorte inevitável que nos aguarda, conforme os nossos méritos e os nossos deméritos. Haverá nisso algo de anti-religioso? Muito pelo contrário, pois os incrédulos encontram nisso a fé e os tíbios uma renovação do fervor e da confiança.
O Espiritismo é, pois, o mais poderoso auxiliar da religião. Se assim é, é que Deus o permite, e o permite para reanimar nossas esperanças vacilantes e para reconduzirnos ao caminho do bem, pela perspectiva do futuro que nos aguarda.
As conversas familiares de além-túmulo que publicamos; a descrição que elas encerram da situação dos Espíritos que nos falam, revelam-nos as suas penas, as suas alegrias, as suas ocupações. São um quadro animado da vida espírita, e na própria variedade dos assuntos podemos encontrar as analogias que nos interessam. Vamos tentar resumir o seu conjunto. Inicialmente consideremos a alma ao deixar este mundo e vejamos o que se passa nessa transmigração. Extinguindo-se as forças vitais, o Espírito se desprende do corpo no momento em que cessa a vida orgânica. Mas a separação não é brusca ou instantânea. Por vezes começa antes da cessação completa da vida e nem sempre é completada no instante da morte. Sabemos que entre o Espírito e o corpo existe um liame semimaterial, que constitui o primeiro envoltório. É esse liame que não se quebra subitamente. Enquanto subsiste, fica o Espírito num estado de perturbação comparável ao que acompanha o despertar. Muitas vezes ele até duvida de sua morte; sente que existe, vê-se e não compreende que possa viver sem seu corpo, do qual se vê separado. Os laços que ainda o prendem à matéria o tornam acessível a certas sensações que toma como sensações físicas. O Espírito só se reconhece quando completamente livre. Até então não compreende a sua situação. A duração desse estado de perturbação, como já o dissemos em outras ocasiões, é muito variável: pode ser de algumas horas, como de vários meses, mas é raro que ao cabo de alguns dias o Espírito não se reconheça mais ou menos bem. Entretanto, como tudo lhe é estranho e desconhecido, é-lhe necessário um certo tempo para familiarizar-se com a sua nova maneira de perceber as coisas.
Solene é o instante em que um deles vê cessar a sua escravização, pela ruptura dos laços que o prendem ao corpo. Ao entrar no mundo dos Espíritos é acolhido pelos amigos que vêm recebê-lo, como se voltasse de penosa viagem. Se a travessia foi feliz, isto é, se o tempo de exílio foi empregado de maneira proveitosa para si e o elevou na hierarquia do mundo dos Espíritos, eles o felicitam. Ali reencontra os conhecidos, mistura-se aos que o amam e com ele simpatizam, e então começa, para ele, verdadeiramente, a sua nova existência.
O envoltório semimaterial do Espírito constitui uma espécie de corpo, de forma definida, limitada e análoga à do corpo físico. Mas esse corpo não tem os nossos órgãos e não pode sentir todas as nossas impressões. Entretanto, percebe tudo quanto percebemos: a luz, os sons, os odores, etc. Estas sensações não são menos reais, embora nada tenham de material; têm, até, algo de mais claro, de mais preciso, de mais sutil, porque lhe chegam sem intermediário, sem passar pela fieira dos órgãos que as embotam. A faculdade de perceber é inerente ao Espírito; é um atributo de todo o seu ser. As sensações lhe chegam por todos os lados, e não através de canais circunscritos. Falando da visão, dizia-nos um Espírito: “É uma faculdade do Espírito e não do corpo. Vedes pelos olhos, mas não é o olho que vê. É o Espírito.”
Em virtude da conformação de nossos órgãos, necessitamos de certos veículos para as sensações. É assim que necessitamos da luz para refletir os objetos e do ar para nos transmitir os sons. Esses veículos se fazem inúteis, desde que não tenhamos mais os intermediários que os tornam indispensáveis. Assim, pois, o Espírito vê sem auxílio de nossa luz e ouve sem necessidade das vibrações do ar. Eis por que para ele não há obscuridade. Mas as sensações permanentes e indefinidas, por mais agradáveis que sejam, com o tempo se tornariam fatigantes, se não lhe fosse possível subtrair-se a elas. Por isso tem o Espírito a faculdade de suspendê-las. Ele pode, à vontade, deixar de ver, de ouvir, de sentir tais ou quais coisas e, consequentemente, não ver, não ouvir, não sentir senão aquilo que queira. Essa faculdade está na razão de sua superioridade, pois há coisas que os Espíritos inferiores não podem evitar, pelo que a sua situação se torna penosa.
A princípio o Espírito não compreende essa nova maneira de sentir, da qual só aos poucos se dá conta. Aqueles cuja inteligência é ainda muito atrasada não a compreendem absolutamente e sentiriam muita dificuldade em exprimi-la, exatamente como entre nós os ignorantes veem e se movem, sem saber como nem por quê.
Essa impossibilidade de compreender o que está acima de seu alcance, aliada à fanfarrice, usual companheira da ignorância, é a fonte de teorias absurdas dadas por certos Espíritos que nos induziriam em erro se as aceitássemos sem controle e se não estivéssemos seguros, pelos meios fornecidos pela experiência e pelo hábito de com eles conversar, quanto ao grau de confiança que merecem.
Essa impossibilidade de compreender o que está acima de seu alcance, aliada à fanfarrice, usual companheira da ignorância, é a fonte de teorias absurdas dadas por certos Espíritos que nos induziriam em erro se as aceitássemos sem controle e se não estivéssemos seguros, pelos meios fornecidos pela experiência e pelo hábito de com eles conversar, quanto ao grau de confiança que merecem.
Há sensações que têm por fonte o próprio estado dos nossos órgãos. Ora, as necessidades inerentes ao corpo não se podem verificar desde que não exista mais corpo. Assim, pois, o Espírito não experimenta fadiga, nem necessidade de repouso ou de alimentação, porque não tem nenhuma perda a reparar. Ele não é acometido por nenhuma de nossas enfermidades. As necessidades do corpo determinam necessidades sociais, que para eles não existem. Assim não mais existem as preocupações dos negócios, as discórdias, as mil e umas tribulações do mundo e os tormentos a que nos entregamos para suprirmos as nossas necessidades ou as superfluidades da vida. Eles têm pena do esforço que fazemos por causa de futilidades. Entretanto, quanto mais felizes são os Espíritos elevados, tanto mais sofrem os inferiores, mas esses sofrimentos se constituem principalmente de angústias que embora nada tenham de físico, nem por isso são menos pungentes.
Eles têm todas as paixões e todos os desejos que tinham em vida (referimo-nos aos Espíritos inferiores) e seu castigo é o de não poder satisfazê-los. Isto é para eles uma tortura que julgam eterna, porque sua própria inferioridade não lhes permite ver o término, o que é também para eles um castigo.
A palavra articulada é uma necessidade de nossa organização. Como os Espíritos não necessitam de vibrações sonoras para lhes ferir os ouvidos, compreendem-se pela simples transmissão do pensamento, assim como por vezes acontece que nos entendemos por um simples olhar. Entretanto, os Espíritos fazem barulho. Sabemos que podem agir sobre a matéria e que essa matéria nos transmite o som. É assim que se dão a entender, quer por meio de pancadas, quer por meio de gritos que vibram no ar. Mas então o fazem para nós e não para eles. Voltaremos ao assunto em artigo especial, no qual trataremos da faculdade dos médiuns auditivos.
Enquanto arrastamos penosamente pela terra o nosso corpo pesado e material, como o condenado as suas cadeias, o dos Espíritos, vaporoso e etéreo, transporta-se sem fadiga de um lugar para outro; rasga o espaço com a velocidade do pensamento e tudo penetra, sem encontrar qualquer obstáculo material.
O Espírito vê tudo aquilo que vemos, e mais claramente do que nós. Além disso, vê aquilo que os nossos sentidos limitados não nos permitem ver. Penetrando, ele mesmo, a matéria, descobre o que a matéria oculta à nossa visão.
Os Espíritos não são, pois, seres vagos e indefinidos, conforme as abstratas definições da alma a que nos referimos acima. São seres reais, determinados, circunscritos, que gozam de todas as nossas faculdades e de outras que nos são desconhecidas, porque inerentes à sua natureza. Eles têm as qualidades da sua matéria peculiar e constituem o mundo invisível que povoa o Espaço, envolvendo-nos e se acotovelando incessantemente conosco. Suponhamos desfeito por um instante o véu material que os oculta aos nossos olhos. Ver-nos-íamos cercados por uma multidão de seres que vão e vêm, agitam-se em torno de nós e nos observam, do mesmo modo que faríamos se nos encontrássemos em uma assembleia de cegos.
Para os Espíritos, nós somos os cegos e eles são os videntes.
Para os Espíritos, nós somos os cegos e eles são os videntes.
Dissemos que ao entrar em sua nova vida o Espírito precisa de algum tempo para se reconhecer; que ali tudo lhe é estranho e desconhecido. Perguntarão como pode ser assim se ele já teve outras existências corpóreas. Essas existências foram separadas por intervalos durante os quais ele habitou o mundo dos Espíritos. Então esse mundo não lhe deve ser desconhecido, desde que não o vê pela primeira vez.
Várias causas contribuem para que essas percepções, embora já experimentadas, lhe pareçam novas. Como dissemos, a morte é sempre seguida por um instante de perturbação, mas que pode ser de curta duração. Nesse estado suas ideias são sempre vagas e confusas; a vida corpórea se confunde, até certo ponto, com a vida espírita e ele ainda não pode separá-las em seu pensamento. Dissipada a primeira impressão, as ideias pouco a pouco se aclaram e a ele volta, mas gradativamente, a lembrança do passado, pois essa memória jamais irrompe bruscamente. Só quando ele se encontra inteiramente desmaterializado é que o passado se desdobra à sua frente, como um espectro saindo de um nevoeiro. Só então ele se recorda de todos os atos de sua última existência, depois das existências anteriores e de suas várias passagens pelo mundo dos Espíritos. Compreende-se, pois, que durante um certo tempo esse mundo lhe pareça novo, até que ele se tenha reconhecido completamente e recuperado de maneira precisa a lembrança das sensações ali experimentadas.
A essa causa, entretanto, deve juntar-se outra, não menos importante.
O estado do Espírito, como Espírito, varia extraordinariamente na razão de sua elevação e de seu grau de pureza. À medida que se eleva e se depura, suas percepções e suas sensações se tornam menos grosseiras; adquirem mais acuidade, mais sutileza, mais delicadeza; vê, sente e compreende coisas que não poderia ver, sentir ou compreender numa condição inferior. Ora, cada existência corpórea sendo para ele uma oportunidade de progresso, lança-o a um meio novo para ele porque, se tiver progredido, encontra-se entre Espíritos de outra ordem, cujos pensamentos e hábitos são todos diferentes. Acrescente-se a isso que tal depuração lhe permite, sempre como Espírito, penetrar nesses mundos inacessíveis aos Espíritos inferiores, do mesmo modo que nos salões da alta Sociedade não têm acesso as pessoas mal educadas. Quanto menos esclarecido, tanto mais limitado é o seu horizonte. À medida que se eleva e se depura, esse horizonte se amplia e com ele, o círculo de suas ideias e percepções.
A seguinte comparação pode facilitar-nos a compreensão. Suponhamos um camponês bruto, ignorante, vindo a Paris pela primeira vez. Poderá conhecer e compreender a Paris dos meios sábios e elegantes? Não, porque frequentará apenas as pessoas de sua classe e os bairros por elas habitados. Mas se no intervalo entre a primeira e uma segunda viagem esse camponês se desenvolveu e adquiriu instrução e boas maneiras, outros serão os seus hábitos e as suas relações.
Então verá um mundo novo, em nada semelhante à Paris de outrora.
Dá-se o mesmo com os Espíritos, mas nem todos experimentam o mesmo grau de incerteza. À medida que progridem, suas ideias se desenvolvem e a memória se apura. Familiarizam-se previamente com a sua nova situação e seu regresso ao convívio dos outros Espíritos já nada tem que lhes cause admiração. Encontram-se novamente em seu meio normal e, passado o primeiro momento de perturbação, se reintegram quase imediatamente.
Essa é a situação geral dos Espíritos no estado que chamamos de erraticidade.
Mas o que fazem nesse estado? Como passam o tempo? Isto é de um interesse capital para nós. São eles mesmos que vão responder, como foram eles que deram as explicações que acabamos de transmitir, de vez que nada disto é fruto de nossa imaginação. Não se trata de um sistema saído de nosso cérebro. Julgamos pelo que vemos e ouvimos. Posta de lado qualquer opinião relativamente ao Espiritismo, hão de convir que esta teoria sobre a vida de além-túmulo nada contém de irracional. Ela apresenta uma sequência e um encadeamento perfeitamente lógicos, que fariam honra a qualquer filósofo. Laboraríamos em erro se acreditássemos que a vida espírita é uma vida ociosa.
Ao contrário, ela é essencialmente ativa e todos nos falam de suas ocupações. Essas ocupações necessariamente diferem, conforme seja o Espírito errante ou encarnado.
No estado de encarnação, elas são relativas à natureza dos mundos habitados; às necessidade que dependem do estado físico e moral desses mundos, bem como da organização dos seres vivos. E não é disso que devemos tratar aqui. Falaremos apenas dos Espíritos errantes.
Entre os que já atingiram certo grau de desenvolvimento, uns velam pela realização dos desígnios de Deus nos grandes destinos do Universo; dirigem a marcha dos acontecimentos e concorrem ao progresso de cada mundo. Outros tomam os indivíduos sob sua proteção, constituindo-se em seus gênios tutelares e anjos da guarda. Acompanham-nos desde o nascimento até a morte, buscando encaminhá-los pela estrada do bem. Sentem-se felizes quando seus esforços são coroados de sucesso. Alguns se encarnam em mundos inferiores, para neles realizar missões de progresso. Pelo trabalho, pelo exemplo, pelos conselhos e pelos
sentimentos, procuram fazer que uns progridam nas ciências e nas artes, outros na moral. Então se submetem voluntariamente às vicissitudes de uma vida corpórea por vezes penosa, com o objetivo de fazer o bem, e o bem que fazem lhes é contado. Muitos, enfim, não têm qualquer atribuição especial. Eles vão a todo lugar onde sua presença pode ser útil para dar conselhos, inspirar boas ideias, animar os desanimados, fortalecer os fracos e castigar os presunçosos.
sentimentos, procuram fazer que uns progridam nas ciências e nas artes, outros na moral. Então se submetem voluntariamente às vicissitudes de uma vida corpórea por vezes penosa, com o objetivo de fazer o bem, e o bem que fazem lhes é contado. Muitos, enfim, não têm qualquer atribuição especial. Eles vão a todo lugar onde sua presença pode ser útil para dar conselhos, inspirar boas ideias, animar os desanimados, fortalecer os fracos e castigar os presunçosos.
Se considerarmos o número infinito de mundos que povoam o Universo e o número incalculável de seres que os habitam, compreenderemos que os Espíritos têm muito em que se ocupar. Essas ocupações, entretanto, nada têm para eles de penoso. Exercem-nas com alegria, voluntariamente, sem constrangimento, e sua felicidade é triunfar naquilo que empreendem. Ninguém pensa numa ociosidade eterna, que seria um verdadeiro suplício.
Quando as circunstâncias o exigem, reúnem-se em conselho; deliberam sobre a marcha a seguir, conforme os acontecimentos; dão ordens aos Espíritos que lhes são subordinados e, a seguir, vão para onde o dever os chama. Essas assembleias são mais gerais ou mais particulares, conforme a importância do assunto. Nenhum lugar especial ou circunscrito é escolhido para essas reuniões. O Espaço é o domínio dos Espíritos. Contudo, elas se realizam de preferência nos mundos que lhes são o objeto. Os Espíritos encarnados, que neles estão em missão, delas participam, conforme a sua elevação. Enquanto o corpo repousa, vão receber conselhos dos outros Espíritos e, por vezes, receber ordens relacionadas com a conduta que devem ter como homens. É verdade que ao despertar não guardam lembrança muito nítida daquilo que se passou, mas têm a intuição, que os leva a agir como se fosse por sua própria iniciativa.
Descendo na hierarquia, encontramos Espíritos menos elevados, menos depurados e, consequentemente, menos esclarecidos, mas nem por isso menos bons e que, numa esfera de atividade mais restrita, desempenham funções análogas. Em vez de estender-se a diferentes mundos, sua ação é antes exercida num mundo especial e relacionada com o seu grau de desenvolvimento. Sua influência é mais individual e tem como objetivo coisas de menor importância. Vem a seguir a multidão de Espíritos vulgares, mais ou menos bons, mais ou menos maus, que pululam em torno de nós. Esses estão ligeiramente acima da Humanidade, cujas nuanças representam e como que refletem, pois têm todos os vícios e virtudes que a caracterizam. Em muitos deles encontramos os gostos, ideias e inclinações que possuíam em vida. Suas faculdades são limitadas, seu julgamento falível como o dos homens e por vezes errôneo e carregado de preconceitos.
Noutros é mais desenvolvido o senso moral. Mesmo sem grande superioridade nem grande profundidade, julgam com mais critério, por vezes até condenando aquilo que fizeram, disseram ou pensaram em vida. Aliás, há uma coisa notável: é que, mesmo entre os Espíritos mais comuns, de um modo geral, os sentimentos são mais puros como Espíritos do que como homens. A vida espírita os esclarece quanto aos seus defeitos e, salvo poucas exceções, arrependem-se amargamente e lamentam o mal que fizeram, pois sofrem mais ou menos cruelmente as suas consequências.
Vimos alguns desses que não eram melhores do que tinham sido em vida. Nunca, porém, os vimos piores. O endurecimento absoluto é muito raro e apenas temporário, porque mais cedo ou mais tarde acabam lamentando a sua posição.
Pode-se, pois, dizer que todos aspiram ao aperfeiçoamento, porque todos compreendem que é este o único meio de saírem da sua inferioridade. Instruir-se e esclarecer-se, eis a sua grande preocupação e eles se sentem felizes quando podem a isto acrescentar pequenas missões de confiança que os elevam aos seus próprios olhos.
Pode-se, pois, dizer que todos aspiram ao aperfeiçoamento, porque todos compreendem que é este o único meio de saírem da sua inferioridade. Instruir-se e esclarecer-se, eis a sua grande preocupação e eles se sentem felizes quando podem a isto acrescentar pequenas missões de confiança que os elevam aos seus próprios olhos.
Também eles têm as suas assembleias, de maior ou menor importância, conforme a natureza de seus pensamentos. Falam-nos, veem e observam aquilo que se passa. Participam de nossas reuniões, de nossos jogos, de nossas festas e de nossos espetáculos, assim como de nossas ocupações sérias. Escutam as nossas conversas, os mais levianos como divertimento ou para rir à nossa custa, ou ainda para nos pregarem uma peça, desde que o possam; os outros, a fim de instruir-se.
Observam os homens, analisam o seu caráter e fazem aquilo a que eles chamam estudo dos costumes, com o fito de escolherem a sua existência futura.
Observam os homens, analisam o seu caráter e fazem aquilo a que eles chamam estudo dos costumes, com o fito de escolherem a sua existência futura.
Vimos o Espírito no momento em que, deixando o corpo, entra em sua vida nova. Analisamos as suas sensações e seguimos-lhe o desenvolvimento gradual das ideias. Os primeiros momentos são empregados em reconhecer-se e compreender o que se passa com ele. Numa palavra, ele, por assim dizer, experimenta as próprias faculdades, como a criança que pouco a pouco vê crescerem-lhe as forças e os pensamentos. Falamos dos Espíritos vulgares, pois os outros, como já dissemos, estão de certo modo e previamente identificados com o estado espírita, que nenhuma surpresa lhes causa senão a alegria de se encontrarem livres dos entraves e dos sofrimentos corporais. Entre os Espíritos inferiores muitos sentem saudades da vida terrena, porque sua situação como Espíritos é cem vezes pior. Eis porque buscam distrair-se com a visão daquilo com que outrora se deliciavam. Essa visão, contudo, lhes é um suplício, porque sentem desejos mas não podem satisfazê-los.
Entre os Espíritos é geral a necessidade de progresso. Isto os excita ao trabalho por seu melhoramento, de vez que compreendem que é esse o preço de sua felicidade. Mas nem todos sentem essa necessidade no mesmo grau, principalmente no início. Alguns chegam mesmo a comprazer-se numa espécie de vagabundagem, aliás de pouca duração; logo a atividade se torna para eles uma necessidade imperiosa, à qual, aliás, são arrastados por outros Espíritos que neles estimulam os sentimentos do bem.
Vem a seguir o que se pode chamar de escória do mundo espírita, constituída de todos os Espíritos impuros, cuja preocupação única é o mal. Sofrem e desejariam que todos sofressem como eles. A inveja lhes torna odiosa toda superioridade. O ódio é a sua essência. Não podendo culpar disso os Espíritos, investem contra os homens, atacando os que lhes parecem mais fracos. Excitar as paixões ruins; insuflar a discórdia; separar os amigos; provocar rixas; fazer que os ambiciosos pavoneiem o seu orgulho, pelo prazer de abatê-los em seguida; espalhar o erro e a mentira, numa palavra, desviar do bem, tais são os seus pensamentos dominantes.
Mas por que permite Deus que assim seja? Deus não tem que nos prestar contas. Dizem-nos os Espíritos superiores que os maus são provações para os bons e que não há virtude onde não há vitória a conquistar. Aliás, se esses Espíritos malfazejos se acham na Terra, é que aqui encontram eco e simpatias. Console-nos o pensamento de que acima deste lodo que nos cerca existem seres puros e benevolentes que nos amam, nos sustentam, nos encorajam e nos estendem os braços, atraindo-nos, a fim de nos conduzirem a mundos melhores, onde o mal não encontra acesso, desde que saibamos fazer o que for preciso para merecê-lo.
Fraudes espíritas
Aqueles que não admitem a realidade das manifestações físicas geralmente atribuem à fraude os efeitos produzidos. Alegam que os prestidigitadores hábeis fazem coisas que parecem prodigiosas, se não lhes conhecemos os segredos. Daí concluem que os médiuns não passam de escamoteadores. Já refutamos esse argumento, ou antes, essa opinião, notadamente nos artigos sobre o Sr. Home e nos números da Revista Espírita de janeiro e fevereiro de 1858. Acrescentaremos apenas algumas palavras, antes de tratar de assunto mais sério.
Pelo fato de haver charlatães que vendem drogas na praça pública; pelo fato de também haver médicos que, mesmo não indo à praça pública, abusam da confiança, segue-se que todos os médicos são charlatães e que a classe é atingida em sua reputação? Pelo fato de haver criaturas que vendem tintura para vinho, segue-se que todos os negociantes de vinho são falsificadores e que não mais existe vinho puro?
Abusa-se de tudo, mesmo das coisas mais respeitáveis e pode-se dizer até que a fraude tem o seu gênio. Mas a fraude tem sempre um objetivo, um interesse material qualquer, e onde nada se pode ganhar não existe nenhum interesse em enganar. Por isso dissemos em nosso número anterior, a propósito dos médiuns mercenários, que a melhor de todas as garantias é um desinteresse absoluto.
Dir-se-á que essa garantia não é única, porque em matéria de prestidigitação há amadores muito hábeis, que visam apenas distrair a Sociedade, e não o fazem por dever de ofício. Não poderia ocorrer o mesmo com os médiuns? Sem dúvida que é possível por uns momentos a gente se divertir, divertindo os outros, mas para passar nisto horas a fio, durante semanas, meses e anos, fora necessário estar possuído do demônio da mistificação, e o primeiro mistificado seria o mistificador.
Desnecessário repetir aqui tudo o que já foi dito relativamente à possível boa-fé dos médiuns e dos assistentes, quanto a serem joguetes de uma ilusão e de uma fascinação. A isso já respondemos inúmeras vezes, bem como a todas as outras objeções sobre o assunto, pelo que remetemos o leitor à nossa Instruction practique sur les manifestations e aos nossos anteriores artigos na Revista Espírita.
O nosso objetivo não é convencer incrédulos. Se não se convencem pelos fatos, menos o fariam pelo raciocínio. Seria, pois, perdermos o nosso tempo.
Dirigimo-nos, pelo contrário, aos adeptos, a fim de preveni-los contra os subterfúgios de que poderiam ser vítimas por parte de criaturas interessadas, por um motivo qualquer, em simular certos fenômenos. Dizemos certos fenômenos, porque alguns há que desafiam evidentemente toda habilidade de prestidigitação, como, principalmente, o movimento de objetos sem contato; a suspensão de corpos pesados no espaço; os golpes dados em diversas direções; as aparições, etc. Mas até mesmo para alguns desses fenômenos seria possível, até certo ponto, a simulação, tal o progresso feito pela arte da imitação.
O que é necessário fazer em semelhantes casos é observar atentamente as circunstâncias e sobretudo levar em consideração o caráter e a condição das pessoas, bem como o objetivo e o interesse que poderiam ter em enganar. Eis o melhor de todos os controles, porque há circunstâncias tais que afastam qualquer motivo de suspeita. Assim, estabelecemos como princípio que é preciso desconfiar de todos quantos fizessem desses fenômenos um espetáculo, um objeto de curiosidade ou um divertimento, ou que dos mesmos tirassem qualquer proveito, por menor que fosse, gabando-se de produzi-los à vontade e a qualquer propósito. Nunca seria demasiado repetir que as inteligências ocultas que se manifestam têm as suas susceptibilidades e querem provar-nos que também possuem livre-arbítrio e não se submetem aos nossos caprichos.
De todos os fenômenos físicos, um dos mais comuns é o dos golpes internos, vibrados na própria substância da madeira, com ou sem movimento da mesa ou de qualquer outro objeto que utilizemos. Ora, este efeito é um dos mais fáceis de imitar, e como é também um dos mais frequentemente produzidos, parece útil revelar uma pequena astúcia com a qual podemos ser logrados. Basta colocar as mãos abertas sobre a mesa, suficientemente próximas para que as unhas dos polegares se apoiem fortemente uma na outra; então, por um movimento muscular absolutamente imperceptível, faz-se estalar as unhas com um ruído seco, muito parecido com o da tiptologia interna. Esse ruído repercute na madeira e produz uma ilusão completa.
Nada mais fácil do que fazer ouvir tantos golpes quantos se queira; uma batida de tambor, etc.; responder a certas perguntas pelo sim e pelo não, conforme os números ou, ainda, pela indicação das letras do alfabeto.
Uma vez prevenidos, o meio de reconhecermos a fraude é muito simples. Ela não será mais possível se as mãos ficarem afastadas uma da outra e se nos certificarmos de que nenhum contato poderá produzir o ruído. Aliás, os golpes autênticos têm a característica de mudar de lugar e de timbre à vontade, o que não ocorre quando produzidos pelo meio mencionado, ou por qualquer outro semelhante.
Eles saem da mesa e vão produzir-se num móvel qualquer, que ninguém toca, e respondem a perguntas imprevistas.
Assim chamamos a atenção das pessoas de boa-fé para esse pequeno estratagema, bem como para outros que possam descobrir, a fim de denunciá-los sem cerimônia. A possibilidade de fraude e de imitação não impede a realidade dos fatos, e o Espiritismo só terá a ganhar com o desmascaramento dos impostores. Se alguém nos disser: Eu vi tal fenômeno, mas havia fraude, responderemos que é possível; chegamos a ver pseudo-sonâmbulos que simulavam o sonambulismo com muita habilidade. Isto, entretanto, não impede que o sonambulismo seja um fato. Todo mundo já viu negociantes venderem algodão por seda, o que não impede que haja verdadeiros tecidos de seda. É necessário examinar todas as circunstâncias e verificar se a dúvida tem fundamento. Mas nisto, como em tudo o mais, é preciso ser perito. Ora, nós não poderíamos aceitar como juiz de uma questão alguém que nada soubesse a respeito dela.
O mesmo diremos dos médiuns psicógrafos. Em geral se pensa que os médiuns mecânicos oferecem mais garantias, não só para a independência das ideias, como também contra o embuste. Mas isto é um erro. A fraude insinua-se por toda parte.
Sabemos que com habilidade é possível dirigir à vontade a cesta e a prancheta que escrevem e dar-lhes todas as nuanças de movimentos espontâneos. O que afasta todas as dúvidas são os pensamentos expressos, quer venham do médium mecânico, intuitivo, auditivo, falante ou vidente. Há comunicações que de tal modo exorbitam das ideias, dos conhecimentos e mesmo do alcance intelectual do médium, que seria necessário nos enganarmos redondamente a fim de lhes dar crédito. Reconhecemos no charlatanismo uma grande habilidade e enormes recursos, mas ainda não lhe reconhecemos o dom de dar sabedoria a um ignorante ou talento a quem não o tenha.
Problema moral - Os canibais
Um dos nossos assinantes dirigiu-nos a seguinte pergunta, rogando-nos a solução pelos Espíritos que nos assistem, se ainda não a tivermos:
“Depois de um lapso de tempo mais ou menos longo, os Espíritos errantes desejam e pedem a Deus a reencarnação, como meio de progresso espiritual. Escolhem as provas e, usando o livre-arbítrio, escolhem naturalmente aquelas que se lhes afiguram mais apropriadas a esse progresso no mundo onde a reencarnação lhes é permitida. Ora, durante sua vida errante, empregada em instruir-se, conforme eles mesmos nos dizem, ficam sabendo quais as nações que mais lhes convêm, a fim de atingirem o fim visado. Veem populações ferozes, antropófagas e têm a certeza de que, nelas encarnando, se tornarão ferozes comedores de carne humana. Certamente não será nesse meio que hão de realizar o progresso espiritual. Seus instintos brutais apenas terão adquirido mais consistência pela força do hábito. Então seu objetivo terá falhado, se houverem escolhido este ou aquele povo.
“Dá-se o mesmo com certas posições sociais. Entre estas, por certo, há as que apresentam invencíveis obstáculos ao progresso espiritual. Citarei apenas os magarefes nos matadouros, os carrascos, etc. Dizem que tais criaturas são necessárias, umas porque não podemos passar sem alimentação animal, outras porque é preciso executar as sentenças judiciais exigidas pela nossa organização social. Não é menos certo que, reencarnando no corpo de um menino destinado a abraçar uma ou outra dessas profissões, deve o Espírito saber que toma um caminho errado e que voluntariamente se priva dos meios que podem conduzi-lo à perfeição. Não poderia acontecer, com a permissão de Deus, que nenhum Espírito quisesse esses gêneros de vida e, nesse caso, o que aconteceria com essas profissões, necessárias, em nossa atual condição social?”
A resposta a essa questão decorre de todos os ensinos que nos têm sido dados. Podemos, portanto, respondê-la, sem ter que submetê-la novamente aos Espíritos.
É evidente que um Espírito já adiantado, como, por exemplo, o de um europeu esclarecido, não poderá escolher como meio de progresso uma existência selvagem, pois em vez de avançar, retrogradaria. Sabemos, entretanto, que os próprios antropófagos não se encontram no último degrau da escala e que há mundos onde o embrutecimento e a ferocidade não têm analogia na Terra. Esses Espíritos são ainda inferiores aos mais atrasados do nosso mundo. É para eles um progresso, portanto, encarnar entre os nossos selvagens. Se não visam um ponto mais alto, é que sua inferioridade moral não lhes permite compreender um progresso mais completo. Só gradativamente pode o Espírito progredir. Deve passar sucessivamente por todos os graus, de modo que cada passo à frente sirva de base para assentar um novo progresso. Ele não pode transpor de um salto a distância que separa a barbárie da civilização, assim como o estudante não pode passar, sem transições do abc à Retórica. É nisto que vemos uma das necessidades da reencarnação, que está realmente de acordo com a justiça de Deus. De outro modo, que seria desses milhões de seres que morrem no último estado de depravação, se não tivessem meios de atingir a superioridade? Por que os teria Deus deserdado dos favores concedidos aos outros homens? Repetimo-lo, por ser ponto essencial: em razão de sua curta inteligência, só compreendem o que é melhor do seu ponto de vista e em estreitos limites. Há, entretanto, alguns que se transviam por quererem subir muito alto e que nos dão o triste espetáculo da ferocidade no meio da civilização. Voltando ao meio dos canibais, ainda lucrarão.
Estas considerações também se aplicam às profissões de que fala o nosso correspondente. Elas oferecem evidente superioridade relativa para certos Espíritos, e é neste sentido que devemos conceber a escolha por eles feita. Pela mesma razão, elas podem ser escolhidas como expiação ou como missão, porque nenhuma existe na qual não se possa fazer o bem e progredir pela própria maneira de exercê-la.
Quanto à pergunta sobre o que seria dessas profissões caso nenhum Espírito quisesse exercê-las, está respondida pelos fatos. Desde que os Espíritos que as alimentam vêm de mais baixo, não há razão para temer o desemprego. Quando o progresso social permitir a supressão do ofício de carrasco, desaparecerá a função, mas não os candidatos, que irão apresentar-se entre outros povos ou em mundos menos adiantados.
A indústria
Comunicação espontânea do médium escrevente. Sr Croz, lida na sessão da sociedade, a 21 de janeiro de 1859
As empresas que vemos surgir diariamente são atos providenciais e o desenvolvimento de germes cultivados através dos séculos. A Humanidade e o planeta por ela habitado têm uma mesma existência, cujas fases se encadeiam e se correspondem.
Logo que se acalmam as grandes convulsões da Natureza, e que passa a febre que propelia às guerras de extermínio, brilha a Filosofia; desaparece a escravidão e florescem as Ciências e as Artes.
A perfeição divina pode resumir-se no belo e no útil. Se Deus fez o homem à sua imagem, é porque desejava que ele vivesse de sua inteligência, como Ele próprio vive no seio dos esplendores da Criação.
Os empreendimentos que Deus abençoa, sejam quais forem as suas proporções, são os que correspondem aos seus desígnios, trazendo o seu concurso à obra coletiva, cuja lei está escrita no Universo: o belo e o útil. A arte, filha do repouso e da inspiração, é o belo. A indústria, filha da Ciência e do trabalho, é o útil.
OBSERVAÇÃO: Esta comunicação é mais ou menos a iniciação de um médium que acaba de desenvolver-se com admirável rapidez. É de convir que, como experiência, ela é promissora. Desde a primeira sessão ele escreveu, de um jacto, quatro páginas que nada ficam a dever ao que se acaba de ler, pela profundidade dos pensamentos, o que nele denota uma admirável aptidão para servir de intermediário a todos os Espíritos, para comunicações particulares. Aliás, necessitamos de mais estudos neste particular, porque nem a todos é dada uma tal flexibilidade.
Conhecemos médiuns que não podem servir de intermediários senão a determinados Espíritos e para uma certa ordem de ideias. Depois de escrita esta nota chegamos a constatar o real progresso do médium, cuja faculdade oferece características especiais e dignas da maior atenção do observador.
Palestras familiares de além-túmulo
Benvenuto Cellini1. ─ (Evocação).
─ Interrogai. Estou pronto. Podeis demorar-vos como quiserdes, pois tenho tempo para vos dar.
─ Interrogai. Estou pronto. Podeis demorar-vos como quiserdes, pois tenho tempo para vos dar.
2. ─ Lembrai-vos da existência que passastes na Terra, no século XVI, entre 1500 e 1570?
─ Sim, sim.
─ Sim, sim.
3. ─ Atualmente, qual a vossa situação como Espírito?
─ Vivi em vários outros mundos e estou muito satisfeito com a posição que hoje ocupo. Não é um cimo, mas estou progredindo.
─ Vivi em vários outros mundos e estou muito satisfeito com a posição que hoje ocupo. Não é um cimo, mas estou progredindo.
4. ─ Tivestes outras existências corporais na Terra, depois daquela que conhecemos?
─ Corporais, sim. Na Terra, não.
─ Corporais, sim. Na Terra, não.
5. ─ Quanto tempo ficastes errante?
─ Não posso calcular. Alguns anos.
─ Não posso calcular. Alguns anos.
6. ─ Quais as vossas ocupações nesse estado errante?
─ Trabalhava pelo meu aperfeiçoamento.
─ Trabalhava pelo meu aperfeiçoamento.
7. ─ Voltais eventualmente à Terra?
─ Poucas vezes.
─ Poucas vezes.
8─ Assististes ao drama em que sois representado? Que pensais dele?
─ Fui vê-lo várias vezes. Fiquei satisfeito como Cellini, mas pouco como Espírito que havia progredido.
─ Fui vê-lo várias vezes. Fiquei satisfeito como Cellini, mas pouco como Espírito que havia progredido.
9. ─ Antes da existência pela qual vos conhecemos, tivestes outras na Terra?
─ Não, nenhuma.
─ Não, nenhuma.
10. ─ Poderíeis dizer o que éreis em vossa precedente existência?
─ Minhas ocupações eram muito diferentes da que tive na Terra.
─ Minhas ocupações eram muito diferentes da que tive na Terra.
11. ─ Que mundo habitais?
─ Não o conheceis e não o vedes.
─ Não o conheceis e não o vedes.
12. ─ Poderíeis dar-nos a sua descrição do ponto de vista físico e do moral?
─ Sim, facilmente. Do ponto de vista físico, meus caros amigos, satisfez-me a sua beleza plástica. Ali nada choca a vista; todas as linhas se harmonizam perfeitamente; a mímica é meio de expressão permanente; os perfumes nos rodeiam e não temos nada a desejar para o nosso bem-estar físico, porque as necessidades pouco numerosas a que estamos sujeitos logo são satisfeitas.
Do ponto de vista moral, a perfeição é menor, pois ali ainda podem ver-se consciências perturbadas e Espíritos dedicados ao mal. Não é a perfeição, longe disso, mas, como já disse, é o seu caminho, e todos esperamos um dia alcançá-la.
─ Sim, facilmente. Do ponto de vista físico, meus caros amigos, satisfez-me a sua beleza plástica. Ali nada choca a vista; todas as linhas se harmonizam perfeitamente; a mímica é meio de expressão permanente; os perfumes nos rodeiam e não temos nada a desejar para o nosso bem-estar físico, porque as necessidades pouco numerosas a que estamos sujeitos logo são satisfeitas.
Do ponto de vista moral, a perfeição é menor, pois ali ainda podem ver-se consciências perturbadas e Espíritos dedicados ao mal. Não é a perfeição, longe disso, mas, como já disse, é o seu caminho, e todos esperamos um dia alcançá-la.
13. ─ Quais as vossas ocupações no mundo que habitais?
─ Trabalhamos as artes. Sou artista.
─ Trabalhamos as artes. Sou artista.
14. ─ Em vossas memórias contais uma cena de feitiçaria e de endemoninhamento que se teria passado no Coliseu, em Roma, e na qual teríeis tomado parte, recordai-vos?
─ Sem muita clareza.
─ Sem muita clareza.
15. ─ Se a lêssemos, a leitura avivaria a vossa lembrança?
─ Sim. Dar-me-ia a noção.
─ Sim. Dar-me-ia a noção.
Fez-se então a leitura do seguinte trecho de suas memórias:
“Em meio a essa vida estranha, eu me liguei a um sacerdote siciliano, de espírito muito fino e profundamente versado nas letras gregas e latinas. Um dia nossa conversa caiu sobre necromancia e eu lhe disse que durante toda a minha vida tinha desejado ardentemente ver e aprender algo dessa arte. Para abordar semelhante empresa é necessário ter una alma firme e intrépida, respondeu o sacerdote.
“Uma noite, entretanto, o padre fez os seus preparativos e me disse que procurasse um ou dois companheiros. Convidou um homem de Pistoia, que também se ocupava de necromancia e dirigimo-nos ao Coliseu. Aí o padre vestiu-se à maneira dos necromantes, depois começou a riscar círculos no chão, acompanhando isto com as mais belas cerimônias que se possam imaginar.
Havia trazido perfumes preciosos, drogas fétidas e fogo. Quando tudo estavaem ordem ele fez uma abertura no círculo e ali nos introduziu, um a um, levando-nos pela mão. Depois distribuiu os papéis. Pôs o talismã nas mãos de seu amigo necromante; encarregou os outros da vigilância do fogo e dos perfumes, depois do que começou as conjurações. Essa cerimônia durou mais de hora e meia. O Coliseu encheu-se de legiões de Espíritos infernais. Quando o padre viu que eram bastante numerosos, voltou-se para mim, que cuidava dos perfumes, e disse:
“─ Benvenuto, pede-lhes alguma coisa.
“Respondi que desejava que eles me reunissem à minha siciliana Angélica.
“Não obstante nenhuma resposta tivéssemos naquela noite, fiquei encantado com o que tinha visto.
“O necromante me disse que era necessário voltar uma segunda vez e que eu obteria tudo quanto quisesse, desde que trouxesse um rapazinho ainda virgem.
“Escolhi um dos meus aprendizes e trouxe mais dois amigos meus.
“Ele pôs-me nas mãos o talismã, mandando que o voltasse para a direção que me fosse indicada. Meu aprendiz ficou colocado debaixo do talismã. O necromante começou suas terríveis evocações. Chamou pelo nome uma porção de chefes de legiões infernais e lhes deu ordens em hebraico, em grego e em latim, em nome do Deus incriado, vivo e eterno. Em breve o Coliseu encheu-se de uma quantidade de demônios cem vezes maior que da primeira vez. A conselho do necromante, pedi novamente para me encontrar com Angélica. Ele voltou-se para mim e me disse:
“Não os ouviste anunciar que em um mês estarias com ela?” E pediu-me que tivesse firmeza, porque havia ainda mil legiões que não tinham sido chamadas, acrescentando que essas eram mais perigosas e que, de vez que haviam respondido ao meu pedido, era necessário tratá-las com brandura e despedi-las tranquilamente.
Por outro lado o menino exclamava com espanto que percebia milhares de homens terríveis que nos ameaçavam, e quatro enormes gigantes, armados dos pés à cabeça, que pareciam querer penetrar em nosso círculo. Entrementes, a tremer de medo, o necromante tentava conjurá-los, ensaiando a mais doce entonação de voz. O menino mergulhava a cabeça entre os joelhos e gritava:
─ “Eu quero morrer assim! Estamos mortos!
“Então eu lhe disse:
“Então eu lhe disse:
“─ Estas criaturas estão todas abaixo de nós. Aquilo que vês não passa de fumaça e sombra. Levanta, pois, os teus olhos.”
“Apenas me havia obedecido, exclamou:
“Apenas me havia obedecido, exclamou:
“─ Todo o Coliseu está em chamas e o fogo vem sobre nós.”
“O necromante mandou que fosse queimada assa-fétida. Agnolo, encarregado dos perfumes, estava semimorto de pavor.
“O ruído e o mau cheiro fizeram o menino levantar a cabeça. Ouvindo o meu riso, animou-se um pouco e disse que os demônios começavam a retirada. Ficamos assim até o momento em que soaram as matinas. Disse-nos o menino que apenas avistava alguns demônios a grande distância. Por fim, quando o necromante concluiu o cerimonial e tirou os paramentos, saímos do círculo.
“Enquanto voltávamos para casa, pela Via dei Banchi, ele garantia que dois demônios faziam piruetas à nossa frente, ora correndo sobre os telhados, ora pelo chão.
“O necromante jurava que desde que havia posto o pé num círculo mágico, jamais lhe havia acontecido algo tão extraordinário. Depois tentou convencer-me a me dedicar com ele a um livro que nos deveria proporcionar riquezas incalculáveis e nos dar os meios de obrigar os demônios a indicar-nos os lugares onde estão ocultos os tesouros que a terra guarda em seu seio...
“Depois de diferentes relatos mais ou menos ligados ao que precede, conta Benvenuto como, ao cabo de trinta dias, ou seja, no prazo fixado pelos demônios, ele encontrou sua Angélica.”
16. ─ Poderíeis dizer-nos o que existe de verídico nesta cena?
─ O necromante era um charlatão; eu era um romancista e Angélica era a minha amante.
─ O necromante era um charlatão; eu era um romancista e Angélica era a minha amante.
17. ─ Revistes o vosso protetor Francisco I?
─ Certamente. Ele reviu muitos outros que não foram seus protegidos.
─ Certamente. Ele reviu muitos outros que não foram seus protegidos.
18. ─ Como o julgáveis em vida e como o julgais agora?
─ Direi como o julgava: como um príncipe e, como tal, enceguecido por sua
educação e pelos que o cercavam.
─ Direi como o julgava: como um príncipe e, como tal, enceguecido por sua
educação e pelos que o cercavam.
19. ─ E agora, que dizeis dele?
─ Ele progrediu.
─ Ele progrediu.
20. ─ Ele protegia os artistas por um sincero amor às artes?
─ Sim, mas também por prazer e por vaidade.
─ Sim, mas também por prazer e por vaidade.
21. ─ Onde se acha ele atualmente?
─ Está vivo.
─ Está vivo.
22. ─ Na Terra?
─ Não.
─ Não.
23. ─ Se o evocássemos agora, ele poderia vir e conversar conosco?
─ Sim. Mas não forceis os Espíritos dessa maneira. Vossas evocações devem ser preparadas com muita antecedência, e então, pouco tereis a perguntar ao Espírito.
Desse modo vos arriscareis muito menos a serdes enganados, pois às vezes isso se dá. (São Luís).
─ Sim. Mas não forceis os Espíritos dessa maneira. Vossas evocações devem ser preparadas com muita antecedência, e então, pouco tereis a perguntar ao Espírito.
Desse modo vos arriscareis muito menos a serdes enganados, pois às vezes isso se dá. (São Luís).
24. ─ (A São Luís): Poderíeis fazer com que dois Espíritos viessem conversar
um com o outro?
─ Sim.
─ Nesse caso seria útil ter dois médiuns?
─ Sim, é necessário.
um com o outro?
─ Sim.
─ Nesse caso seria útil ter dois médiuns?
─ Sim, é necessário.
NOTA: O diálogo em questão ocorreu em outra sessão. Publicá-lo-emos no próximo número.
25. (A Cellini): ─ Qual a origem da vossa vocação para a arte? Seria devido a um especial desenvolvimento anterior?
─ Sim. Durante muito tempo fui atraído pela poesia e pela beleza da linguagem. Na Terra prendi-me à beleza como reprodução. Hoje me ocupo da beleza como invenção.
─ Sim. Durante muito tempo fui atraído pela poesia e pela beleza da linguagem. Na Terra prendi-me à beleza como reprodução. Hoje me ocupo da beleza como invenção.
26. ─ Tínheis também habilidade militar, pois o Papa Clemente VII vos confiou a defesa do Castelo de Santo Ângelo. Entretanto, o vosso talento de artista não vos devia dar muita aptidão para a guerra.
─ Tinha talento e sabia aplicá-lo. Em tudo é necessário discernimento, sobretudo na arte militar de então.
─ Tinha talento e sabia aplicá-lo. Em tudo é necessário discernimento, sobretudo na arte militar de então.
27. ─ Poderíeis dar alguns conselhos aos artistas que buscam seguir as vossas pegadas?
─ Sim. Dir-lhes-ei apenas que mais do que fazem e mais do que fiz, busquem a pureza e a verdadeira beleza. Eles me compreenderão.
─ Sim. Dir-lhes-ei apenas que mais do que fazem e mais do que fiz, busquem a pureza e a verdadeira beleza. Eles me compreenderão.
28. ─ A beleza não é relativa e convencional? O europeu julga-se mais belo que o negro, e o negro mais belo que o branco. Se há uma beleza absoluta, qual o padrão? Podeis dar a vossa opinião a respeito?
─ Com prazer. Não quis aludir a uma beleza convencional. Pelo contrário, a beleza está em toda parte, como um reflexo do Espírito sobre o corpo e não apenas como forma corpórea. Como dissestes, um negro pode ser belo, de uma beleza apreciada apenas por seus semelhantes, é verdade. Do mesmo modo vossa beleza terrena é deformidade para o Céu, assim como para vós, brancos, o belo negro quase que se vos afigura disforme. Para o artista, o belo é a vida, o sentimento que sabe dar à obra. Com isso dará beleza às coisas mais vulgares.
─ Com prazer. Não quis aludir a uma beleza convencional. Pelo contrário, a beleza está em toda parte, como um reflexo do Espírito sobre o corpo e não apenas como forma corpórea. Como dissestes, um negro pode ser belo, de uma beleza apreciada apenas por seus semelhantes, é verdade. Do mesmo modo vossa beleza terrena é deformidade para o Céu, assim como para vós, brancos, o belo negro quase que se vos afigura disforme. Para o artista, o belo é a vida, o sentimento que sabe dar à obra. Com isso dará beleza às coisas mais vulgares.
29. ─ Poderíeis guiar um médium na execução de modelagens, assim como Bernard de Palissy em relação aos desenhos?
─ Sim.
─ Sim.
30. ─ Poderíeis levar o médium de quem vos servis no momento a produzir alguma coisa?
─ Como os outros, mas preferiria um artista, que conhecesse os truques da arte.
─ Como os outros, mas preferiria um artista, que conhecesse os truques da arte.
OBSERVAÇÃO: Prova a experiência que a aptidão de um médium para tal ou qual gênero de produção depende da flexibilidade que apresenta ao Espírito, abstração feita do seu talento. O conhecimento do ofício e os meios materiais de execução não constituem o talento, mas é compreensível que, dirigindo o médium, nele encontre o Espírito menos dificuldade mecânica a vencer. Entretanto, veem-se médiuns que fazem coisas admiráveis, embora lhes faltem as primeiras noções, como no caso dos desenhos, da poesia, das gravuras, da música, etc., mas então é que existe neles uma aptidão inata, sem dúvida devida a um desenvolvimento anterior, do qual apenas conservaram a intuição.
31. ─ Poderíeis dirigir a senhora G. S., aqui presente, que é artista, mas que jamais conseguiu produzir algo como médium?
─ Se ela tiver vontade, experimentarei.
─ Se ela tiver vontade, experimentarei.
32. (A Sra. G. S.): ─ Quando queres começar?
─ Quando quiseres, a partir de amanhã.
─ Quando quiseres, a partir de amanhã.
33. ─ Como, porém, saberei que a inspiração virá de ti?
─ A convicção vem com as provas. Deixai que venha lentamente.
─ A convicção vem com as provas. Deixai que venha lentamente.
34. ─ Por que não tive êxito até este momento?
─ Pouca persistência e falta de boa vontade por parte do Espírito a quem solicitas.
─ Pouca persistência e falta de boa vontade por parte do Espírito a quem solicitas.
35. ─ Agradeço-te pela assistência que me prometes.
─ Adeus. Até a vista, companheira de trabalho.
─ Adeus. Até a vista, companheira de trabalho.
NOTA: A Sra. G. S. pôs-se à obra, mas ainda ignoramos quais os resultados.
Girard de Codemberg
Ex-aluno da Escola Politécnica, membro de várias associações científicas, autor de um livro intitulado: Le Monde spirituel, ou science chrétienne de communiquer intimement avec les puissances célestes et les âmes heureuses. Falecido em novembro de 1858, foi evocado na Sociedade a 14 de janeiro seguinte.
1. ─ (Evocação).
─ Aqui me acho. Que querem?
2. ─ Atendeis ao nosso chamado de boa vontade?
─ Sim.
3. ─ Quereis dizer-nos o que pensais atualmente do livro que publicastes?
─ Cometi alguns erros, mas ali há coisas aproveitáveis. Creio que, sem autoelogio, vós mesmos concordareis com o que disse.
4. ─ Dizeis principalmente que tivestes comunicações com a mãe do Cristo. Vedes agora se era realmente ela?
─ Não. Não era ela, mas um Espírito que lhe tomava o nome.
5. ─ Com que fim esse Espírito lhe tomava o nome?
─ Ele me via seguir por um caminho errado e aproveitava para me empurrar ainda mais. Era um Espírito perturbador, um ser leviano, mais inclinado ao mal do que ao bem. Sentia-se feliz por ver a minha falsa alegria. Eu era o seu joguete, como muitas vezes vós homens o sois dos próprios semelhantes.
6. ─ Como é que vós, dotado de uma inteligência superior, não percebestes o ridículo de certas comunicações?
─ Eu estava fascinado e tomava por bom tudo quanto me diziam
7. ─ Não julgais que essa obra possa fazer mal, no sentido de prestar-se ao ridículo, relativamente às comunicações de além-túmulo?
─ Nesse sentido, sim. Mas eu disse também que havia coisas aproveitáveis, como também verdadeiras e que, sob um outro ponto de vista, impressionam as massas. Naquilo que nos parece mau, por vezes encontramos uma boa semente.
8. ─ Sois agora mais feliz do que quando vivo?
─ Sim. Mas tenho muita necessidade de esclarecer-me, pois ainda me acho nas brumas que se seguem à morte. Estou como o aluno que começa a soletrar.
9. ─ Quando vivo conhecestes O Livro dos Espíritos?
─ Nunca lhe havia prestado atenção. Tinha ideias preconcebidas. Nisto eu pecava, pois nunca é demais aprofundar-se e estudar todas as coisas. Mas o orgulho está sempre presente, criando-nos ilusões. Isto é próprio dos ignorantes em geral, que não estudam senão aquilo que preferem e não ouvem senão aqueles que os elogiam.
10. ─ Mas não éreis um ignorante. Vossos títulos bem o provam.
─ Que é o sábio da Terra ante a Ciência do céu? Aliás, sempre há a influência de certos Espíritos, interessados em afastar-nos da luz.
OBSERVAÇÃO: Isto corrobora o que já foi dito, que certos Espíritos inspiram o afastamento das pessoas que poderiam dar conselhos úteis e frustrar os seus planos. Essa influência jamais seria a de um bom Espírito.
11. ─ E agora, que pensais desse livro?
─ Eu não poderia dizê-lo sem elogios, e nós não elogiamos. Deveis compreender-me.
12. ─ Modificou-se a vossa opinião relativamente às penas futuras?
─ Sim. Eu acreditava nas penas materiais. Agora creio nas penas morais.
13. ─ Podemos fazer algo que vos seja agradável?
─ Sempre. Que cada um faça, à noite, uma prece em minha intenção. Serei reconhecido. Principalmente não me esqueçais.
OBSERVAÇÃO: O livro do Sr. de Codemberg causou alguma sensação e, digamos mesmo, uma penosa sensação entre os esclarecidos partidários do Espiritismo, em consequência da extravagância de certas comunicações que se prestam ao ridículo. Sua intenção era louvável, pois era um homem sincero, mas é um exemplo do domínio que certos Espíritos podem exercer, adulando e exagerando ideias e preconceitos daqueles que não ponderam com muita severidade os prós e os contras das comunicações espíritas. Ele nos mostra principalmente o perigo de divulgá-los muito levianamente para o público, porque podem tornar-se motivo de repulsa, fortalecendo certas pessoas na incredulidade e, assim, fazendo maior mal do que bem, porque dão armas aos inimigos da causa. Nunca seríamos demasiadamente cautelosos a este respeito.
1. ─ (Evocação).
─ Aqui me acho. Que querem?
2. ─ Atendeis ao nosso chamado de boa vontade?
─ Sim.
3. ─ Quereis dizer-nos o que pensais atualmente do livro que publicastes?
─ Cometi alguns erros, mas ali há coisas aproveitáveis. Creio que, sem autoelogio, vós mesmos concordareis com o que disse.
4. ─ Dizeis principalmente que tivestes comunicações com a mãe do Cristo. Vedes agora se era realmente ela?
─ Não. Não era ela, mas um Espírito que lhe tomava o nome.
5. ─ Com que fim esse Espírito lhe tomava o nome?
─ Ele me via seguir por um caminho errado e aproveitava para me empurrar ainda mais. Era um Espírito perturbador, um ser leviano, mais inclinado ao mal do que ao bem. Sentia-se feliz por ver a minha falsa alegria. Eu era o seu joguete, como muitas vezes vós homens o sois dos próprios semelhantes.
6. ─ Como é que vós, dotado de uma inteligência superior, não percebestes o ridículo de certas comunicações?
─ Eu estava fascinado e tomava por bom tudo quanto me diziam
7. ─ Não julgais que essa obra possa fazer mal, no sentido de prestar-se ao ridículo, relativamente às comunicações de além-túmulo?
─ Nesse sentido, sim. Mas eu disse também que havia coisas aproveitáveis, como também verdadeiras e que, sob um outro ponto de vista, impressionam as massas. Naquilo que nos parece mau, por vezes encontramos uma boa semente.
8. ─ Sois agora mais feliz do que quando vivo?
─ Sim. Mas tenho muita necessidade de esclarecer-me, pois ainda me acho nas brumas que se seguem à morte. Estou como o aluno que começa a soletrar.
9. ─ Quando vivo conhecestes O Livro dos Espíritos?
─ Nunca lhe havia prestado atenção. Tinha ideias preconcebidas. Nisto eu pecava, pois nunca é demais aprofundar-se e estudar todas as coisas. Mas o orgulho está sempre presente, criando-nos ilusões. Isto é próprio dos ignorantes em geral, que não estudam senão aquilo que preferem e não ouvem senão aqueles que os elogiam.
10. ─ Mas não éreis um ignorante. Vossos títulos bem o provam.
─ Que é o sábio da Terra ante a Ciência do céu? Aliás, sempre há a influência de certos Espíritos, interessados em afastar-nos da luz.
OBSERVAÇÃO: Isto corrobora o que já foi dito, que certos Espíritos inspiram o afastamento das pessoas que poderiam dar conselhos úteis e frustrar os seus planos. Essa influência jamais seria a de um bom Espírito.
11. ─ E agora, que pensais desse livro?
─ Eu não poderia dizê-lo sem elogios, e nós não elogiamos. Deveis compreender-me.
12. ─ Modificou-se a vossa opinião relativamente às penas futuras?
─ Sim. Eu acreditava nas penas materiais. Agora creio nas penas morais.
13. ─ Podemos fazer algo que vos seja agradável?
─ Sempre. Que cada um faça, à noite, uma prece em minha intenção. Serei reconhecido. Principalmente não me esqueçais.
OBSERVAÇÃO: O livro do Sr. de Codemberg causou alguma sensação e, digamos mesmo, uma penosa sensação entre os esclarecidos partidários do Espiritismo, em consequência da extravagância de certas comunicações que se prestam ao ridículo. Sua intenção era louvável, pois era um homem sincero, mas é um exemplo do domínio que certos Espíritos podem exercer, adulando e exagerando ideias e preconceitos daqueles que não ponderam com muita severidade os prós e os contras das comunicações espíritas. Ele nos mostra principalmente o perigo de divulgá-los muito levianamente para o público, porque podem tornar-se motivo de repulsa, fortalecendo certas pessoas na incredulidade e, assim, fazendo maior mal do que bem, porque dão armas aos inimigos da causa. Nunca seríamos demasiadamente cautelosos a este respeito.
Poitevin, o aeronauta
1. ─ (Evocação).
─ Eis-me aqui. Falai.
─ Eis-me aqui. Falai.
2. ─ Tendes saudades da vida terrena?
─ Não.
─ Não.
3. ─ Sois mais feliz agora do que quando vivo?
─ Muito.
─ Muito.
4. ─ Qual o motivo que vos levou a experiências aeronáuticas?
─ A necessidade.
─ A necessidade.
5. ─ Tínheis ideia de servir à Ciência?
─ De modo algum.
─ De modo algum.
6. ─ Vedes agora a ciência aeronáutica de um ponto de vista diverso do que tínheis quando vivo?
─ Não. Eu a via como a vejo agora, pois a via bem. Via muitos aperfeiçoamentos a introduzir, mas não podia fazê-los por falta de conhecimento. Mas esperai. Virão homens que hão de dar-lhe a importância que ela merece e que merecerá um dia.
─ Não. Eu a via como a vejo agora, pois a via bem. Via muitos aperfeiçoamentos a introduzir, mas não podia fazê-los por falta de conhecimento. Mas esperai. Virão homens que hão de dar-lhe a importância que ela merece e que merecerá um dia.
7. ─ Credes que a aeronáutica venha a tornar-se um dia de utilidade pública?
─ Sim, certamente.
─ Sim, certamente.
8. ─ A grande preocupação dos que se dedicam a essa ciência é a busca da dirigibilidade dos balões. Pensais que o conseguirão?
─ Sim, com certeza.
─ Sim, com certeza.
9. ─ Na vossa opinião, qual a maior dificuldade para a dirigibilidade dos balões?
─ O vento e as tempestades.
─ O vento e as tempestades.
10. ─ Então não é a dificuldade de encontrar um ponto de apoio?
─ Se dirigíssemos os ventos, dirigiríamos os balões.
─ Se dirigíssemos os ventos, dirigiríamos os balões.
11. ─ Poderíeis assinalar o ponto para o qual deveriam ser dirigidas as pesquisas a esse respeito?
─ Deixemos como está.
─ Deixemos como está.
12. ─ Estudastes em vida os vários sistemas propostos?
─ Não.
─ Não.
13. ─ Poderíeis dar conselhos aos que se ocupam de tais pesquisas?
─ Pensais que os vossos conselhos seriam seguidos?
─ Pensais que os vossos conselhos seriam seguidos?
14. ─ Não seriam os nossos, mas os vossos.
─ Quereis um tratado? Eu mandarei fazê-lo.
─ Quereis um tratado? Eu mandarei fazê-lo.
15. ─ Por quem?
─ Pelos amigos que me guiaram.
─ Pelos amigos que me guiaram.
16. ─ Aqui estão dois inventores distintos em matéria de aerostação, os senhores Sanson e Ducroz, que tiveram menções científicas muito honrosas. Tendes ideia de seus sistemas?
─ Não. Muito há que dizer. Eu não os conheço.
─ Não. Muito há que dizer. Eu não os conheço.
17. ─ Admitindo estar resolvido o problema da dirigibilidade, credes na possibilidade de uma navegação aérea em grande escala como sobre o mar?
─ Não, nunca como pelo telégrafo.
─ Não, nunca como pelo telégrafo.
18. ─ Não falo da rapidez das comunicações, que jamais podem ser comparadas à do telégrafo, mas do transporte de um grande número de pessoas e de objetos materiais. Que resultado podemos esperar neste sentido?
─ Pouca presteza.
─ Pouca presteza.
19. ─ Quando em perigo iminente, pensastes no que seríeis depois da morte?
─ Não. Estava inteiramente absorvido nas manobras.
─ Não. Estava inteiramente absorvido nas manobras.
20. ─ Que impressão vos causava o perigo que corríeis?
─ O hábito tinha diminuído o medo.
─ O hábito tinha diminuído o medo.
21. ─ Que sensação tínheis quando estáveis perdido no espaço?
─ Perturbação, mas felicidade. Parece que meu Espírito fugia do vosso mundo. Entretanto, a necessidade de manobrar trazia-me à realidade e fazia-me cair na fria e perigosa posição em que me achava.
─ Perturbação, mas felicidade. Parece que meu Espírito fugia do vosso mundo. Entretanto, a necessidade de manobrar trazia-me à realidade e fazia-me cair na fria e perigosa posição em que me achava.
22. ─ Vedes com prazer a vossa esposa seguir a mesma carreira aventurosa?
─ Não.
─ Não.
23. ─ Qual a vossa situação como Espírito?
─ Vivo como vós, isto é, posso prover à minha vida espiritual como vós à vossa material.
─ Vivo como vós, isto é, posso prover à minha vida espiritual como vós à vossa material.
OBSERVAÇÃO: As curiosas experiências do Sr. Poitevin, sua intrepidez, sua notável habilidade na manobra dos balões, faziam-nos esperar dele maior elevação e grandeza de ideias. O resultado não correspondeu à nossa expectativa. Como vimos, a aerostação não era para ele senão uma indústria, um modo de viver, um gênero especial de espetáculo. Todas as suas faculdades estavam concentradas nos meios de satisfazer à curiosidade pública. Assim é que, nestas conversas de além-túmulo as previsões são muitas vezes incertas: ora são ultrapassadas, ora ficam aquém do que se esperava, o que é prova evidente da independência das comunicações.
Numa sessão particular, através do mesmo médium, Poitevin ditou os conselhos que se seguem, para cumprir a promessa que acabara de fazer. Cada um poderá medir-lhes o valor, pois os damos como objeto de estudo sobre a natureza dos Espíritos e não por seu mérito científico, mais que contestável.
“Para dirigir um balão cheio de gás, encontrareis sempre as maiores dificuldades: a imensa superfície que ele oferece exposta aos ventos; a insignificância do peso que o gás pode transportar; a fragilidade do envoltório, exigida por esse ar sutil. Todas estas causas jamais permitirão dar ao sistema aerostático a grande extensão que desejaríeis vê-lo tomar. Para que o aeróstato tenha uma utilidade real, é preciso que seja um sistema de comunicação poderoso e dotado de uma certa presteza, sobretudo poderoso. Dissemos que representaria um meio termo entre a eletricidade e o vapor. Sim, sob dois pontos de vista:
1.º ─ Deve transportar passageiros com mais rapidez que as ferrovias e mensagens com menos rapidez que o telégrafos;
2.º ─ Não se coloca como meio termo entre os dois sistemas, porque participa, ao mesmo tempo, do ar e da terra, ambos lhe servindo de caminho. Está entre o céu e o mundo.
1.º ─ Deve transportar passageiros com mais rapidez que as ferrovias e mensagens com menos rapidez que o telégrafos;
2.º ─ Não se coloca como meio termo entre os dois sistemas, porque participa, ao mesmo tempo, do ar e da terra, ambos lhe servindo de caminho. Está entre o céu e o mundo.
“Não me perguntastes se por este meio chegaríeis a visitar outros planetas. Entretanto, tal pensamento inquietou muitas cabeças e a sua solução encheria o vosso mundo de espanto. Não. Não o conseguireis. Pensai que para atravessar os espaços inimagináveis, de milhões e milhões de léguas, a luz leva anos. Vede, pois, quanto tempo seria necessário para atingi-los, mesmo levados pelo vapor e pelo vento.
“Para voltar ao tema principal, eu vos dizia, de começo, que se não deveria esperar muito do vosso sistema atual, mas que obteríeis muito mais agindo sobre o ar por compressão forte e extensa. O ponto de apoio que buscais está à vossa frente e vos cerca por todos os lados. Com ele vos chocais em cada um dos vossos movimentos; diariamente ele entrava a vossa rota e influi sobre tudo quanto tocais. Pensai muito nisto e tirai desta revelação tudo quanto for possível. Suas consequências são enormes. Não podemos tomar-vos a mão e levar-vos a forjar os utensílios necessários a esse trabalho. Não vos podemos dar uma indução, palavra por palavra. É preciso que o vosso espírito trabalhe e amadureça os seus projetos, sem o que não compreenderíeis aquilo que fizésseis e não saberíeis manejar os instrumentos. Seríamos nós obrigados a torcer e abrir os vossos êmbolos; então as circunstâncias imprevistas que, um dia ou outro, viessem atrapalhar os vossos esforços, lançar-vos-iam em vossa primitiva ignorância.
“Trabalhai, pois, e encontrareis aquilo que tiverdes procurado. Conduzi o vosso Espírito na direção que vos indicamos e aprendei, pela experiência, que não vos induzimos em erro.”
OBSERVAÇÃO: Embora encerrando verdades incontestes, nem por isto estes conselhos deixam de revelar um Espírito pouco esclarecido, sob certos pontos de vista, pois parece ignorar a verdadeira causa da impossibilidade de atingir outros planetas. É uma prova a mais da diversidade de aptidões e de luzes encontradas, como na Terra, no mundo dos Espíritos. É pela multiplicidade das observações que chegaremos a conhecê-lo, compreendê-lo e julgá-lo. Eis por que damos modelos de comunicações de todo gênero, tomando, porém, o cuidado de ressaltar o forte e o fraco. Esta de Poitevin termina por uma consideração muito justa, que nos parece ter sido suscitada por um Espírito mais filosófico que o seu. Aliás, ele havia dito que tais conselhos seriam redigidos por seus amigos que, definitivamente, nada ensinam.
Nisto encontramos ainda nova prova de que os homens que na Terra tiveram uma especialidade nem sempre são os mais adequados ao nosso esclarecimento como Espíritos, principalmente se não forem bastante elevados e desprendidos da vida terrena.
É lamentável que, para o progresso da aeronáutica, a maioria desses homens intrépidos não possam colocar a sua experiência a serviço da Ciência, enquanto os teóricos são alheios à prática, como marinheiros que jamais tivessem visto o mar. Incontestavelmente, um dia haverá engenheiros aeronautas, como há engenheiros navais, mas só quando eles tiverem, eles próprios, visto e sondado as profundezas do oceano aéreo. Quantas ideias não lhes seriam dadas pelo contato real dos elementos, ideias que escapam à gente do ofício, porque, seja qual for o seu saber, não podem eles, do fundo de seu gabinete, perceber todos os escolhos. Entretanto, se um dia essa ciência deve tornar-se realidade, só o será por intermédio deles. Aos olhos de muita gente isto ainda é uma quimera, por isso os inventores, que em geral não são capitalistas, não encontram nem o apoio nem o encorajamento necessários. Quando a aerostação produzir dividendos, mesmo que em esperança, e puder ser avaliada financeiramente, não lhe faltará o capital. Até lá é necessário contar com a dedicação daqueles que colocam o progresso acima da especulação. Enquanto houver carência de recursos para execução, haverá derrotas, pela impossibilidade de fazer experiências em escala suficientemente vasta ou em condições convenientes. Se somos obrigados a fazer acanhadamente, fazemos mal feito, nisto como em todas as coisas. Não haverá sucesso senão ao preço de sacrifícios suficientes para entrar decisivamente na vida prática. Quem diz sacrifício quer dizer exclusão de qualquer ideia de lucro. Esperemos que a ideia de dotar o mundo com a solução de um grande problema, quando mais não seja do ponto de vista da Ciência, inspire um generoso desinteresse. Mas a primeira coisa a fazer seria dotar os teóricos dos meios necessários à aquisição de experiência no ar, mesmo que fosse através dos meios imperfeitos que possuímos. Se Poitevin tivesse sido um homem de saber e tivesse inventado um sistema de locomoção aérea, sem dúvida teria inspirado mais confiança àqueles que jamais deixaram a terra e provavelmente teria encontrado os recursos que aos outros são recusados.
Pensamentos poéticos
Se tu sofres na Terra,
Oh coração aflito;
Se a miséria te aferra
Por quinhão de precito,
Pensa, na tua dor,
Que segues o caminho
Que conduz com ardor
Para um melhor destino.
Os pesares da vida
Serão assim tão grandes
Que o coração olvida
O dia em que entre os grandes
Por paga da sofrença
O Espírito sidéreo
Vai ter a recompensa
Do domínio etéreo?
-----
A vida é uma passagem;
Conheces-lhe o percurso.
Agindo com coragem
Farás feliz seu curso.
Oh coração aflito;
Se a miséria te aferra
Por quinhão de precito,
Pensa, na tua dor,
Que segues o caminho
Que conduz com ardor
Para um melhor destino.
Os pesares da vida
Serão assim tão grandes
Que o coração olvida
O dia em que entre os grandes
Por paga da sofrença
O Espírito sidéreo
Vai ter a recompensa
Do domínio etéreo?
-----
A vida é uma passagem;
Conheces-lhe o percurso.
Agindo com coragem
Farás feliz seu curso.
OBSERVAÇÃO: A médium que serviu de intérprete não só desconhece as mais elementares regras da poesia, como jamais fez um verso. Ela os escreve com extraordinária facilidade, quando ditados pelos Espíritos. Posto seja médium há bem pouco tempo, já possui uma coleção numerosa e muito interessante. Vimos entre eles alguns encantadores e muito oportunos, ditados pelo Espírito de uma pessoa viva que ela evocou e que reside a 200 léguas. Essa pessoa, quando em vigília, não é mais poeta que a médium.
Sonâmbulos assalariados
Escreve-nos um dos nossos correspondentes, a propósito de nosso último artigo sobre os médiuns mercenários, para perguntar se nossas observações também se aplicam aos sonâmbulos assalariados.
Se quisermos remontar à causa do fenômeno, veremos que, embora possa ser considerado como uma variedade de médium, o sonâmbulo está num caso diferente do médium propriamente dito. Com efeito, este último recebe suas comunicações de Espíritos estranhos, que virão ou não, conforme as circunstâncias ou as simpatias que encontrem. O sonâmbulo, ao contrário, age por si mesmo; é o seu próprio Espírito que se desprende da matéria e vê mais ou menos bem, conforme mais ou menos completo o desprendimento. É verdade que o sonâmbulo se acha em contato com outros Espíritos, que o assistem mais ou menos de boa vontade, conforme as suas simpatias, mas, em definitivo, é o seu próprio Espírito que vê e que pode, até certo ponto, dispor de si mesmo, sem que outros tenham o que repetir e sem que seu concurso seja indispensável. Daí resulta que o sonâmbulo que busca uma compensação material ao esforço, por vezes grande, decorrente do exercício de sua faculdade, não tem que vencer as mesmas susceptibilidades que o médium, que não passa de um instrumento.
Além disto, sabe-se que a lucidez sonambúlica se desenvolve pelo exercício. Ora, quem disto faz uma ocupação exclusiva adquire tanto maior facilidade, quanto mais vê coisas com as quais acaba por identificar-se, como também com certos termos especiais que mais facilmente lhe voltam à memória. Numa palavra, ele se familiariza com esse estado, o qual se torna, por assim dizer, seu estado normal.
Nada mais lhe causa admiração. Aliás, os fatos aí estão para provar com que clareza e nitidez podem eles ver, de onde concluímos que a retribuição paga a certos sonâmbulos não é obstáculo ao desenvolvimento da lucidez.
A isto fazem uma objeção: Como a lucidez é por vezes variável e depende de causas fortuitas, pergunta-se se o interesse de lucro não poderia induzir o sonâmbulo a fingir essa lucidez, mesmo quando ela lhe faltasse, por fadiga ou qualquer outra causa, inconveniente que não ocorre quando não há interesse. Isto é muito certo, mas respondemos que tudo tem o seu lado mau. Pode-se abusar de tudo, e por toda parte onde se insinua a fraude é necessário denunciá-la. O sonâmbulo que agisse assim, faltaria à lealdade, o que, infelizmente, acontece também com os que não dormem. Com um pouco de hábito podemos percebê-lo facilmente. Seria difícil enganar por muito tempo um observador experimentado. Nisto, como em todas as coisas, o essencial é nos certificarmos do grau de confiança que merece a pessoa a quem nos dirigimos. Se o sonâmbulo não assalariado não oferece esse inconveniente, não se deve supor que sua lucidez seja infalível. Ele pode enganar-se como qualquer outro, caso esteja em más condições. Neste particular, o melhor guia é a experiência.
Em resumo, não preconizamos estes ou aqueles. Chegamos a constatar notáveis serviços prestados por uns e outros. Nosso fim era apenas provar que é possível achar bons sonâmbulos numa e noutra daquelas condições.
Aforismo espíritas e pensamentos soltos
Os Espíritos se encarnam homens e mulheres, porque não têm sexo. Como devem progredir em tudo, cada sexo, como cada posição social, lhes impõe provas e deveres especiais, no momento de adquirir experiências. Aquele que tivesse de ser sempre homem só saberia aquilo que sabem os homens.
Pela doutrina espírita, a solidariedade não se restringe mais à sociedade terrena: abarca todos os mundos. Pelas relações que os Espíritos estabelecem entre as várias esferas, a solidariedade é universal, porque de um a outro mundo os seres vivos se prestam mútuo apoio.
Aviso
Incessantemente recebemos cartas de nossos correspondentes, pedindo-nos a Histoire de Jeanne d’Arc e a Histoire de Louis XI, das quais publicamos extratos, bem como o álbum de desenhos do Sr. Victorien Sardou. Lembramos aos nossos leitores que a Histoire de Jeanne d’Arc atualmente está esgotada; que a vida de Louis XI, assim como a de Louis IX, ainda não foram publicadas. Esperamos que o sejam um dia. Será então para nós um dever anunciálas em nossa resenha. Até lá qualquer encomenda dessas obras não atingirá seu objetivo. O mesmo se dá com o álbum do Sr. Sardou. O desenho publicado da casa de Mozart é o único que se acha à venda, na casa Ledoyen.
ALLAN KARDEC
ALLAN KARDEC