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Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1863 > Fevereiro
Fevereiro
Estudos sobre os possessos de MorzineCausas da obsessão e meios de combate
(III artigo) *
O estudo dos fenômenos de Morzine não oferecerá, por assim dizer, nenhuma dificuldade, quando estivermos bem compenetrados dos fatos particulares que citamos, e das considerações que um estudo atento permitiu deduzir das mesmas. Basta relatá-los para que cada um encontre por si mesmo sua aplicação, por analogia. Os dois fatos seguintes ainda nos ajudarão a pôr o leitor no caminho certo. O primeiro nos é transmitido pelo Dr. Chaigneau, membro honorário da Sociedade de Paris, presidente da Sociedade Espírita de Saint-Jean d’Angély.
“Uma família fazia evocações com um ardor desenfreado, arrastada por um Espírito que nos foi assinalado como muito perigoso. Era um de seus parentes, falecido depois de uma vida pouco decente e marcada, em seu final, por vários anos de alienação mental. Sob nome fictício, por surpreendentes provas mecânicas, belas promessas e conselhos de uma moralidade sem reservas, tinha conseguido de tal modo fascinar aquela gente muito crédula, que submetia todos às suas exigências e os obrigava aos atos mais excêntricos. Não podendo mais satisfazer a todos os seus desejos, pediram o nosso conselho e tivemos muito trabalho para dissuadi-los e provar-lhes que tratavam com um Espírito da pior espécie. Conseguimo-lo, entretanto, e pudemos obter que eles se abstivessem, ao menos por algum tempo. Desde então a obsessão tomou outro caráter: O Espírito se apoderava completamente do filho mais moço, de quatorze anos, o reduzia ao estado de catalepsia e, por sua boca, solicitava entretenimentos, dava ordens, fazia ameaças. Aconselhamos o mais absoluto mutismo, que foi observado rigorosamente. Os pais entregaram-se às preces e vinham procurar um de nós para assisti-los. O recolhimento e a força de vontade sempre nos deram domínio, em poucos minutos.
“Praticamente, hoje, tudo cessou. Esperamos que na casa a ordem suceda a desordem. Longe de se desgostarem do Espiritismo, eles creem mais que nunca, mas creem mais seriamente. Agora eles compreendem sua finalidade e suas consequências morais. Todos compreendem que receberam uma lição. Alguns, uma punição, talvez merecida.”
Este exemplo prova, mais uma vez, o inconveniente de nos entregarmos às evocações sem conhecimento de causa e sem objetivo sério. Graças aos conselhos da experiência, que aquelas pessoas escutaram, puderam desembaraçar-se de um inimigo talvez terrível.
Disto ressalta outro ensinamento não menos importante. Aos olhos dos desconhecedores do Espiritismo, o rapaz teria passado por um louco. Não deixariam de lhe dar o tratamento correspondente, que teria possivelmente desenvolvido uma loucura real. Com a assistência de um médico espírita, o mal foi atacado em sua verdadeira causa e não teve consequências.
Já o mesmo não se deu no fato seguinte.
Um senhor, nosso conhecido, residente numa cidade provinciana muito hostil às ideias espíritas, de súbito foi tomado por uma espécie de delírio, no qual dizia coisas absurdas. Como se ocupasse de Espiritismo, naturalmente falava de Espíritos. Assustadas e alarmadas, as pessoas mais próximas, sem aprofundar as coisas, apressadamente trataram de chamar os médicos, que o declararam atacado de loucura, para grande satisfação dos inimigos do Espiritismo, que já falavam em interná-lo numa casa de saúde.
Tudo quanto coligimos em relação às circunstâncias desse acontecimento, prova que aquele senhor foi submetido ao império de uma subjugação momentânea, talvez favorecida por certas condições físicas. Foi a ideia que ele teve. Escreveu-nos e nós lhe respondemos. Infelizmente nossa carta não lhe chegou a tempo e dela só teve conhecimento muito mais tarde. “É muito lamentável”, disse-nos ele posteriormente, “que não tenha recebido vossa carta consoladora. Naquele momento, ela me teria feito um bem imenso, confirmando-me a ideia de que eu era joguete de uma obsessão, o que me teria tranquilizado, ao passo que eu ouvia com tanta frequência repetirem à minha volta que eu estava louco, que acabei acreditando. Essa ideia me torturava a tal ponto que se tivesse continuado, não sei o que teria acontecido”.
Consultado a respeito, um Espírito respondeu:
─ Esse senhor não é louco, mas pela maneira como ele é tratado, poderia enlouquecer. Mais ainda: poderiam matá-lo. O remédio para o seu mal está no próprio Espiritismo, e consideram-no um contrassenso.”
─ Seria possível, daqui, agir sobre ele?
─ Sim, sem dúvida. Podeis fazer-lhe o bem, mas a vossa ação é paralisada pela má vontade dos que o cercam.
Casos análogos ocorreram em todas as épocas, e muitos foram presos como loucos, sem o serem.
Só um observador experimentado nestes assuntos pode apreciá-los. Como hoje há muitos médicos espíritas, em casos semelhantes convém a estes recorrer. Um dia a obsessão será colocada entre as causas patológicas, como o é hoje a ação de animais microscópicos, de cuja existência não se suspeitava antes da invenção do microscópio. Mas então reconhecer-se-á que nem as duchas nem as sangrias poderão curá-la. O médico que não admite nem busca senão causas puramente materiais é tão impróprio a compreender e tratar tais afecções quanto um cego o é para distinguir as cores.
O segundo caso nos é relatado por um dos nossos correspondentes de Boulogne-sur-Mer.
“A mulher de um marinheiro desta cidade, de quarenta e cinco anos, está há quinze anos sob o domínio de uma triste subjugação. Quase todas as noites, sem excetuar as do período de gravidez, ela é despertada por volta da meia-noite, tomada de tremores nos membros, como se sob a ação de uma pilha galvânica. Seu estômago fica comprimido como que num círculo de ferro e queimado por um ferro em brasa; o cérebro num estado de exaltação furiosa, e ela se sente arrancada se seu leito, e depois, por vezes seminua, é arrastada para fora de casa e forçada a correr pelo campo. Ela caminha sem saber para onde vai, durante duas ou três horas, e somente ao parar é que sabe onde se encontra. Ela não pode orar e, ao ajoelhar-se para fazê-lo, suas ideias se misturam com coisas bizarras e até sujas. Ela não pode entrar em nenhuma igreja. Tem vontade e um desejo ardente de fazê-lo, mas ao chegar à porta, sente uma barreira que a impede. Quatro homens tentaram levá-la para dentro da igreja dos redentoristas, mas não conseguiram. Ela gritava que a estavam matando, que lhe esmagavam o peito.
“Para fugir a essa horrível situação, a pobre tentou suicidar-se, por várias vezes, sem consegui-lo. Tomou café no qual havia dissolvido fósforo; tomou detergente e nada sofreu; duas vezes jogou-se na água, mas a cada vez voltava à superfície, até que alguém a socorresse. Fora dos momentos de crise de que falei, essa mulher é inteiramente normal, e mesmo naqueles momentos ela tem perfeita consciência do que faz e da força exterior que sobre ela atua. Toda a vizinhança diz que ela é vítima de um malefício ou um despacho.”
A subjugação não poderia ser melhor caracterizada senão pelos fenômenos que, sem a menor dúvida, não podem deixar de ser obra de um Espírito da pior espécie. Dirão que foi o Espiritismo que o atraiu para ela ou lhe perturbou o cérebro? Mas há quinze anos não se cogitava disto. Aliás, a mulher não é louca, e o que experimenta não é uma ilusão.
A medicina ordinária não verá nesses sintomas senão uma dessas afecções a que dá o nome de nevrose, cuja causa ainda lhe é um mistério. A afecção é real, mas para todo efeito há uma causa. Ora, qual a primeira causa? Eis o problema em cuja via pode entrar o Espiritismo, demonstrando um novo agente no perispírito e na ação do mundo invisível sobre o mundo visível. Não generalizamos, e reconhecemos que, em certos casos, a causa pode ser puramente material, mas há outros nos quais a intervenção de uma inteligência oculta é evidente, pois que, combatendo essa inteligência, para-se o mal, ao passo que atacando apenas a suposta causa material, nada se consegue.
Há um traço característico nos Espíritos perversos: é a sua aversão a tudo quanto se liga à religião. A maioria dos médiuns não obsedados que receberam comunicações de Espíritos maus, muitas vezes os viram blasfemar contra as coisas mais sagradas, rir-se da prece e a repelir, e irritar-se, até, quando se lhes fala em Deus.
No médium subjugado, o Espírito, dispondo de cerca de um terço do corpo para agir, exprime seus pensamentos, já não pela escrita, mas pelos gestos e palavras que provoca no médium. Ora, como nenhum fenômeno espírita pode produzir-se sem uma aptidão mediúnica, pode-se dizer que a mulher de quem falamos é médium espontânea, inconsciente e involuntária. A impossibilidade em que se encontra de orar e de entrar na igreja vem da repulsão do Espírito que dela se apoderou, pois sabe que a prece é um meio de fazê-lo largar a presa.
Em vez de uma pessoa, suponhamos, na mesma localidade, dez, vinte, trinta ou mais, no mesmo estado, e tereis a reprodução do que se passou em Morzine.
Não está aí uma prova evidente de que são demônios? dirão certas pessoas. Chamemo-los demônios, se isto vos agrada: esse nome não os caluniaria. Mas não vedes diariamente homens que não valem nada e que, de pleno direito, poderiam ser chamados demônios encarnados? Não há os que blasfemam e renegam Deus? Que parecem fazer o mal com prazer? Que se alegram à vista do sofrimento de seus semelhantes? Por que queríeis que, uma vez no mundo dos Espíritos, de súbito se transformassem?
Aqueles a quem chamais demônios nós chamamos maus Espíritos, e vos concedemos toda a perversidade que lhes queirais atribuir. Contudo, a diferença é que, em vossa opinião, os demônios são anjos decaídos, isto é, seres perfeitos que se tornaram maus, e para sempre votados ao mal e ao sofrimento. Em nossa opinião, são seres pertencentes à Humanidade primitiva, espécie de selvagens ainda atrasados, mas a quem o futuro não está fechado e que melhorar-se-ão à medida que neles se desenvolver o senso moral, na série de existências sucessivas, o que nos parece mais conforme com a lei do progresso e justiça de Deus. Temos a mais, a nosso favor, a experiência, que prova a possibilidade de melhorar e de levar ao arrependimento os Espíritos do mais baixo nível e aqueles que são colocados na categoria de demônios.
Vejamos uma fase especial desses Espíritos, cujo estudo é de alta importância para o assunto que nos ocupa.
Sabe-se que os Espíritos inferiores ainda se acham sob a influência da matéria e que entre eles se encontram todos os vícios e paixões da Humanidade, paixões que eles carregam ao deixar a Terra e que trazem ao se reencarnarem, porquanto não emendaram, o que produz os homens perversos.
Prova a experiência que uns são sensuais de diversas categorias: obscenos, lascivos, satisfeitos com os lugares baixos, impelindo e excitando à orgia e ao deboche, a cuja vista se repastam.
Perguntaremos, então: A que categoria de Espíritos poderão ter pertencido, após a morte, seres como Tibério, Nero, Cláudio, Messalina, Calígula, Heliogábalo? Que gênero de obsessão poderiam ter provocado? É necessário, para explicar essas obsessões, recorrer a seres especiais que Deus teria criado especialmente para impelir o homem ao mal?
Há certos gêneros de obsessões que não deixam dúvidas quanto à qualidade dos Espíritos que as produzem. Foram obsessões desse gênero que deram lugar à fábula dos íncubos e súcubos, em que acreditava firmemente Santo Agostinho. Poderíamos citar mais de um exemplo em apoio a esta asserção.
Quando se estudam as várias impressões corporais e os toques perceptíveis por vezes produzidos por certos Espíritos; quando se conhecem os gostos e as tendências de alguns deles, e se, por outro lado, se examina o caráter de certos fenômenos histéricos, a gente se pergunta se eles não representariam um papel nessa afecção, como representam na loucura obsessiva. Nós a vimos várias vezes, acompanhada de sintomas nada equívocos da subjugação.
Vejamos agora o que se passou em Morzine e, para começar, digamos algumas palavras sobre o lugar, o que não é sem importância.
Morzine é uma comuna do Chablais, na Alta Saboia, situada a oito léguas de Thonon, na extremidade do vale do Drance, nos confins do Valais, na Suíça, da qual é separada por uma montanha. Sua população, de cerca de 2.500 almas, além da aldeia principal compreende várias outras espalhadas nas alturas circundantes. É cercada e dominada por todos os lados por altas montanhas dependentes da cadeia dos Alpes, mas, na maior parte, cobertas de bosques e cultivadas até alturas consideráveis. Aliás, em parte alguma se vê neve ou gelo perpétuos. Segundo nos disseram, ali a neve seria menos persistente do que no Jura.
Enviado em 1861 pelo governo francês, a fim de estudar a doença, o Dr. Constant lá ficou três meses. Ele faz da região e de seus habitantes um quadro pouco lisonjeiro. Vindo com a ideia de que o mal era puramente físico, só buscou causas físicas. Essa preocupação o levava a insistir naquilo que poderia corroborar sua opinião, e essa ideia provavelmente fez com que ele visse os homens e as coisas de um ângulo desfavorável.
Em sua opinião, a moléstia é uma afecção nervosa, cuja fonte primeira é a constituição dos habitantes, debilitados pela insalubridade das habitações e pela insuficiência e má qualidade da alimentação, e cuja causa imediata está no estado histérico da maioria dos doentes do sexo feminino.
Sem contestar a existência dessa afecção, é bom notar que se o mal atacou em grande parte as mulheres, os homens também foram atingidos, bem como mulheres em idade avançada. Não se poderia, portanto, ver na histeria uma causa exclusiva. Aliás, qual a causa da histeria?
Fizemos uma curta visita a Morzine, mas devemos dizer que nossas observações e os dados que recolhemos entre pessoas notáveis, de um médico da região e das autoridades locais, diferem um pouco das do Dr. Constant.
A aldeia principal, de modo geral, é bem construída. As casas das aldeias circunvizinhas certamente não são hotéis, mas não têm o aspecto miserável que se vê em muitas regiões da França, como na Bretanha, por exemplo, onde o camponês mora em verdadeiras choças.
A população não nos pareceu estiolada nem raquítica, nem, sobretudo, com bócio, como diz o Dr. Constant. Vimos alguns bócios rudimentares, mas nenhum pronunciado, como se vê em todas as mulheres da Mauriana. Os idiotas e cretinos ali são raros, a despeito do que diz o Dr. Constant, ao passo que na outra encosta da montanha, no Valais, eles são muito numerosos.
Quanto à alimentação, a região produz além do consumo dos habitantes. Se não há abundância em toda parte, também não há miséria propriamente dita, nem,sobretudo, essa horrível miséria que encontramos em outras regiões. Algumas existem onde a população campesina é infinitamente pior alimentada. Um fato característico é que não vimos um só mendigo a pedir esmola.
A própria região oferece importantes recursos em madeira e pedra, mas que ficam improdutivos pela impossibilidade de transporte. A dificuldade de comunicações é a chaga da região, sem o que seria uma das mais ricas do país. Pode julgar-se da dificuldade, pelo fato de o correio do Thonon não poder ir além de duas léguas da cidade. Daí em diante não há estrada, mas um simples caminho que alternativamente sobe a pique através da floresta e desce à margem do Drance, torrente furiosa que rola em cascatas através de massas enormes de rochedos de granito e que do alto das montanhas se precipita em seu leito, no fundo de uma garganta estreita. Por várias léguas é a imagem do caos. Transposta essa passagem, o vale toma um aspecto risonho até Morzine, onde termina. Mas a dificuldade para lá chegar afasta os viajantes, de sorte que a região só é visitada por caçadores bastante fortes para escalar os rochedos.
Desde a anexação, os caminhos foram melhorados. Antes, só eram praticáveis a cavalo. Dizem que o governo está estudando o prolongamento da estrada de Thonon a Morzine, margeando o rio. É um trabalho difícil, mas que transformará a região, permitindo a exportação de seus produtos.
Tal é o aspecto geral da região, que aliás não oferece nenhuma causa de insalubridade. Admitindo que a principal aldeia de Morzine, situada no fundo do vale, à margem do rio, seja úmida, o que não observamos, devemos considerar que a maioria dos doentes são das aldeias vizinhas, situadas na altura, e portanto em localizações arejadas e muito salubres.
Se, como pretende o Dr. Constant, a doença se devesse a causas locais; à constituição dos habitantes; aos hábitos e gênero de vida, essas causas permanentes deveriam produzir efeitos permanentes, e o mal seria endêmico, como as febres intermitentes de Camargue e dos pântanos pontinos. Se o cretinismo e o bócio são endêmicos no vale do Ródano e não no vale do Drance, que é limítrofe, é que num existe uma causa local permanente que não existe no outro.
Se o que se chama a possessão de Morzine é apenas temporário, é que sua causa é acidental.
O Dr. Constant diz que suas observações não lhe revelaram nenhuma causa sobrenatural. Mas ele, que só acredita em causas materiais, é capaz de julgar efeitos resultantes da ação de uma força extra-material? Estudou ele os efeitos dessa força? Ele sabe em que consistem e por quais sintomas podem ser reconhecidos? Não, e desde então se lhe afiguram aquilo que não são, crendo sem dúvida que consistem em milagres e aparições fantásticas.
Esses sintomas, ele os viu e os descreveu em seu relatório, mas não admitindo uma causa oculta, buscou alhures, no mundo material, onde não a encontrou.
Os doentes se diziam atormentados por seres invisíveis, mas como ele não viu duendes nem fantasmas, concluiu que os doentes eram loucos, e o que o confirmava nessa ideia é que esses doentes por vezes diziam coisas notoriamente absurdas, mesmo aos olhos do mais firme crente nos Espíritos. Mas para ele tudo devia ser absurdo. Entretanto, ele devia saber, ele médico, que até em meio a divagações da loucura há, por vezes, revelações da verdade.
Esses infelizes, diz ele, e a população em geral, estão imbuídos de ideias supersticiosas. Mas o que há de espantoso numa população rural, ignorante e isolada no meio das montanhas? O que há de mais natural que essa gente, aterrada pelos fenômenos, os tenha amplificado? Porque nos relatos que faziam se misturavam apreciações ridículas, partindo do seu ponto de vista, ele disso concluiu que tudo deveria ser ridículo, sem contar que aos olhos de quem quer que não admita a ação do mundo invisível, todos os efeitos resultantes dessa ação são relegados à condição de crenças supersticiosas.
Em favor desta última tese, ele insiste muito sobre um fato, na ocasião contado pelos jornais, inspirado sem dúvida nalguma imaginação aterrada, exaltada ou doente e, segundo o qual certos doentes subiam, com a agilidade de gatos, em árvores de quarenta metros de altura; andavam sobre os galhos sem que estes vergassem; postavam-se nas copas, com os pés para cima, e desciam de cabeça para baixo, sem nada sofrerem. Ele discute longamente para provar a impossibilidade da coisa e para demonstrar que, segundo a direção do raio visual, a árvore assinalada não podia ser vista das casas de onde diziam ter visto o fato. Tanto esforço era inútil, pois lá nos disseram que a coisa não era verdadeira. Apenas um rapazinho havia subido numa árvore de porte comum, mas sem malabarismo.
Assim descreve o Dr. Constant o histórico e os efeitos da doença.
“Uma família fazia evocações com um ardor desenfreado, arrastada por um Espírito que nos foi assinalado como muito perigoso. Era um de seus parentes, falecido depois de uma vida pouco decente e marcada, em seu final, por vários anos de alienação mental. Sob nome fictício, por surpreendentes provas mecânicas, belas promessas e conselhos de uma moralidade sem reservas, tinha conseguido de tal modo fascinar aquela gente muito crédula, que submetia todos às suas exigências e os obrigava aos atos mais excêntricos. Não podendo mais satisfazer a todos os seus desejos, pediram o nosso conselho e tivemos muito trabalho para dissuadi-los e provar-lhes que tratavam com um Espírito da pior espécie. Conseguimo-lo, entretanto, e pudemos obter que eles se abstivessem, ao menos por algum tempo. Desde então a obsessão tomou outro caráter: O Espírito se apoderava completamente do filho mais moço, de quatorze anos, o reduzia ao estado de catalepsia e, por sua boca, solicitava entretenimentos, dava ordens, fazia ameaças. Aconselhamos o mais absoluto mutismo, que foi observado rigorosamente. Os pais entregaram-se às preces e vinham procurar um de nós para assisti-los. O recolhimento e a força de vontade sempre nos deram domínio, em poucos minutos.
“Praticamente, hoje, tudo cessou. Esperamos que na casa a ordem suceda a desordem. Longe de se desgostarem do Espiritismo, eles creem mais que nunca, mas creem mais seriamente. Agora eles compreendem sua finalidade e suas consequências morais. Todos compreendem que receberam uma lição. Alguns, uma punição, talvez merecida.”
Este exemplo prova, mais uma vez, o inconveniente de nos entregarmos às evocações sem conhecimento de causa e sem objetivo sério. Graças aos conselhos da experiência, que aquelas pessoas escutaram, puderam desembaraçar-se de um inimigo talvez terrível.
Disto ressalta outro ensinamento não menos importante. Aos olhos dos desconhecedores do Espiritismo, o rapaz teria passado por um louco. Não deixariam de lhe dar o tratamento correspondente, que teria possivelmente desenvolvido uma loucura real. Com a assistência de um médico espírita, o mal foi atacado em sua verdadeira causa e não teve consequências.
Já o mesmo não se deu no fato seguinte.
Um senhor, nosso conhecido, residente numa cidade provinciana muito hostil às ideias espíritas, de súbito foi tomado por uma espécie de delírio, no qual dizia coisas absurdas. Como se ocupasse de Espiritismo, naturalmente falava de Espíritos. Assustadas e alarmadas, as pessoas mais próximas, sem aprofundar as coisas, apressadamente trataram de chamar os médicos, que o declararam atacado de loucura, para grande satisfação dos inimigos do Espiritismo, que já falavam em interná-lo numa casa de saúde.
Tudo quanto coligimos em relação às circunstâncias desse acontecimento, prova que aquele senhor foi submetido ao império de uma subjugação momentânea, talvez favorecida por certas condições físicas. Foi a ideia que ele teve. Escreveu-nos e nós lhe respondemos. Infelizmente nossa carta não lhe chegou a tempo e dela só teve conhecimento muito mais tarde. “É muito lamentável”, disse-nos ele posteriormente, “que não tenha recebido vossa carta consoladora. Naquele momento, ela me teria feito um bem imenso, confirmando-me a ideia de que eu era joguete de uma obsessão, o que me teria tranquilizado, ao passo que eu ouvia com tanta frequência repetirem à minha volta que eu estava louco, que acabei acreditando. Essa ideia me torturava a tal ponto que se tivesse continuado, não sei o que teria acontecido”.
Consultado a respeito, um Espírito respondeu:
─ Esse senhor não é louco, mas pela maneira como ele é tratado, poderia enlouquecer. Mais ainda: poderiam matá-lo. O remédio para o seu mal está no próprio Espiritismo, e consideram-no um contrassenso.”
─ Seria possível, daqui, agir sobre ele?
─ Sim, sem dúvida. Podeis fazer-lhe o bem, mas a vossa ação é paralisada pela má vontade dos que o cercam.
Casos análogos ocorreram em todas as épocas, e muitos foram presos como loucos, sem o serem.
Só um observador experimentado nestes assuntos pode apreciá-los. Como hoje há muitos médicos espíritas, em casos semelhantes convém a estes recorrer. Um dia a obsessão será colocada entre as causas patológicas, como o é hoje a ação de animais microscópicos, de cuja existência não se suspeitava antes da invenção do microscópio. Mas então reconhecer-se-á que nem as duchas nem as sangrias poderão curá-la. O médico que não admite nem busca senão causas puramente materiais é tão impróprio a compreender e tratar tais afecções quanto um cego o é para distinguir as cores.
O segundo caso nos é relatado por um dos nossos correspondentes de Boulogne-sur-Mer.
“A mulher de um marinheiro desta cidade, de quarenta e cinco anos, está há quinze anos sob o domínio de uma triste subjugação. Quase todas as noites, sem excetuar as do período de gravidez, ela é despertada por volta da meia-noite, tomada de tremores nos membros, como se sob a ação de uma pilha galvânica. Seu estômago fica comprimido como que num círculo de ferro e queimado por um ferro em brasa; o cérebro num estado de exaltação furiosa, e ela se sente arrancada se seu leito, e depois, por vezes seminua, é arrastada para fora de casa e forçada a correr pelo campo. Ela caminha sem saber para onde vai, durante duas ou três horas, e somente ao parar é que sabe onde se encontra. Ela não pode orar e, ao ajoelhar-se para fazê-lo, suas ideias se misturam com coisas bizarras e até sujas. Ela não pode entrar em nenhuma igreja. Tem vontade e um desejo ardente de fazê-lo, mas ao chegar à porta, sente uma barreira que a impede. Quatro homens tentaram levá-la para dentro da igreja dos redentoristas, mas não conseguiram. Ela gritava que a estavam matando, que lhe esmagavam o peito.
“Para fugir a essa horrível situação, a pobre tentou suicidar-se, por várias vezes, sem consegui-lo. Tomou café no qual havia dissolvido fósforo; tomou detergente e nada sofreu; duas vezes jogou-se na água, mas a cada vez voltava à superfície, até que alguém a socorresse. Fora dos momentos de crise de que falei, essa mulher é inteiramente normal, e mesmo naqueles momentos ela tem perfeita consciência do que faz e da força exterior que sobre ela atua. Toda a vizinhança diz que ela é vítima de um malefício ou um despacho.”
A subjugação não poderia ser melhor caracterizada senão pelos fenômenos que, sem a menor dúvida, não podem deixar de ser obra de um Espírito da pior espécie. Dirão que foi o Espiritismo que o atraiu para ela ou lhe perturbou o cérebro? Mas há quinze anos não se cogitava disto. Aliás, a mulher não é louca, e o que experimenta não é uma ilusão.
A medicina ordinária não verá nesses sintomas senão uma dessas afecções a que dá o nome de nevrose, cuja causa ainda lhe é um mistério. A afecção é real, mas para todo efeito há uma causa. Ora, qual a primeira causa? Eis o problema em cuja via pode entrar o Espiritismo, demonstrando um novo agente no perispírito e na ação do mundo invisível sobre o mundo visível. Não generalizamos, e reconhecemos que, em certos casos, a causa pode ser puramente material, mas há outros nos quais a intervenção de uma inteligência oculta é evidente, pois que, combatendo essa inteligência, para-se o mal, ao passo que atacando apenas a suposta causa material, nada se consegue.
Há um traço característico nos Espíritos perversos: é a sua aversão a tudo quanto se liga à religião. A maioria dos médiuns não obsedados que receberam comunicações de Espíritos maus, muitas vezes os viram blasfemar contra as coisas mais sagradas, rir-se da prece e a repelir, e irritar-se, até, quando se lhes fala em Deus.
No médium subjugado, o Espírito, dispondo de cerca de um terço do corpo para agir, exprime seus pensamentos, já não pela escrita, mas pelos gestos e palavras que provoca no médium. Ora, como nenhum fenômeno espírita pode produzir-se sem uma aptidão mediúnica, pode-se dizer que a mulher de quem falamos é médium espontânea, inconsciente e involuntária. A impossibilidade em que se encontra de orar e de entrar na igreja vem da repulsão do Espírito que dela se apoderou, pois sabe que a prece é um meio de fazê-lo largar a presa.
Em vez de uma pessoa, suponhamos, na mesma localidade, dez, vinte, trinta ou mais, no mesmo estado, e tereis a reprodução do que se passou em Morzine.
Não está aí uma prova evidente de que são demônios? dirão certas pessoas. Chamemo-los demônios, se isto vos agrada: esse nome não os caluniaria. Mas não vedes diariamente homens que não valem nada e que, de pleno direito, poderiam ser chamados demônios encarnados? Não há os que blasfemam e renegam Deus? Que parecem fazer o mal com prazer? Que se alegram à vista do sofrimento de seus semelhantes? Por que queríeis que, uma vez no mundo dos Espíritos, de súbito se transformassem?
Aqueles a quem chamais demônios nós chamamos maus Espíritos, e vos concedemos toda a perversidade que lhes queirais atribuir. Contudo, a diferença é que, em vossa opinião, os demônios são anjos decaídos, isto é, seres perfeitos que se tornaram maus, e para sempre votados ao mal e ao sofrimento. Em nossa opinião, são seres pertencentes à Humanidade primitiva, espécie de selvagens ainda atrasados, mas a quem o futuro não está fechado e que melhorar-se-ão à medida que neles se desenvolver o senso moral, na série de existências sucessivas, o que nos parece mais conforme com a lei do progresso e justiça de Deus. Temos a mais, a nosso favor, a experiência, que prova a possibilidade de melhorar e de levar ao arrependimento os Espíritos do mais baixo nível e aqueles que são colocados na categoria de demônios.
Vejamos uma fase especial desses Espíritos, cujo estudo é de alta importância para o assunto que nos ocupa.
Sabe-se que os Espíritos inferiores ainda se acham sob a influência da matéria e que entre eles se encontram todos os vícios e paixões da Humanidade, paixões que eles carregam ao deixar a Terra e que trazem ao se reencarnarem, porquanto não emendaram, o que produz os homens perversos.
Prova a experiência que uns são sensuais de diversas categorias: obscenos, lascivos, satisfeitos com os lugares baixos, impelindo e excitando à orgia e ao deboche, a cuja vista se repastam.
Perguntaremos, então: A que categoria de Espíritos poderão ter pertencido, após a morte, seres como Tibério, Nero, Cláudio, Messalina, Calígula, Heliogábalo? Que gênero de obsessão poderiam ter provocado? É necessário, para explicar essas obsessões, recorrer a seres especiais que Deus teria criado especialmente para impelir o homem ao mal?
Há certos gêneros de obsessões que não deixam dúvidas quanto à qualidade dos Espíritos que as produzem. Foram obsessões desse gênero que deram lugar à fábula dos íncubos e súcubos, em que acreditava firmemente Santo Agostinho. Poderíamos citar mais de um exemplo em apoio a esta asserção.
Quando se estudam as várias impressões corporais e os toques perceptíveis por vezes produzidos por certos Espíritos; quando se conhecem os gostos e as tendências de alguns deles, e se, por outro lado, se examina o caráter de certos fenômenos histéricos, a gente se pergunta se eles não representariam um papel nessa afecção, como representam na loucura obsessiva. Nós a vimos várias vezes, acompanhada de sintomas nada equívocos da subjugação.
Vejamos agora o que se passou em Morzine e, para começar, digamos algumas palavras sobre o lugar, o que não é sem importância.
Morzine é uma comuna do Chablais, na Alta Saboia, situada a oito léguas de Thonon, na extremidade do vale do Drance, nos confins do Valais, na Suíça, da qual é separada por uma montanha. Sua população, de cerca de 2.500 almas, além da aldeia principal compreende várias outras espalhadas nas alturas circundantes. É cercada e dominada por todos os lados por altas montanhas dependentes da cadeia dos Alpes, mas, na maior parte, cobertas de bosques e cultivadas até alturas consideráveis. Aliás, em parte alguma se vê neve ou gelo perpétuos. Segundo nos disseram, ali a neve seria menos persistente do que no Jura.
Enviado em 1861 pelo governo francês, a fim de estudar a doença, o Dr. Constant lá ficou três meses. Ele faz da região e de seus habitantes um quadro pouco lisonjeiro. Vindo com a ideia de que o mal era puramente físico, só buscou causas físicas. Essa preocupação o levava a insistir naquilo que poderia corroborar sua opinião, e essa ideia provavelmente fez com que ele visse os homens e as coisas de um ângulo desfavorável.
Em sua opinião, a moléstia é uma afecção nervosa, cuja fonte primeira é a constituição dos habitantes, debilitados pela insalubridade das habitações e pela insuficiência e má qualidade da alimentação, e cuja causa imediata está no estado histérico da maioria dos doentes do sexo feminino.
Sem contestar a existência dessa afecção, é bom notar que se o mal atacou em grande parte as mulheres, os homens também foram atingidos, bem como mulheres em idade avançada. Não se poderia, portanto, ver na histeria uma causa exclusiva. Aliás, qual a causa da histeria?
Fizemos uma curta visita a Morzine, mas devemos dizer que nossas observações e os dados que recolhemos entre pessoas notáveis, de um médico da região e das autoridades locais, diferem um pouco das do Dr. Constant.
A aldeia principal, de modo geral, é bem construída. As casas das aldeias circunvizinhas certamente não são hotéis, mas não têm o aspecto miserável que se vê em muitas regiões da França, como na Bretanha, por exemplo, onde o camponês mora em verdadeiras choças.
A população não nos pareceu estiolada nem raquítica, nem, sobretudo, com bócio, como diz o Dr. Constant. Vimos alguns bócios rudimentares, mas nenhum pronunciado, como se vê em todas as mulheres da Mauriana. Os idiotas e cretinos ali são raros, a despeito do que diz o Dr. Constant, ao passo que na outra encosta da montanha, no Valais, eles são muito numerosos.
Quanto à alimentação, a região produz além do consumo dos habitantes. Se não há abundância em toda parte, também não há miséria propriamente dita, nem,sobretudo, essa horrível miséria que encontramos em outras regiões. Algumas existem onde a população campesina é infinitamente pior alimentada. Um fato característico é que não vimos um só mendigo a pedir esmola.
A própria região oferece importantes recursos em madeira e pedra, mas que ficam improdutivos pela impossibilidade de transporte. A dificuldade de comunicações é a chaga da região, sem o que seria uma das mais ricas do país. Pode julgar-se da dificuldade, pelo fato de o correio do Thonon não poder ir além de duas léguas da cidade. Daí em diante não há estrada, mas um simples caminho que alternativamente sobe a pique através da floresta e desce à margem do Drance, torrente furiosa que rola em cascatas através de massas enormes de rochedos de granito e que do alto das montanhas se precipita em seu leito, no fundo de uma garganta estreita. Por várias léguas é a imagem do caos. Transposta essa passagem, o vale toma um aspecto risonho até Morzine, onde termina. Mas a dificuldade para lá chegar afasta os viajantes, de sorte que a região só é visitada por caçadores bastante fortes para escalar os rochedos.
Desde a anexação, os caminhos foram melhorados. Antes, só eram praticáveis a cavalo. Dizem que o governo está estudando o prolongamento da estrada de Thonon a Morzine, margeando o rio. É um trabalho difícil, mas que transformará a região, permitindo a exportação de seus produtos.
Tal é o aspecto geral da região, que aliás não oferece nenhuma causa de insalubridade. Admitindo que a principal aldeia de Morzine, situada no fundo do vale, à margem do rio, seja úmida, o que não observamos, devemos considerar que a maioria dos doentes são das aldeias vizinhas, situadas na altura, e portanto em localizações arejadas e muito salubres.
Se, como pretende o Dr. Constant, a doença se devesse a causas locais; à constituição dos habitantes; aos hábitos e gênero de vida, essas causas permanentes deveriam produzir efeitos permanentes, e o mal seria endêmico, como as febres intermitentes de Camargue e dos pântanos pontinos. Se o cretinismo e o bócio são endêmicos no vale do Ródano e não no vale do Drance, que é limítrofe, é que num existe uma causa local permanente que não existe no outro.
Se o que se chama a possessão de Morzine é apenas temporário, é que sua causa é acidental.
O Dr. Constant diz que suas observações não lhe revelaram nenhuma causa sobrenatural. Mas ele, que só acredita em causas materiais, é capaz de julgar efeitos resultantes da ação de uma força extra-material? Estudou ele os efeitos dessa força? Ele sabe em que consistem e por quais sintomas podem ser reconhecidos? Não, e desde então se lhe afiguram aquilo que não são, crendo sem dúvida que consistem em milagres e aparições fantásticas.
Esses sintomas, ele os viu e os descreveu em seu relatório, mas não admitindo uma causa oculta, buscou alhures, no mundo material, onde não a encontrou.
Os doentes se diziam atormentados por seres invisíveis, mas como ele não viu duendes nem fantasmas, concluiu que os doentes eram loucos, e o que o confirmava nessa ideia é que esses doentes por vezes diziam coisas notoriamente absurdas, mesmo aos olhos do mais firme crente nos Espíritos. Mas para ele tudo devia ser absurdo. Entretanto, ele devia saber, ele médico, que até em meio a divagações da loucura há, por vezes, revelações da verdade.
Esses infelizes, diz ele, e a população em geral, estão imbuídos de ideias supersticiosas. Mas o que há de espantoso numa população rural, ignorante e isolada no meio das montanhas? O que há de mais natural que essa gente, aterrada pelos fenômenos, os tenha amplificado? Porque nos relatos que faziam se misturavam apreciações ridículas, partindo do seu ponto de vista, ele disso concluiu que tudo deveria ser ridículo, sem contar que aos olhos de quem quer que não admita a ação do mundo invisível, todos os efeitos resultantes dessa ação são relegados à condição de crenças supersticiosas.
Em favor desta última tese, ele insiste muito sobre um fato, na ocasião contado pelos jornais, inspirado sem dúvida nalguma imaginação aterrada, exaltada ou doente e, segundo o qual certos doentes subiam, com a agilidade de gatos, em árvores de quarenta metros de altura; andavam sobre os galhos sem que estes vergassem; postavam-se nas copas, com os pés para cima, e desciam de cabeça para baixo, sem nada sofrerem. Ele discute longamente para provar a impossibilidade da coisa e para demonstrar que, segundo a direção do raio visual, a árvore assinalada não podia ser vista das casas de onde diziam ter visto o fato. Tanto esforço era inútil, pois lá nos disseram que a coisa não era verdadeira. Apenas um rapazinho havia subido numa árvore de porte comum, mas sem malabarismo.
Assim descreve o Dr. Constant o histórico e os efeitos da doença.
(continua no próximo número)
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* (*) Vide os números de dez. de 62 e jan. de 63.
Sermões contra o Espiritismo
Uma carta de Lyon, de 7 de dezembro de 1862, contém a passagem seguinte, que uma testemunha ocular confirmou-nos, verbalmente:
“Tivemos aqui o bispo do Texas, na América, que pregou, terça-feira, 2 de dezembro, à 8 horas da noite, na igreja de Saint-Nizier, perante um auditório de cerca de duas mil pessoas, entre as quais encontrava-se grande número de espíritas. Ah! Ele não parece bem instruído em nossa doutrina. Pode julgar-se por este resumo: ‘Os espíritas não admitem o inferno nem as preces nas igrejas. Eles se fecham em seus quartos e aí oram a Deus, quem sabe que preces!... Só há duas espécies de Espíritos: os perfeitos e os ladrões; os assassinos e os canalhas... Eu venho da América, onde essas infâmias começaram. Ora! Eu vos posso garantir que há dois anos naquele país ninguém mais se ocupa disso. Disseram-me que aqui, nesta cidade de Lyon, tão conhecida por sua piedade, havia muitos espíritas. Isto não pode ser. Não acredito. Estou certo, caros irmãos e caras irmãs, que entre vós não há um só médium nem uma só médium, porque, vede, os Espíritos não admitem casamento nem batismo, e todos os espíritas se separaram de suas esposas etc. etc...’
“Estas poucas frases dão ideia do resto. Que teria dito o orador se soubesse que um quarto da assistência era de espíritas? Quanto à sua eloquência, só uma coisa posso dizer: é que em certos momentos parecia um frenesi; parecia perder o fio das ideias e não sabia o que queria dizer. Se eu não temesse servir-me de uma expressão irreverente, diria que ele chafurdava. Creio realmente que ele era levado por alguns Espíritos a dizer tais absurdos e de tal maneira que, eu vos asseguro, a gente não se apercebia de estar num lugar santo. Então, todo mundo ria. Alguns de seus partidários saíram na frente, para observar o efeito produzido pelo sermão, mas não devem ter ficado muito satisfeitos porque, uma vez lá fora, cada um ria e dizia o que pensava. Vários de seus amigos deploravam os desvios por ele cometidos e compreendiam que não tinha alcançado o objetivo. Com efeito, não poderia proceder melhor para recrutar adeptos, e foi o que aconteceu na sessão posterior. Uma senhora, que se achava ao lado de uma boníssima espírita minha conhecida, disse-lhe: ‘Mas o que é esse Espiritismo e o que são esses médiuns de quem se fala tanto e contra os quais esses senhores estão tão furiosos?’ A coisa lhe foi explicada e ela disse: ‘Oh! Ao chegar em casa, vou adquirir livros e tentar escrever.’
“Posso assegurar-vos que se os espíritas são tão numerosos em Lyon é graças a alguns sermões desse gênero. Lembrai-vos que há três anos, quando aqui contávamos apenas algumas centenas de espíritas, eu vos escrevi, a propósito de uma pregação furibunda contra a doutrina, que teve excelente efeito: ‘Mais alguns sermões como este e em um ano decuplicará o número de adeptos’. Então! Hoje está centuplicado, graças, também, aos ignóbeis e mentirosos ataques de alguns órgãos da imprensa.
“Todo mundo, e até o simples operário que sob suas vestes grosseiras tem mais bom-senso do que se julga, diz que não se ataca com tanta fúria uma coisa que não vale nada. Assim, quiseram ver por si mesmos e, ao reconhecerem a falsidade de certas afirmações, que denotavam ignorância ou malevolência, a crítica ficou desacreditada e, em vez de afastar as pessoas do Espiritismo, deu-lhe partidários.
“Dar-se-á o mesmo, esperamo-lo, com o sermão do bispo do Texas, cuja maior infelicidade foi a de dizer que ‘todos os espíritas estão separados das esposas’, quando temos aqui, aos nossos olhos, numerosos exemplos de casais outrora separados e que o Espiritismo trouxe à união e à concórdia.
“Cada um se diz, naturalmente, que se os adversários do Espiritismo lhe atribuem ensinos e resultados cuja falsidade é demonstrada pelos fatos e pela leitura dos livros, que dizem o contrário, nada prova a verdade daquelas críticas. Creio que se os espíritas lioneses não temessem faltar com o respeito ao bispo do Texas, terlhe-iam mandado uma carta de agradecimentos. Mas o Espiritismo nos torna caridosos, até para com os inimigos”.
Outra carta, de testemunha ocular, contém a seguinte passagem:
“O orador de Saint-Nizier partiu do dado que o Espiritismo já fez sua época nos Estados Unidos e que há dois anos não se fala mais nele. Era, pois, em sua opinião, uma questão de moda. Os fenômenos não tinham consistência e não mereciam ser estudados. Ele tinha procurado ver e nada vira. Contudo, assinalava a nova doutrina como atentatória aos laços de família, à propriedade, à constituição da Sociedade e a denunciava como tal às autoridades competentes.
“Os adversários esperavam um efeito mais chocante e não uma simples negação apresentada de maneira tão ridícula, pois não ignoram o que se passa na cidade, a marcha do progresso e a natureza das manifestações. A questão foi retomada no domingo, dia 14, em Saint-Jean, desta vez tratada um pouco melhor.
“O orador de Saint-Nizier tinha negado os fenômenos. O de Saint-Jean reconheceu-os e afirmou: ‘Ouvem-se batidas nas paredes; no ar, vozes misteriosas; na verdade são Espíritos, mas que Espíritos? Não podem ser bons, pois os bons são dóceis e submissos às ordens de Deus, que proibiu a evocação dos Espíritos. Portanto, os que vêm só podem ser maus.
“Havia umas três mil pessoas em Saint-Jean. Entre essas, pelo menos trezentas irão à descoberta.
“O que por certo contribuirá para fazer refletirem as criaturas honestas ou inteligentes que compunham o auditório, são as singulares afirmações do orador ─ digo singulares por polidez. ─ ‘O Espiritismo’, disse ele, ‘vem destruir a família, aviltar a mulher, pregar o suicídio, o adultério e o aborto, preconizar o comunismo, dissolver a Sociedade.’ Depois convidou os paroquianos que por acaso tivessem livros espíritas, que os trouxessem a esses senhores, a fim de serem queimados, como São Paulo havia feito em Éfeso com obras heréticas.
“Não sei se aqueles senhores encontrarão muitas pessoas bastante zelosas para irem com dinheiro na mão esvaziar nossas livrarias. Alguns espíritas estavam furiosos; a maioria se alegrava, por compreender que era um grande dia.
“Assim, do alto da segunda cátedra da França, acabam de proclamar que os fenômenos são verdadeiros. Toda a questão, pois, se reduz a saber se são bons ou maus Espíritos e se só aos maus Deus permite que venham”.
O orador do Saint-Jean afirma que só podem ser os maus. Este outro modificou um pouco a solução.
Escrevem-nos de Angoulême que quinta-feira, 5 de dezembro último, um pregador assim se exprimia em seu sermão: “Nós todos sabíamos que se podiam evocar os Espíritos, e isto desde muito tempo, mas só a Igreja deve fazê-lo. Aos outros homens não é permitido tentar corresponder-se com eles por meios físicos. Para mim é uma heresia.” O efeito produzido foi inteiramente contrário ao esperado.
Assim, é evidente que os bons e maus podem comunicar-se, porque se só os maus tivessem tal poder, não é provável que a Igreja se reservasse o privilégio de chamá-los.
Duvidamos que dois sermões pregados em Bordeaux, no mês de outubro último, tenham servido melhor à causa dos nossos antagonistas. Eis a sua análise, feita por um ouvinte. Os espíritas poderão ver se, sob esse disfarce, reconhecem a sua doutrina e se os argumentos que lhes opõem são de molde a lhes abalar a fé. Quanto a nós, repetimos o que já dissemos alhures: Enquanto não atacarem o Espiritismo com melhores armas, ele nada deverá temer.
“Lamentarei sempre, diz o narrador, não ter ouvido o primeiro desses sermões, na Capela Margaux, a 15 de outubro último, se estou bem informado. Conforme me disseram testemunhas fidedignas, a tese desenvolvida foi a seguinte: ‘Os Espíritos podem comunicar-se com os homens. Os bons só se comunicam na Igreja. Todos quantos se manifestam fora da Igreja são maus, porque fora da Igreja não há salvação. ─ Os médiuns são infelizes que fizeram pacto com o diabo e dele obtêm, ao preço de sua alma, que para ele venderam, manifestações de toda sorte, fossem elas extraordinárias, para não dizer miraculosas.’
“Passo em silêncio outras citações ainda mais estranhas. Não as tendo ouvido diretamente, temo que hajam exagerado.
“No domingo seguinte, 19 de outubro, tive a sorte de ouvir o seguinte sermão. Procurei saber o nome do pregador e me responderam que era o Padre Lapeyre, da Companhia de Jesus.
“O Padre Lapeyre faz a crítica de O Livro dos Espíritos e, por certo, era necessária enorme dose de boa vontade para reconhecer essa obra admirável nas teorias desprovidas de bom-senso que o pregador pretendia ali ter achado. Limitarme-ei a assinalar os pontos que mais me chocaram, preferindo ficar abaixo da verdade do que atribuir ao nosso adversário o que ele não teria dito ou eu teria mal compreendido.
“Segundo o Padre Lapeyre, ‘O Livro dos Espíritos prega o comunismo; a partilha dos bens; o divórcio; a igualdade entre todos os homens, e sobretudo entre o homem e a mulher; a igualdade entre o homem e seu Deus, porque o homem, levado por esse orgulho que perdeu os anjos não aspira a nada menos que tornar-se semelhante a Jesus Cristo. Ele arrasta os homens ao materialismo e aos prazeres sensuais, porque o trabalho de aperfeiçoamento pode fazer-se sem o concurso de Deus, malgrado seu, por efeito dessa força que quer que tudo se aperfeiçoe gradualmente, e preconiza a metempsicose, essa loucura dos Antigos, etc.’
“Passando, a seguir, à rapidez com que se propagam as ideias novas, ele constata com horror quanto é hábil e astuto o diabo, que as ditou; quanto soube elaborá-las com arte, de modo a fazê-las vibrar com força nos corações pervertidos dos filhos deste século de incredulidade e heresias. Então exclama: ‘Este século ama tanto à liberdade! e vêm lhe oferecer o livre exame, o livre-arbítrio, a liberdade de consciência! Este século ama tanto a igualdade! e lhe mostram o homem à altura de Deus! Ama tanto a luz! e de uma penada rasga-se o véu que ocultava os santos mistérios’.
“Depois, ele ataca a questão das penas eternas, e sobre esse assunto palpitante de emoções, teve magníficas tiradas oratórias: ‘Acreditaríeis, meus caros irmãos; acreditaríeis até onde chegou a impudência desses filósofos novos, que pensam fazer desmoronar, ao peso dos sofismas, a santa religião do Cristo! Oh! os infelizes! dizem que não há inferno! não há purgatório! Para eles não mais relações benditas que ligam os vivos às almas daqueles que perderam! Não mais o santo sacrifício da missa! E por que a celebrariam? Essas almas não se purificarão por si mesmas e sem nenhum trabalho, pela eficácia dessa força irresistível que incessantemente as atrai para a perfeição? E sabeis quais são as autoridades que vêm proclamar essas doutrinas ímpias, marcadas na fronte pelo sinal indelével desse inferno que queriam aniquilar? Ah! meus irmãos! São as mais sólidas colunas da Igreja: São Paulo, Santo Agostinho, São Lucas, São Vicente de Paulo, Bossuet, Fénelon, Lamennais, e todos esses homens de elite, santos homens que, durante a vida, combateram pelo estabelecimento das verdades inamolgáveis sobre as quais a Igreja construiu seus alicerces, e que hoje vêm declarar que seus Espíritos, desprendidos da matéria, estando mais clarividentes, se aperceberam que suas opiniões estavam erradas, e que se deve crer no contrário.’
“Passando depois à questão que o autor da Carta de um Católico dirige a um Espírito para saber se, praticando o Espiritismo, ele é herético, o pregador acrescenta: ‘Eis a resposta, meus irmãos. Ela é curiosa, e o que é mais curioso, o que mostra de maneira mais evidente que o diabo, a despeito de sua astúcia e habilidade, deixa sempre aparecerem as suas unhas, é o nome do Espírito que deu essa resposta. Eu vo-lo direi daqui há pouco.’
“Segue a citação dessa resposta, que termina assim: ‘Estás de acordo com a Igreja em todas as verdades que te fortalecem no bem, que aumentam em tua alma o amor a Deus e o devotamento aos teus irmãos? Sim; pois bem: tu és católico.’ E acrescenta: ‘Assinado... Zenon!... Zenon! Um filósofo grego, um pagão, um idólatra que do fundo do inferno onde se queima há vinte séculos vem nos dizer que se pode ser católico e não crer nesse inferno que o tortura e que espera a todos os que, como ele, não morrerem humildes e submissos no seio da santa Igreja... Mas, insensatos e cegos que sois! Com toda a vossa filosofia, não tereis senão esta prova, esta única prova que a doutrina que proclamais emana do demônio, que será mil vezes suficiente!’
“Depois de longos rodeios sobre esta questão e sobre o privilégio exclusivo da Igreja de expulsar os demônios, acrescenta:
“‘Pobres insensatos que vos divertis em falar com os Espíritos e pretendeis sobre eles exercer qualquer influência! Não temeis que, como aquele de que fala São Lucas, esses Espíritos batedores e turbulentos ─ e eles são bem classificados, meus irmãos ─ não vos perguntem também: E vós quem sois? Quem sois para virdes perturbar-nos? Credes impunemente submeter-nos aos vossos caprichos sacrílegos? E que, tomando as cadeiras e as mesas que fazeis girar, não se apoderem de vós, como se apoderaram do filho de Sceva, e não vos maltratem a tal ponto que sejais forçados a fugir, nus e feridos, e reconhecendo demasiadamente tarde toda a abominação que há em brincar com os mortos?
“‘Diante desses fatos tão patentes e que falam tão alto, que nos resta fazer? Que temos a dizer? Ah! meus caros irmãos! Guardai-vos cuidadosamente do contágio. Repeli com horror todas as tentativas que os maus não cessarão de fazer para vos arrastar com eles ao abismo. Mas, ah! Já é muito tarde para fazer tais recomendações. O mal já fez rápidos progressos. Esses livros infames, ditados pelo príncipe das trevas, a fim de atrair para o seu reino uma multidão de pobres ignorantes, de tal modo se espalharam que se, como outrora em Éfeso, se estimasse o preço dos que circulam em Bordeaux, tenho certeza que ultrapassaria a soma de cinquenta mil denários de prata (170.000 francos, em nossa moeda - repetição da citação feita em outra parte do sermão). E eu não ficaria admirado se entre os numerosos fiéis que me escutam não haja alguns que já foram arrastados à sua leitura. A estes só podemos dizer: Depressa! Aproximai-vos do tribunal das penitências. Depressa! Vinde abrir os vossos corações aos guias espirituais. Cheios de doçura e bondade e seguindo em todos os pontos o magnífico exemplo de São Paulo, apressar-nos-emos a vos dar a absolvição. Mas, como ele, não vo-la daremos senão com a condição expressa de nos trazerdes esses livros de magia que quase vos perderam. E que faremos desses livros, caros irmãos? Sim, o que faremos? Como São Paulo, faremos uma montanha em praça pública e nós mesmos meteremos fogo!’
Faremos apenas uma ligeira observação sobre esse sermão: é que o autor se engana quanto à data e que talvez, novo Epimênides, ele dormiu desde o século quatorze.
Outro fato que se destaca é o rápido desenvolvimento do Espiritismo. Os adversários de uma outra escola também o constatam com desespero, tão grande é o amor que têm pela razão humana.
Lê-se no Moniteur de Moselle, de 7 de novembro de 1862: “O Espiritismo faz perigoso progresso. Invade a alta, a média e a baixa sociedade. Magistrados, médicos, gente séria, também caem nessa esparrela.” Nós achamos esta asserção repetida na maior parte das críticas atuais. É que em presença de um fato tão patente, era preciso vir do fundo do Texas para entrar num auditório onde se acham mais de mil espíritas que há dois anos não mais se ocupam de Espiritismo. Então, por que tanta cólera se o Espiritismo está morto e enterrado? Ao menos o Padre Lepeyre não tem ilusões. Seu horror até exagera a extensão desse pretenso mal, pois avalia numa soma fabulosa o valor dos livros espíritas espalhados só em Bordeaux. Em todo caso, é reconhecer um grande poder à ideia. Seja como for, em presença de todas essas afirmações, ninguém nos taxará de exagero quando falarmos do rápido progresso da doutrina. Que uns o atribuam ao poder do diabo, lutando com vantagem contra Deus, os outros a um acesso de loucura que invade todas as classes sociais, de tal modo que o círculo da gente de juízo vai se estreitando a tal ponto que em breve só haverá lugar para muito poucos; que uns e outros deplorem este estado de coisas, cada um do seu ponto de vista e se perguntem: “Para onde vamos, grande Deus?” É o seu direito. Disso resulta o fato que o Espiritismo vence todas as barreiras que lhe opõem. Assim, se é uma loucura, em breve só haverá loucos na Terra. O provérbio é conhecido. Se for obra do diabo, em breve só haverá danados, e se os que falam em nome de Deus não podem detê-lo, é que o diabo é mais forte do que Deus. Os espíritas são mais respeitosos para com a Divindade. Eles não admitem que haja um ser capaz de lutar com Deus em igualdade de condições, e sobretudo vencê-lo. Do contrário, os papéis estariam invertidos e o diabo tornar-se-ia o verdadeiro senhor do Universo.
Dizem os espíritas que sendo Deus soberano sem partilha, nada acontece no mundo sem sua permissão. Assim, se o Espiritismo se espalha com a rapidez do raio, façam o que fizerem para detê-lo, há que ver nisso um efeito da vontade de Deus. Ora, sendo Deus soberanamente justo e bom, ele não pode querer a perda de suas criaturas, nem permitir que sejam tentadas, com a certeza, em virtude de sua presciência, de que elas sucumbirão, para precipitá-las nos tormentos eternos.
Hoje, o dilema está posto. Ele está submetido à consciência de todos, e o futuro se encarrega da conclusão.
Se fazemos estas citações, é para mostrar a que argumentos estão reduzidos os adversários do Espiritismo para atacá-lo. Com efeito, é preciso estar mui carente de boas razões para recorrer a uma calúnia como a que o representa pregando a desunião da família, o adultério, o aborto, o comunismo, a derrubada da ordem social.
Temos necessidade de refutar estas asserções? Não. Basta remeter ao estudo da doutrina, à leitura do que ela ensina, que é o que se faz em toda a parte.
Quem poderá crer que pregamos o comunismo depois das instruções dadas arespeito no discurso publicado in extenso no relatório de nossa viagem em 1862? Quem poderá ver um excitamento à anarquia nas seguintes palavras, na mesma brochura, página 58: “Em todo caso, os espíritas devem ser os primeiros a dar exemplo de submissão às leis, no caso de serem convocados.”
Propor tais coisas numa região distante, onde o Espiritismo fosse desconhecido, onde não houvesse qualquer meio de controle, poderia produzir algum efeito. Mas afirmá-las do alto da cátedra da verdade, em meio a uma população espírita que aí dá incessantemente um desmentido por seus ensinos e seu exemplo, é inabilidade, e não se pode deixar de dizer que é necessário estar tomado por singular vertigem para iludir-se a tal ponto e não compreender que assim falando serve à causa do Espiritismo.
Seria erro, contudo, pensar seja esta a opinião de todos os membros do clero. Ao contrário, há muitos padres que não a esposam, e conhecemos muitos que deploram tais desvios, mais prejudiciais à religião que à Doutrina Espírita. São, pois, opiniões individuais, que não podem fazer lei, e o que prova que são apreciações pessoais é a contradição entre elas existente. Assim, ao passo que um declara que todos os Espíritos que se manifestam são necessariamente maus, pois desobedecem a Deus, comunicando-se, outro reconhece que há bons e maus, mas que só os bons vão à Igreja, e os maus, ao vulgo.
Um acusa o Espiritismo de aviltar a mulher, outro o censura por elevá-la ao nível dos direitos do homem. Um pretende que ele “arrasta os homens ao materialismo e aos prazeres sensuais” e outro, o Sr. Cura de Marouzeau, reconheceu que ele destrói o materialismo.
Em sua brochura, assim se exprime o Padre Marouzeau: “Na verdade, segundo os partidários das comunicações de além-túmulo, seria intenção deliberada do clero combater o Espiritismo a qualquer preço. Por que, então, supor que o clero tenha tão pouca inteligência e bom-senso e uma mente estúpida? Por que acreditar que a Igreja, que em todos os tempos deu tantas provas de prudência, de sabedoria e de alta inteligência para discernir o verdadeiro do falso, seria hoje incapaz de compreender o interesse de seus filhos? Por que condená-la sem ouvi-la? Se ela se recusa a reconhecer a vossa bandeira, é que a vossa bandeira não é a dela; ela tem cores que lhe são essencialmente hostis; é que, ao lado do bem que fazeis combatendo o horrível materialismo, ela vê um perigo real para as almas e para a Sociedade.” E, noutra passagem: “Concluamos de tudo isto que o Espiritismo deve limitar-se a combater o materialismo, a dar ao homem provas palpáveis de sua imortalidade por meio de manifestações de além-túmulo bem constatadas.”
De tudo isto ressalta um fato capital: é que todos esses senhores estão de acordo sobre a realidade das manifestações. Apenas cada um as aprecia a seu modo. Com efeito, negá-las seria negar a verdade das Escrituras, e os próprios fatos sobre os quais se apoia a maioria dos dogmas. Quanto à maneira de encarar a coisa, desde já, é possível constatar em que sentido se faz a unidade e se pronuncia a opinião pública, que também tem o seu veto. Ressalta ainda outro fato: é que a Doutrina Espírita abala profundamente as massas; que enquanto uns nela veem um fantasma terrível, outros veem o anjo da consolação e da libertação e uma nova era de progresso moral para a Humanidade.
Já que citamos a brochura do Padre Marouzeau, talvez nos perguntem por que ainda não a respondemos, se nos foi dirigida pessoalmente. Seu motivo pôde ser visto em nosso relatório de viagem, a propósito das refutações. Quando tratamos de uma questão, fazemo-lo do ponto de vista geral, abstraindo das pessoas que, aos nossos olhos, não passam de individualidades que se apegam ante as questões de princípios.
Falaremos do Sr. Marouzeau no devido tempo, como de alguns outros, quando examinarmos o conjunto das objeções. Para isto era útil esperar que cada um tivesse falado, grosso ou fino ─ e vimos acima alguns falaram grosso ─ para apreciar a força da oposição. Respostas especiais e individuais teriam sido prematuras e incessantemente repetidas.
A brochura do Sr. Marouzeau era um tiro de fuzil. Pedimos-lhe desculpas por colocá-lo na fila dos simples fuzileiros, mas sua modéstia cristã não ficará ofendida.
Protegido por uma porção de escudos, pareceu-nos conveniente deixar que descarregassem todas as armas, mesmo a artilharia pesada que, como se vê, acaba de entrar, a fim de julgar o seu poderio. Ora, até o presente, não temos que lamentar claros por ela abertos em nossas fileiras. Ao contrário, seus tiros ricochetearam contra ela.
Por outro lado, não era menos útil deixar desenhar-se a situação, e hão de convir que de dois anos para cá, o estado das coisas, longe de piorar, diariamente nos traz novas forças.
Responderemos, pois, quando julgarmos oportuno. Até agora não houve tempo perdido, pois sem isto temos ganho terreno incessantemente, e os próprios adversários se encarregam de facilitar nossa tarefa. Temos apenas que deixá-los agir.
“Tivemos aqui o bispo do Texas, na América, que pregou, terça-feira, 2 de dezembro, à 8 horas da noite, na igreja de Saint-Nizier, perante um auditório de cerca de duas mil pessoas, entre as quais encontrava-se grande número de espíritas. Ah! Ele não parece bem instruído em nossa doutrina. Pode julgar-se por este resumo: ‘Os espíritas não admitem o inferno nem as preces nas igrejas. Eles se fecham em seus quartos e aí oram a Deus, quem sabe que preces!... Só há duas espécies de Espíritos: os perfeitos e os ladrões; os assassinos e os canalhas... Eu venho da América, onde essas infâmias começaram. Ora! Eu vos posso garantir que há dois anos naquele país ninguém mais se ocupa disso. Disseram-me que aqui, nesta cidade de Lyon, tão conhecida por sua piedade, havia muitos espíritas. Isto não pode ser. Não acredito. Estou certo, caros irmãos e caras irmãs, que entre vós não há um só médium nem uma só médium, porque, vede, os Espíritos não admitem casamento nem batismo, e todos os espíritas se separaram de suas esposas etc. etc...’
“Estas poucas frases dão ideia do resto. Que teria dito o orador se soubesse que um quarto da assistência era de espíritas? Quanto à sua eloquência, só uma coisa posso dizer: é que em certos momentos parecia um frenesi; parecia perder o fio das ideias e não sabia o que queria dizer. Se eu não temesse servir-me de uma expressão irreverente, diria que ele chafurdava. Creio realmente que ele era levado por alguns Espíritos a dizer tais absurdos e de tal maneira que, eu vos asseguro, a gente não se apercebia de estar num lugar santo. Então, todo mundo ria. Alguns de seus partidários saíram na frente, para observar o efeito produzido pelo sermão, mas não devem ter ficado muito satisfeitos porque, uma vez lá fora, cada um ria e dizia o que pensava. Vários de seus amigos deploravam os desvios por ele cometidos e compreendiam que não tinha alcançado o objetivo. Com efeito, não poderia proceder melhor para recrutar adeptos, e foi o que aconteceu na sessão posterior. Uma senhora, que se achava ao lado de uma boníssima espírita minha conhecida, disse-lhe: ‘Mas o que é esse Espiritismo e o que são esses médiuns de quem se fala tanto e contra os quais esses senhores estão tão furiosos?’ A coisa lhe foi explicada e ela disse: ‘Oh! Ao chegar em casa, vou adquirir livros e tentar escrever.’
“Posso assegurar-vos que se os espíritas são tão numerosos em Lyon é graças a alguns sermões desse gênero. Lembrai-vos que há três anos, quando aqui contávamos apenas algumas centenas de espíritas, eu vos escrevi, a propósito de uma pregação furibunda contra a doutrina, que teve excelente efeito: ‘Mais alguns sermões como este e em um ano decuplicará o número de adeptos’. Então! Hoje está centuplicado, graças, também, aos ignóbeis e mentirosos ataques de alguns órgãos da imprensa.
“Todo mundo, e até o simples operário que sob suas vestes grosseiras tem mais bom-senso do que se julga, diz que não se ataca com tanta fúria uma coisa que não vale nada. Assim, quiseram ver por si mesmos e, ao reconhecerem a falsidade de certas afirmações, que denotavam ignorância ou malevolência, a crítica ficou desacreditada e, em vez de afastar as pessoas do Espiritismo, deu-lhe partidários.
“Dar-se-á o mesmo, esperamo-lo, com o sermão do bispo do Texas, cuja maior infelicidade foi a de dizer que ‘todos os espíritas estão separados das esposas’, quando temos aqui, aos nossos olhos, numerosos exemplos de casais outrora separados e que o Espiritismo trouxe à união e à concórdia.
“Cada um se diz, naturalmente, que se os adversários do Espiritismo lhe atribuem ensinos e resultados cuja falsidade é demonstrada pelos fatos e pela leitura dos livros, que dizem o contrário, nada prova a verdade daquelas críticas. Creio que se os espíritas lioneses não temessem faltar com o respeito ao bispo do Texas, terlhe-iam mandado uma carta de agradecimentos. Mas o Espiritismo nos torna caridosos, até para com os inimigos”.
Outra carta, de testemunha ocular, contém a seguinte passagem:
“O orador de Saint-Nizier partiu do dado que o Espiritismo já fez sua época nos Estados Unidos e que há dois anos não se fala mais nele. Era, pois, em sua opinião, uma questão de moda. Os fenômenos não tinham consistência e não mereciam ser estudados. Ele tinha procurado ver e nada vira. Contudo, assinalava a nova doutrina como atentatória aos laços de família, à propriedade, à constituição da Sociedade e a denunciava como tal às autoridades competentes.
“Os adversários esperavam um efeito mais chocante e não uma simples negação apresentada de maneira tão ridícula, pois não ignoram o que se passa na cidade, a marcha do progresso e a natureza das manifestações. A questão foi retomada no domingo, dia 14, em Saint-Jean, desta vez tratada um pouco melhor.
“O orador de Saint-Nizier tinha negado os fenômenos. O de Saint-Jean reconheceu-os e afirmou: ‘Ouvem-se batidas nas paredes; no ar, vozes misteriosas; na verdade são Espíritos, mas que Espíritos? Não podem ser bons, pois os bons são dóceis e submissos às ordens de Deus, que proibiu a evocação dos Espíritos. Portanto, os que vêm só podem ser maus.
“Havia umas três mil pessoas em Saint-Jean. Entre essas, pelo menos trezentas irão à descoberta.
“O que por certo contribuirá para fazer refletirem as criaturas honestas ou inteligentes que compunham o auditório, são as singulares afirmações do orador ─ digo singulares por polidez. ─ ‘O Espiritismo’, disse ele, ‘vem destruir a família, aviltar a mulher, pregar o suicídio, o adultério e o aborto, preconizar o comunismo, dissolver a Sociedade.’ Depois convidou os paroquianos que por acaso tivessem livros espíritas, que os trouxessem a esses senhores, a fim de serem queimados, como São Paulo havia feito em Éfeso com obras heréticas.
“Não sei se aqueles senhores encontrarão muitas pessoas bastante zelosas para irem com dinheiro na mão esvaziar nossas livrarias. Alguns espíritas estavam furiosos; a maioria se alegrava, por compreender que era um grande dia.
“Assim, do alto da segunda cátedra da França, acabam de proclamar que os fenômenos são verdadeiros. Toda a questão, pois, se reduz a saber se são bons ou maus Espíritos e se só aos maus Deus permite que venham”.
O orador do Saint-Jean afirma que só podem ser os maus. Este outro modificou um pouco a solução.
Escrevem-nos de Angoulême que quinta-feira, 5 de dezembro último, um pregador assim se exprimia em seu sermão: “Nós todos sabíamos que se podiam evocar os Espíritos, e isto desde muito tempo, mas só a Igreja deve fazê-lo. Aos outros homens não é permitido tentar corresponder-se com eles por meios físicos. Para mim é uma heresia.” O efeito produzido foi inteiramente contrário ao esperado.
Assim, é evidente que os bons e maus podem comunicar-se, porque se só os maus tivessem tal poder, não é provável que a Igreja se reservasse o privilégio de chamá-los.
Duvidamos que dois sermões pregados em Bordeaux, no mês de outubro último, tenham servido melhor à causa dos nossos antagonistas. Eis a sua análise, feita por um ouvinte. Os espíritas poderão ver se, sob esse disfarce, reconhecem a sua doutrina e se os argumentos que lhes opõem são de molde a lhes abalar a fé. Quanto a nós, repetimos o que já dissemos alhures: Enquanto não atacarem o Espiritismo com melhores armas, ele nada deverá temer.
“Lamentarei sempre, diz o narrador, não ter ouvido o primeiro desses sermões, na Capela Margaux, a 15 de outubro último, se estou bem informado. Conforme me disseram testemunhas fidedignas, a tese desenvolvida foi a seguinte: ‘Os Espíritos podem comunicar-se com os homens. Os bons só se comunicam na Igreja. Todos quantos se manifestam fora da Igreja são maus, porque fora da Igreja não há salvação. ─ Os médiuns são infelizes que fizeram pacto com o diabo e dele obtêm, ao preço de sua alma, que para ele venderam, manifestações de toda sorte, fossem elas extraordinárias, para não dizer miraculosas.’
“Passo em silêncio outras citações ainda mais estranhas. Não as tendo ouvido diretamente, temo que hajam exagerado.
“No domingo seguinte, 19 de outubro, tive a sorte de ouvir o seguinte sermão. Procurei saber o nome do pregador e me responderam que era o Padre Lapeyre, da Companhia de Jesus.
“O Padre Lapeyre faz a crítica de O Livro dos Espíritos e, por certo, era necessária enorme dose de boa vontade para reconhecer essa obra admirável nas teorias desprovidas de bom-senso que o pregador pretendia ali ter achado. Limitarme-ei a assinalar os pontos que mais me chocaram, preferindo ficar abaixo da verdade do que atribuir ao nosso adversário o que ele não teria dito ou eu teria mal compreendido.
“Segundo o Padre Lapeyre, ‘O Livro dos Espíritos prega o comunismo; a partilha dos bens; o divórcio; a igualdade entre todos os homens, e sobretudo entre o homem e a mulher; a igualdade entre o homem e seu Deus, porque o homem, levado por esse orgulho que perdeu os anjos não aspira a nada menos que tornar-se semelhante a Jesus Cristo. Ele arrasta os homens ao materialismo e aos prazeres sensuais, porque o trabalho de aperfeiçoamento pode fazer-se sem o concurso de Deus, malgrado seu, por efeito dessa força que quer que tudo se aperfeiçoe gradualmente, e preconiza a metempsicose, essa loucura dos Antigos, etc.’
“Passando, a seguir, à rapidez com que se propagam as ideias novas, ele constata com horror quanto é hábil e astuto o diabo, que as ditou; quanto soube elaborá-las com arte, de modo a fazê-las vibrar com força nos corações pervertidos dos filhos deste século de incredulidade e heresias. Então exclama: ‘Este século ama tanto à liberdade! e vêm lhe oferecer o livre exame, o livre-arbítrio, a liberdade de consciência! Este século ama tanto a igualdade! e lhe mostram o homem à altura de Deus! Ama tanto a luz! e de uma penada rasga-se o véu que ocultava os santos mistérios’.
“Depois, ele ataca a questão das penas eternas, e sobre esse assunto palpitante de emoções, teve magníficas tiradas oratórias: ‘Acreditaríeis, meus caros irmãos; acreditaríeis até onde chegou a impudência desses filósofos novos, que pensam fazer desmoronar, ao peso dos sofismas, a santa religião do Cristo! Oh! os infelizes! dizem que não há inferno! não há purgatório! Para eles não mais relações benditas que ligam os vivos às almas daqueles que perderam! Não mais o santo sacrifício da missa! E por que a celebrariam? Essas almas não se purificarão por si mesmas e sem nenhum trabalho, pela eficácia dessa força irresistível que incessantemente as atrai para a perfeição? E sabeis quais são as autoridades que vêm proclamar essas doutrinas ímpias, marcadas na fronte pelo sinal indelével desse inferno que queriam aniquilar? Ah! meus irmãos! São as mais sólidas colunas da Igreja: São Paulo, Santo Agostinho, São Lucas, São Vicente de Paulo, Bossuet, Fénelon, Lamennais, e todos esses homens de elite, santos homens que, durante a vida, combateram pelo estabelecimento das verdades inamolgáveis sobre as quais a Igreja construiu seus alicerces, e que hoje vêm declarar que seus Espíritos, desprendidos da matéria, estando mais clarividentes, se aperceberam que suas opiniões estavam erradas, e que se deve crer no contrário.’
“Passando depois à questão que o autor da Carta de um Católico dirige a um Espírito para saber se, praticando o Espiritismo, ele é herético, o pregador acrescenta: ‘Eis a resposta, meus irmãos. Ela é curiosa, e o que é mais curioso, o que mostra de maneira mais evidente que o diabo, a despeito de sua astúcia e habilidade, deixa sempre aparecerem as suas unhas, é o nome do Espírito que deu essa resposta. Eu vo-lo direi daqui há pouco.’
“Segue a citação dessa resposta, que termina assim: ‘Estás de acordo com a Igreja em todas as verdades que te fortalecem no bem, que aumentam em tua alma o amor a Deus e o devotamento aos teus irmãos? Sim; pois bem: tu és católico.’ E acrescenta: ‘Assinado... Zenon!... Zenon! Um filósofo grego, um pagão, um idólatra que do fundo do inferno onde se queima há vinte séculos vem nos dizer que se pode ser católico e não crer nesse inferno que o tortura e que espera a todos os que, como ele, não morrerem humildes e submissos no seio da santa Igreja... Mas, insensatos e cegos que sois! Com toda a vossa filosofia, não tereis senão esta prova, esta única prova que a doutrina que proclamais emana do demônio, que será mil vezes suficiente!’
“Depois de longos rodeios sobre esta questão e sobre o privilégio exclusivo da Igreja de expulsar os demônios, acrescenta:
“‘Pobres insensatos que vos divertis em falar com os Espíritos e pretendeis sobre eles exercer qualquer influência! Não temeis que, como aquele de que fala São Lucas, esses Espíritos batedores e turbulentos ─ e eles são bem classificados, meus irmãos ─ não vos perguntem também: E vós quem sois? Quem sois para virdes perturbar-nos? Credes impunemente submeter-nos aos vossos caprichos sacrílegos? E que, tomando as cadeiras e as mesas que fazeis girar, não se apoderem de vós, como se apoderaram do filho de Sceva, e não vos maltratem a tal ponto que sejais forçados a fugir, nus e feridos, e reconhecendo demasiadamente tarde toda a abominação que há em brincar com os mortos?
“‘Diante desses fatos tão patentes e que falam tão alto, que nos resta fazer? Que temos a dizer? Ah! meus caros irmãos! Guardai-vos cuidadosamente do contágio. Repeli com horror todas as tentativas que os maus não cessarão de fazer para vos arrastar com eles ao abismo. Mas, ah! Já é muito tarde para fazer tais recomendações. O mal já fez rápidos progressos. Esses livros infames, ditados pelo príncipe das trevas, a fim de atrair para o seu reino uma multidão de pobres ignorantes, de tal modo se espalharam que se, como outrora em Éfeso, se estimasse o preço dos que circulam em Bordeaux, tenho certeza que ultrapassaria a soma de cinquenta mil denários de prata (170.000 francos, em nossa moeda - repetição da citação feita em outra parte do sermão). E eu não ficaria admirado se entre os numerosos fiéis que me escutam não haja alguns que já foram arrastados à sua leitura. A estes só podemos dizer: Depressa! Aproximai-vos do tribunal das penitências. Depressa! Vinde abrir os vossos corações aos guias espirituais. Cheios de doçura e bondade e seguindo em todos os pontos o magnífico exemplo de São Paulo, apressar-nos-emos a vos dar a absolvição. Mas, como ele, não vo-la daremos senão com a condição expressa de nos trazerdes esses livros de magia que quase vos perderam. E que faremos desses livros, caros irmãos? Sim, o que faremos? Como São Paulo, faremos uma montanha em praça pública e nós mesmos meteremos fogo!’
Faremos apenas uma ligeira observação sobre esse sermão: é que o autor se engana quanto à data e que talvez, novo Epimênides, ele dormiu desde o século quatorze.
Outro fato que se destaca é o rápido desenvolvimento do Espiritismo. Os adversários de uma outra escola também o constatam com desespero, tão grande é o amor que têm pela razão humana.
Lê-se no Moniteur de Moselle, de 7 de novembro de 1862: “O Espiritismo faz perigoso progresso. Invade a alta, a média e a baixa sociedade. Magistrados, médicos, gente séria, também caem nessa esparrela.” Nós achamos esta asserção repetida na maior parte das críticas atuais. É que em presença de um fato tão patente, era preciso vir do fundo do Texas para entrar num auditório onde se acham mais de mil espíritas que há dois anos não mais se ocupam de Espiritismo. Então, por que tanta cólera se o Espiritismo está morto e enterrado? Ao menos o Padre Lepeyre não tem ilusões. Seu horror até exagera a extensão desse pretenso mal, pois avalia numa soma fabulosa o valor dos livros espíritas espalhados só em Bordeaux. Em todo caso, é reconhecer um grande poder à ideia. Seja como for, em presença de todas essas afirmações, ninguém nos taxará de exagero quando falarmos do rápido progresso da doutrina. Que uns o atribuam ao poder do diabo, lutando com vantagem contra Deus, os outros a um acesso de loucura que invade todas as classes sociais, de tal modo que o círculo da gente de juízo vai se estreitando a tal ponto que em breve só haverá lugar para muito poucos; que uns e outros deplorem este estado de coisas, cada um do seu ponto de vista e se perguntem: “Para onde vamos, grande Deus?” É o seu direito. Disso resulta o fato que o Espiritismo vence todas as barreiras que lhe opõem. Assim, se é uma loucura, em breve só haverá loucos na Terra. O provérbio é conhecido. Se for obra do diabo, em breve só haverá danados, e se os que falam em nome de Deus não podem detê-lo, é que o diabo é mais forte do que Deus. Os espíritas são mais respeitosos para com a Divindade. Eles não admitem que haja um ser capaz de lutar com Deus em igualdade de condições, e sobretudo vencê-lo. Do contrário, os papéis estariam invertidos e o diabo tornar-se-ia o verdadeiro senhor do Universo.
Dizem os espíritas que sendo Deus soberano sem partilha, nada acontece no mundo sem sua permissão. Assim, se o Espiritismo se espalha com a rapidez do raio, façam o que fizerem para detê-lo, há que ver nisso um efeito da vontade de Deus. Ora, sendo Deus soberanamente justo e bom, ele não pode querer a perda de suas criaturas, nem permitir que sejam tentadas, com a certeza, em virtude de sua presciência, de que elas sucumbirão, para precipitá-las nos tormentos eternos.
Hoje, o dilema está posto. Ele está submetido à consciência de todos, e o futuro se encarrega da conclusão.
Se fazemos estas citações, é para mostrar a que argumentos estão reduzidos os adversários do Espiritismo para atacá-lo. Com efeito, é preciso estar mui carente de boas razões para recorrer a uma calúnia como a que o representa pregando a desunião da família, o adultério, o aborto, o comunismo, a derrubada da ordem social.
Temos necessidade de refutar estas asserções? Não. Basta remeter ao estudo da doutrina, à leitura do que ela ensina, que é o que se faz em toda a parte.
Quem poderá crer que pregamos o comunismo depois das instruções dadas arespeito no discurso publicado in extenso no relatório de nossa viagem em 1862? Quem poderá ver um excitamento à anarquia nas seguintes palavras, na mesma brochura, página 58: “Em todo caso, os espíritas devem ser os primeiros a dar exemplo de submissão às leis, no caso de serem convocados.”
Propor tais coisas numa região distante, onde o Espiritismo fosse desconhecido, onde não houvesse qualquer meio de controle, poderia produzir algum efeito. Mas afirmá-las do alto da cátedra da verdade, em meio a uma população espírita que aí dá incessantemente um desmentido por seus ensinos e seu exemplo, é inabilidade, e não se pode deixar de dizer que é necessário estar tomado por singular vertigem para iludir-se a tal ponto e não compreender que assim falando serve à causa do Espiritismo.
Seria erro, contudo, pensar seja esta a opinião de todos os membros do clero. Ao contrário, há muitos padres que não a esposam, e conhecemos muitos que deploram tais desvios, mais prejudiciais à religião que à Doutrina Espírita. São, pois, opiniões individuais, que não podem fazer lei, e o que prova que são apreciações pessoais é a contradição entre elas existente. Assim, ao passo que um declara que todos os Espíritos que se manifestam são necessariamente maus, pois desobedecem a Deus, comunicando-se, outro reconhece que há bons e maus, mas que só os bons vão à Igreja, e os maus, ao vulgo.
Um acusa o Espiritismo de aviltar a mulher, outro o censura por elevá-la ao nível dos direitos do homem. Um pretende que ele “arrasta os homens ao materialismo e aos prazeres sensuais” e outro, o Sr. Cura de Marouzeau, reconheceu que ele destrói o materialismo.
Em sua brochura, assim se exprime o Padre Marouzeau: “Na verdade, segundo os partidários das comunicações de além-túmulo, seria intenção deliberada do clero combater o Espiritismo a qualquer preço. Por que, então, supor que o clero tenha tão pouca inteligência e bom-senso e uma mente estúpida? Por que acreditar que a Igreja, que em todos os tempos deu tantas provas de prudência, de sabedoria e de alta inteligência para discernir o verdadeiro do falso, seria hoje incapaz de compreender o interesse de seus filhos? Por que condená-la sem ouvi-la? Se ela se recusa a reconhecer a vossa bandeira, é que a vossa bandeira não é a dela; ela tem cores que lhe são essencialmente hostis; é que, ao lado do bem que fazeis combatendo o horrível materialismo, ela vê um perigo real para as almas e para a Sociedade.” E, noutra passagem: “Concluamos de tudo isto que o Espiritismo deve limitar-se a combater o materialismo, a dar ao homem provas palpáveis de sua imortalidade por meio de manifestações de além-túmulo bem constatadas.”
De tudo isto ressalta um fato capital: é que todos esses senhores estão de acordo sobre a realidade das manifestações. Apenas cada um as aprecia a seu modo. Com efeito, negá-las seria negar a verdade das Escrituras, e os próprios fatos sobre os quais se apoia a maioria dos dogmas. Quanto à maneira de encarar a coisa, desde já, é possível constatar em que sentido se faz a unidade e se pronuncia a opinião pública, que também tem o seu veto. Ressalta ainda outro fato: é que a Doutrina Espírita abala profundamente as massas; que enquanto uns nela veem um fantasma terrível, outros veem o anjo da consolação e da libertação e uma nova era de progresso moral para a Humanidade.
Já que citamos a brochura do Padre Marouzeau, talvez nos perguntem por que ainda não a respondemos, se nos foi dirigida pessoalmente. Seu motivo pôde ser visto em nosso relatório de viagem, a propósito das refutações. Quando tratamos de uma questão, fazemo-lo do ponto de vista geral, abstraindo das pessoas que, aos nossos olhos, não passam de individualidades que se apegam ante as questões de princípios.
Falaremos do Sr. Marouzeau no devido tempo, como de alguns outros, quando examinarmos o conjunto das objeções. Para isto era útil esperar que cada um tivesse falado, grosso ou fino ─ e vimos acima alguns falaram grosso ─ para apreciar a força da oposição. Respostas especiais e individuais teriam sido prematuras e incessantemente repetidas.
A brochura do Sr. Marouzeau era um tiro de fuzil. Pedimos-lhe desculpas por colocá-lo na fila dos simples fuzileiros, mas sua modéstia cristã não ficará ofendida.
Protegido por uma porção de escudos, pareceu-nos conveniente deixar que descarregassem todas as armas, mesmo a artilharia pesada que, como se vê, acaba de entrar, a fim de julgar o seu poderio. Ora, até o presente, não temos que lamentar claros por ela abertos em nossas fileiras. Ao contrário, seus tiros ricochetearam contra ela.
Por outro lado, não era menos útil deixar desenhar-se a situação, e hão de convir que de dois anos para cá, o estado das coisas, longe de piorar, diariamente nos traz novas forças.
Responderemos, pois, quando julgarmos oportuno. Até agora não houve tempo perdido, pois sem isto temos ganho terreno incessantemente, e os próprios adversários se encarregam de facilitar nossa tarefa. Temos apenas que deixá-los agir.
A loucura Espírita - Resposta ao Sr. Burlet, de Lyon - Ciências
O folhetim da Presse de 8 de janeiro de 1863 traz o artigo seguinte, tirado do Salut Public de Lyon, e que o Gironde, de Bordeaux, apressou-se em reproduzir, crendo lavrar um tento contra o Espiritismo:
CIÊNCIAS
“O Sr. Philibert Burlet, interno dos hospitais de Lyon, leu recentemente na Sociedade de Ciências Médicas desta cidade um interessante trabalho sobre o Espiritismo considerado como causa de alienação mental. Em face da epidemia que pesa no momento sobre a sociedade francesa, não será desprovido de utilidade assinalar os fatos contidos na memória do Sr. Burlet.
“O autor descreve com cuidado seis casos de loucura, dita aguda, por ele observados no hospital de Antiquaille, e nos quais, sem dificuldade, se constata a relação direta entre a alienação mental e as práticas espíritas. Por seu lado, diz ele, o Dr. Carrier teve ocasião, há pouco tempo, de tratar e ver curadas, em seu serviço, três mulheres que o Espiritismo havia enlouquecido. Aliás, não há um só médico que trata especificamente de alienação mental que não tenha observado casos análogos, em maior ou menor número, sem falar, é claro, das perturbações intelectuais ou afetivas que, sem chegar ao ponto a que se convencionou chamar de loucura, não deixam de alterar a razão e tornar desagradável e bizarro o comportamento dos que a apresentam.
“Essa influência da pretensa Doutrina Espírita está hoje bem demonstrada pela Ciência. As observações que o estabelecem contam-se aos milhares. Diz o Sr. Burlet que ‘Se nas outras partes da França, os casos de loucura causados pela doutrina dos médiuns forem tão frequentes quanto no departamento que habitamos ─ e não há motivos para que assim não seja ─ parece-nos fora de dúvida que o Espiritismo pode tomar lugar na linha das causas mais fecundas de alienação mental.’
“Terminando, o autor exorta os pais e mães de família, os chefes de oficinas etc. a ficarem atentos para que seus filhos e empregados não vão nunca ‘a essas reuniões espíritas chamadas grupos, nas quais o perigo para a razão não é o único a temer’.
“É, pois, de incontestável utilidade dar publicidade aos fatos deste gênero, colhidos conscienciosamente, como os do interno dos hospitais de Lyon. Não que haja a menor chance para agir sobre indivíduos já afetados pela epidemia. O caráter de sua loucura é precisamente a forte convicção de serem os únicos detentores da verdade. Em sua humildade, julgam-se com o dom de comunicar-se com os Espíritos, e consideram orgulhosa a Ciência que ousa duvidar de seu poder. Vítimas da alucinação que os empolga, admitida a sua premissa, raciocinam a seguir com uma lógica inatacável, que não faz senão fortalecê-los na aberração. Mas, pode-se conservar a esperança de agir sobre as inteligências ainda sãs que seriam tentadas a se exporem às seduções do Espiritismo, assinalando-lhes o perigo, e assim garanti-las contra esse perigo.
“É bom saber que as práticas espíritas e a convivência com os médiuns ─ que são verdadeiros alucinados — é necessariamente prejudicial para a razão. Só os caracteres fortemente temperados podem resistir. Os outros aí sempre deixam uma parte, maior ou menor, do seu bom-senso.”
A. SANSON
“O autor descreve com cuidado seis casos de loucura, dita aguda, por ele observados no hospital de Antiquaille, e nos quais, sem dificuldade, se constata a relação direta entre a alienação mental e as práticas espíritas. Por seu lado, diz ele, o Dr. Carrier teve ocasião, há pouco tempo, de tratar e ver curadas, em seu serviço, três mulheres que o Espiritismo havia enlouquecido. Aliás, não há um só médico que trata especificamente de alienação mental que não tenha observado casos análogos, em maior ou menor número, sem falar, é claro, das perturbações intelectuais ou afetivas que, sem chegar ao ponto a que se convencionou chamar de loucura, não deixam de alterar a razão e tornar desagradável e bizarro o comportamento dos que a apresentam.
“Essa influência da pretensa Doutrina Espírita está hoje bem demonstrada pela Ciência. As observações que o estabelecem contam-se aos milhares. Diz o Sr. Burlet que ‘Se nas outras partes da França, os casos de loucura causados pela doutrina dos médiuns forem tão frequentes quanto no departamento que habitamos ─ e não há motivos para que assim não seja ─ parece-nos fora de dúvida que o Espiritismo pode tomar lugar na linha das causas mais fecundas de alienação mental.’
“Terminando, o autor exorta os pais e mães de família, os chefes de oficinas etc. a ficarem atentos para que seus filhos e empregados não vão nunca ‘a essas reuniões espíritas chamadas grupos, nas quais o perigo para a razão não é o único a temer’.
“É, pois, de incontestável utilidade dar publicidade aos fatos deste gênero, colhidos conscienciosamente, como os do interno dos hospitais de Lyon. Não que haja a menor chance para agir sobre indivíduos já afetados pela epidemia. O caráter de sua loucura é precisamente a forte convicção de serem os únicos detentores da verdade. Em sua humildade, julgam-se com o dom de comunicar-se com os Espíritos, e consideram orgulhosa a Ciência que ousa duvidar de seu poder. Vítimas da alucinação que os empolga, admitida a sua premissa, raciocinam a seguir com uma lógica inatacável, que não faz senão fortalecê-los na aberração. Mas, pode-se conservar a esperança de agir sobre as inteligências ainda sãs que seriam tentadas a se exporem às seduções do Espiritismo, assinalando-lhes o perigo, e assim garanti-las contra esse perigo.
“É bom saber que as práticas espíritas e a convivência com os médiuns ─ que são verdadeiros alucinados — é necessariamente prejudicial para a razão. Só os caracteres fortemente temperados podem resistir. Os outros aí sempre deixam uma parte, maior ou menor, do seu bom-senso.”
A. SANSON
Este artigo pode fazer o contrapeso dos sermões relatados no artigo precedente. Pode-se ver, se não uma unidade de origem, ao menos uma intenção idêntica: a de levantar a opinião contra o Espiritismo, por meios onde transparece a boa-fé ou a ignorância das coisas.
Note-se a gradação que tiveram os ataques, a partir do famoso e desajeitado artigo da Gazette de Lyon (Vide Revista Espírita de outubro de 1860). Então não passava de chã zombaria, pelas quais os operários daquela cidade eram achincalhados, ridicularizados, e seus teares comparados a forcas. Não era, realmente, prova de deselegância lançar o desprezo sobre os trabalhadores e sobre os instrumentos que fazem a prosperidade de uma cidade como Lyon?
Desde então, a agressão toma outro caráter. Vendo a impotência do ridículo, e não podendo impedir-se de constatar o terreno que diariamente ganham as ideias espíritas, ela o retoma num tom mais lamentável. É em nome da Humanidade, em face da epidemia que pesa no momento sobre a sociedade francesa, que ela vem assinalar os perigos dessa pretensa doutrina que torna desagradável e bizarro o relacionamento daqueles que a professam, referência pouco lisonjeira para as senhoras de todas as classes, inclusive para as princesas que acreditam nos Espíritos.
Parece-nos, entretanto, que as pessoas violentas e irascíveis tornadas mansas e boas pelo Espiritismo não constituem prova de um caráter muito mau e são menos desagradáveis do que antes, e que entre os não espíritas só se encontram criaturas amáveis e benevolentes. Posto se encontrem muitas famílias onde o Espiritismo restabeleceu a paz e a união, é em nome de seu interesse que se intimam os operários a não irem a “essas reuniões chamadas grupos, onde podem perder a razão e outras coisas”, sem dúvida achando que as conservariam melhor indo ao cabaré do que ficando em casa.
Não tendo êxito com o motejo, eis que agora os adversários chamam a Ciência em seu apoio, não mais a ciência trocista, representada pelo músculo que range, do Sr. Jobert, de Lamballe (Vide Revista Espírita de junho de 1859), mas a Ciência séria, condenando o Espiritismo tão gravemente quanto outrora condenou a aplicação do vapor à marinha, e tantas outras utopias que mais tarde teve a fraqueza de aceitar como verdades.
E qual o seu representante em tão grave questão? É o Instituto de França? Não. É o Sr. Philibert Burlet, interno dos hospitais de Lyon, isto é, estudante de medicina, que forja as primeiras armas lançando uma memória contra o Espiritismo. Ele falou, e em seu nome e em nome do Sr. Sanson, da Presse, que a Ciência deu a sua sentença, sentença que provavelmente também não será mais inapelável que a dos doutores que condenaram a teoria de Harvey sobre a circulação do sangue, e que lançaram contra o seu autor “libelos e diatribes mais ou menos virulentos e grosseiros”. (Dictionnaire des Origines). Seja dito, entre parênteses, que um trabalho curioso seria uma monografia dos erros dos cientistas.
Diz o Sr. Burlet ter observado seis casos de loucura aguda produzida pelo Espiritismo, mas como é pouco para uma população de 300.000 almas, das quais pelo menos a décima parte é espírita, tem ele o cuidado de acrescentar “que se contariam por milhares se nas outras partes da França os casos de loucura causados pela doutrina dos médiuns fossem tão frequentes quanto no departamento que habitamos, e não há motivos para que assim não seja.”
Com o sistema de suposições vai-se muito longe, como se vê. Ora! Vamos mais longe que ele, e diremos, não por hipótese, mas por afirmação que, num tempo dado, só se encontrarão loucos entre os espíritas. Com efeito, a loucura é uma das enfermidades da espécie humana. Mil causas acidentais podem produzi-la, e a prova é que havia loucos antes que se falasse de Espiritismo, e que nem todos os loucos são espíritas, o Sr. Burlet há de concordar. Em todos os tempos houve loucos, e os haverá sempre. Então, se todos os habitantes de Lyon fossem espíritas, só se encontrariam loucos entre os espíritas, do mesmo modo que numa região inteiramente católica só haverá loucos entre os católicos. Observando a marcha da doutrina de uns anos para cá, até certo ponto poder-se-ia prever o tempo necessário para isto. Mas falemos só do presente.
Os loucos falam do que os preocupa. É bem certo que aquele que jamais tivesse ouvido falar de Espiritismo, dele não falaria, ao passo que, caso contrário, dele falará, assim como falaria de religião, de amor etc. Seja qual for a causa da loucura, o número de loucos falando de Espíritos aumentará naturalmente com o número de adeptos. A questão é saber se o Espiritismo é uma causa eficiente de loucura. O Sr. Burlet o afirma do alto de sua autoridade de interno, dizendo que “Essa influência é hoje bem demonstrada pela Ciência”. Daí, inflamado, apela aos rigores da autoridade, como se uma autoridade qualquer pudesse impedir o curso de uma ideia, e sem pensar que as ideias jamais se propagam melhor do que sob o império da perseguição. Toma ele sua opinião e a dos que pensam como ele por decretos da Ciência? Ele parece ignorar que o Espiritismo conta em suas fileiras grande número de médicos ilustres; que muitos dos grupos e sociedades são presididos por médicos que, também eles, são homens de ciência, e que chegam a conclusões contrárias às suas. Quem tem razão: ele ou os outros? Neste conflito entre a afirmação e a negação, quem pronunciará o veredito final? O tempo, a opinião, a consciência da maioria e a própria Ciência, que se renderá à evidência, como já o fez em outras circunstâncias.
Diremos ao Sr. Burlet que é contra os mais simples preceitos da lógica deduzir uma consequência geral de alguns fatos isolados, a que outros fatos podem dar um desmentido. Para apoiar vossa tese, seria preciso um trabalho diverso do vosso. Dissestes haver observado seis casos. Creio em vossa palavra, mas, o que é que isso prova? Se tivésseis observado o dobro ou o triplo não provaríeis mais, se o total dos loucos não passou da média. Suponhamos a média de 1.000, para usar um número redondo. Sendo sempre as mesmas as causas habituais da loucura, se o Espiritismo pode provocá-la, é mais uma causa que, somada às outras, deve aumentar a cifra da média. Se desde a introdução das ideias espíritas a média de 1.000 tivesse subido para 1.200, por exemplo, e a diferença fosse precisamente a dos casos de loucura espírita, a questão mudaria de figura. Mas enquanto não for provado que sob a influência do Espiritismo a média dos alienados aumentou, a amostragem feita de alguns casos isolados nada prova senão a intenção de lançar o descrédito sobre as ideias espíritas e de apavorar a opinião.
No estado atual das coisas, resta mesmo conhecer o valor dos casos isolados que se nos apresentam, e saber se todo alienado que fala dos Espíritos deve sua loucura ao Espiritismo, para o que seria necessário um juiz imparcial e desinteressado. Suponhamos que o Sr. Burlet fique louco, o que pode acontecer-lhe, como a qualquer outro, - e, quem sabe, talvez mais do que a um outro, - haveria algo de admirável que, preocupado com a ideia que combateu, dela falasse em sua demência? Deveria daí concluir-se que foi a crença nos Espíritos que o enlouqueceu?
Poderíamos citar vários casos, dos quais fazem muito alarido, e nos quais ficou provado que as pessoas se tinham ocupado pouco ou nada do Espiritismo, ou que tinham tido ataques de loucura bem caracterizados muito anteriores.
A isto devem juntar-se os casos de obsessão e subjugação, que são confundidos com a loucura e tratados como tal, com grande prejuízo para a saúde das pessoas afetadas, como explicamos em nossos artigos sobre Morzine. À primeira vista, são estes os únicos que poderiam ser atribuídos ao Espiritismo, posto esteja provado que se encontram em grande número de pessoas estranhas a ele e que, pela ignorância da causa, são erroneamente tratados.
É verdadeiramente curioso ver certos adversários que não creem nos Espíritos nem em suas manifestações pretenderem que o Espiritismo seja uma causa de loucura. Se os Espíritos não existem ou se não podem comunicar-se com os homens, todas essas crenças são quimeras que nada têm de real. Perguntamos, então, como o nada pode produzir alguma coisa?
É a ideia, dirão eles; essa ideia é falsa; ora, todo homem que professa uma ideia falsa desarrazoa. Que ideia é essa, tão funesta à razão? Ei-la: Temos uma alma que vive após a morte do corpo. Essa alma conserva as afeições da vida terrena e pode comunicar-se com os vivos. Segundo eles, é melhor acreditar no nada após a morte, ou então, o que dá no mesmo, que a alma, perdendo a sua individualidade, se confunde no todo universal, como as gotas de água no oceano. De fato, com esta última ideia não há mais necessidade de nos inquietarmos com a sorte do próximo e que só temos que pensar em nós, bem beber, bem comer nesta vida, tudo em proveito do egoísmo.
Se a crença contrária é uma causa de loucura, por que existem tantos loucos entre as pessoas que em nada creem? Direis que esta causa não é a única. De acordo. Mas então, por que quereríeis que essas causas não pudessem ferir um espírita como a qualquer outro? E por que pretenderíeis tornar o Espiritismo responsável por uma febre alta ou uma insolação?
Apelais à autoridade para tomar medidas contra as ideias espíritas porque, em vossa opinião, elas desorganizam o cérebro. Mas por que não chamais a vigilância da autoridade contra as outras causas? Na vossa solicitude pela razão humana, da qual vos supondes o protótipo, fizestes a estatística dos inumeráveis casos de loucura produzidos pelo desespero do amor? Por que não apelais à autoridade para proscrever o sentimento amoroso?
Está comprovado que todas as revoluções são marcadas por uma recrudescência notável nas afecções mentais. Eis aí uma causa eficiente bem manifesta, pois aumenta a cifra da média. Por que não aconselhais os governos a interditarem as revoluções como coisa malsã?
Considerando-se que o Sr. Burlet fez o relato enorme de seis casos de loucura dita espírita, numa população de 300.000 almas, aconselhamos os médicos espíritas a fazerem o mesmo com todos os casos de loucura, de epilepsia e outras afecções causadas pelo medo do diabo, pelo terrível quadro das torturas do inferno e pelo ascetismo das reclusões claustrais.
Longe de admitir o Espiritismo como uma causa de aumento da loucura, dizemos que ele é uma causa atenuante, que deve diminuir o número dos casos produzidos pelas causas ordinárias. Com efeito, entre essas causas, devem ser colocados em primeira linha os desgostos de toda natureza, as decepções, as afeições contrariadas, os revezes da fortuna, as ambições frustradas. O efeito dessas causas está na razão da impressionabilidade do indivíduo. Se tivéssemos um meio de atenuar essa impressionabilidade, este seria, sem dúvida, o melhor preservativo. Ora! Esse meio está no Espiritismo, que amortece o contra-golpe moral; que faz suportar com resignação as vicissitudes da vida. Alguém que se teria suicidado por um revés, adquire na crença espírita uma força moral que o leva a receber o mal com paciência. Não só não se matará, mas, em presença da maior adversidade, conservará a razão fria, porque tem uma fé inalterável no futuro.
Dar-lhe-eis essa calma com a perspectiva do nada? Não, pois ele não entrevê nenhuma compensação, e se não tiver o que comer, poderá comer-vos. A fome é terrível conselheira para quem acredita que tudo acaba com a vida. Ora! O Espiritismo faz suportar a fome, porque faz ver, compreender e esperar a vida que sucede à morte do corpo. Eis a sua loucura.
A maneira pela qual o verdadeiro espírita encara as coisas deste mundo e do outro, leva-o a domar em si as mais violentas paixões, mesmo a cólera e a vingança.
Depois do artigo insultuoso da Gazette de Lyon, relembrado pouco acima, um grupo de cerca de uma dúzia de operários nos disse: “Se não fôssemos espíritas iríamos dar uma surra no autor, para lhe ensinar a viver, e se estivéssemos em revolução incendiaríamos a redação de seu jornal. Mas somos espíritas. Nós o lastimamos e pedimos a Deus que o perdoe.”
Que dizeis desta loucura, Sr. Burlet? Num caso semelhante, o que teríeis preferido: tratar com loucos dessa espécie ou com homens que nada temem? Pensai que hoje os há mais de vinte mil em Lyon. Pretendeis servir aos interesses da Humanidade e não compreendeis os vossos! Pedi a Deus para que um dia não tenhais que lamentar não sejam todos os homens espíritas. É para isto que vós e os vossos trabalhais com todas as forças. Semeando a incredulidade, minais os fundamentos da ordem social; estimulais a anarquia, as reações sangrentas.
Nós trabalhamos para dar a fé aos que em nada creem; para espalhar uma crença que torna os homens melhores uns para com os outros; que lhes ensina a perdoar aos inimigos; a se olharem como irmãos, sem distinção de raça, casta, seita, cor, opinião política ou religiosa, uma crença que, numa palavra, faz nascer o verdadeiro sentimento da caridade, da fraternidade e dos deveres sociais.
Perguntai a todos os chefes militares que têm subordinados espíritas sob suas ordens, quais eles conduzem com mais facilidade, que melhor observam a disciplina sem emprego do rigor.
Perguntai aos magistrados, aos agentes da autoridade que têm auxiliares espíritas nas camadas inferiores da Sociedade, quais são os mais ordeiros e tranquilos; sobre os quais menos se exerce a lei; onde há menos tumulto a apaziguar e desordens a reprimir.
Numa cidade do sul, dizia-nos um comissário de polícia: “Desde que o Espiritismo se espalhou em minha circunscrição, tenho dez vezes menos casos do que antes”.
Perguntai, enfim, aos médicos espíritas quais os doentes em que encontram menos afecções causadas pelos excessos de todo o gênero. Eis uma estatística que me parece um pouco mais concludente que os vossos seis casos de alienação mental. Se tais resultados são uma loucura, tenho a glória de propagá-la.
Onde foram colhidos tais resultados? Nos livros que alguns queriam lançar à fogueira. Nos grupos dos quais recomendais aos operários que fujam. Que é o que se vê nesses grupos, que pintais como o túmulo da razão? Homens, senhoras, crianças que escutam com recolhimento uma suave e consoladora moral, em vez de ir ao cabaré perder seu dinheiro e sua saúde ou fazer barulho em praça pública; que de lá saem com o amor aos semelhantes no coração, em vez de ódio e vingança.
Eis uma singular confissão feita pelo autor do artigo precitado: “Vítimas da alucinação que os empolga, admitida a sua premissa, raciocinam a seguir com uma lógica inatacável, que não faz senão fortalecê-los na aberração.” Singular loucura, na verdade, essa que raciocina com uma lógica irreprochável!
Ora, qual é essa premissa? Nós o dissemos há pouco: A alma sobrevive ao corpo, conserva a sua individualidade e suas afeições, e pode comunicar-se com os vivos. O que pode provar a verdade de uma premissa, senão a lógica irreprochável das deduções? Quem diz irreprochável, diz inatacável, irrefutável. Assim, se as deduções de uma premissa são inatacáveis, é que satisfazem a tudo, e que nada se lhes pode opor. Assim, se essas deduções são verdadeiras, é que a premissa é verdadeira, pois a verdade não pode ter o erro por princípio.
De um princípio falso, sem dúvida podem deduzir-se consequências aparentemente lógicas, mas será uma lógica aparente, isto é, sofismas e não uma lógica irreprochável, pois deixará sempre uma porta aberta à refutação. A verdadeira lógica é a que satisfaz plenamente à razão; a que não pode ser contestada.
A falsa lógica não passa de falso raciocínio, sempre contestável. O que caracteriza as deduções de nossa premissa é, em princípio, que são baseadas na observação dos fatos; em segundo lugar, que explicam de maneira racional o que sem isso seria inexplicável. Substituí a nossa premissa pela negação e vos chocareis a cada passo com dificuldades insolúveis. A teoria espírita, dizemos nós, é baseada em fatos, mas sobre milhares de fatos que se repetem todos os dias e são observados por milhões de pessoas. A vossa, sobre meia dúzia, observados por vós. Eis uma premissa da qual cada um pode tirar a conclusão.
Note-se a gradação que tiveram os ataques, a partir do famoso e desajeitado artigo da Gazette de Lyon (Vide Revista Espírita de outubro de 1860). Então não passava de chã zombaria, pelas quais os operários daquela cidade eram achincalhados, ridicularizados, e seus teares comparados a forcas. Não era, realmente, prova de deselegância lançar o desprezo sobre os trabalhadores e sobre os instrumentos que fazem a prosperidade de uma cidade como Lyon?
Desde então, a agressão toma outro caráter. Vendo a impotência do ridículo, e não podendo impedir-se de constatar o terreno que diariamente ganham as ideias espíritas, ela o retoma num tom mais lamentável. É em nome da Humanidade, em face da epidemia que pesa no momento sobre a sociedade francesa, que ela vem assinalar os perigos dessa pretensa doutrina que torna desagradável e bizarro o relacionamento daqueles que a professam, referência pouco lisonjeira para as senhoras de todas as classes, inclusive para as princesas que acreditam nos Espíritos.
Parece-nos, entretanto, que as pessoas violentas e irascíveis tornadas mansas e boas pelo Espiritismo não constituem prova de um caráter muito mau e são menos desagradáveis do que antes, e que entre os não espíritas só se encontram criaturas amáveis e benevolentes. Posto se encontrem muitas famílias onde o Espiritismo restabeleceu a paz e a união, é em nome de seu interesse que se intimam os operários a não irem a “essas reuniões chamadas grupos, onde podem perder a razão e outras coisas”, sem dúvida achando que as conservariam melhor indo ao cabaré do que ficando em casa.
Não tendo êxito com o motejo, eis que agora os adversários chamam a Ciência em seu apoio, não mais a ciência trocista, representada pelo músculo que range, do Sr. Jobert, de Lamballe (Vide Revista Espírita de junho de 1859), mas a Ciência séria, condenando o Espiritismo tão gravemente quanto outrora condenou a aplicação do vapor à marinha, e tantas outras utopias que mais tarde teve a fraqueza de aceitar como verdades.
E qual o seu representante em tão grave questão? É o Instituto de França? Não. É o Sr. Philibert Burlet, interno dos hospitais de Lyon, isto é, estudante de medicina, que forja as primeiras armas lançando uma memória contra o Espiritismo. Ele falou, e em seu nome e em nome do Sr. Sanson, da Presse, que a Ciência deu a sua sentença, sentença que provavelmente também não será mais inapelável que a dos doutores que condenaram a teoria de Harvey sobre a circulação do sangue, e que lançaram contra o seu autor “libelos e diatribes mais ou menos virulentos e grosseiros”. (Dictionnaire des Origines). Seja dito, entre parênteses, que um trabalho curioso seria uma monografia dos erros dos cientistas.
Diz o Sr. Burlet ter observado seis casos de loucura aguda produzida pelo Espiritismo, mas como é pouco para uma população de 300.000 almas, das quais pelo menos a décima parte é espírita, tem ele o cuidado de acrescentar “que se contariam por milhares se nas outras partes da França os casos de loucura causados pela doutrina dos médiuns fossem tão frequentes quanto no departamento que habitamos, e não há motivos para que assim não seja.”
Com o sistema de suposições vai-se muito longe, como se vê. Ora! Vamos mais longe que ele, e diremos, não por hipótese, mas por afirmação que, num tempo dado, só se encontrarão loucos entre os espíritas. Com efeito, a loucura é uma das enfermidades da espécie humana. Mil causas acidentais podem produzi-la, e a prova é que havia loucos antes que se falasse de Espiritismo, e que nem todos os loucos são espíritas, o Sr. Burlet há de concordar. Em todos os tempos houve loucos, e os haverá sempre. Então, se todos os habitantes de Lyon fossem espíritas, só se encontrariam loucos entre os espíritas, do mesmo modo que numa região inteiramente católica só haverá loucos entre os católicos. Observando a marcha da doutrina de uns anos para cá, até certo ponto poder-se-ia prever o tempo necessário para isto. Mas falemos só do presente.
Os loucos falam do que os preocupa. É bem certo que aquele que jamais tivesse ouvido falar de Espiritismo, dele não falaria, ao passo que, caso contrário, dele falará, assim como falaria de religião, de amor etc. Seja qual for a causa da loucura, o número de loucos falando de Espíritos aumentará naturalmente com o número de adeptos. A questão é saber se o Espiritismo é uma causa eficiente de loucura. O Sr. Burlet o afirma do alto de sua autoridade de interno, dizendo que “Essa influência é hoje bem demonstrada pela Ciência”. Daí, inflamado, apela aos rigores da autoridade, como se uma autoridade qualquer pudesse impedir o curso de uma ideia, e sem pensar que as ideias jamais se propagam melhor do que sob o império da perseguição. Toma ele sua opinião e a dos que pensam como ele por decretos da Ciência? Ele parece ignorar que o Espiritismo conta em suas fileiras grande número de médicos ilustres; que muitos dos grupos e sociedades são presididos por médicos que, também eles, são homens de ciência, e que chegam a conclusões contrárias às suas. Quem tem razão: ele ou os outros? Neste conflito entre a afirmação e a negação, quem pronunciará o veredito final? O tempo, a opinião, a consciência da maioria e a própria Ciência, que se renderá à evidência, como já o fez em outras circunstâncias.
Diremos ao Sr. Burlet que é contra os mais simples preceitos da lógica deduzir uma consequência geral de alguns fatos isolados, a que outros fatos podem dar um desmentido. Para apoiar vossa tese, seria preciso um trabalho diverso do vosso. Dissestes haver observado seis casos. Creio em vossa palavra, mas, o que é que isso prova? Se tivésseis observado o dobro ou o triplo não provaríeis mais, se o total dos loucos não passou da média. Suponhamos a média de 1.000, para usar um número redondo. Sendo sempre as mesmas as causas habituais da loucura, se o Espiritismo pode provocá-la, é mais uma causa que, somada às outras, deve aumentar a cifra da média. Se desde a introdução das ideias espíritas a média de 1.000 tivesse subido para 1.200, por exemplo, e a diferença fosse precisamente a dos casos de loucura espírita, a questão mudaria de figura. Mas enquanto não for provado que sob a influência do Espiritismo a média dos alienados aumentou, a amostragem feita de alguns casos isolados nada prova senão a intenção de lançar o descrédito sobre as ideias espíritas e de apavorar a opinião.
No estado atual das coisas, resta mesmo conhecer o valor dos casos isolados que se nos apresentam, e saber se todo alienado que fala dos Espíritos deve sua loucura ao Espiritismo, para o que seria necessário um juiz imparcial e desinteressado. Suponhamos que o Sr. Burlet fique louco, o que pode acontecer-lhe, como a qualquer outro, - e, quem sabe, talvez mais do que a um outro, - haveria algo de admirável que, preocupado com a ideia que combateu, dela falasse em sua demência? Deveria daí concluir-se que foi a crença nos Espíritos que o enlouqueceu?
Poderíamos citar vários casos, dos quais fazem muito alarido, e nos quais ficou provado que as pessoas se tinham ocupado pouco ou nada do Espiritismo, ou que tinham tido ataques de loucura bem caracterizados muito anteriores.
A isto devem juntar-se os casos de obsessão e subjugação, que são confundidos com a loucura e tratados como tal, com grande prejuízo para a saúde das pessoas afetadas, como explicamos em nossos artigos sobre Morzine. À primeira vista, são estes os únicos que poderiam ser atribuídos ao Espiritismo, posto esteja provado que se encontram em grande número de pessoas estranhas a ele e que, pela ignorância da causa, são erroneamente tratados.
É verdadeiramente curioso ver certos adversários que não creem nos Espíritos nem em suas manifestações pretenderem que o Espiritismo seja uma causa de loucura. Se os Espíritos não existem ou se não podem comunicar-se com os homens, todas essas crenças são quimeras que nada têm de real. Perguntamos, então, como o nada pode produzir alguma coisa?
É a ideia, dirão eles; essa ideia é falsa; ora, todo homem que professa uma ideia falsa desarrazoa. Que ideia é essa, tão funesta à razão? Ei-la: Temos uma alma que vive após a morte do corpo. Essa alma conserva as afeições da vida terrena e pode comunicar-se com os vivos. Segundo eles, é melhor acreditar no nada após a morte, ou então, o que dá no mesmo, que a alma, perdendo a sua individualidade, se confunde no todo universal, como as gotas de água no oceano. De fato, com esta última ideia não há mais necessidade de nos inquietarmos com a sorte do próximo e que só temos que pensar em nós, bem beber, bem comer nesta vida, tudo em proveito do egoísmo.
Se a crença contrária é uma causa de loucura, por que existem tantos loucos entre as pessoas que em nada creem? Direis que esta causa não é a única. De acordo. Mas então, por que quereríeis que essas causas não pudessem ferir um espírita como a qualquer outro? E por que pretenderíeis tornar o Espiritismo responsável por uma febre alta ou uma insolação?
Apelais à autoridade para tomar medidas contra as ideias espíritas porque, em vossa opinião, elas desorganizam o cérebro. Mas por que não chamais a vigilância da autoridade contra as outras causas? Na vossa solicitude pela razão humana, da qual vos supondes o protótipo, fizestes a estatística dos inumeráveis casos de loucura produzidos pelo desespero do amor? Por que não apelais à autoridade para proscrever o sentimento amoroso?
Está comprovado que todas as revoluções são marcadas por uma recrudescência notável nas afecções mentais. Eis aí uma causa eficiente bem manifesta, pois aumenta a cifra da média. Por que não aconselhais os governos a interditarem as revoluções como coisa malsã?
Considerando-se que o Sr. Burlet fez o relato enorme de seis casos de loucura dita espírita, numa população de 300.000 almas, aconselhamos os médicos espíritas a fazerem o mesmo com todos os casos de loucura, de epilepsia e outras afecções causadas pelo medo do diabo, pelo terrível quadro das torturas do inferno e pelo ascetismo das reclusões claustrais.
Longe de admitir o Espiritismo como uma causa de aumento da loucura, dizemos que ele é uma causa atenuante, que deve diminuir o número dos casos produzidos pelas causas ordinárias. Com efeito, entre essas causas, devem ser colocados em primeira linha os desgostos de toda natureza, as decepções, as afeições contrariadas, os revezes da fortuna, as ambições frustradas. O efeito dessas causas está na razão da impressionabilidade do indivíduo. Se tivéssemos um meio de atenuar essa impressionabilidade, este seria, sem dúvida, o melhor preservativo. Ora! Esse meio está no Espiritismo, que amortece o contra-golpe moral; que faz suportar com resignação as vicissitudes da vida. Alguém que se teria suicidado por um revés, adquire na crença espírita uma força moral que o leva a receber o mal com paciência. Não só não se matará, mas, em presença da maior adversidade, conservará a razão fria, porque tem uma fé inalterável no futuro.
Dar-lhe-eis essa calma com a perspectiva do nada? Não, pois ele não entrevê nenhuma compensação, e se não tiver o que comer, poderá comer-vos. A fome é terrível conselheira para quem acredita que tudo acaba com a vida. Ora! O Espiritismo faz suportar a fome, porque faz ver, compreender e esperar a vida que sucede à morte do corpo. Eis a sua loucura.
A maneira pela qual o verdadeiro espírita encara as coisas deste mundo e do outro, leva-o a domar em si as mais violentas paixões, mesmo a cólera e a vingança.
Depois do artigo insultuoso da Gazette de Lyon, relembrado pouco acima, um grupo de cerca de uma dúzia de operários nos disse: “Se não fôssemos espíritas iríamos dar uma surra no autor, para lhe ensinar a viver, e se estivéssemos em revolução incendiaríamos a redação de seu jornal. Mas somos espíritas. Nós o lastimamos e pedimos a Deus que o perdoe.”
Que dizeis desta loucura, Sr. Burlet? Num caso semelhante, o que teríeis preferido: tratar com loucos dessa espécie ou com homens que nada temem? Pensai que hoje os há mais de vinte mil em Lyon. Pretendeis servir aos interesses da Humanidade e não compreendeis os vossos! Pedi a Deus para que um dia não tenhais que lamentar não sejam todos os homens espíritas. É para isto que vós e os vossos trabalhais com todas as forças. Semeando a incredulidade, minais os fundamentos da ordem social; estimulais a anarquia, as reações sangrentas.
Nós trabalhamos para dar a fé aos que em nada creem; para espalhar uma crença que torna os homens melhores uns para com os outros; que lhes ensina a perdoar aos inimigos; a se olharem como irmãos, sem distinção de raça, casta, seita, cor, opinião política ou religiosa, uma crença que, numa palavra, faz nascer o verdadeiro sentimento da caridade, da fraternidade e dos deveres sociais.
Perguntai a todos os chefes militares que têm subordinados espíritas sob suas ordens, quais eles conduzem com mais facilidade, que melhor observam a disciplina sem emprego do rigor.
Perguntai aos magistrados, aos agentes da autoridade que têm auxiliares espíritas nas camadas inferiores da Sociedade, quais são os mais ordeiros e tranquilos; sobre os quais menos se exerce a lei; onde há menos tumulto a apaziguar e desordens a reprimir.
Numa cidade do sul, dizia-nos um comissário de polícia: “Desde que o Espiritismo se espalhou em minha circunscrição, tenho dez vezes menos casos do que antes”.
Perguntai, enfim, aos médicos espíritas quais os doentes em que encontram menos afecções causadas pelos excessos de todo o gênero. Eis uma estatística que me parece um pouco mais concludente que os vossos seis casos de alienação mental. Se tais resultados são uma loucura, tenho a glória de propagá-la.
Onde foram colhidos tais resultados? Nos livros que alguns queriam lançar à fogueira. Nos grupos dos quais recomendais aos operários que fujam. Que é o que se vê nesses grupos, que pintais como o túmulo da razão? Homens, senhoras, crianças que escutam com recolhimento uma suave e consoladora moral, em vez de ir ao cabaré perder seu dinheiro e sua saúde ou fazer barulho em praça pública; que de lá saem com o amor aos semelhantes no coração, em vez de ódio e vingança.
Eis uma singular confissão feita pelo autor do artigo precitado: “Vítimas da alucinação que os empolga, admitida a sua premissa, raciocinam a seguir com uma lógica inatacável, que não faz senão fortalecê-los na aberração.” Singular loucura, na verdade, essa que raciocina com uma lógica irreprochável!
Ora, qual é essa premissa? Nós o dissemos há pouco: A alma sobrevive ao corpo, conserva a sua individualidade e suas afeições, e pode comunicar-se com os vivos. O que pode provar a verdade de uma premissa, senão a lógica irreprochável das deduções? Quem diz irreprochável, diz inatacável, irrefutável. Assim, se as deduções de uma premissa são inatacáveis, é que satisfazem a tudo, e que nada se lhes pode opor. Assim, se essas deduções são verdadeiras, é que a premissa é verdadeira, pois a verdade não pode ter o erro por princípio.
De um princípio falso, sem dúvida podem deduzir-se consequências aparentemente lógicas, mas será uma lógica aparente, isto é, sofismas e não uma lógica irreprochável, pois deixará sempre uma porta aberta à refutação. A verdadeira lógica é a que satisfaz plenamente à razão; a que não pode ser contestada.
A falsa lógica não passa de falso raciocínio, sempre contestável. O que caracteriza as deduções de nossa premissa é, em princípio, que são baseadas na observação dos fatos; em segundo lugar, que explicam de maneira racional o que sem isso seria inexplicável. Substituí a nossa premissa pela negação e vos chocareis a cada passo com dificuldades insolúveis. A teoria espírita, dizemos nós, é baseada em fatos, mas sobre milhares de fatos que se repetem todos os dias e são observados por milhões de pessoas. A vossa, sobre meia dúzia, observados por vós. Eis uma premissa da qual cada um pode tirar a conclusão.
Círculo espírita de Tours - Discurso do presidente na sessão de instalação
(Terça-feira, 12 de novembro de 1862)
“Senhores,
“Inicialmente, devo agradecer aos Espíritos protetores de nossa pequena sociedade nascente a minha designação para vossa presidência. Tratarei de justificar a escolha, que me honra, velando escrupulosamente para que os trabalhos de nossas reuniões tenham sempre um caráter sério e moral, objetivo que jamais devemos perder de vista, sob pena de nos expormos a muitas decepções.
“Que vimos buscar aqui, senhores, longe do bulício dos negócios mundanos? O conhecimento de nossos destinos. Sim, todos quantos estamos neste modesto círculo, que crescerá e que se elevará, assim espero, pela grandeza e altura do objetivo que perseguimos, cedemos ao desejo muito natural de rasgar o véu espesso que oculta aos pobres humanos o temível mistério da morte, e de saber se é verdade, como ensina uma falsa ciência, e como creem tantos infelizes Espíritos tresmalhados, que o túmulo fecha o livro dos destinos do homem.
“Bem sei que Deus colocou no coração de cada um, um facho destinado a clarear seus passos pelos rudes caminhos da vida: a razão, e uma balança para pesar todas as coisas em seu justo valor: a justiça. Mas quando a viva e pura luz desse facho diretor se enfraquece mais e mais, ao sopro impuro das paixões pervertidas, ela está a ponto de extinguir-se. Quando essa balança da Justiça é viciada pelo erro e pela mentira; quando o cancro do materialismo, após invadir tudo, até as religiões, ameaça tudo devorar, é necessário que o Supremo Juiz venha enfim, por prodígios de sua onipotência e por manifestações insólitas capazes de chamar a atenção violentamente, endireitar os caminhos da Humanidade e retirá-la do abismo.
“No ponto de degradação moral em que tombaram as sociedades modernas, sob a influência de falsas e perniciosas doutrinas toleradas, senão encorajadas, exatamente por aqueles que têm a missão de reprimi-las; no meio desse indiferentismo geral por tudo quanto não é matéria; desse sensualismo extremo, exclusivo; desse furor, antes desconhecido, de enriquecimento a qualquer preço; desse culto desenfreado do bezerro de ouro; dessa desordenada paixão do lucro, que engendra o egoísmo, gela todos os corações falseando todas as inteligências, e tende à dissolução dos laços sociais, as comunicações de além-túmulo podem ser consideradas como uma revelação divina, necessária para a chamada à ordem por parte da Providência, que não pode deixar perecer sem socorro sua criatura predileta. Com a rapidez que se expandem em todos os pontos do globo os ensinamentos da Doutrina Espírita, fácil é prever que a hora se aproxima em que a Humanidade, depois de um compasso de espera, vai transpor uma nova etapa, passar a uma nova fase de desenvolvimento na sua progressão intermitente através dos séculos.
“Quanto a nós, senhores, agradeçamos à Providência por nos haver escolhido para espalhar e fazer frutificar neste recanto da Terra a semente espírita, e assim cooperar, na medida de nossas forças, na grande obra da regeneração moral que se prepara.
“Eu me ocupo, neste momento, a propósito de uma questão médica, alguns dentre vós o sabem, de um trabalho filosófico importante, no qual tento explicar racionalmente os fenômenos fisiológicos do Espiritismo e ligá-los à filosofia geral. Antes de publicar esse trabalho, essencialmente antimaterialista, que ainda não passa de um esboço, proponho-me submetê-lo à vossa apreciação, a fim de tomar vosso conselho quanto à oportunidade de submeter à aprovação dos Espíritos elevados que têm a bondade de nos assistir, os principais pontos de doutrina que ele encerra.
Além do mais, ali poderemos encontrar, previamente e metodicamente dispostas, a maior parte das questões que devem constituir o tema de nossas conversas espíritas.
“Jamais devemos perder de vista, senhores, o fim essencial do Espiritismo, que é a destruição do materialismo pela prova experimental da sobrevivência da alma humana. Se os mortos respondem ao nosso chamado, se se põem em comunicação conosco, é que evidentemente eles não estão mortos de fato; é que o último estertor da agonia não lhes marcou o termo definitivo de sua existência. Todos os sermões do mundo não valem, a tal respeito, um argumento como este.
“É por isto que é dever nosso, de crentes, espalhar a luz em volta de nós e não encerrá-la sob o alqueire, isto é, neste pequeno recinto que, ao contrário, por nosso zelo deve tornar-se um foco de irradiação. Isto quer dizer que deveríamos convidar todo mundo às nossas reuniões, acolher o primeiro que manifeste curiosidade de nos ver em atividade, como se se tratasse de ver um prestidigitador operando? Seria irrefletidamente expor às chances do ridículo a coisa mais séria do mundo, e nós mesmos nos comprometermos. Mas sempre que uma pessoa, de cuja boa-fé não temos motivo de suspeita, tiver adquirido noções do Espiritismo na leitura de obras especiais e deseje presenciar os fatos, devemos satisfazer-lhe o pedido. Apenas será bom regular essas admissões e não admitir em nossas sessões pessoas estranhas, sem que a sociedade, consultada, tenha dado autorização prévia.
“Senhores, quando, há dois anos apenas, constatávamos, com um dos nossos sócios, em casa de um amigo comum, os fenômenos espíritas de ordem mecânica e intelectual mais admiráveis, a despeito da evidência dos fatos que testemunhávamos, e a despeito de nossa convicção profunda de que essas manifestações extraordinárias se passavam fora das leis naturais conhecidas, apenas ousáramos expor timidamente os nossos conhecimentos íntimos, tamanho era o receio que pusessem em dúvida a integridade de nossa razão. O Livro dos Espíritos, então pouco conhecido em Tours, ainda estava na primeira ou na segunda edição. Naquela época, numa palavra, quase não havia transposto os limites da capital. Ora, vede que imenso progresso no espaço de três anos! Hoje o Espiritismo penetrou em toda a parte; tem adeptos em todas as camadas sociais; reuniões e grupos mais ou menos numerosos organizam-se em todas as cidades, grandes e pequenas, esperando a vez das aldeias. Hoje as obras espíritas são expostas em todos os livreiros, que têm dificuldade em atender à demanda da clientela, ávida de iniciar-se nos grandes mistérios das evocações. Hoje, enfim, o Espiritismo vulgarizado, de todos conhecido de alguma forma, não é mais um espantalho, um signo de reprovação ou de desdém, e podemos ousadamente, sem receio de passar por loucos, revelar a finalidade de nossas reuniões. Podemos desafiar a troça e o sarcasmo e dizer aos brincalhões: ‘Antes de nos pôr em ridículo, ao menos nos contem e nos pesem.’
“Quanto ao anátema de um partido, avaliamos bem o seu pequeno alcance para nos inquietarmos. Dizem que fizemos pacto com o diabo. Seja. Mas, então, há que convir que nem todos os diabos são maus. Aos seus olhos, o nosso verdadeiro crime é a nossa pretensão, certamente muito legítima, de nos comunicarmos com Deus e seus santos, sem a sua intermediação obrigatória.
“Provemos-lhes que, graças aos ensinamentos dos que eles chamam demônios, nós compreendemos a moral sublime do Evangelho, que se resume no amor a Deus e aos nossos semelhantes e na caridade universal. Abraçamos a Humanidade inteira, sem distinção de culto, de raça, de origem, e, com mais forte razão, de família, de fortuna e de condição social. Que saibam que o nosso Deus, o dos espíritas, não é um tirano cruel e vingativo que pune um instante de desvio com torturas eternas, mas um pai bom e misericordioso que vela por seus filhos desviados, com uma solicitude incessante e procura atraí-los a si por uma série de provas destinadas a lavá-los de todas as manchas. Não está escrito que Deus não quer a morte do pecador, mas a sua conversão?
“Além disso, nós nos reservamos expressamente, aqui como em qualquer parte, os direitos imprescritíveis da razão que deve tudo dominar e tudo julgar em última instância. Não dizemos aos recalcitrantes, conduzindo-os ao pé da fogueira: Crê ou morre, mas, crê, se tua razão o quer.
“Ainda uma palavra para terminar, senhores, pois não quero abusar de vossa atenção. Não tendo, nem podendo ter nossa sociedade outro fim senão a nossa instrução e o nosso melhoramento moral, devemos afastar de nossas reuniões, com o maior cuidado, toda questão ligada direta ou indiretamente a pessoas, à política e aos interesses materiais.
“Estudo do homem em relação ao seu destino futuro, tal o nosso programa, do qual jamais nos devemos separar.”
“Inicialmente, devo agradecer aos Espíritos protetores de nossa pequena sociedade nascente a minha designação para vossa presidência. Tratarei de justificar a escolha, que me honra, velando escrupulosamente para que os trabalhos de nossas reuniões tenham sempre um caráter sério e moral, objetivo que jamais devemos perder de vista, sob pena de nos expormos a muitas decepções.
“Que vimos buscar aqui, senhores, longe do bulício dos negócios mundanos? O conhecimento de nossos destinos. Sim, todos quantos estamos neste modesto círculo, que crescerá e que se elevará, assim espero, pela grandeza e altura do objetivo que perseguimos, cedemos ao desejo muito natural de rasgar o véu espesso que oculta aos pobres humanos o temível mistério da morte, e de saber se é verdade, como ensina uma falsa ciência, e como creem tantos infelizes Espíritos tresmalhados, que o túmulo fecha o livro dos destinos do homem.
“Bem sei que Deus colocou no coração de cada um, um facho destinado a clarear seus passos pelos rudes caminhos da vida: a razão, e uma balança para pesar todas as coisas em seu justo valor: a justiça. Mas quando a viva e pura luz desse facho diretor se enfraquece mais e mais, ao sopro impuro das paixões pervertidas, ela está a ponto de extinguir-se. Quando essa balança da Justiça é viciada pelo erro e pela mentira; quando o cancro do materialismo, após invadir tudo, até as religiões, ameaça tudo devorar, é necessário que o Supremo Juiz venha enfim, por prodígios de sua onipotência e por manifestações insólitas capazes de chamar a atenção violentamente, endireitar os caminhos da Humanidade e retirá-la do abismo.
“No ponto de degradação moral em que tombaram as sociedades modernas, sob a influência de falsas e perniciosas doutrinas toleradas, senão encorajadas, exatamente por aqueles que têm a missão de reprimi-las; no meio desse indiferentismo geral por tudo quanto não é matéria; desse sensualismo extremo, exclusivo; desse furor, antes desconhecido, de enriquecimento a qualquer preço; desse culto desenfreado do bezerro de ouro; dessa desordenada paixão do lucro, que engendra o egoísmo, gela todos os corações falseando todas as inteligências, e tende à dissolução dos laços sociais, as comunicações de além-túmulo podem ser consideradas como uma revelação divina, necessária para a chamada à ordem por parte da Providência, que não pode deixar perecer sem socorro sua criatura predileta. Com a rapidez que se expandem em todos os pontos do globo os ensinamentos da Doutrina Espírita, fácil é prever que a hora se aproxima em que a Humanidade, depois de um compasso de espera, vai transpor uma nova etapa, passar a uma nova fase de desenvolvimento na sua progressão intermitente através dos séculos.
“Quanto a nós, senhores, agradeçamos à Providência por nos haver escolhido para espalhar e fazer frutificar neste recanto da Terra a semente espírita, e assim cooperar, na medida de nossas forças, na grande obra da regeneração moral que se prepara.
“Eu me ocupo, neste momento, a propósito de uma questão médica, alguns dentre vós o sabem, de um trabalho filosófico importante, no qual tento explicar racionalmente os fenômenos fisiológicos do Espiritismo e ligá-los à filosofia geral. Antes de publicar esse trabalho, essencialmente antimaterialista, que ainda não passa de um esboço, proponho-me submetê-lo à vossa apreciação, a fim de tomar vosso conselho quanto à oportunidade de submeter à aprovação dos Espíritos elevados que têm a bondade de nos assistir, os principais pontos de doutrina que ele encerra.
Além do mais, ali poderemos encontrar, previamente e metodicamente dispostas, a maior parte das questões que devem constituir o tema de nossas conversas espíritas.
“Jamais devemos perder de vista, senhores, o fim essencial do Espiritismo, que é a destruição do materialismo pela prova experimental da sobrevivência da alma humana. Se os mortos respondem ao nosso chamado, se se põem em comunicação conosco, é que evidentemente eles não estão mortos de fato; é que o último estertor da agonia não lhes marcou o termo definitivo de sua existência. Todos os sermões do mundo não valem, a tal respeito, um argumento como este.
“É por isto que é dever nosso, de crentes, espalhar a luz em volta de nós e não encerrá-la sob o alqueire, isto é, neste pequeno recinto que, ao contrário, por nosso zelo deve tornar-se um foco de irradiação. Isto quer dizer que deveríamos convidar todo mundo às nossas reuniões, acolher o primeiro que manifeste curiosidade de nos ver em atividade, como se se tratasse de ver um prestidigitador operando? Seria irrefletidamente expor às chances do ridículo a coisa mais séria do mundo, e nós mesmos nos comprometermos. Mas sempre que uma pessoa, de cuja boa-fé não temos motivo de suspeita, tiver adquirido noções do Espiritismo na leitura de obras especiais e deseje presenciar os fatos, devemos satisfazer-lhe o pedido. Apenas será bom regular essas admissões e não admitir em nossas sessões pessoas estranhas, sem que a sociedade, consultada, tenha dado autorização prévia.
“Senhores, quando, há dois anos apenas, constatávamos, com um dos nossos sócios, em casa de um amigo comum, os fenômenos espíritas de ordem mecânica e intelectual mais admiráveis, a despeito da evidência dos fatos que testemunhávamos, e a despeito de nossa convicção profunda de que essas manifestações extraordinárias se passavam fora das leis naturais conhecidas, apenas ousáramos expor timidamente os nossos conhecimentos íntimos, tamanho era o receio que pusessem em dúvida a integridade de nossa razão. O Livro dos Espíritos, então pouco conhecido em Tours, ainda estava na primeira ou na segunda edição. Naquela época, numa palavra, quase não havia transposto os limites da capital. Ora, vede que imenso progresso no espaço de três anos! Hoje o Espiritismo penetrou em toda a parte; tem adeptos em todas as camadas sociais; reuniões e grupos mais ou menos numerosos organizam-se em todas as cidades, grandes e pequenas, esperando a vez das aldeias. Hoje as obras espíritas são expostas em todos os livreiros, que têm dificuldade em atender à demanda da clientela, ávida de iniciar-se nos grandes mistérios das evocações. Hoje, enfim, o Espiritismo vulgarizado, de todos conhecido de alguma forma, não é mais um espantalho, um signo de reprovação ou de desdém, e podemos ousadamente, sem receio de passar por loucos, revelar a finalidade de nossas reuniões. Podemos desafiar a troça e o sarcasmo e dizer aos brincalhões: ‘Antes de nos pôr em ridículo, ao menos nos contem e nos pesem.’
“Quanto ao anátema de um partido, avaliamos bem o seu pequeno alcance para nos inquietarmos. Dizem que fizemos pacto com o diabo. Seja. Mas, então, há que convir que nem todos os diabos são maus. Aos seus olhos, o nosso verdadeiro crime é a nossa pretensão, certamente muito legítima, de nos comunicarmos com Deus e seus santos, sem a sua intermediação obrigatória.
“Provemos-lhes que, graças aos ensinamentos dos que eles chamam demônios, nós compreendemos a moral sublime do Evangelho, que se resume no amor a Deus e aos nossos semelhantes e na caridade universal. Abraçamos a Humanidade inteira, sem distinção de culto, de raça, de origem, e, com mais forte razão, de família, de fortuna e de condição social. Que saibam que o nosso Deus, o dos espíritas, não é um tirano cruel e vingativo que pune um instante de desvio com torturas eternas, mas um pai bom e misericordioso que vela por seus filhos desviados, com uma solicitude incessante e procura atraí-los a si por uma série de provas destinadas a lavá-los de todas as manchas. Não está escrito que Deus não quer a morte do pecador, mas a sua conversão?
“Além disso, nós nos reservamos expressamente, aqui como em qualquer parte, os direitos imprescritíveis da razão que deve tudo dominar e tudo julgar em última instância. Não dizemos aos recalcitrantes, conduzindo-os ao pé da fogueira: Crê ou morre, mas, crê, se tua razão o quer.
“Ainda uma palavra para terminar, senhores, pois não quero abusar de vossa atenção. Não tendo, nem podendo ter nossa sociedade outro fim senão a nossa instrução e o nosso melhoramento moral, devemos afastar de nossas reuniões, com o maior cuidado, toda questão ligada direta ou indiretamente a pessoas, à política e aos interesses materiais.
“Estudo do homem em relação ao seu destino futuro, tal o nosso programa, do qual jamais nos devemos separar.”
CHAUVET Doutor em medicina.
Segue a esse discurso a comunicação espontânea abaixo transcrita, recebida por um dos médiuns da sociedade:
“Meus amigos, a finalidade de vossa sociedade é de vos instruirdes e trazer o homem tresmalhado à luz, que há tanto tempo é obscurecida pela treva que reina neste século. Não deveis olhar esta Instituição como se ele tivesse vindo instruir-vos sobre questões de Direito ou Ciência. Ela vem pura e simplesmente para vos dispor a entrar na nova via da regeneração que deveis percorrer sem medo, pondo vossa confiança nas instruções que recebereis. Nada deveis temer, porque Deus vela pelo homem que faz o bem e não o abandona.
“Eu vos ouvi discutir a propósito de um artigo do regulamento de admissão de pessoas estranhas em vossa sociedade. Escutai um pouco os conselhos de um amigo, ou antes, do irmão que vos fala, não de boca, mas do coração, não materialmente, mas espiritualmente, porque, crede-o, quando para vir até vós transponho todos os graus de Espíritos impuros, o espaço a percorrer não me parece penoso se vejo vosso coração animado de sentimentos do bem.
“Quando um estranho pedir para assistir às vossas sessões, antes de admiti-lo, fazei-o vir em particular ao vosso gabinete e, na conversa, sondai os seus sentimentos e vede se está instruído na nova doutrina. Se nele descobrirdes o desejo do bem e não simples curiosidade; se vem animado de intenções sérias, então podeis admiti-lo sem receio. Mas repeli quem quer que venha com o pensamento de perturbar a sessão e desprezar os vossos ensinos. Pensai também que os espiões se insinuam por toda a parte: Jesus o teve.
“Se alguém se apresenta dizendo-se espírita ou médium, não o recebais sem saber com quem estais lidando. Não ignorais que há médiuns cheios de frivolidade e de orgulho e que, por isso mesmo, só atraem Espíritos levianos. Diz-se sempre que semelhante atrai semelhante. Um verdadeiro espírita não deve ter outro sentimento senão o do bem e da caridade, sem o que não pode ser assistido por Espíritos elevados.
“Sem dúvida a perda de um médium pode deixar um vazio entre vós, mas, por isso, não se deve crer que não tereis mais instruções nossas, porque estaremos sempre prontos a vir assistir-vos nos trabalhos, sempre que Deus o permita. Se um bom médium vos é tirado, é que certamente Deus o destina a outra missão, que julga mais útil. Quem sabe o que o espera? Há coisas que o homem não pode compreender, mas que deve aceitar.
“O caminho que ides percorrer, meus amigos, é difícil de subir, mas, com a ajuda dos vossos irmãos que estão acima de vós, conseguireis.
“Espero numa outra oportunidade vos instruir sobre questões mais sérias.”
“Meus amigos, a finalidade de vossa sociedade é de vos instruirdes e trazer o homem tresmalhado à luz, que há tanto tempo é obscurecida pela treva que reina neste século. Não deveis olhar esta Instituição como se ele tivesse vindo instruir-vos sobre questões de Direito ou Ciência. Ela vem pura e simplesmente para vos dispor a entrar na nova via da regeneração que deveis percorrer sem medo, pondo vossa confiança nas instruções que recebereis. Nada deveis temer, porque Deus vela pelo homem que faz o bem e não o abandona.
“Eu vos ouvi discutir a propósito de um artigo do regulamento de admissão de pessoas estranhas em vossa sociedade. Escutai um pouco os conselhos de um amigo, ou antes, do irmão que vos fala, não de boca, mas do coração, não materialmente, mas espiritualmente, porque, crede-o, quando para vir até vós transponho todos os graus de Espíritos impuros, o espaço a percorrer não me parece penoso se vejo vosso coração animado de sentimentos do bem.
“Quando um estranho pedir para assistir às vossas sessões, antes de admiti-lo, fazei-o vir em particular ao vosso gabinete e, na conversa, sondai os seus sentimentos e vede se está instruído na nova doutrina. Se nele descobrirdes o desejo do bem e não simples curiosidade; se vem animado de intenções sérias, então podeis admiti-lo sem receio. Mas repeli quem quer que venha com o pensamento de perturbar a sessão e desprezar os vossos ensinos. Pensai também que os espiões se insinuam por toda a parte: Jesus o teve.
“Se alguém se apresenta dizendo-se espírita ou médium, não o recebais sem saber com quem estais lidando. Não ignorais que há médiuns cheios de frivolidade e de orgulho e que, por isso mesmo, só atraem Espíritos levianos. Diz-se sempre que semelhante atrai semelhante. Um verdadeiro espírita não deve ter outro sentimento senão o do bem e da caridade, sem o que não pode ser assistido por Espíritos elevados.
“Sem dúvida a perda de um médium pode deixar um vazio entre vós, mas, por isso, não se deve crer que não tereis mais instruções nossas, porque estaremos sempre prontos a vir assistir-vos nos trabalhos, sempre que Deus o permita. Se um bom médium vos é tirado, é que certamente Deus o destina a outra missão, que julga mais útil. Quem sabe o que o espera? Há coisas que o homem não pode compreender, mas que deve aceitar.
“O caminho que ides percorrer, meus amigos, é difícil de subir, mas, com a ajuda dos vossos irmãos que estão acima de vós, conseguireis.
“Espero numa outra oportunidade vos instruir sobre questões mais sérias.”
FÉNELON
Variedade - Cura por um Espírito
Recebemos várias cartas constatando a boa aplicação do remédio indicado na Revista Espírita de novembro de 1862, cuja receita foi dada por um Espírito. Um oficial de cavalaria nos disse que o farmacêutico de seu regimento teve o cuidado de prepará-la para os casos mais frequentes de coices dados pelos cavalos. Sabemos que outros farmacêuticos fizeram o mesmo em certas cidades.
A propósito da origem do remédio, um assinante de Eure-et-Loir comunica-nos o seguinte fato, de seu conhecimento pessoal:
“Autheusel, 6 de novembro de 1862
“Um homem doente, chamado Paquine, que mora numa comuna próxima, veio ver-me, há um mês, andando de muletas. Admirado de vê-lo assim, indaguei do acidente. Respondeu-me que há algum tempo suas pernas estavam demasiadamente inchadas e cobertas de úlceras, e que nenhum remédio fazia efeito.
“Esse homem é espírita e tem alguma mediunidade. Disse-lhe que era necessário dirigir-se a Espíritos bons e fazê-lo com fervor. No dia de Todos os Santos vi-o na missa, com uma simples bengala. No dia seguinte veio ver-me e contou o seguinte:
“─ Senhor, disse ele, desde que me recomendou empregar os bons Espíritos para obter a cura, não deixei uma noite, e algumas vezes durante o dia, de invocá-los e de lhes mostrar quanto o meu mal me trazia dificuldades para ganhar a vida. Havia apenas cinco ou seis dias que assim orava quando uma noite, estando adormecido, apareceu-me no meio do quarto um homem todo de branco. Ele avançou para o meu aparador e pegou um boião, no qual havia graxa de que eu me servia para aliviar as dores das pernas. Mostrou-me o boião e depois, tomando fumo que eu conservava sobre um papel, mostrou-me também. Em seguida foi buscar um vidro com extrato de saturno, depois uma garrafa com essência de terebintina. Mostrando tudo, indicou-me que era preciso fazer uma mistura. Indicou-me a dose, despejando-a no boião. Depois de fazer sinais de amizade, desapareceu. No dia seguinte fiz o que o Espírito havia indicado e desde então as pernas entraram em excelente via de cura. Hoje só me resta uma inchação no pé, que desaparece aos poucos, pela eficácia do remédio. Espero em breve estar curado.
“Eis, senhores, um fato que quase poderia ser classificado como cura milagrosa, e creio que seria levar longe o espírito de partido para ver aí um fato demoníaco.
“Examinando a vulgaridade e quase sempre a simplicidade dos remédios indicados pelos Espíritos em geral, eu me pergunto se daí não seria possível concluir que o remédio em si não passa de simples fórmula e que é a influência fluídica do Espírito que opera a cura. Penso que a questão poderia ser estudada.
“L. DE TARRAGON.”
A propósito da origem do remédio, um assinante de Eure-et-Loir comunica-nos o seguinte fato, de seu conhecimento pessoal:
“Autheusel, 6 de novembro de 1862
“Um homem doente, chamado Paquine, que mora numa comuna próxima, veio ver-me, há um mês, andando de muletas. Admirado de vê-lo assim, indaguei do acidente. Respondeu-me que há algum tempo suas pernas estavam demasiadamente inchadas e cobertas de úlceras, e que nenhum remédio fazia efeito.
“Esse homem é espírita e tem alguma mediunidade. Disse-lhe que era necessário dirigir-se a Espíritos bons e fazê-lo com fervor. No dia de Todos os Santos vi-o na missa, com uma simples bengala. No dia seguinte veio ver-me e contou o seguinte:
“─ Senhor, disse ele, desde que me recomendou empregar os bons Espíritos para obter a cura, não deixei uma noite, e algumas vezes durante o dia, de invocá-los e de lhes mostrar quanto o meu mal me trazia dificuldades para ganhar a vida. Havia apenas cinco ou seis dias que assim orava quando uma noite, estando adormecido, apareceu-me no meio do quarto um homem todo de branco. Ele avançou para o meu aparador e pegou um boião, no qual havia graxa de que eu me servia para aliviar as dores das pernas. Mostrou-me o boião e depois, tomando fumo que eu conservava sobre um papel, mostrou-me também. Em seguida foi buscar um vidro com extrato de saturno, depois uma garrafa com essência de terebintina. Mostrando tudo, indicou-me que era preciso fazer uma mistura. Indicou-me a dose, despejando-a no boião. Depois de fazer sinais de amizade, desapareceu. No dia seguinte fiz o que o Espírito havia indicado e desde então as pernas entraram em excelente via de cura. Hoje só me resta uma inchação no pé, que desaparece aos poucos, pela eficácia do remédio. Espero em breve estar curado.
“Eis, senhores, um fato que quase poderia ser classificado como cura milagrosa, e creio que seria levar longe o espírito de partido para ver aí um fato demoníaco.
“Examinando a vulgaridade e quase sempre a simplicidade dos remédios indicados pelos Espíritos em geral, eu me pergunto se daí não seria possível concluir que o remédio em si não passa de simples fórmula e que é a influência fluídica do Espírito que opera a cura. Penso que a questão poderia ser estudada.
“L. DE TARRAGON.”
A última questão não nos parece duvidosa, sobretudo quando se conhecem as propriedades que a ação magnética pode dar às substâncias mais benignas, como a água, por exemplo. Ora, como os Espíritos magnetizam também, eles certamente podem, conforme as circunstâncias, dar propriedades curativas a certas substâncias. Se o Espiritismo revela todo um mundo de seres pensando e agindo, revela, também, forças materiais desconhecidas, que um dia serão aproveitadas pela Ciência.
Dissertações espíritas - Paz aos homens de boa vontade
(Poitiers, reunião preparatória de operários espíritas - Médium: Sr. X...)
Meus caros amigos, a vida é curta. Grande é o que a precede e o que a sucede. Nada acontece senão pela vontade de Deus. Nada é, portanto, senão legítima e alta justiça. Vossa miséria, quando vos aperta, é um mal merecido, uma punição, não tenhais dúvida, de faltas anteriores. Encarai-a bravamente e levai os olhos ao alto com resignação. A bênção e o alívio descerão.
Por vezes vossos pesares são a prova pedida pelo vosso Espírito, por vosso Espírito desejoso de chegar prontamente ao objetivo final, sempre entrevisto no estado de não encarnado.
No momento em que o mundo se agita e sofre, em que as sociedades, em busca do que é verdadeiro, se contorce num parto laborioso, Deus permite que o Espiritismo, isto é, um raio da eterna verdade, desça das altas regiões e vos esclareça. Nosso objetivo é mostrar-vos o caminho, mas deixar-vos a liberdade, isto é, o mérito e o demérito de vossas ações. Escutai-nos, pois, e ficai certos de que a vossa felicidade é para nós uma viva preocupação. Se soubésseis quanto vossas más ações nos afligem; quanto os vossos esforços para a lei de Deus nos enchem de alegria!
O Senhor nos disse: “Servidores do meu império, apóstolos dedicados da minha lei, a todos levai a minha palavra; a todos explicai que a vida eterna será a dos que praticam o Evangelho; a todos os homens fazei entender que o bem, o belo, o grande, degraus de minha eternidade, estão contidos numa palavra: Amor.”
O Senhor nos disse: “Espíritos velozes, correi a todos: aos mais infelizes e aos mais felizes; do rei ao artesão; do fariseu ao que se queima em fé ardente”. E nós vamos a todos os lados e gritamos aos infelizes: resignação; aos felizes: caridade, humildade; aos reis: amor aos povos; ao artesão: respeito à lei!
Meus amigos, no dia em que fizerdes mais que nos escutar, isto é, no dia em que praticardes os preceitos, não mais egoísmo, não mais inveja. Partindo daí, não mais misérias, não mais esse luxo que é o verme que rói as sociedades e as destrói; não mais esses erros morais que perturbam as consciências; não mais revoluções, não mais sangue! Não mais esse triste preconceito que fez com que por muito tempo se acreditasse, nas famílias principescas, que o povo era uma coisa que lhes pertencia e que elas tinham um sangue diferente do sangue do povo. Nada além da felicidade!
Vossos governos serão bons, porque governantes e governados terão tirado proveito do Espiritismo. As Ciências e as Artes, levadas nas asas da divina caridade, elevar-se-ão a uma altura que não suspeitais. Vosso clima, saneado pelos trabalhos agrícolas; vossas colheitas mais abundantes; as palavras tão profundas de igualdade e fraternidade enfim interpretadas sem que ninguém sonhe despojar aquele que possui, realizarão, vo-lo afirmo, as promessas do vosso Deus.
“Paz, disse o seu Cristo, aos homens de boa vontade!” Não tivestes a paz porque não tivestes a boa vontade. A boa vontade, tanto para os pobres quanto para os ricos, chama-se caridade. Há caridade moral, como há caridade material, e não a tivestes, e o pobre foi tão culpado quanto o rico!
Escutai-me bem: Crede e amai!
Amai: Muito será perdoado a quem muito amou.
Crede: A fé transporta montanhas.
Prudência e doçura no apostolado novo: Vossa melhor prédica será o bom exemplo.
Lamentai os cegos: os que não querem ver a luz. Lamentai, mas não censureis.
Orai, meus amigos, e a bênção de Deus será com as vossas almas. O facho da vida irradia; em todos os lados do horizonte acendem-se faróis; a tempestade vai sacudir e talvez quebrar os barcos! Mas o piloto que sobre a vaga furiosa olhar sempre o farol, chegará à praia e o Senhor lhe dirá: “Paz aos homens de boa vontade; sê bendito, tu que amaste; sê feliz, pois trabalhaste pela felicidade de outrem. Meu filho, a cada um segundo suas obras!”
Por vezes vossos pesares são a prova pedida pelo vosso Espírito, por vosso Espírito desejoso de chegar prontamente ao objetivo final, sempre entrevisto no estado de não encarnado.
No momento em que o mundo se agita e sofre, em que as sociedades, em busca do que é verdadeiro, se contorce num parto laborioso, Deus permite que o Espiritismo, isto é, um raio da eterna verdade, desça das altas regiões e vos esclareça. Nosso objetivo é mostrar-vos o caminho, mas deixar-vos a liberdade, isto é, o mérito e o demérito de vossas ações. Escutai-nos, pois, e ficai certos de que a vossa felicidade é para nós uma viva preocupação. Se soubésseis quanto vossas más ações nos afligem; quanto os vossos esforços para a lei de Deus nos enchem de alegria!
O Senhor nos disse: “Servidores do meu império, apóstolos dedicados da minha lei, a todos levai a minha palavra; a todos explicai que a vida eterna será a dos que praticam o Evangelho; a todos os homens fazei entender que o bem, o belo, o grande, degraus de minha eternidade, estão contidos numa palavra: Amor.”
O Senhor nos disse: “Espíritos velozes, correi a todos: aos mais infelizes e aos mais felizes; do rei ao artesão; do fariseu ao que se queima em fé ardente”. E nós vamos a todos os lados e gritamos aos infelizes: resignação; aos felizes: caridade, humildade; aos reis: amor aos povos; ao artesão: respeito à lei!
Meus amigos, no dia em que fizerdes mais que nos escutar, isto é, no dia em que praticardes os preceitos, não mais egoísmo, não mais inveja. Partindo daí, não mais misérias, não mais esse luxo que é o verme que rói as sociedades e as destrói; não mais esses erros morais que perturbam as consciências; não mais revoluções, não mais sangue! Não mais esse triste preconceito que fez com que por muito tempo se acreditasse, nas famílias principescas, que o povo era uma coisa que lhes pertencia e que elas tinham um sangue diferente do sangue do povo. Nada além da felicidade!
Vossos governos serão bons, porque governantes e governados terão tirado proveito do Espiritismo. As Ciências e as Artes, levadas nas asas da divina caridade, elevar-se-ão a uma altura que não suspeitais. Vosso clima, saneado pelos trabalhos agrícolas; vossas colheitas mais abundantes; as palavras tão profundas de igualdade e fraternidade enfim interpretadas sem que ninguém sonhe despojar aquele que possui, realizarão, vo-lo afirmo, as promessas do vosso Deus.
“Paz, disse o seu Cristo, aos homens de boa vontade!” Não tivestes a paz porque não tivestes a boa vontade. A boa vontade, tanto para os pobres quanto para os ricos, chama-se caridade. Há caridade moral, como há caridade material, e não a tivestes, e o pobre foi tão culpado quanto o rico!
Escutai-me bem: Crede e amai!
Amai: Muito será perdoado a quem muito amou.
Crede: A fé transporta montanhas.
Prudência e doçura no apostolado novo: Vossa melhor prédica será o bom exemplo.
Lamentai os cegos: os que não querem ver a luz. Lamentai, mas não censureis.
Orai, meus amigos, e a bênção de Deus será com as vossas almas. O facho da vida irradia; em todos os lados do horizonte acendem-se faróis; a tempestade vai sacudir e talvez quebrar os barcos! Mas o piloto que sobre a vaga furiosa olhar sempre o farol, chegará à praia e o Senhor lhe dirá: “Paz aos homens de boa vontade; sê bendito, tu que amaste; sê feliz, pois trabalhaste pela felicidade de outrem. Meu filho, a cada um segundo suas obras!”
F. D.
Antigo magistrado
Antigo magistrado
Poesia Espírita - O doente e o médico
Conto dedicado ao Sr. redator do Renard, de Bordeaux, pelo Espírito batedor de Carcassone.
“Não aguento mais, doutor; é muito forte!
Exclamava outro dia o Sr. Rochefort.
Tome o pulso, doutor, estou doente;
O mundo inteiro está esmaniado. Parece que Deus não sabe o seu ofício.
Ele baixa... e eu maldigo o mundo inteiro.
Pra começo o vapor...
É assim que se caminha?
Que foi o que restou da gostosa berlinda,
Quando sem risco de partir o pescoço,
Nós íamos em bando, de Paris até Sceaux?
Fala-se de progresso!...
Doutor, isto é ridículo!
Passando para trás o planeta recua.
Um caos.....
Um cabo, um fio de ferro,
De Calais a Pequim tagarela no mar.
Um alfaiate costura sem agulhas;
Da água fazem fogo; do algodão, pólvora;
Um troca-tintas sem pincel mas com caixa
Vende retratos fabricados ao sol!
Glória, glória ao passado! Neste século frívolo,
A igualdade berra; o povo é que fala!
Resolveu Sabescrever em Bordeaux!
Veja, doutor, tudo está transtornado.
Eu hei de descobrir a pista dos patifes!
Diabo! E avisarei ao chefe da Etincelle.
É lá que, espada em punho, um crânio nos defende.
Não é tudo, doutor, ó escândalo! Pretendem
Que, seguindo o bom do La Fontaine,
Um morto, um Espírito, nos meta a palmatória.”
Aqui Rochefort cuspiu, depois continuou:
─ Doutor, de boa-fé, acredita em Espírito?
─ Báh! lhe diz o doutor, fingindo bom apóstolo,
Em Espírito?
Meu caro eu não creio... nem mesmo no seu.
NOTA: Este conto, cujo mérito cabe ao leitor julgar, foi obtido espontaneamente pela tiptologia, como outros belos versos pelo mesmo médium, a propósito de um espirituoso artigo do Sr. Aug. Bez, publicado no Renard, que deseja abrir suas colunas aos adeptos do Espiritismo. O Etincelle (centelha) é um outro jornal de Bordeaux, redigido pelo Sr. de Rattier, e que lança flechas incendiárias contra o Espiritismo, mas que, até agora, só conseguiu uma luz semelhante à das centelhas dos fogos de artifício, que se apagam antes de tocar a terra. Quanto ao Sr. de Rochefort, certamente achará a poesia malsã.
Subscrição ruanesa
Pagamentos feitos no escritório da Revista Espírita em 27 de Janeiro 1863:
Sociedade Espírita de Paris: 423 francos; Príncipe da Geórgia, 20 fr.; Srs. Aumont, livreiros, 5 fr.; Courtois, 2 fr.; Dolé, desenhista-litog., 5 fr.; Roger, 20 fr.; Yvose, 10 fr.; Sra. Hilaire, 20 fr. TOTAL: 505,00 fr.
Sociedades e grupos espíritas: de Sens, 60,05 fr.; de Orléans, 40 fr.; de Marennes, 34,50 fr.; de Saint-Malo, 15 fr. ─ Srs. Bodin, (de Cognac), 20 fr.; Borreau (de Niort), 3 fr.; Bitaubé (de Blaye), 5 fr.; Bourgès, lugar-tenente (de Provins), 10 fr.; Blin, cap. (de Marselha), 20 fr.; Lausat (de Condom), 5 fr.; Viseur (de Orthez), 10 fr.; Saint-Martin, arcabuzeiro (de Maubourguet), 5 fr.; Petitjean, alfaiate, e seu ajudante (de Joinville H.-M.), 7 fr.; Auzanneau (de Neuvic), 10 fr.; Lafage (de Tarbes), 5 fr.; Jouffroy (de Gaillon), 6 fr.; Noël (de Bone), 10 fr.; D… (Guelma), 2,50 fr.; N… (Ilha de Ré), 9 fr. ─ de Poitiers: Sr. Barbault de la Motte, antigo magistrado, 100 fr.; Sra. Barbault de la Motte, 100 fr.; Sr. Frothier, escultor, 20 fr.; Sr. Bonvalet, operário, 10 fr. ─ Sociedade Espírita de Montreuil-sur-Mer, 74 fr. TOTAL: 497,05 francos.
Espíritas e colônia francesa de Barcelona (Espanha): Srs. Henri de Vincio, François Nerici, Ernest Lalaux, Ed. Hardy, Désiré Maigrin, Maurice Lachâtre, Srta. Marie Garette, 100 fr. ─ Srs. Achon, Ziegler, Ed. Bettiz, G. Sins, J.-C. Carpentier, Holder, Muller, J. Arto, Devenel, 80 fr.; Srta. Nérici, 5 fr.; Srs. Rovira, pai e filho, 2,60 fr.; Louis Borel, chapeleiro, 5 fr.; Simonnet, ourives, 10 fr.; Srta. Caroline Vignes, 10 fr.; Sra. Guizy, 20 fr.; Srs. Guizy, 30 fr.; E. B., 5 fr.; Emprin, comissário, 10 fr.; Marius Brunos, sapateiro, 5 fr.; Leconte, irmãos, 25 fr.; Hardy, pai, 5 fr.; Flocon, caixeiro-viajante, 5 fr.; Bonsignori, joalheiro, 1 fr.; Louis Pintrau, fundidor, 1 fr.; Canals & Cia., negociantes, 15 fr.; Cousseau & Cia., tapesseiros, 10 fr.; Tasimez Bion, 1 fr.; Subernie, 1 fr.; Dupont, 2 fr.; Irmãos Paul, fabricantes, 50 fr.; Garcerie, novidades, 10 fr.; Senhoras Curel, modas, 10 fr.; Antoinette Fournols, modista, 10 fr.; Srs. Emile Consoles, enfermeiro, 5 fr.; J. Hugon, 10 fr.; Louis Verdereau, novidades, 20 fr.; Torri, chapeleiro, 5 fr.; Joseph Faur, 1 fr.; A. C., 5 fr.; Gustave Fouquel, 1 fr.; Lavallée, 5 fr.; Fournier, 3,75 fr.; J.-J. Maumus, 3 fr.; Thiébault, 2 fr. TOTAL: 489,35 francos. Total Geral: 1.491,40 francos.[1] A subscrição continua aberta.
ALLAN KARDEC
[1] A soma das parcelas não confere com os totais parciais. Deve haver erros de revisão, impossíveis de corrigir. N. do T.
Sociedade Espírita de Paris: 423 francos; Príncipe da Geórgia, 20 fr.; Srs. Aumont, livreiros, 5 fr.; Courtois, 2 fr.; Dolé, desenhista-litog., 5 fr.; Roger, 20 fr.; Yvose, 10 fr.; Sra. Hilaire, 20 fr. TOTAL: 505,00 fr.
Sociedades e grupos espíritas: de Sens, 60,05 fr.; de Orléans, 40 fr.; de Marennes, 34,50 fr.; de Saint-Malo, 15 fr. ─ Srs. Bodin, (de Cognac), 20 fr.; Borreau (de Niort), 3 fr.; Bitaubé (de Blaye), 5 fr.; Bourgès, lugar-tenente (de Provins), 10 fr.; Blin, cap. (de Marselha), 20 fr.; Lausat (de Condom), 5 fr.; Viseur (de Orthez), 10 fr.; Saint-Martin, arcabuzeiro (de Maubourguet), 5 fr.; Petitjean, alfaiate, e seu ajudante (de Joinville H.-M.), 7 fr.; Auzanneau (de Neuvic), 10 fr.; Lafage (de Tarbes), 5 fr.; Jouffroy (de Gaillon), 6 fr.; Noël (de Bone), 10 fr.; D… (Guelma), 2,50 fr.; N… (Ilha de Ré), 9 fr. ─ de Poitiers: Sr. Barbault de la Motte, antigo magistrado, 100 fr.; Sra. Barbault de la Motte, 100 fr.; Sr. Frothier, escultor, 20 fr.; Sr. Bonvalet, operário, 10 fr. ─ Sociedade Espírita de Montreuil-sur-Mer, 74 fr. TOTAL: 497,05 francos.
Espíritas e colônia francesa de Barcelona (Espanha): Srs. Henri de Vincio, François Nerici, Ernest Lalaux, Ed. Hardy, Désiré Maigrin, Maurice Lachâtre, Srta. Marie Garette, 100 fr. ─ Srs. Achon, Ziegler, Ed. Bettiz, G. Sins, J.-C. Carpentier, Holder, Muller, J. Arto, Devenel, 80 fr.; Srta. Nérici, 5 fr.; Srs. Rovira, pai e filho, 2,60 fr.; Louis Borel, chapeleiro, 5 fr.; Simonnet, ourives, 10 fr.; Srta. Caroline Vignes, 10 fr.; Sra. Guizy, 20 fr.; Srs. Guizy, 30 fr.; E. B., 5 fr.; Emprin, comissário, 10 fr.; Marius Brunos, sapateiro, 5 fr.; Leconte, irmãos, 25 fr.; Hardy, pai, 5 fr.; Flocon, caixeiro-viajante, 5 fr.; Bonsignori, joalheiro, 1 fr.; Louis Pintrau, fundidor, 1 fr.; Canals & Cia., negociantes, 15 fr.; Cousseau & Cia., tapesseiros, 10 fr.; Tasimez Bion, 1 fr.; Subernie, 1 fr.; Dupont, 2 fr.; Irmãos Paul, fabricantes, 50 fr.; Garcerie, novidades, 10 fr.; Senhoras Curel, modas, 10 fr.; Antoinette Fournols, modista, 10 fr.; Srs. Emile Consoles, enfermeiro, 5 fr.; J. Hugon, 10 fr.; Louis Verdereau, novidades, 20 fr.; Torri, chapeleiro, 5 fr.; Joseph Faur, 1 fr.; A. C., 5 fr.; Gustave Fouquel, 1 fr.; Lavallée, 5 fr.; Fournier, 3,75 fr.; J.-J. Maumus, 3 fr.; Thiébault, 2 fr. TOTAL: 489,35 francos. Total Geral: 1.491,40 francos.[1] A subscrição continua aberta.
ALLAN KARDEC
[1] A soma das parcelas não confere com os totais parciais. Deve haver erros de revisão, impossíveis de corrigir. N. do T.