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Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1863 > Agosto
Agosto
Vimos, por nossa vez, lançar algumas flores sobre o túmulo recentemente fechado de um homem tão recomendável pelo saber quanto pelas qualidades morais, e ao qual, coisa rara, todos os partidos concordam em fazer justiça.
Jean Reynaud, nascido em Lyon em fevereiro de 1808, morreu em Paris a 28 de junho de 1863. Não poderíamos dar uma ideia mais justa de seu caráter do que reproduzindo o curto e tocante necrológio que seu amigo, Sr. Ernest Legouvé, publicou no Siècle de 30 de junho de 1863:
“A democracia, a filosofia e, não receio dizer, a religião, acabam de sofrer uma perda imensa: Jean Reynaud morreu ontem, após uma curta moléstia. De qualquer ponto de vista que se julguem as suas doutrinas, sua obra, bem como a sua vida, foi eminentemente religiosa, porque tanto sua vida quanto sua obra foram um dos protestos mais eloquentes contra o grande flagelo que nos ameaça: o cepticismo, sob todas as suas formas. Ninguém acreditou mais energicamente na personalidade divina; ninguém acreditou mais energicamente na personalidade humana; ninguém amou mais ardentemente a liberdade. No seu livro Terre et Ciel, que desde o início abriu um sulco tão profundo, e cuja lembrança ir-se-á marcando cada vez mais, nesse livro respira um tal sentimento do infinito, um tal sentimento da presença divina que, pode-se dizer, Deus aí palpita em cada página! E como poderia ser de outro modo, quando aquele que escreveu essas páginas vivia sempre em presença de Deus? Sabemos bem, todos nós que o conhecemos e o amamos, e cujo mais belo título de honra é termos sido amados por tal homem, que ele era uma fonte de vida moral sempre a jorrar. Ninguém podia dele se aproximar sem se firmar melhor no bem; só o seu rosto era uma lição de direitura, de honra, de devotamento. As almas decaídas se perturbavam ante aquele claro olhar, como diante do próprio olho da justiça.
E tudo isto partiu! Partiu em plena força, quando tantas palavras úteis, tão grandes exemplos ainda podiam sair daquela boca, daquele coração!...
“Não choramos Reynaud apenas por nós. Nós o choramos por nosso país inteiro.
“E. LEGOUVÉ”
Jean Reynaud, nascido em Lyon em fevereiro de 1808, morreu em Paris a 28 de junho de 1863. Não poderíamos dar uma ideia mais justa de seu caráter do que reproduzindo o curto e tocante necrológio que seu amigo, Sr. Ernest Legouvé, publicou no Siècle de 30 de junho de 1863:
“A democracia, a filosofia e, não receio dizer, a religião, acabam de sofrer uma perda imensa: Jean Reynaud morreu ontem, após uma curta moléstia. De qualquer ponto de vista que se julguem as suas doutrinas, sua obra, bem como a sua vida, foi eminentemente religiosa, porque tanto sua vida quanto sua obra foram um dos protestos mais eloquentes contra o grande flagelo que nos ameaça: o cepticismo, sob todas as suas formas. Ninguém acreditou mais energicamente na personalidade divina; ninguém acreditou mais energicamente na personalidade humana; ninguém amou mais ardentemente a liberdade. No seu livro Terre et Ciel, que desde o início abriu um sulco tão profundo, e cuja lembrança ir-se-á marcando cada vez mais, nesse livro respira um tal sentimento do infinito, um tal sentimento da presença divina que, pode-se dizer, Deus aí palpita em cada página! E como poderia ser de outro modo, quando aquele que escreveu essas páginas vivia sempre em presença de Deus? Sabemos bem, todos nós que o conhecemos e o amamos, e cujo mais belo título de honra é termos sido amados por tal homem, que ele era uma fonte de vida moral sempre a jorrar. Ninguém podia dele se aproximar sem se firmar melhor no bem; só o seu rosto era uma lição de direitura, de honra, de devotamento. As almas decaídas se perturbavam ante aquele claro olhar, como diante do próprio olho da justiça.
E tudo isto partiu! Partiu em plena força, quando tantas palavras úteis, tão grandes exemplos ainda podiam sair daquela boca, daquele coração!...
“Não choramos Reynaud apenas por nós. Nós o choramos por nosso país inteiro.
“E. LEGOUVÉ”
No mesmo jornal de 16 de julho, o Sr. Henri Martin deu detalhes mais circunstanciados sobre a vida e as obras de Jean Reynaud. Diz ele:
“Criado na liberdade do campo por uma mãe de alma forte e terna, foi aí que ele adquiriu esses hábitos de intimidade com a Natureza que jamais o deixaram, e desenvolveu esses órgãos robustos, com os quais, mais tarde, fazia vinte léguas de um fôlego e passava de geleira a geleira, de uma a outra crista dos Alpes, por estreitas cornijas onde não se aventuram os caçadores de cabrito montês.
“Seus estudos foram rápidos e fecundos. Manifestando desde a juventude o mais vivo gosto pelas letras e por todas as formas do belo, a princípio voltou as vistas para as ciências, feliz direção que lhe devia fornecer o alimento e os instrumentos para o pensamento e fazer do sábio o servidor útil do filósofo. Egresso da primeira turma da Escola Politécnica, era engenheiro de minas na Córsega, no momento da eclosão da revolução de julho. Voltou a Paris, onde o sansimonismo acabava de irromper, e foi envolvido nesse grande e singular movimento, que então empolgava tantas inteligências jovens pela atração do dogma da perfectibilidade do gênero humano. Contudo, a escola pretendeu tornar-se uma igreja. Jean Reynaud não a acompanhou, trocando-a pela democracia. Tratou de reconstituir um grupo e um centro de ação intelectual com os amigos que dela se haviam separado ao mesmo tempo que ele. Pierre Leroux, Carnot e ele retomaram das mãos de Julien (de Paris) a Revue Encyclopédique. Foi aí que Pierre Leroux publicou seu notável Essai sur la doctrine du progrés continu, e Jean Reynaud o trecho tão atraente do Infinité des Cieux, germe de seu grande livro Terre et Ciel. Em seguida fundou com Pierre Leroux a Encyclopédie Nouvelle, obra imensa, que ficou inacabada.
“O 24 de fevereiro roubou o filósofo aos seus pacíficos trabalhos, para atirá-lo na política ativa. Presidente da comissão de altos estudos científicos e literários, depois Subsecretário de Estado no Ministério da Instrução Pública, elaborou com o ministro Carnot, um dos seus mais antigos e mais constantes amigos, planos destinados a pôr a instrução pública no nível das instituições democráticas.
“Transferido da Instrução Pública para o Conselho de Estado, Jean Reynaud aí conquistou rapidamente uma autoridade que procedia tanto de seu caráter quanto de suas luzes e, por mais curta que tivesse sido ali a sua passagem, deixou na memória dos mais eminentes especialistas uma inapagável impressão.”
De todos os escritos de Jean Reynaud, o que mais contribuiu para a sua popularidade foi, sem contradita, seu livro Terre et Ciel, posto a forma abstrata da linguagem não o ponha ao alcance de todos; mas a profundeza das ideias e a lógica das deduções o tornaram apreciado por todos os pensadores sérios e colocaram o autor na primeira linha dos filósofos espiritualistas.
Essa obra pareceu à Igreja um perigo para a ortodoxia da fé. Em consequência, foi condenada e posta no Index pela cúria de Roma, o que aumentou ainda o crédito de que já desfrutava e a tornou procurada com avidez. Na época em que a obra apareceu, lá por 1840, ainda não se cogitava dos Espíritos, contudo, Jean Reynaud parece ter tido, como aliás muitos outros escritores modernos, a intuição e o pressentimento do Espiritismo, do qual foi um dos mais eloquentes precursores. Como Charles Fourier, ele admite o progresso indefinido da alma e, como consequência desse progresso, a necessidade da pluralidade das existências, demonstrada pelos diversos estados do homem na Terra.
Jean Reynaud nada tinha visto. Tudo tirou de sua profunda intuição. O Espiritismo viu o que o filósofo apenas tinha pressentido, assim, acrescentou a sanção da experiência à teoria puramente especulativa e, naturalmente, a experiência o levou a descobrir detalhes que só a imaginação não podia entrever, mas que vêm completar e corroborar os pontos fundamentais. Como todas as grandes ideias que revolucionaram o mundo, o Espiritismo não nasceu de súbito. Ele germinou em mais de um cérebro e mostrou-se, aqui e ali, pouco a pouco, como que para habituar os homens à ideia. Uma brusca aparição completa teria encontrado uma resistência muito viva, teria deslumbrado sem convencer.
Aliás, cada coisa deve vir a seu tempo, e toda planta deve germinar e crescer antes de atingir seu completo desenvolvimento. Dá-se o mesmo em política, pois não há revolução que não tenha sido demoradamente elaborada, e quem quer que, guiado pela experiência e pelo estudo do passado, siga atentamente essas preliminares, pode, com segurança e sem ser profeta, prever-lhe o desenlace. Foi assim que os princípios do Espiritismo moderno se mostraram parcialmente e sob diversas faces, em várias épocas: no último século, com Swedenborg; no começo deste século, com a doutrina dos teósofos, que admitiam claramente as comunicações entre o mundo visível e o invisível; com Charles Fourier, que admite o progresso da alma pela reencarnação; com Jean Reynaud, que admite o mesmo princípio, sondando o infinito com a ciência às mãos; há doze anos, nas manifestações americanas, que tiveram tão grande repercussão e vieram provar as relações materiais entre mortos e vivos e, finalmente, na filosofia espírita, que reuniu esses diversos elementos em corpo de doutrina e lhes deduziu as consequências morais.
Quem diria, quando se ocupavam das mesas girantes, que desse divertimento sairia toda uma filosofia? Quando essa filosofia apareceu, quem teria dito que em poucos anos faria a volta ao mundo e conquistaria milhões de adeptos? Hoje, quem poderia afirmar que ela disse a última palavra? Certamente não disse, pois se as bases fundamentais estão estabelecidas, ainda há muitos detalhes a elucidar e que virão a seu tempo. Depois, quanto mais se avança, mais se vê quanto são múltiplos os interesses que ela abrange, pois pode-se dizer sem exagero que ela abarca todas as questões da ordem social. Assim, só o futuro lhe pode desenvolver todas as consequências, ou melhor, suas consequências desenvolver-se-ão por si mesmas, pela força das coisas, porque no Espiritismo se encontra o que inutilmente se buscou alhures. Por isto mesmo ser-se-á levado a reconhecer que só ele pode encher o vazio moral que diariamente se faz em torno do homem, vazio que ameaça a própria Sociedade na sua base, e cujo temor já se começa a sentir.
Num dado momento, o Espiritismo será a tábua de salvação, mas não era preciso esperar esse momento para atirar a corda de salvamento, assim como não se espera a época da colheita para semear.
Em sua sabedoria, a Providência prepara as coisas devagar. Eis por que a ideia matriz tem tido, como dissemos, numerosos precursores que abriram caminho e prepararam o terreno para receber a semente, uns num sentido, outros noutro, e um dia reconhecer-se-á por quais numerosos fios todas essas ideias parciais se ligam à ideia fundamental. Ora, cada uma dessas ideias tem seus partidários, disso resultando nuns uma predisposição muito natural para aceitar o complemento da ideia, pois cada uma dessas ideias preparou uma porção do terreno. Sem contradita, aí está uma das causas dessa propagação, que chega às raias do prodígio e da qual nenhum exemplo oferece a história das doutrinas filosóficas. Já os adversários se espantam com a resistência que ele apresenta aos seus ataques. Mas tarde terão que ceder ante a força da opinião.
Entre os precursores do Espiritismo há que colocar uma porção de escritores contemporâneos, cujas obras estão semeadas, talvez malgrado seu, de ideias espíritas. Ter-se-ia que escrever volumes, se se quisesse recolher as inumeráveis passagens em que se faz uma alusão mais ou menos direta à preexistência e à sobrevivência da alma; à sua presença entre os vivos; às suas manifestações; às suas peregrinações através de mundos progressivos; à pluralidade de existências, etc. Admitindo que, da parte dos autores, isto não passe de um jogo de imaginação, a ideia não se filtra menos no espírito das massas, onde fica latente até o momento de ser demonstrada como verdade.
Haverá um pensamento mais espírita que o que se encerra na carta do Sr. Victor Hugo, sobre a morte da Sra. Lamartine, e que a maior parte dos jornais aclamaram com entusiasmo, mesmo os que glosam com mais rigor a crença nos Espíritos? Eis a carta, que diz muito em poucas linhas:
“Hauteville-House, 23 de maio.
“Caro Lamartine,
“Uma grande desgraça vos fere. Necessito pôr meu coração junto do vosso. Eu venerava aquela que amáveis. Vosso alto espírito vê além do horizonte. Percebeis distintamente a vida futura.
“Não é a vós que se precisa dizer: Esperai. Sois daqueles que sabem e esperam.
“Ela é sempre vossa companheira, invisível, mas presente. Perdestes a esposa, mas não a alma. Caro amigo, vivamos nos mortos.
“Criado na liberdade do campo por uma mãe de alma forte e terna, foi aí que ele adquiriu esses hábitos de intimidade com a Natureza que jamais o deixaram, e desenvolveu esses órgãos robustos, com os quais, mais tarde, fazia vinte léguas de um fôlego e passava de geleira a geleira, de uma a outra crista dos Alpes, por estreitas cornijas onde não se aventuram os caçadores de cabrito montês.
“Seus estudos foram rápidos e fecundos. Manifestando desde a juventude o mais vivo gosto pelas letras e por todas as formas do belo, a princípio voltou as vistas para as ciências, feliz direção que lhe devia fornecer o alimento e os instrumentos para o pensamento e fazer do sábio o servidor útil do filósofo. Egresso da primeira turma da Escola Politécnica, era engenheiro de minas na Córsega, no momento da eclosão da revolução de julho. Voltou a Paris, onde o sansimonismo acabava de irromper, e foi envolvido nesse grande e singular movimento, que então empolgava tantas inteligências jovens pela atração do dogma da perfectibilidade do gênero humano. Contudo, a escola pretendeu tornar-se uma igreja. Jean Reynaud não a acompanhou, trocando-a pela democracia. Tratou de reconstituir um grupo e um centro de ação intelectual com os amigos que dela se haviam separado ao mesmo tempo que ele. Pierre Leroux, Carnot e ele retomaram das mãos de Julien (de Paris) a Revue Encyclopédique. Foi aí que Pierre Leroux publicou seu notável Essai sur la doctrine du progrés continu, e Jean Reynaud o trecho tão atraente do Infinité des Cieux, germe de seu grande livro Terre et Ciel. Em seguida fundou com Pierre Leroux a Encyclopédie Nouvelle, obra imensa, que ficou inacabada.
“O 24 de fevereiro roubou o filósofo aos seus pacíficos trabalhos, para atirá-lo na política ativa. Presidente da comissão de altos estudos científicos e literários, depois Subsecretário de Estado no Ministério da Instrução Pública, elaborou com o ministro Carnot, um dos seus mais antigos e mais constantes amigos, planos destinados a pôr a instrução pública no nível das instituições democráticas.
“Transferido da Instrução Pública para o Conselho de Estado, Jean Reynaud aí conquistou rapidamente uma autoridade que procedia tanto de seu caráter quanto de suas luzes e, por mais curta que tivesse sido ali a sua passagem, deixou na memória dos mais eminentes especialistas uma inapagável impressão.”
De todos os escritos de Jean Reynaud, o que mais contribuiu para a sua popularidade foi, sem contradita, seu livro Terre et Ciel, posto a forma abstrata da linguagem não o ponha ao alcance de todos; mas a profundeza das ideias e a lógica das deduções o tornaram apreciado por todos os pensadores sérios e colocaram o autor na primeira linha dos filósofos espiritualistas.
Essa obra pareceu à Igreja um perigo para a ortodoxia da fé. Em consequência, foi condenada e posta no Index pela cúria de Roma, o que aumentou ainda o crédito de que já desfrutava e a tornou procurada com avidez. Na época em que a obra apareceu, lá por 1840, ainda não se cogitava dos Espíritos, contudo, Jean Reynaud parece ter tido, como aliás muitos outros escritores modernos, a intuição e o pressentimento do Espiritismo, do qual foi um dos mais eloquentes precursores. Como Charles Fourier, ele admite o progresso indefinido da alma e, como consequência desse progresso, a necessidade da pluralidade das existências, demonstrada pelos diversos estados do homem na Terra.
Jean Reynaud nada tinha visto. Tudo tirou de sua profunda intuição. O Espiritismo viu o que o filósofo apenas tinha pressentido, assim, acrescentou a sanção da experiência à teoria puramente especulativa e, naturalmente, a experiência o levou a descobrir detalhes que só a imaginação não podia entrever, mas que vêm completar e corroborar os pontos fundamentais. Como todas as grandes ideias que revolucionaram o mundo, o Espiritismo não nasceu de súbito. Ele germinou em mais de um cérebro e mostrou-se, aqui e ali, pouco a pouco, como que para habituar os homens à ideia. Uma brusca aparição completa teria encontrado uma resistência muito viva, teria deslumbrado sem convencer.
Aliás, cada coisa deve vir a seu tempo, e toda planta deve germinar e crescer antes de atingir seu completo desenvolvimento. Dá-se o mesmo em política, pois não há revolução que não tenha sido demoradamente elaborada, e quem quer que, guiado pela experiência e pelo estudo do passado, siga atentamente essas preliminares, pode, com segurança e sem ser profeta, prever-lhe o desenlace. Foi assim que os princípios do Espiritismo moderno se mostraram parcialmente e sob diversas faces, em várias épocas: no último século, com Swedenborg; no começo deste século, com a doutrina dos teósofos, que admitiam claramente as comunicações entre o mundo visível e o invisível; com Charles Fourier, que admite o progresso da alma pela reencarnação; com Jean Reynaud, que admite o mesmo princípio, sondando o infinito com a ciência às mãos; há doze anos, nas manifestações americanas, que tiveram tão grande repercussão e vieram provar as relações materiais entre mortos e vivos e, finalmente, na filosofia espírita, que reuniu esses diversos elementos em corpo de doutrina e lhes deduziu as consequências morais.
Quem diria, quando se ocupavam das mesas girantes, que desse divertimento sairia toda uma filosofia? Quando essa filosofia apareceu, quem teria dito que em poucos anos faria a volta ao mundo e conquistaria milhões de adeptos? Hoje, quem poderia afirmar que ela disse a última palavra? Certamente não disse, pois se as bases fundamentais estão estabelecidas, ainda há muitos detalhes a elucidar e que virão a seu tempo. Depois, quanto mais se avança, mais se vê quanto são múltiplos os interesses que ela abrange, pois pode-se dizer sem exagero que ela abarca todas as questões da ordem social. Assim, só o futuro lhe pode desenvolver todas as consequências, ou melhor, suas consequências desenvolver-se-ão por si mesmas, pela força das coisas, porque no Espiritismo se encontra o que inutilmente se buscou alhures. Por isto mesmo ser-se-á levado a reconhecer que só ele pode encher o vazio moral que diariamente se faz em torno do homem, vazio que ameaça a própria Sociedade na sua base, e cujo temor já se começa a sentir.
Num dado momento, o Espiritismo será a tábua de salvação, mas não era preciso esperar esse momento para atirar a corda de salvamento, assim como não se espera a época da colheita para semear.
Em sua sabedoria, a Providência prepara as coisas devagar. Eis por que a ideia matriz tem tido, como dissemos, numerosos precursores que abriram caminho e prepararam o terreno para receber a semente, uns num sentido, outros noutro, e um dia reconhecer-se-á por quais numerosos fios todas essas ideias parciais se ligam à ideia fundamental. Ora, cada uma dessas ideias tem seus partidários, disso resultando nuns uma predisposição muito natural para aceitar o complemento da ideia, pois cada uma dessas ideias preparou uma porção do terreno. Sem contradita, aí está uma das causas dessa propagação, que chega às raias do prodígio e da qual nenhum exemplo oferece a história das doutrinas filosóficas. Já os adversários se espantam com a resistência que ele apresenta aos seus ataques. Mas tarde terão que ceder ante a força da opinião.
Entre os precursores do Espiritismo há que colocar uma porção de escritores contemporâneos, cujas obras estão semeadas, talvez malgrado seu, de ideias espíritas. Ter-se-ia que escrever volumes, se se quisesse recolher as inumeráveis passagens em que se faz uma alusão mais ou menos direta à preexistência e à sobrevivência da alma; à sua presença entre os vivos; às suas manifestações; às suas peregrinações através de mundos progressivos; à pluralidade de existências, etc. Admitindo que, da parte dos autores, isto não passe de um jogo de imaginação, a ideia não se filtra menos no espírito das massas, onde fica latente até o momento de ser demonstrada como verdade.
Haverá um pensamento mais espírita que o que se encerra na carta do Sr. Victor Hugo, sobre a morte da Sra. Lamartine, e que a maior parte dos jornais aclamaram com entusiasmo, mesmo os que glosam com mais rigor a crença nos Espíritos? Eis a carta, que diz muito em poucas linhas:
“Hauteville-House, 23 de maio.
“Caro Lamartine,
“Uma grande desgraça vos fere. Necessito pôr meu coração junto do vosso. Eu venerava aquela que amáveis. Vosso alto espírito vê além do horizonte. Percebeis distintamente a vida futura.
“Não é a vós que se precisa dizer: Esperai. Sois daqueles que sabem e esperam.
“Ela é sempre vossa companheira, invisível, mas presente. Perdestes a esposa, mas não a alma. Caro amigo, vivamos nos mortos.
“VICTOR HUGO”
Não são apenas os escritores isolados que semeiam, aqui e ali, algumas ideias, é a própria Ciência que vem preparar os caminhos. O magnetismo foi o primeiro passo para o conhecimento da ação perispiritual, fonte de todos os fenômenos espíritas. O sonambulismo foi a primeira manifestação isolada da alma. A frenologia provou que o organismo cerebral é um teclado a serviço do princípio inteligente para a expressão das diversas faculdades, pois contrariamente à intenção de Gall, seu fundador, que era materialista, ela serviu para provar a independência do Espírito e da matéria. Provando o poder de ação da matéria espiritualizada, a homeopatia se liga ao papel importante que representa o perispírito em certas afecções; ataca o mal em sua própria fonte, que está fora do organismo, cuja alteração é apenas consecutiva. Tal a razão pela qual a homeopatia triunfa numa porção de casos em que falha a medicina ordinária: mais que esta, ela leva em conta o elemento espiritualista, tão preponderante na economia, o que explica a facilidade com que os médicos homeopatas aceitam o Espiritismo e por que a maioria dos médicos espíritas pertencem à escola de Hahnemann. Enfim, não é senão até as recentes descobertas sobre as propriedades da eletricidade, que vieram trazer seu contingente na questão que nos ocupa, que se lança um pouco de luz sobre o que poderia ser chamado a fisiologia dos Espíritos.
Não terminaríamos mais se quiséssemos analisar todas as circunstâncias, pequenas ou grandes, que há meio século vieram abrir a rota à filosofia nova. Veríamos as mais contraditórias doutrinas provocarem o desenvolvimento da ideia; os próprios acontecimentos políticos prepararem sua introdução na vida prática; mas, de todas as causas, a mais preponderante é a Igreja, que parece predestinada a fatalmente impulsioná-la.
Tudo lhe vem em auxílio, e se conhecessem os inúmeros documentos que nos chegam de toda parte; se pudessem acompanhar, como nós, essa marcha providencial através do mundo, favorecida pelos acontecimentos menos esperados e que, à primeira vista, lhe pareceriam contrários, compreenderiam melhor quanto ela é irresistível, e se admirariam menos de nossa impassibilidade. É que vemos todos trabalhando para isso, de bom grado ou de mau grado, voluntária ou involuntariamente; é que vemos o objetivo e sabemos quando e como será alcançado; vemos o conjunto que avança, e por isso nos inquietamos pouco com algumas individualidades que marcham às avessas.
Assim, Jean Reynaud foi um precursor do Espiritismo por seus escritos. Ele também tinha sua missão providencial e devia abrir um sulco. Ser-lhe-á útil após a morte.
Um eminente Espírito deu a apreciação seguinte sobre a ocorrência:
“Mais uma circunstância que vai ser favorável ao Espiritismo. Jean Reynaud tinha feito o que devia fazer nesta última existência. Vão falar de sua morte, de sua vida e, mais do que nunca, de suas obras. Ora, falar de suas obras é pôr o pé no caminho do Espiritismo.
“Muitas inteligências aprenderão nossa crença estudando esse filósofo que ganhou autoridade. Compreender-se-á e ver-se-á que não sois tão loucos como pretendem os que riem de vós e de vossa fé. Tudo quanto Deus faz é bem feito, crede-me. Ele será louvado por vossos detratores, e sabeis que são eles que, sem o querer, trabalham mais para vos arranjar adeptos.
“Deixai agir. Deixai gritar. Tudo será conforme à vontade de Deus.
“Ainda um pouco de paciência e o escol dos homens de inteligência e de saber unir-se-á convosco e, ante certas adesões ostensivas, a crítica terá que baixar a voz.
Não terminaríamos mais se quiséssemos analisar todas as circunstâncias, pequenas ou grandes, que há meio século vieram abrir a rota à filosofia nova. Veríamos as mais contraditórias doutrinas provocarem o desenvolvimento da ideia; os próprios acontecimentos políticos prepararem sua introdução na vida prática; mas, de todas as causas, a mais preponderante é a Igreja, que parece predestinada a fatalmente impulsioná-la.
Tudo lhe vem em auxílio, e se conhecessem os inúmeros documentos que nos chegam de toda parte; se pudessem acompanhar, como nós, essa marcha providencial através do mundo, favorecida pelos acontecimentos menos esperados e que, à primeira vista, lhe pareceriam contrários, compreenderiam melhor quanto ela é irresistível, e se admirariam menos de nossa impassibilidade. É que vemos todos trabalhando para isso, de bom grado ou de mau grado, voluntária ou involuntariamente; é que vemos o objetivo e sabemos quando e como será alcançado; vemos o conjunto que avança, e por isso nos inquietamos pouco com algumas individualidades que marcham às avessas.
Assim, Jean Reynaud foi um precursor do Espiritismo por seus escritos. Ele também tinha sua missão providencial e devia abrir um sulco. Ser-lhe-á útil após a morte.
Um eminente Espírito deu a apreciação seguinte sobre a ocorrência:
“Mais uma circunstância que vai ser favorável ao Espiritismo. Jean Reynaud tinha feito o que devia fazer nesta última existência. Vão falar de sua morte, de sua vida e, mais do que nunca, de suas obras. Ora, falar de suas obras é pôr o pé no caminho do Espiritismo.
“Muitas inteligências aprenderão nossa crença estudando esse filósofo que ganhou autoridade. Compreender-se-á e ver-se-á que não sois tão loucos como pretendem os que riem de vós e de vossa fé. Tudo quanto Deus faz é bem feito, crede-me. Ele será louvado por vossos detratores, e sabeis que são eles que, sem o querer, trabalham mais para vos arranjar adeptos.
“Deixai agir. Deixai gritar. Tudo será conforme à vontade de Deus.
“Ainda um pouco de paciência e o escol dos homens de inteligência e de saber unir-se-á convosco e, ante certas adesões ostensivas, a crítica terá que baixar a voz.
SANTO AGOSTINHO
Nota – Ver adiante, nas dissertações, algumas comunicações de Jean Reynaud.
EXTRATO DA VIAGEM AO ORIENTE, DO SR. DE LAMARTINE
“Oh! Para isto, digo-lhe eu, há uma outra pergunta. Ninguém mais do que eu sofre e geme o gemido universal da Natureza, dos homens e da Sociedade. Ninguém confessa mais alto os enormes abusos sociais, políticos e religiosos. Ninguém deseja e espera mais uma reparação a esses males intoleráveis da Humanidade. Ninguém está mais convencido que esse reparador não pode ser senão divino! Se a isso chamais esperar um messias, eu o espero como vós e mais que vós suspiro por seu aparecimento próximo; como vós e mais que vós eu vejo nas crenças abaladas do homem, no tumulto de suas ideias, no vazio de seu coração, na depravação de seu estado social, nos repetidos abalos de suas instituições políticas, todos os sintomas de uma desordem e, por conseguinte, de uma renovação próxima e iminente. Creio que Deus sempre se mostra no momento preciso em que tudo quanto é humano é insuficiente, em que o homem confessa nada poder por si mesmo. O mundo está nisto. Creio, pois, num messias; não vejo o Cristo, que nada mais nos tem a dar em sabedoria, virtude e verdade; vejo aquele que o Cristo anunciou que viria após ele: este Espírito Santo sempre atuante, sempre assistindo ao homem, sempre lhe revelando, conforme os tempos e as necessidades, o que deve saber e fazer. Que este Espírito divino se encarne num homem ou numa doutrina, num fato ou numa ideia, pouco importa: é sempre ele, homem ou doutrina, fato ou ideia. Creio nele, espero nele e o aguardo, e mais que vós, senhora, eu o invoco! Vedes, pois, que nos podemos entender e que nossas estrelas não são tão divergentes quanto esta conversa pôde vos fazer pensar.” (1º vol., pág. 176).
“A imaginação do homem é mais verdadeira do que se pensa. Ela nem sempre constrói com os sonhos, mas procede por assimilações instintivas de coisas e imagens que lhe dão resultados mais seguros e mais evidentes que a Ciência e a Lógica. Exceto os vales do Líbano, as ruínas de Balbek, as barrancas do Bósforo, em Constantinopla, e o primeiro aspecto de Damasco, do alto do Anti-Líbano, jamais encontrei um lugar, uma coisa cuja primeira vista não fosse para mim como uma lembrança!
“Já vivemos duas vezes ou mil vezes? Nossa memória não será um vidro embaciado, que o sopro de Deus limpa? Ou temos em nossa imaginação a força de pressentir e ver, antes que vejamos realmente? Questões insolúveis!” (1º vol., pág. 327).
“A imaginação do homem é mais verdadeira do que se pensa. Ela nem sempre constrói com os sonhos, mas procede por assimilações instintivas de coisas e imagens que lhe dão resultados mais seguros e mais evidentes que a Ciência e a Lógica. Exceto os vales do Líbano, as ruínas de Balbek, as barrancas do Bósforo, em Constantinopla, e o primeiro aspecto de Damasco, do alto do Anti-Líbano, jamais encontrei um lugar, uma coisa cuja primeira vista não fosse para mim como uma lembrança!
“Já vivemos duas vezes ou mil vezes? Nossa memória não será um vidro embaciado, que o sopro de Deus limpa? Ou temos em nossa imaginação a força de pressentir e ver, antes que vejamos realmente? Questões insolúveis!” (1º vol., pág. 327).
OBSERVAÇÃO: Em nosso artigo precedente, sobre os precursores do Espiritismo, dissemos que se acham em muitos autores elementos esparsos desta doutrina. Os fragmentos acima são muito claros, para que seja necessário lhes fazer ressaltar o propósito.
Pelo fato de que homens como o Sr. Lamartine e outros emitam ideias espíritas em seus escritos, segue-se que francamente adotem o Espiritismo? Não. Na maior parte não o estudaram, ou se o fizeram não ousam ligar o próprio nome conhecido a uma nova bandeira. Aliás, sua convicção é apenas parcial, e para eles a ideia é apenas um relâmpago que parte de uma vaga intuição não formulada, não amadurecida em seu espírito; eles podem, pois, recuar ante um conjunto do qual certas partes podem ofuscá-los, até mesmo apavorá-los. Para nós não representa menos o indício do pressentimento da ideia geral que germina parcialmente nos cérebros de escol, o que basta para provar a certos adversários que essas ideias não são tão desprovidas de senso quanto pretendem, desde que partilhadas pelos mesmos homens cuja superioridade reconhecem. Reunindo e coordenando as ideias parciais de cada um, chegar-se-ia certamente a constituir a Doutrina Espírita completa, conforme os homens mais eminentes e mais acreditados.
Agradecemos ao nosso assinante de Joinville, que teve a gentileza de nos enviar as duas passagens precitadas, e seremos sempre muito reconhecidos às pessoas que tiverem a bondade de, como ele, comunicar-nos o fruto de suas leituras.
Pelo fato de que homens como o Sr. Lamartine e outros emitam ideias espíritas em seus escritos, segue-se que francamente adotem o Espiritismo? Não. Na maior parte não o estudaram, ou se o fizeram não ousam ligar o próprio nome conhecido a uma nova bandeira. Aliás, sua convicção é apenas parcial, e para eles a ideia é apenas um relâmpago que parte de uma vaga intuição não formulada, não amadurecida em seu espírito; eles podem, pois, recuar ante um conjunto do qual certas partes podem ofuscá-los, até mesmo apavorá-los. Para nós não representa menos o indício do pressentimento da ideia geral que germina parcialmente nos cérebros de escol, o que basta para provar a certos adversários que essas ideias não são tão desprovidas de senso quanto pretendem, desde que partilhadas pelos mesmos homens cuja superioridade reconhecem. Reunindo e coordenando as ideias parciais de cada um, chegar-se-ia certamente a constituir a Doutrina Espírita completa, conforme os homens mais eminentes e mais acreditados.
Agradecemos ao nosso assinante de Joinville, que teve a gentileza de nos enviar as duas passagens precitadas, e seremos sempre muito reconhecidos às pessoas que tiverem a bondade de, como ele, comunicar-nos o fruto de suas leituras.
NOTA: Aproveitamos a ocasião para agradecer à pessoa que nos remeteu uma brochura intitulada Dissertação sobre o dilúvio. Como a remessa veio sem uma carta, não podemos agradecer diretamente. Uma olhada na brochura nos convenceu que o sistema muito original do autor está em contradição com os dados mais vulgares e mais positivos da ciência geológica que, digam o que disserem, têm o seu valor.
Assim, seria fácil refutar sua teoria por observações ao menos tão rigorosas quanto as suas.
Assim, seria fácil refutar sua teoria por observações ao menos tão rigorosas quanto as suas.
(Por Hippolyte Renaud, antigo aluno da escola Politécnica)
A Presse de 27 de julho de 1862 dava a notícia seguinte sobre a obra acima indicada. Ela se liga de maneira muito direta à Doutrina Espírita para que os leitores saibam que a reproduzimos de bom grado. Nós mesmos poderíamos ter feito uma análise da obra, mas preferimos a de uma pessoa desinteressada no assunto. Limitarnos-emos a fazê-la seguir de algumas considerações. Diz o redator:
O que de mais atraente para o espírito e mais refrescante para a alma do que encontrar, na hora presente, um homem de fé sincera, singela e profunda, um homem que crê e entretanto raciocina, e raciocina sem preconceitos, para buscar a verdade, à luz de sua consciência? Tal é o Sr. Renaud.
Nele as matemáticas e a Ciência não mataram o sentimento nem turvaram as fontes misteriosas que nos ligam ao infinito pela fé. O Sr. Renaud é um crente firme, convicto, um excelente cristão, mesmo sendo um mau católico, do que não se defende. Ao contrário.
Sua razão esclarecida, não menos que seu coração amante, lhe faz repelir para bem longe a ideia de um Deus vingador, ciumento e colérico; de um Deus que teria escolhido a cólera para ligar a criatura ao seu autor; de um Deus que pune o filho pela falta do pai, coisa iníqua aos olhos da justiça humana.
O Deus do Sr. Renaud é um Deus de luz e de amor. A harmonia de sua obra infinita manifesta sua onipotência e sua bondade. O homem não é sua vítima, mas seu colaborador numa parte mínima mas ainda gloriosa e proporcional às suas forças. Então, por que o mal e como explicá-lo? O mal não vem de uma queda primitiva que teria mudado todas as condições da vida humana. Ele tem por causa o descumprimento da lei de Deus e a desobediência do homem, usando mal o livrearbítrio. Teríamos achado mais claro se o Sr. Renaud tivesse dito simplesmente que o homem começa pelo instinto, e que só gradativamente pôde desenvolver seus sentimentos superiores e sua inteligência.
O homem espécie, como todos os seres vivos, não pode de repente achar-se na plenitude de seu ser. Percorre evoluções sucessivas e normais. Sua infância social é caracterizada pelo domínio dos instintos. Daí sua miséria, sua ignorância, sua brutalidade. À medida que se eleva na vida, pouco a pouco se desprende do lodo das primeiras idades. A inteligência cresce, os sentimentos ganham força, e ele começa a humanizar-se. Quanto mais o homem compreende, tanto mais se liga à lei, mais se torna religioso e concorre, de sua parte, para a harmonia geral.
O sofrimento é uma advertência, um estimulante para se livrar do mal, para se retirar da sombra e marchar para a luz. Quanto mais avança, mais horror tem ao mundo do instinto, da luta, da violência e da guerra; quanto mais vê e compreende, melhor aspira ao mundo da paz e da ordem, ao império da razão, ao reino dos sentimentos elevados, que são a dignidade e o sinal sagrado de sua espécie.
Daí resulta que, graças à Ciência, à Industria, ao incessante progresso da sociabilidade, o gênero humano tende a constituir-se como o rei ou, se se preferir um termo menos ambicioso, como o gerente de seu globo. Mas depois, e admitindo por um momento esta hipótese que, a bem dizer, parece tornar-se mais certa a cada dia, mas depois, restará sempre a satisfazer esse desejo insaciado do homem, que não pode parar e limitar-se ao presente, por mais magnífico que possa ser?
Que me importa, afinal de contas, vossa felicidade material e terrena, se me deixa a alma vazia e sedenta? A gente se sente tomado de um supremo tédio e de um grande desgosto em presença de tal felicidade que dura tão pouco.
Isto é verdade, responde o Sr. Renaud, e é aqui que ele triunfa. Iluminado pela Ciência, sua fé robusta nos destinos eternos do homem lhe mostra todo um futuro infinito de atividade consciente e de alegrias paradisíacas.
Ao primeiro despertar do pensamento, aos primeiros tremores da alma, o homem eleva o olhar ao céu, interroga suas profundezas infinitas e busca qual pode ser o seu elo com o universo que entrevê. Esta existência terrena, tão curta e por vezes tão triste, não lhe basta. Ele sente que participa do infinito e a todo preço nele quer encontrar o seu lugar. O homem tem horror ao nada, como a Natureza o tem ao vácuo. Em vez de ficar sem ideal, ele se lançará louco nas crenças mais estranhas. Daí tantas concepções paradisíacas mais ou menos loucas, mas que atestam essa necessidade absoluta e fundamental de sentir-se religado ao infinito, assegurado da imortalidade.
Conhece-se o paraíso dos budistas; os Campos Elíseos dos gregos; o paraíso dos selvagens, com suas florestas e prados abundantes de caça; o paraíso de Maomé, com suas delícias materiais e suas huris sem manchas.
O paraíso católico, que coloca a Humanidade num estado de be atitude contemplativa infinita, é uma concepção relativa às épocas cruéis em que o trabalho era considerado sofrimento e castigo; onde o sofrimento geral é tal que a resignação neste mundo e o repouso no outro puderam parecer a soberana sabedoria e o mais elevado ideal.
Mas, evidentemente, esta hipótese é inteiramente contraditória com as noções mais simples e mais claras da existência. Viver é ser; ser é agir com todas as forças de suas faculdades e de sua energia vital. Viver é aspirar e transformar-se incessantemente.
A metempsicose de Pitágoras, embora respeitando a ideia de atividade, é incompleta, no sentido que limita a transformação por passagens em organismos que vivem na face da Terra e ainda por não levar em conta a lei do progresso ascendente que governa todas as coisas.
Segundo o Sr. Renaud, só há uma maneira racional de encarar esta questão da imortalidade.
O autor repele, de início, a concepção que, depois de uma temporada no mundo visível, lugar de provação, colocaria o homem no mundo invisível, o Paraíso, no estado de beato contemplativo e mais que desinteressado de seus semelhantes e de sua obra terrena. Que eleitos e que bem-aventurados seriam esses seres despojados de todo desejo e de toda aspiração, de toda atividade fecunda, de todo interesse por seu passado e por seus semelhantes, pelo Universo infinito, onde trabalharam, sentiram e pensaram!...
O Sr. Renaud repele igualmente a hipótese de uma série indefinida de existências, quer na Terra, quer noutros globos. Esse gênero de imortalidade já possui uma grande vantagem sobre a primeira concepção, pois abre um campo indefinido à atividade humana. Os Srs. Jean Reynaud, Pierre Leroux, Henri Martin e Lamennais se ligam mais ou menos a essa ideia. Mas há um ponto capital que a deteriora pela base: a ausência da memória. Que me importa uma imortalidade de que não tenho consciência e que só Deus conhece? Para que minha imortalidade seja real é preciso que numa vida diferente de minha vida atual eu tenha a lembrança de minhas vidas anteriores; eu tenha consciência da continuidade e da identidade de meu ser. Só com esta condição sou verdadeiramente imortal, participando do Infinito e consciente de minha função no Universo. Só conhecemos o nosso ser por suas manifestações, porque sua essência virtual nos escapa. Em que, pois, repugnaria à nossa razão admitir que nosso ser, cuja persistência constatamos aqui em baixo nas suas incessantes modificações, persistisse eternamente? Ele apenas muda de forma e de órgãos, conforme o meio que atravessa em suas sucessivas encarnações.
É assim que o Sr. Renaud chega a expor sua concepção, que satisfaz a essa condição essencial, conservar a memória, e que é, além disso, conforme à justiça e à onipotente bondade de Deus.
No Universo não há vazio, como não há o nada. Ora, se o mundo visível está em toda a parte, o mundo invisível não está em parte alguma, diz judiciosamente o Sr. Renaud, a menos que também esteja em toda a parte.
Nesta Terra o homem tem dois estados bem distintos. Em vigília ele se lembra geralmente de todos os seus atos e tem consciência de si mesmo; durante o sono perde a memória e a consciência. Consequentemente, porque não teria o homem dois distintos modos de existências, sempre ligadas entre si, sempre unidas à vida do espaço e do planeta? De início, a existência que conhecemos aqui embaixo, depois outra existência, de ordem mais elevada, na qual o indivíduo se organiza e se reencarna por meio de fluidos imponderáveis; participa de maneira mais larga e mais extensa da vida do nosso turbilhão; conserva então a memória de suas existências anteriores e possui plena consciência de seu papel e de sua função ao Universo? A existência mundana ou visível está em relação com o sono, e a existência transmundana ou etérea está em analogia com a vigília?
Nesta hipótese, a solidariedade do gênero humano, nas suas gerações presentes e futuras, nos aparece completa e inteira. Cada um de nós viveu, vive e viverá em diferentes épocas da vida da espécie nesta Terra, e no seu duplo modo visível e invisível. Cada um de nós aí nasce e daí sai, conforme a lei de números, pesos e medidas que preside à harmonia dos mundos. Nossas diversas alternâncias são contadas como os dias e as estações. Cada um de nós renasce na Terra, toma sua classe na espécie e sua função no trabalho geral, de acordo com o seu valor e segundo a lei da ordem universal. Talvez cada um de nós passe pelos diversos estados e funções que nos apresenta o conjunto da espécie. Seguramente a mais absoluta justiça preside a essas transformações, como a mais harmoniosa ordem brilha na eterna criação, nas variadas combinações que caracterizam todo organismo e todo ser vivo. Renascemos para a vida etérea e dela saímos sob essas mesmas condições de ordem e de harmonia.
Tal é a concepção do Sr. Renaud, que aqui não posso expor com todo o desenvolvimento conveniente. É preciso recorrer ao seu livro, claro, simples, rápido, onde uma fé profunda unida a uma razão tão elevada quanto imparcial, mantém constantemente o leitor sob o encanto de uma teoria tão consoladora quanto religiosa e grandiosa.
A livre espontaneidade do homem, sua solidariedade íntima e incessante com os seus semelhantes, com o seu globo, com o seu turbilhão, com o Universo; sua atividade cada vez mais progressiva, eficaz, irradiante, em harmonia com as leis divinas; uma carreira infinita para sua eterna aspiração; a onipotência e a bondade de Deus justificadas, explicadas e glorificadas; o amor como elo entre Deus e o homem, eis o que ressalta desse livrinho, o mais completo de todos os que foram escritos sob a inspiração desta grande sentença: “Os desejos do homem são as promessas de Deus.”
E. DE POMPÉRY
O que de mais atraente para o espírito e mais refrescante para a alma do que encontrar, na hora presente, um homem de fé sincera, singela e profunda, um homem que crê e entretanto raciocina, e raciocina sem preconceitos, para buscar a verdade, à luz de sua consciência? Tal é o Sr. Renaud.
Nele as matemáticas e a Ciência não mataram o sentimento nem turvaram as fontes misteriosas que nos ligam ao infinito pela fé. O Sr. Renaud é um crente firme, convicto, um excelente cristão, mesmo sendo um mau católico, do que não se defende. Ao contrário.
Sua razão esclarecida, não menos que seu coração amante, lhe faz repelir para bem longe a ideia de um Deus vingador, ciumento e colérico; de um Deus que teria escolhido a cólera para ligar a criatura ao seu autor; de um Deus que pune o filho pela falta do pai, coisa iníqua aos olhos da justiça humana.
O Deus do Sr. Renaud é um Deus de luz e de amor. A harmonia de sua obra infinita manifesta sua onipotência e sua bondade. O homem não é sua vítima, mas seu colaborador numa parte mínima mas ainda gloriosa e proporcional às suas forças. Então, por que o mal e como explicá-lo? O mal não vem de uma queda primitiva que teria mudado todas as condições da vida humana. Ele tem por causa o descumprimento da lei de Deus e a desobediência do homem, usando mal o livrearbítrio. Teríamos achado mais claro se o Sr. Renaud tivesse dito simplesmente que o homem começa pelo instinto, e que só gradativamente pôde desenvolver seus sentimentos superiores e sua inteligência.
O homem espécie, como todos os seres vivos, não pode de repente achar-se na plenitude de seu ser. Percorre evoluções sucessivas e normais. Sua infância social é caracterizada pelo domínio dos instintos. Daí sua miséria, sua ignorância, sua brutalidade. À medida que se eleva na vida, pouco a pouco se desprende do lodo das primeiras idades. A inteligência cresce, os sentimentos ganham força, e ele começa a humanizar-se. Quanto mais o homem compreende, tanto mais se liga à lei, mais se torna religioso e concorre, de sua parte, para a harmonia geral.
O sofrimento é uma advertência, um estimulante para se livrar do mal, para se retirar da sombra e marchar para a luz. Quanto mais avança, mais horror tem ao mundo do instinto, da luta, da violência e da guerra; quanto mais vê e compreende, melhor aspira ao mundo da paz e da ordem, ao império da razão, ao reino dos sentimentos elevados, que são a dignidade e o sinal sagrado de sua espécie.
Daí resulta que, graças à Ciência, à Industria, ao incessante progresso da sociabilidade, o gênero humano tende a constituir-se como o rei ou, se se preferir um termo menos ambicioso, como o gerente de seu globo. Mas depois, e admitindo por um momento esta hipótese que, a bem dizer, parece tornar-se mais certa a cada dia, mas depois, restará sempre a satisfazer esse desejo insaciado do homem, que não pode parar e limitar-se ao presente, por mais magnífico que possa ser?
Que me importa, afinal de contas, vossa felicidade material e terrena, se me deixa a alma vazia e sedenta? A gente se sente tomado de um supremo tédio e de um grande desgosto em presença de tal felicidade que dura tão pouco.
Isto é verdade, responde o Sr. Renaud, e é aqui que ele triunfa. Iluminado pela Ciência, sua fé robusta nos destinos eternos do homem lhe mostra todo um futuro infinito de atividade consciente e de alegrias paradisíacas.
Ao primeiro despertar do pensamento, aos primeiros tremores da alma, o homem eleva o olhar ao céu, interroga suas profundezas infinitas e busca qual pode ser o seu elo com o universo que entrevê. Esta existência terrena, tão curta e por vezes tão triste, não lhe basta. Ele sente que participa do infinito e a todo preço nele quer encontrar o seu lugar. O homem tem horror ao nada, como a Natureza o tem ao vácuo. Em vez de ficar sem ideal, ele se lançará louco nas crenças mais estranhas. Daí tantas concepções paradisíacas mais ou menos loucas, mas que atestam essa necessidade absoluta e fundamental de sentir-se religado ao infinito, assegurado da imortalidade.
Conhece-se o paraíso dos budistas; os Campos Elíseos dos gregos; o paraíso dos selvagens, com suas florestas e prados abundantes de caça; o paraíso de Maomé, com suas delícias materiais e suas huris sem manchas.
O paraíso católico, que coloca a Humanidade num estado de be atitude contemplativa infinita, é uma concepção relativa às épocas cruéis em que o trabalho era considerado sofrimento e castigo; onde o sofrimento geral é tal que a resignação neste mundo e o repouso no outro puderam parecer a soberana sabedoria e o mais elevado ideal.
Mas, evidentemente, esta hipótese é inteiramente contraditória com as noções mais simples e mais claras da existência. Viver é ser; ser é agir com todas as forças de suas faculdades e de sua energia vital. Viver é aspirar e transformar-se incessantemente.
A metempsicose de Pitágoras, embora respeitando a ideia de atividade, é incompleta, no sentido que limita a transformação por passagens em organismos que vivem na face da Terra e ainda por não levar em conta a lei do progresso ascendente que governa todas as coisas.
Segundo o Sr. Renaud, só há uma maneira racional de encarar esta questão da imortalidade.
O autor repele, de início, a concepção que, depois de uma temporada no mundo visível, lugar de provação, colocaria o homem no mundo invisível, o Paraíso, no estado de beato contemplativo e mais que desinteressado de seus semelhantes e de sua obra terrena. Que eleitos e que bem-aventurados seriam esses seres despojados de todo desejo e de toda aspiração, de toda atividade fecunda, de todo interesse por seu passado e por seus semelhantes, pelo Universo infinito, onde trabalharam, sentiram e pensaram!...
O Sr. Renaud repele igualmente a hipótese de uma série indefinida de existências, quer na Terra, quer noutros globos. Esse gênero de imortalidade já possui uma grande vantagem sobre a primeira concepção, pois abre um campo indefinido à atividade humana. Os Srs. Jean Reynaud, Pierre Leroux, Henri Martin e Lamennais se ligam mais ou menos a essa ideia. Mas há um ponto capital que a deteriora pela base: a ausência da memória. Que me importa uma imortalidade de que não tenho consciência e que só Deus conhece? Para que minha imortalidade seja real é preciso que numa vida diferente de minha vida atual eu tenha a lembrança de minhas vidas anteriores; eu tenha consciência da continuidade e da identidade de meu ser. Só com esta condição sou verdadeiramente imortal, participando do Infinito e consciente de minha função no Universo. Só conhecemos o nosso ser por suas manifestações, porque sua essência virtual nos escapa. Em que, pois, repugnaria à nossa razão admitir que nosso ser, cuja persistência constatamos aqui em baixo nas suas incessantes modificações, persistisse eternamente? Ele apenas muda de forma e de órgãos, conforme o meio que atravessa em suas sucessivas encarnações.
É assim que o Sr. Renaud chega a expor sua concepção, que satisfaz a essa condição essencial, conservar a memória, e que é, além disso, conforme à justiça e à onipotente bondade de Deus.
No Universo não há vazio, como não há o nada. Ora, se o mundo visível está em toda a parte, o mundo invisível não está em parte alguma, diz judiciosamente o Sr. Renaud, a menos que também esteja em toda a parte.
Nesta Terra o homem tem dois estados bem distintos. Em vigília ele se lembra geralmente de todos os seus atos e tem consciência de si mesmo; durante o sono perde a memória e a consciência. Consequentemente, porque não teria o homem dois distintos modos de existências, sempre ligadas entre si, sempre unidas à vida do espaço e do planeta? De início, a existência que conhecemos aqui embaixo, depois outra existência, de ordem mais elevada, na qual o indivíduo se organiza e se reencarna por meio de fluidos imponderáveis; participa de maneira mais larga e mais extensa da vida do nosso turbilhão; conserva então a memória de suas existências anteriores e possui plena consciência de seu papel e de sua função ao Universo? A existência mundana ou visível está em relação com o sono, e a existência transmundana ou etérea está em analogia com a vigília?
Nesta hipótese, a solidariedade do gênero humano, nas suas gerações presentes e futuras, nos aparece completa e inteira. Cada um de nós viveu, vive e viverá em diferentes épocas da vida da espécie nesta Terra, e no seu duplo modo visível e invisível. Cada um de nós aí nasce e daí sai, conforme a lei de números, pesos e medidas que preside à harmonia dos mundos. Nossas diversas alternâncias são contadas como os dias e as estações. Cada um de nós renasce na Terra, toma sua classe na espécie e sua função no trabalho geral, de acordo com o seu valor e segundo a lei da ordem universal. Talvez cada um de nós passe pelos diversos estados e funções que nos apresenta o conjunto da espécie. Seguramente a mais absoluta justiça preside a essas transformações, como a mais harmoniosa ordem brilha na eterna criação, nas variadas combinações que caracterizam todo organismo e todo ser vivo. Renascemos para a vida etérea e dela saímos sob essas mesmas condições de ordem e de harmonia.
Tal é a concepção do Sr. Renaud, que aqui não posso expor com todo o desenvolvimento conveniente. É preciso recorrer ao seu livro, claro, simples, rápido, onde uma fé profunda unida a uma razão tão elevada quanto imparcial, mantém constantemente o leitor sob o encanto de uma teoria tão consoladora quanto religiosa e grandiosa.
A livre espontaneidade do homem, sua solidariedade íntima e incessante com os seus semelhantes, com o seu globo, com o seu turbilhão, com o Universo; sua atividade cada vez mais progressiva, eficaz, irradiante, em harmonia com as leis divinas; uma carreira infinita para sua eterna aspiração; a onipotência e a bondade de Deus justificadas, explicadas e glorificadas; o amor como elo entre Deus e o homem, eis o que ressalta desse livrinho, o mais completo de todos os que foram escritos sob a inspiração desta grande sentença: “Os desejos do homem são as promessas de Deus.”
E. DE POMPÉRY
Este artigo provocou as duas cartas seguintes, igualmente publicadas na Presse de 31 de julho e 5 de agosto de 1862.
“Paris, 29 de julho de 1862.
“Ao redator.
“Senhor,
“Acabo de ler na Presse de ontem de tarde a seguinte passagem (artigo do Sr. de Pompéry, sobre a obra do Sr. Renaud):
“O Sr. Renaud repele a hipótese de uma série indefinida de existências, quer sobre a Terra, quer noutros globos... Hipótese a que se ligam mais ou menos os Srs. Jean Reynaud, Pierre Leroux, Henri Martin e Lamennais... Mas há um ponto capital que a deteriora pela base: a ausência da memória. Que me importa uma imortalidade de que não tenho consciência e que só Deus conhece? Para que minha imortalidade seja real, é preciso que numa vida diferente de minha vida atual eu tenha a lembrança de minhas vidas anteriores, tenha consciência da continuidade e da identidade de meu ser.”
“O Sr. de Pompéry tem razão, em minha opinião: uma metempsicose indefinida e sem memória não é a imortalidade. Mas, se tem razão quanto às ideias, não a tem quanto às pessoas. Dos quatro escritores que cita, só um professou a doutrina que ele combate: o Sr. Pierre Leroux, em seu livro Humanité. De minha parte, considerando-se que fui citado, devo comparecer. Embora sem títulos para figurar ao lado de três filósofos célebres, devo dizer que minha opinião é a exposta acima pelo Sr. de Pompéry.
“Quanto ao Sr. Jean Reynaud, ele fez, de certo modo, desta opinião o coroamento de seu livro Terre et Ciel, onde apresenta a ausência de memória como condição das existências inferiores, e a memória readquirida e conservada para sempre como atributo essencial da vida mais alta.
“Também não creio que o Sr. Lamennais, numa época qualquer de sua carreira, tenha de modo algum parecido inclinar-se à ideia da transmigração inconsciente e indefinida. Ela era muito contrária a todas as suas tendências.
“Ser-vos-ei reconhecido, senhor redator chefe, se acolherdes esta reclamação, e rogo aceiteis meus mais distintos sentimentos.
“HENRI MARTIN”
“Paris, 29 de julho de 1862.
“Ao redator.
“Senhor,
“Acabo de ler na Presse de ontem de tarde a seguinte passagem (artigo do Sr. de Pompéry, sobre a obra do Sr. Renaud):
“O Sr. Renaud repele a hipótese de uma série indefinida de existências, quer sobre a Terra, quer noutros globos... Hipótese a que se ligam mais ou menos os Srs. Jean Reynaud, Pierre Leroux, Henri Martin e Lamennais... Mas há um ponto capital que a deteriora pela base: a ausência da memória. Que me importa uma imortalidade de que não tenho consciência e que só Deus conhece? Para que minha imortalidade seja real, é preciso que numa vida diferente de minha vida atual eu tenha a lembrança de minhas vidas anteriores, tenha consciência da continuidade e da identidade de meu ser.”
“O Sr. de Pompéry tem razão, em minha opinião: uma metempsicose indefinida e sem memória não é a imortalidade. Mas, se tem razão quanto às ideias, não a tem quanto às pessoas. Dos quatro escritores que cita, só um professou a doutrina que ele combate: o Sr. Pierre Leroux, em seu livro Humanité. De minha parte, considerando-se que fui citado, devo comparecer. Embora sem títulos para figurar ao lado de três filósofos célebres, devo dizer que minha opinião é a exposta acima pelo Sr. de Pompéry.
“Quanto ao Sr. Jean Reynaud, ele fez, de certo modo, desta opinião o coroamento de seu livro Terre et Ciel, onde apresenta a ausência de memória como condição das existências inferiores, e a memória readquirida e conservada para sempre como atributo essencial da vida mais alta.
“Também não creio que o Sr. Lamennais, numa época qualquer de sua carreira, tenha de modo algum parecido inclinar-se à ideia da transmigração inconsciente e indefinida. Ela era muito contrária a todas as suas tendências.
“Ser-vos-ei reconhecido, senhor redator chefe, se acolherdes esta reclamação, e rogo aceiteis meus mais distintos sentimentos.
“HENRI MARTIN”
Ao redator,
“Senhor,
“Apreciando o livro do Sr. Renaud, eu disse, de acordo com o autor, que os Srs. Henri Martin, Jean Reynaud, Pierre Leroux e Lamennais, de acordo com os sistemas por eles adotados, não podiam conservar no homem a memória em suas existências ulteriores. Isto não implica que no pensamento desses filósofos não estivesse a ideia de conservar no homem, nas suas existências indefinidas, a identidade e a perpetuidade de seu ser por meio da memória.
“A reclamação do Sr. Henri Martin seria, pois, muito justa, do ponto de vista de sua intenção, o que constato com prazer. Resta saber agora se o Sr. Renaud, discutindo os sistemas de seus ilustres contraditores, não tem razão de concluir pela sua improcedência. Nisto está toda a questão, na qual não posso entrar. É preciso ver o debate no livro do Sr. Renaud, que aliás testemunha a mais alta simpatia por esses homens eminentes.
“Recebei, etc.
E. DE POMPÉRY
“Senhor,
“Apreciando o livro do Sr. Renaud, eu disse, de acordo com o autor, que os Srs. Henri Martin, Jean Reynaud, Pierre Leroux e Lamennais, de acordo com os sistemas por eles adotados, não podiam conservar no homem a memória em suas existências ulteriores. Isto não implica que no pensamento desses filósofos não estivesse a ideia de conservar no homem, nas suas existências indefinidas, a identidade e a perpetuidade de seu ser por meio da memória.
“A reclamação do Sr. Henri Martin seria, pois, muito justa, do ponto de vista de sua intenção, o que constato com prazer. Resta saber agora se o Sr. Renaud, discutindo os sistemas de seus ilustres contraditores, não tem razão de concluir pela sua improcedência. Nisto está toda a questão, na qual não posso entrar. É preciso ver o debate no livro do Sr. Renaud, que aliás testemunha a mais alta simpatia por esses homens eminentes.
“Recebei, etc.
E. DE POMPÉRY
Eis, pois, um debate travado seriamente num jornal, sem pilhérias vulgares e tolas, sobre a questão da pluralidade das existências, uma das bases fundamentais da Doutrina Espírita, por homens cujo valor intelectual não poderia ser contestado, o que prova não ser ela tão absurda quanto a alguns apraz dizer.
Se se quiser aprofundar mais as ideias emitidas no artigo do Sr. de Pompéry, encontrar-se-ão todas as da Doutrina Espírita sobre esse ponto. Só faltam, para completá-las, as relações entre o mundo visível e o invisível, de que não se cogita.
Pela simples força do raciocínio e da intuição, esses senhores, aos quais poderiam juntar-se muitos outros, tais como Charles Fourier e Louis Jourdan, chegaram ao ponto culminante do Espiritismo, sem ter passado pela fieira intermediária. A única diferença entre eles e nós é que eles encontraram a coisa por si mesmos, ao passo que a nós foi revelada pelos Espíritos e, aos olhos de certa gente, aí está o seu maior erro.
Se se quiser aprofundar mais as ideias emitidas no artigo do Sr. de Pompéry, encontrar-se-ão todas as da Doutrina Espírita sobre esse ponto. Só faltam, para completá-las, as relações entre o mundo visível e o invisível, de que não se cogita.
Pela simples força do raciocínio e da intuição, esses senhores, aos quais poderiam juntar-se muitos outros, tais como Charles Fourier e Louis Jourdan, chegaram ao ponto culminante do Espiritismo, sem ter passado pela fieira intermediária. A única diferença entre eles e nós é que eles encontraram a coisa por si mesmos, ao passo que a nós foi revelada pelos Espíritos e, aos olhos de certa gente, aí está o seu maior erro.
O fato seguinte nos foi transmitido pelo Sr. A. Superchi, de Parma, membro honorário da Sociedade Espírita de Paris.
“Em nossa sessão de 23 de abril último, fiz o médium pôr a mão sobre o papel, sem evocar nenhum Espírito. Logo que a mão começou a se mover, ele sentiu uma força estranha que o obrigou a manter o indicador levantado e duro, numa posição absolutamente anormal. O dedo estava singularmente frio. Não me podendo dar a razão para tal originalidade, pedi a explicação ao Espírito. Respondeu: ‘Esquecido que sois! Não vos lembrais daquele que, em vida, assim escrevia? Endureci este dedo para dar uma prova de nossa autenticidade e de nosso poder.’ Era o Espírito de um irmão do médium, falecido havia há mais de vinte anos, em Florença. Ele tinha ferido o dedo ao quebrar uma garrafa, quando derramava o seu conteúdo, de tal modo que o dedo ficou anquilosado. Anexo, um desenho representando a posição da mão do médium.
“Um outro médium, despeitado por uma mistificação, aliás merecida, esforçava-se por provar que os fenômenos provinham do nosso próprio Espírito, concentrado não sei como. Um dia, conversando, tomou maquinalmente um lápis para desenhar algumas linhas, brincando, mas a mão ficou imóvel, malgrado todos os esforços para servir-se dela. Por fim, pôs-se em movimento e escreveu: ‘Quando eu não quiser, jamais poderás escrever coisa alguma.’ Surpreendido, mas ao mesmo tempo ferido no amor-próprio, retomou o lápis, dizendo que não queria escrever e que veria se esse suposto Espírito teria poder de obrigá-lo. Malgrado sua resolução, a mão moveu-se rapidamente e escreveu: ‘Quando eu quiser, não poderás deixar de escrever.’”
Nos dois casos acima, a ação do Espírito sobre os órgãos é, como se vê, inteiramente independente da vontade. Desde logo concebe-se que ela pode ocorrer espontaneamente, abstração feita de qualquer noção do Espiritismo. Com efeito, é o que provam muitas observações. Aqui ela ocorre num dedo, ali será sobre outro órgão, e poderá traduzir-se por outros efeitos. Temporária nesta circunstância, a ação poderia ter uma certa duração e apresentar uma aparência patológica, na realidade inexistente, e contra a qual seria improfícua a terapêutica ordinária.
Considerado do ponto de vista das manifestações espíritas, esse fenômeno oferece uma notável prova de identidade. O Espírito, na condição de Espírito, incontestavelmente não tem o dedo anquilosado; mas a um vidente ele se teria apresentado com tal enfermidade, para ser reconhecido; ao que não era vidente, comunica temporariamente a sua enfermidade. Ainda aqui está a prova de que o Espírito se identifica com o médium e se serve do corpo dele como se fora o seu próprio. Seja esta ação produzida por um Espírito malévolo, que adquira uma certa duração, que afete formas mais características e excêntricas, e ter-se-á a explicação da maioria dos casos de subjugação corporal, que tomam como loucura.
O fato seguinte, de natureza análoga, foi relatado por um membro da Sociedade de Paris, que o testemunhou numa cidade provinciana. Diz ele:
“Vi uma médium muito original. É uma senhora ainda moça, que pede ao seu Espírito familiar lhe paralise, por exemplo, a língua, e logo não pode falar senão à maneira de um mudo que se esforça para se fazer compreendido. A seu pedido, ele faz a mão aderir à outra, de modo que é impossível separá-las. Ele a prega numa cadeira, até que ela lhe peça para devolver-lhe a liberdade. Pedi ao Espírito que a adormecesse instantaneamente, e ele o fez: A médium adormeceu imediatamente, na primeira vez, sem auxílio de ninguém. Foi nesse estado que julguei reconhecer a natureza desse Espírito, que me pareceu obsessor, pois quando a senhora sofria, ou, ao menos, ficava muito agitada durante o sono, se eu lhe quisesse fazer uns passes magnéticos para acalmá-la, o Espírito a levava a me repelir duramente. Aconselhei à senhora a não repetir as experiências com muita frequência.”
Quanto a nós, aconselhamos abster-se totalmente, porque ele poderia pregar-lhe uma peça. É evidente que um bom Espírito não se presta a semelhantes coisas. Delas fazer um jogo é pôr-se voluntariamente sob funesta dependência, moral e fisicamente, e só Deus sabe onde isto iria parar. Poderia resultar-lhe qualquer subjugação terrível, da qual lhe seria muito difícil, senão impossível, ver-se livre. Já é bastante que tais acidentes ocorram espontaneamente, sem dar lugar a um prazer e apenas para satisfazer a uma vã curiosidade.
Tais experiências não têm qualquer utilidade para o melhoramento moral, e podem acarretar os mais graves inconvenientes. Depois, culpariam o Espiritismo, quando só deveriam acusar a imprevidência ou o orgulho dos que se julgam capazes de manejar os maus Espíritos à sua vontade. Jamais os desafiamos impunemente.
Não afirmamos que o Espírito em questão seja fundamentalmente mau. Mas o que é certo é que não pode ser adiantado, nem mesmo fundamentalmente bom, e que é sempre perigoso submeter-se a tal domínio, cujo menor inconveniente seria a neutralização do livre-arbítrio. Dando acesso aos Espíritos dessa espécie, fica-se penetrado de seus fluidos, necessariamente refratários às influências dos bons Espíritos, que se afastam, se não nos esforçamos para atraí-los, buscando no Espiritismo os meios de nos melhorarmos.
Uma vez penetrado por um fluido maléfico, o perispírito é como uma vestimenta impregnada de odor acre, que os mais deliciosos perfumes não podem fazer desaparecer.
“Em nossa sessão de 23 de abril último, fiz o médium pôr a mão sobre o papel, sem evocar nenhum Espírito. Logo que a mão começou a se mover, ele sentiu uma força estranha que o obrigou a manter o indicador levantado e duro, numa posição absolutamente anormal. O dedo estava singularmente frio. Não me podendo dar a razão para tal originalidade, pedi a explicação ao Espírito. Respondeu: ‘Esquecido que sois! Não vos lembrais daquele que, em vida, assim escrevia? Endureci este dedo para dar uma prova de nossa autenticidade e de nosso poder.’ Era o Espírito de um irmão do médium, falecido havia há mais de vinte anos, em Florença. Ele tinha ferido o dedo ao quebrar uma garrafa, quando derramava o seu conteúdo, de tal modo que o dedo ficou anquilosado. Anexo, um desenho representando a posição da mão do médium.
“Um outro médium, despeitado por uma mistificação, aliás merecida, esforçava-se por provar que os fenômenos provinham do nosso próprio Espírito, concentrado não sei como. Um dia, conversando, tomou maquinalmente um lápis para desenhar algumas linhas, brincando, mas a mão ficou imóvel, malgrado todos os esforços para servir-se dela. Por fim, pôs-se em movimento e escreveu: ‘Quando eu não quiser, jamais poderás escrever coisa alguma.’ Surpreendido, mas ao mesmo tempo ferido no amor-próprio, retomou o lápis, dizendo que não queria escrever e que veria se esse suposto Espírito teria poder de obrigá-lo. Malgrado sua resolução, a mão moveu-se rapidamente e escreveu: ‘Quando eu quiser, não poderás deixar de escrever.’”
Nos dois casos acima, a ação do Espírito sobre os órgãos é, como se vê, inteiramente independente da vontade. Desde logo concebe-se que ela pode ocorrer espontaneamente, abstração feita de qualquer noção do Espiritismo. Com efeito, é o que provam muitas observações. Aqui ela ocorre num dedo, ali será sobre outro órgão, e poderá traduzir-se por outros efeitos. Temporária nesta circunstância, a ação poderia ter uma certa duração e apresentar uma aparência patológica, na realidade inexistente, e contra a qual seria improfícua a terapêutica ordinária.
Considerado do ponto de vista das manifestações espíritas, esse fenômeno oferece uma notável prova de identidade. O Espírito, na condição de Espírito, incontestavelmente não tem o dedo anquilosado; mas a um vidente ele se teria apresentado com tal enfermidade, para ser reconhecido; ao que não era vidente, comunica temporariamente a sua enfermidade. Ainda aqui está a prova de que o Espírito se identifica com o médium e se serve do corpo dele como se fora o seu próprio. Seja esta ação produzida por um Espírito malévolo, que adquira uma certa duração, que afete formas mais características e excêntricas, e ter-se-á a explicação da maioria dos casos de subjugação corporal, que tomam como loucura.
O fato seguinte, de natureza análoga, foi relatado por um membro da Sociedade de Paris, que o testemunhou numa cidade provinciana. Diz ele:
“Vi uma médium muito original. É uma senhora ainda moça, que pede ao seu Espírito familiar lhe paralise, por exemplo, a língua, e logo não pode falar senão à maneira de um mudo que se esforça para se fazer compreendido. A seu pedido, ele faz a mão aderir à outra, de modo que é impossível separá-las. Ele a prega numa cadeira, até que ela lhe peça para devolver-lhe a liberdade. Pedi ao Espírito que a adormecesse instantaneamente, e ele o fez: A médium adormeceu imediatamente, na primeira vez, sem auxílio de ninguém. Foi nesse estado que julguei reconhecer a natureza desse Espírito, que me pareceu obsessor, pois quando a senhora sofria, ou, ao menos, ficava muito agitada durante o sono, se eu lhe quisesse fazer uns passes magnéticos para acalmá-la, o Espírito a levava a me repelir duramente. Aconselhei à senhora a não repetir as experiências com muita frequência.”
Quanto a nós, aconselhamos abster-se totalmente, porque ele poderia pregar-lhe uma peça. É evidente que um bom Espírito não se presta a semelhantes coisas. Delas fazer um jogo é pôr-se voluntariamente sob funesta dependência, moral e fisicamente, e só Deus sabe onde isto iria parar. Poderia resultar-lhe qualquer subjugação terrível, da qual lhe seria muito difícil, senão impossível, ver-se livre. Já é bastante que tais acidentes ocorram espontaneamente, sem dar lugar a um prazer e apenas para satisfazer a uma vã curiosidade.
Tais experiências não têm qualquer utilidade para o melhoramento moral, e podem acarretar os mais graves inconvenientes. Depois, culpariam o Espiritismo, quando só deveriam acusar a imprevidência ou o orgulho dos que se julgam capazes de manejar os maus Espíritos à sua vontade. Jamais os desafiamos impunemente.
Não afirmamos que o Espírito em questão seja fundamentalmente mau. Mas o que é certo é que não pode ser adiantado, nem mesmo fundamentalmente bom, e que é sempre perigoso submeter-se a tal domínio, cujo menor inconveniente seria a neutralização do livre-arbítrio. Dando acesso aos Espíritos dessa espécie, fica-se penetrado de seus fluidos, necessariamente refratários às influências dos bons Espíritos, que se afastam, se não nos esforçamos para atraí-los, buscando no Espiritismo os meios de nos melhorarmos.
Uma vez penetrado por um fluido maléfico, o perispírito é como uma vestimenta impregnada de odor acre, que os mais deliciosos perfumes não podem fazer desaparecer.
A revista hebdomadária do Siècle de 12 de julho de 1863 trazia o seguinte:
“Fora destas questões importantes, outras há, de ordem diversa, e que não podem ser negligenciadas, entre as quais a questão muito viva dos espectros. Vistes os espectros? Há uns oito dias o espectro é o único assunto a alegrar as conversas. Assim, cada teatro tem os seus: espectros de honestos velhacos que roubaram, pilharam, assassinaram e que retornam, sombras impalpáveis, para passear à meia noite no quinto ato de um drama muito bem planejado.
“Esse segredo do espectro ou, para usar a linguagem dos bastidores, esse truque, ao que se diz pago muito caro a um inglês, é de uma simplicidade tão elementar, que todos os teatros têm tido seus espectros no mesmo dia, este mais caro que aquele. Depois do teatro, o espectro passou para a sala de visitas, onde dá boanoite aos senhores e senhoras, como que picados por uma tarântula por essa amável espectromania.
Eis um divertimento que vem a propósito para explicar muitos prodígios, e quero falar principalmente dos prodígios do Espiritismo. Tem-se falado muito desses espíritas que evocam os mortos e os mostram em pequenos grupos de crentes apavorados. Com o auxílio de um simples truque, pode-se fazer a mesma tarefa, sem passar por grande feiticeiro. Essa evocação geral dos espectros dá um golpe funesto no maravilhoso, hoje que está provado que não é mais difícil fazer aparecerem fantasmas do que pessoas em carne e osso. O célebre Sr. Home em pessoa já deve ter caído 75% na estima de suas numerosas admiradoras.
“O ideal vira pó ao toque do real. O real é o truque.
“EDMOND TEXIER.”
“Fora destas questões importantes, outras há, de ordem diversa, e que não podem ser negligenciadas, entre as quais a questão muito viva dos espectros. Vistes os espectros? Há uns oito dias o espectro é o único assunto a alegrar as conversas. Assim, cada teatro tem os seus: espectros de honestos velhacos que roubaram, pilharam, assassinaram e que retornam, sombras impalpáveis, para passear à meia noite no quinto ato de um drama muito bem planejado.
“Esse segredo do espectro ou, para usar a linguagem dos bastidores, esse truque, ao que se diz pago muito caro a um inglês, é de uma simplicidade tão elementar, que todos os teatros têm tido seus espectros no mesmo dia, este mais caro que aquele. Depois do teatro, o espectro passou para a sala de visitas, onde dá boanoite aos senhores e senhoras, como que picados por uma tarântula por essa amável espectromania.
Eis um divertimento que vem a propósito para explicar muitos prodígios, e quero falar principalmente dos prodígios do Espiritismo. Tem-se falado muito desses espíritas que evocam os mortos e os mostram em pequenos grupos de crentes apavorados. Com o auxílio de um simples truque, pode-se fazer a mesma tarefa, sem passar por grande feiticeiro. Essa evocação geral dos espectros dá um golpe funesto no maravilhoso, hoje que está provado que não é mais difícil fazer aparecerem fantasmas do que pessoas em carne e osso. O célebre Sr. Home em pessoa já deve ter caído 75% na estima de suas numerosas admiradoras.
“O ideal vira pó ao toque do real. O real é o truque.
“EDMOND TEXIER.”
Tínhamos razão ao dizer, a propósito deste novo processo fantasmagórico, que os jornais não deixariam de falar do Espiritismo. Já o Independence Belge tinha esfregado as mãos, exclamando: “Como vão os espíritas sair desta?”
Diremos a esses senhores apenas que se informem de como se porta o Espiritismo. O que mais claramente ressalta desses artigos é, como sempre, a prova da mais absoluta ignorância do assunto que atacam. Com efeito, é preciso não saber a primeira palavra para crer que os espíritas se reúnam para fazer aparecerem fantasmas. Ora, o que é mais singular é que jamais os vimos, nem mesmo nos teatros, posto que, no dizer desses senhores, estejamos grandemente interessados no assunto.
O Sr. Robin, o prestidigitador citado em nosso artigo precedente, do mês de julho, vai mais longe. Não é só o Espiritismo que pretende demolir, mas a própria Bíblia. Em sua alocução cotidiana aos espectadores, ele afirma que a aparição de Samuel a Saul se deu pelo mesmo processo que o seu. Não pensamos que os conhecimentos de óptica estivessem tão adiantados naquela época, entre os Hebreus, que não passavam por muito cultos. Desse jeito, sem dúvida foi também por meio de algum truque que Jesus apareceu a seus discípulos.
Não produzindo os falsos espectros o resultado esperado, sem dúvida em breve veremos surgir algum novo estratagema. Eles terão seu tempo, como tudo quanto só tem como resultado apenas satisfazer a curiosidade. Esse tempo talvez seja mais curto do que se pensa, porque logo as pessoas se cansam do que nada deixa no espírito. Então, os teatros farão bem aproveitando-os enquanto têm o privilégio de atrair a multidão, pela força da novidade. Sua aparição terá tido, de qualquer forma, a vantagem de fazer falar de Espiritismo e de espalhar suas ideias. Era um meio, como qualquer outro, de excitar muita gente a se inquirir da verdade.
Que diremos nós do folhetim do Sr. Oscar Comettant sobre o livro do Sr. Home, publicado no Siècle de 15 de julho de 1863? Nada, a não ser que é a melhor propaganda para a venda da obra, do que se beneficiará o Espiritismo. É útil que, de tempos em tempos, haja essas chicotadas, para despertar a atenção dos indiferentes. Se o artigo não é espírita nem espiritualista, é, ao menos, espirituoso? Deixamos que outros se pronunciem.
Há, entretanto, algo de bom nesse artigo. É que o autor, a exemplo de vários de seus confrades, cai com toda a força sobre os que fazem profissão da faculdade mediúnica. Ele censura com justa severidade os abusos daí resultantes, e assim contribui para desacreditá-los, do que o Espiritismo sério não poderia lamentar-se, pois ele próprio repudia toda exploração desse gênero, como indigna do caráter exclusivamente moral do Espiritismo e como uma falta do respeito devido aos mortos.
O Sr. Comettant comete o erro de generalizar o que seria, no máximo, uma rara exceção, e sobretudo de assimilar os médiuns aos saltimbancos, aos tiradores de cartas, aos ledores da sorte, aos trapaceiros, porque viu saltimbancos tomarem o nome de médiuns, como se veem charlatães se dizendo médicos.
Parece que ele ignora que há médiuns entre os membros das famílias das mais altas classes; que os há mesmo entre escritores de renome, tidos em elevada estima por ele próprio e seus amigos; que é notório que a Sra. Émile de Girardin era uma excelente médium. Teríamos curiosidade de saber se ele ousaria dizer-lhes na cara que são farsistas.
Se os que assim falam se tivessem dado ao trabalho de estudar antes de falar, saberiam que o exercício da mediunidade exige um profundo recolhimento, incompatível com a leviandade de caráter e a balbúrdia dos curiosos e que nada de sério se deve esperar nas reuniões públicas.
O Espiritismo desaprova toda experiência de pura curiosidade, feita com o propósito de distração, pois não nos devemos divertir com essas coisas. Os Espíritos, isto é, as almas dos que deixaram a Terra, dos nossos parentes e de nossos amigos, o que nada tem de divertido, vêm para nos instruir e moralizar, e não para alegrar os ociosos. Elas não vêm predizer o futuro nem descobrir segredos ou tesouros escondidos. Vêm ensinar-nos que há uma outra vida, e como nos devemos conduzir para nela sermos felizes, o que é pouco recreativo para certa gente.
Se não se acredita na alma e na sobrevivência dos que nos foram caros, é sempre incorreto levar essa crença em troça, no mínimo em respeito à sua memória.
O Espiritismo ainda nos ensina que os Espíritos não estão às ordens de ninguém; que eles vêm quando e com quem quiserem; que se alguém que pretendesse tê-los a sua disposição e governá-los à vontade, poderia, com boas razões, passar por ignorante ou charlatão; que tanto é lógico quanto irreverente admitir que Espíritos sérios estejam ao capricho do primeiro que chegue e pretenda evocá-los a toda hora e a tanto por sessão, para representarem o papel de comparsas; que há mesmo um sentimento instintivo de repugnância ligado à ideia de que a alma do ser que se chora venha a troco de dinheiro.
Por outro lado, é princípio consagrado pela experiência que os Espíritos não se comunicam facilmente, nem de boa vontade, por certos médiuns, e que entre estes últimos os há absolutamente repulsivos a certos Espíritos, o que se compreende facilmente, desde que se conheça a maneira pela qual se opera a comunicação, pela assimilação de fluidos. Pode, pois, haver entre o Espírito e o médium atração ou repulsão, conforme o grau de afinidade simpática.
A simpatia é fundada sobre as similitudes morais e a afeição. Ora, que simpatia pode ter o Espírito por um médium que só o chama por dinheiro? Talvez digam que o Espírito vem pela pessoa que o chama e não pelo médium, que não passa de instrumento. De acordo, mas nem por isso são menos necessárias as condições fluídicas, essencialmente modificadas pelos sentimentos morais e pelas relações pessoais entre Espírito e médium. É por isso que não há um médium que se possa gabar de comunicar-se indistintamente com todos os Espíritos, dificuldade capital para aquele que quisesse explorá-los.
Eis o que ensinamos ao Sr. Comettant, pois que ele ignora, e isto destrói as assimilações que ele pretende estabelecer. A mediunidade real é uma faculdade preciosa, que adquire tanto mais valor quanto mais é empregada para o bem e quanto mais é exercida religiosamente e com desinteresse completo, moral e material.
Quanto à mediunidade simulada ou abusiva, seja no que for, nós a entregamos a todas as severidades da crítica. É ignorar os mais elementares princípios do Espiritismo crer que ele se constitui seu defensor, e que a repressão legal de um abuso, caso houvesse, lhe constitui um revés. Nenhuma repressão poderia atingir os médiuns que não fizessem de sua faculdade uma profissão e não se afastassem da via moral que lhes é traçada pela doutrina. As armas que os abusos fornecem aos detratores, sempre ardentes em aproveitar as ocasiões de ataque, e mesmo inventadas, quando não existem, fazem ressaltar ainda mais, aos olhos dos espíritas sinceros, a necessidade de mostrar que não há qualquer solidariedade entre a verdadeira doutrina e aqueles que a parodiam.
Diremos a esses senhores apenas que se informem de como se porta o Espiritismo. O que mais claramente ressalta desses artigos é, como sempre, a prova da mais absoluta ignorância do assunto que atacam. Com efeito, é preciso não saber a primeira palavra para crer que os espíritas se reúnam para fazer aparecerem fantasmas. Ora, o que é mais singular é que jamais os vimos, nem mesmo nos teatros, posto que, no dizer desses senhores, estejamos grandemente interessados no assunto.
O Sr. Robin, o prestidigitador citado em nosso artigo precedente, do mês de julho, vai mais longe. Não é só o Espiritismo que pretende demolir, mas a própria Bíblia. Em sua alocução cotidiana aos espectadores, ele afirma que a aparição de Samuel a Saul se deu pelo mesmo processo que o seu. Não pensamos que os conhecimentos de óptica estivessem tão adiantados naquela época, entre os Hebreus, que não passavam por muito cultos. Desse jeito, sem dúvida foi também por meio de algum truque que Jesus apareceu a seus discípulos.
Não produzindo os falsos espectros o resultado esperado, sem dúvida em breve veremos surgir algum novo estratagema. Eles terão seu tempo, como tudo quanto só tem como resultado apenas satisfazer a curiosidade. Esse tempo talvez seja mais curto do que se pensa, porque logo as pessoas se cansam do que nada deixa no espírito. Então, os teatros farão bem aproveitando-os enquanto têm o privilégio de atrair a multidão, pela força da novidade. Sua aparição terá tido, de qualquer forma, a vantagem de fazer falar de Espiritismo e de espalhar suas ideias. Era um meio, como qualquer outro, de excitar muita gente a se inquirir da verdade.
Que diremos nós do folhetim do Sr. Oscar Comettant sobre o livro do Sr. Home, publicado no Siècle de 15 de julho de 1863? Nada, a não ser que é a melhor propaganda para a venda da obra, do que se beneficiará o Espiritismo. É útil que, de tempos em tempos, haja essas chicotadas, para despertar a atenção dos indiferentes. Se o artigo não é espírita nem espiritualista, é, ao menos, espirituoso? Deixamos que outros se pronunciem.
Há, entretanto, algo de bom nesse artigo. É que o autor, a exemplo de vários de seus confrades, cai com toda a força sobre os que fazem profissão da faculdade mediúnica. Ele censura com justa severidade os abusos daí resultantes, e assim contribui para desacreditá-los, do que o Espiritismo sério não poderia lamentar-se, pois ele próprio repudia toda exploração desse gênero, como indigna do caráter exclusivamente moral do Espiritismo e como uma falta do respeito devido aos mortos.
O Sr. Comettant comete o erro de generalizar o que seria, no máximo, uma rara exceção, e sobretudo de assimilar os médiuns aos saltimbancos, aos tiradores de cartas, aos ledores da sorte, aos trapaceiros, porque viu saltimbancos tomarem o nome de médiuns, como se veem charlatães se dizendo médicos.
Parece que ele ignora que há médiuns entre os membros das famílias das mais altas classes; que os há mesmo entre escritores de renome, tidos em elevada estima por ele próprio e seus amigos; que é notório que a Sra. Émile de Girardin era uma excelente médium. Teríamos curiosidade de saber se ele ousaria dizer-lhes na cara que são farsistas.
Se os que assim falam se tivessem dado ao trabalho de estudar antes de falar, saberiam que o exercício da mediunidade exige um profundo recolhimento, incompatível com a leviandade de caráter e a balbúrdia dos curiosos e que nada de sério se deve esperar nas reuniões públicas.
O Espiritismo desaprova toda experiência de pura curiosidade, feita com o propósito de distração, pois não nos devemos divertir com essas coisas. Os Espíritos, isto é, as almas dos que deixaram a Terra, dos nossos parentes e de nossos amigos, o que nada tem de divertido, vêm para nos instruir e moralizar, e não para alegrar os ociosos. Elas não vêm predizer o futuro nem descobrir segredos ou tesouros escondidos. Vêm ensinar-nos que há uma outra vida, e como nos devemos conduzir para nela sermos felizes, o que é pouco recreativo para certa gente.
Se não se acredita na alma e na sobrevivência dos que nos foram caros, é sempre incorreto levar essa crença em troça, no mínimo em respeito à sua memória.
O Espiritismo ainda nos ensina que os Espíritos não estão às ordens de ninguém; que eles vêm quando e com quem quiserem; que se alguém que pretendesse tê-los a sua disposição e governá-los à vontade, poderia, com boas razões, passar por ignorante ou charlatão; que tanto é lógico quanto irreverente admitir que Espíritos sérios estejam ao capricho do primeiro que chegue e pretenda evocá-los a toda hora e a tanto por sessão, para representarem o papel de comparsas; que há mesmo um sentimento instintivo de repugnância ligado à ideia de que a alma do ser que se chora venha a troco de dinheiro.
Por outro lado, é princípio consagrado pela experiência que os Espíritos não se comunicam facilmente, nem de boa vontade, por certos médiuns, e que entre estes últimos os há absolutamente repulsivos a certos Espíritos, o que se compreende facilmente, desde que se conheça a maneira pela qual se opera a comunicação, pela assimilação de fluidos. Pode, pois, haver entre o Espírito e o médium atração ou repulsão, conforme o grau de afinidade simpática.
A simpatia é fundada sobre as similitudes morais e a afeição. Ora, que simpatia pode ter o Espírito por um médium que só o chama por dinheiro? Talvez digam que o Espírito vem pela pessoa que o chama e não pelo médium, que não passa de instrumento. De acordo, mas nem por isso são menos necessárias as condições fluídicas, essencialmente modificadas pelos sentimentos morais e pelas relações pessoais entre Espírito e médium. É por isso que não há um médium que se possa gabar de comunicar-se indistintamente com todos os Espíritos, dificuldade capital para aquele que quisesse explorá-los.
Eis o que ensinamos ao Sr. Comettant, pois que ele ignora, e isto destrói as assimilações que ele pretende estabelecer. A mediunidade real é uma faculdade preciosa, que adquire tanto mais valor quanto mais é empregada para o bem e quanto mais é exercida religiosamente e com desinteresse completo, moral e material.
Quanto à mediunidade simulada ou abusiva, seja no que for, nós a entregamos a todas as severidades da crítica. É ignorar os mais elementares princípios do Espiritismo crer que ele se constitui seu defensor, e que a repressão legal de um abuso, caso houvesse, lhe constitui um revés. Nenhuma repressão poderia atingir os médiuns que não fizessem de sua faculdade uma profissão e não se afastassem da via moral que lhes é traçada pela doutrina. As armas que os abusos fornecem aos detratores, sempre ardentes em aproveitar as ocasiões de ataque, e mesmo inventadas, quando não existem, fazem ressaltar ainda mais, aos olhos dos espíritas sinceros, a necessidade de mostrar que não há qualquer solidariedade entre a verdadeira doutrina e aqueles que a parodiam.
Perguntas e problemas
Uma carta de Locarno contém a seguinte passagem:
“...Para mim a dúvida seria impossível, pois tenho uma filha muito boa médium, e meu próprio filho que escreve. Mas, ah! Ele recebeu tão cruéis mistificações, que seu desânimo contagiou-me um pouco, sem contudo perturbar a nossa crença tão pura e consoladora, malgrado os pesares que experimentamos quando nos vemos enganados por respostas decepcionantes. Por que, então, Deus permite que os bem-intencionados sejam assim enganados pelos que deveriam esclarecê-los?...”
Resposta.
Derramando-se o mundo corpóreo, pela morte, no mundo espírita, e o mundo espírita derramando-se no mundo corpóreo pela encarnação, daí resulta que a população normal do espaço que rodeia a Terra é composta de Espíritos prove nientes da Humanidade terrena. Sendo esta Humanidade uma das mais imperfeitas, não pode dar senão produtos imperfeitos. Eis a razão por que em torno dela pululam os maus Espíritos. Pela mesma razão, nos mundos mais adiantados, onde o bem reina sem partilha, só há bons Espíritos. Admitindo isto, compreender-se-á que a intromissão, tão frequente, dos maus Espíritos nas relações mediúnicas, é inerente à inferioridade do nosso globo. Aqui corre-se o risco de ser vítima dos Espíritos enganadores, como num país de ladrões o de ser roubado.
Não se poderia, também, perguntar por que Deus permite que pessoas honestas sejam despojadas por ladrões, vítimas da malevolência, expostas a toda sorte de misérias? Perguntai antes por que estais na Terra, e vos será respondido que é porque não merecestes um lugar melhor, salvo os Espíritos que aqui estão em missão. É preciso, pois, sofrer-lhe as consequências e fazer esforços para dele sair o mais cedo possível. Enquanto se espera, é necessário esforçar-se para se preservar dos assaltos dos maus Espíritos, o que só se consegue fechando-lhes todas as entradas que lhes poderiam dar acesso a nossa alma, a eles se impondo pela superioridade moral, pela coragem, pela perseverança e por uma fé inquebrantável na proteção de Deus e dos bons Espíritos, e no futuro, que é tudo, ao passo que o presente nada é. Mas como ninguém é perfeito na Terra, ninguém se pode gabar, sem orgulho, de estar ao abrigo de suas malícias de maneira absoluta.
Sem dúvida a pureza de intenções é muito. É o caminho que conduz à perfeição, mas não é a perfeição, e ainda pode haver, no fundo da alma, algum velho fermento. Eis por que ele não é o único médium que já foi mais ou menos enganado.
Diz-nos a simples razão que os bons Espíritos não podem fazer senão o bem, pois, do contrário, não seriam bons, e que o mal não pode vir senão de Espíritos imperfeitos. Assim, as mistificações não podem ser senão de Espíritos levianos ou mentirosos que abusam da credulidade e que muitas vezes exploram o orgulho, a vaidade e outras paixões. Tais mistificações têm o objetivo de pôr à prova a perseverança e a firmeza na fé, e de exercitar o julgamento. Se os bons Espíritos as permitem em certas ocasiões, não é por impotência de sua parte, mas para nos deixar o mérito da luta. Sendo a experiência que se adquire às suas custas a mais proveitosa, se a coragem faltar, é uma prova de fraqueza que nos deixa à mercê dos maus Espíritos.
Os bons Espíritos velam por nós, assistem-nos e nos ajudam, mas com a condição que nos ajudemos a nós mesmos.
O homem está na Terra para a luta. Ele precisa vencer para dela sair, senão, nela ficará.
“...Para mim a dúvida seria impossível, pois tenho uma filha muito boa médium, e meu próprio filho que escreve. Mas, ah! Ele recebeu tão cruéis mistificações, que seu desânimo contagiou-me um pouco, sem contudo perturbar a nossa crença tão pura e consoladora, malgrado os pesares que experimentamos quando nos vemos enganados por respostas decepcionantes. Por que, então, Deus permite que os bem-intencionados sejam assim enganados pelos que deveriam esclarecê-los?...”
Resposta.
Derramando-se o mundo corpóreo, pela morte, no mundo espírita, e o mundo espírita derramando-se no mundo corpóreo pela encarnação, daí resulta que a população normal do espaço que rodeia a Terra é composta de Espíritos prove nientes da Humanidade terrena. Sendo esta Humanidade uma das mais imperfeitas, não pode dar senão produtos imperfeitos. Eis a razão por que em torno dela pululam os maus Espíritos. Pela mesma razão, nos mundos mais adiantados, onde o bem reina sem partilha, só há bons Espíritos. Admitindo isto, compreender-se-á que a intromissão, tão frequente, dos maus Espíritos nas relações mediúnicas, é inerente à inferioridade do nosso globo. Aqui corre-se o risco de ser vítima dos Espíritos enganadores, como num país de ladrões o de ser roubado.
Não se poderia, também, perguntar por que Deus permite que pessoas honestas sejam despojadas por ladrões, vítimas da malevolência, expostas a toda sorte de misérias? Perguntai antes por que estais na Terra, e vos será respondido que é porque não merecestes um lugar melhor, salvo os Espíritos que aqui estão em missão. É preciso, pois, sofrer-lhe as consequências e fazer esforços para dele sair o mais cedo possível. Enquanto se espera, é necessário esforçar-se para se preservar dos assaltos dos maus Espíritos, o que só se consegue fechando-lhes todas as entradas que lhes poderiam dar acesso a nossa alma, a eles se impondo pela superioridade moral, pela coragem, pela perseverança e por uma fé inquebrantável na proteção de Deus e dos bons Espíritos, e no futuro, que é tudo, ao passo que o presente nada é. Mas como ninguém é perfeito na Terra, ninguém se pode gabar, sem orgulho, de estar ao abrigo de suas malícias de maneira absoluta.
Sem dúvida a pureza de intenções é muito. É o caminho que conduz à perfeição, mas não é a perfeição, e ainda pode haver, no fundo da alma, algum velho fermento. Eis por que ele não é o único médium que já foi mais ou menos enganado.
Diz-nos a simples razão que os bons Espíritos não podem fazer senão o bem, pois, do contrário, não seriam bons, e que o mal não pode vir senão de Espíritos imperfeitos. Assim, as mistificações não podem ser senão de Espíritos levianos ou mentirosos que abusam da credulidade e que muitas vezes exploram o orgulho, a vaidade e outras paixões. Tais mistificações têm o objetivo de pôr à prova a perseverança e a firmeza na fé, e de exercitar o julgamento. Se os bons Espíritos as permitem em certas ocasiões, não é por impotência de sua parte, mas para nos deixar o mérito da luta. Sendo a experiência que se adquire às suas custas a mais proveitosa, se a coragem faltar, é uma prova de fraqueza que nos deixa à mercê dos maus Espíritos.
Os bons Espíritos velam por nós, assistem-nos e nos ajudam, mas com a condição que nos ajudemos a nós mesmos.
O homem está na Terra para a luta. Ele precisa vencer para dela sair, senão, nela ficará.
De São Petersburgo escrevem-nos a 1º de julho último:
“...No Livro dos Espíritos, livro I, Capítulo I, nº. 2, notei esta proposição: Tudo quanto é desconhecido é infinito. Parece-me que muitas coisas nos são desconhecidas, sem que por isto sejam infinitas. Como o vocábulo se acha em todas as edições, pedi a explicação ao meu guia, que me respondeu: “O vocábulo infinito aqui é um erro. Deve ser indefinido.” Que pensar disto?...”
Resposta:
Os dois vocábulos, posto que sinônimos no sentido geral, têm, cada um, uma acepção especial. A Academia assim os define:
Indefinido, cujo fim e cujos limites não são ou não podem ser determinados. Tempo indefinido. Número indefinido. Linha indefinida. Espaço indefinido.
Infinito, que não tem começo nem fim, que é sem marcos e sem limites. O espaço é infinito. Deus é infinito. A misericórdia de Deus é infinita. Por extensão, diz-se daquilo de que se não podem assinalar os marcos, o termo, e, por exagero, tanto no sentido físico quanto no moral, de tudo quanto é muito considerável em seu gênero. Diz-se particularmente para inumerável. Uma duração infinita. A beatitude infinita dos eleitos. Astros situados a uma distância infinita. Eu vos faço um agradecimento infinito. Uma infinita variedade de objetos. Penas infinitas. Há um número infinito de autores que escreveram sobre este assunto.
Resulta daí que o vocábulo indefinido tem um sentido mais particular e o vocábulo infinito, um sentido mais geral; que o primeiro se diz de preferência a propósito de coisas materiais e o segundo de coisas abstratas, portanto, ele é mais vago que o outro.
O sentido mais geral da palavra infinito permite aplicá-la, em certos casos, ao que não é senão indefinido, ao passo que o inverso não poderia ter lugar. Diz-se igualmente: uma duração infinita e uma duração indefinida, mas não se poderia dizer: Deus é indefinido, sua misericórdia é indefinida.
Sob este ponto de vista o emprego do vocábulo infinito na frase precitada não é abusivo e não é um erro. Dizemos mais, que o vocábulo indefinido não exprimiria a mesma ideia. Do momento que uma coisa é desconhecida, ela tem para o pensamento o vago do infinito, senão absoluto, ao menos relativo.
Por exemplo: Não sabeis o que vos acontecerá amanhã, portanto vosso pensamento erra no infinito; os acontecimentos é que são indefinidos. Não sabeis quantas estrelas há, portanto, seu número é indefinido, mas é também infinito para a imaginação. No caso de que se trata, convinha, pois, empregar o vocábulo que generaliza o pensamento, de preferência ao que lhe daria um sentido restritivo.
“...No Livro dos Espíritos, livro I, Capítulo I, nº. 2, notei esta proposição: Tudo quanto é desconhecido é infinito. Parece-me que muitas coisas nos são desconhecidas, sem que por isto sejam infinitas. Como o vocábulo se acha em todas as edições, pedi a explicação ao meu guia, que me respondeu: “O vocábulo infinito aqui é um erro. Deve ser indefinido.” Que pensar disto?...”
Resposta:
Os dois vocábulos, posto que sinônimos no sentido geral, têm, cada um, uma acepção especial. A Academia assim os define:
Indefinido, cujo fim e cujos limites não são ou não podem ser determinados. Tempo indefinido. Número indefinido. Linha indefinida. Espaço indefinido.
Infinito, que não tem começo nem fim, que é sem marcos e sem limites. O espaço é infinito. Deus é infinito. A misericórdia de Deus é infinita. Por extensão, diz-se daquilo de que se não podem assinalar os marcos, o termo, e, por exagero, tanto no sentido físico quanto no moral, de tudo quanto é muito considerável em seu gênero. Diz-se particularmente para inumerável. Uma duração infinita. A beatitude infinita dos eleitos. Astros situados a uma distância infinita. Eu vos faço um agradecimento infinito. Uma infinita variedade de objetos. Penas infinitas. Há um número infinito de autores que escreveram sobre este assunto.
Resulta daí que o vocábulo indefinido tem um sentido mais particular e o vocábulo infinito, um sentido mais geral; que o primeiro se diz de preferência a propósito de coisas materiais e o segundo de coisas abstratas, portanto, ele é mais vago que o outro.
O sentido mais geral da palavra infinito permite aplicá-la, em certos casos, ao que não é senão indefinido, ao passo que o inverso não poderia ter lugar. Diz-se igualmente: uma duração infinita e uma duração indefinida, mas não se poderia dizer: Deus é indefinido, sua misericórdia é indefinida.
Sob este ponto de vista o emprego do vocábulo infinito na frase precitada não é abusivo e não é um erro. Dizemos mais, que o vocábulo indefinido não exprimiria a mesma ideia. Do momento que uma coisa é desconhecida, ela tem para o pensamento o vago do infinito, senão absoluto, ao menos relativo.
Por exemplo: Não sabeis o que vos acontecerá amanhã, portanto vosso pensamento erra no infinito; os acontecimentos é que são indefinidos. Não sabeis quantas estrelas há, portanto, seu número é indefinido, mas é também infinito para a imaginação. No caso de que se trata, convinha, pois, empregar o vocábulo que generaliza o pensamento, de preferência ao que lhe daria um sentido restritivo.
Sr. Cardon, Médico, morto em setembro de 1862
(Sociedade de Paris - Médium: Sr. Leymarie)
O Sr. Cardon tinha passado parte da vida na marinha mercante, como médico de um baleeiro e havia adquirido hábitos e ideias um pouco materialistas. Retirado para a aldeia de J..., ali exercia a modesta profissão de médico de roça. Há algum tempo ele estava convencido de que sofria uma hipertrofia do coração e, sabendo que era mal incurável, o pensamento da morte o mergulhava em sombria melancolia, de que nada o distraía.
Com cerca de dois meses de antecedência, ele predisse o seu fim, em determinado dia, e quando se viu perto da hora da morte, reuniu a família para lhe dizer o último adeus. A mãe, a esposa, os três filhos e outros parentes estavam reunidos em volta de seu leito. No momento em que a esposa tentou soerguê-lo, ele se abateu, tornou-se de um azul lívido, os olhos fecharam e julgaram-no morto. A esposa colocou-se diante dele, para esconder dos filhos esse espetáculo. Após alguns minutos, ele reabriu os olhos, e com o rosto por assim dizer iluminado, tomou uma expressão de radiosa beatitude e exclamou:
─ Oh! meus filhos, como é belo! Como é sublime! Oh! A morte! Que benefício! Que coisa suave! Eu estava morto e senti minha alma elevar-se bem alto, bem alto, mas Deus me permitiu voltar para vos dizer: Não temais a morte. Ela é a libertação... Não vos posso pintar a magnificência do que vi e as impressões de que me senti penetrado! Mas não poderíeis compreendê-las!... Oh! meus filhos, conduzivos sempre de maneira a merecer essa inefável felicidade, reservada aos homens de bem. Vivei segundo a caridade. Se tiverdes alguma coisa, dai uma parte àqueles a quem falta o necessário... Minha cara mulher, deixo-te numa posição que não é feliz. Devem-nos dinheiro, mas eu te conjuro, não atormentes os que nos devem. Se estiverem
em apuros, espera que possam pagar, e aos que não o puderem, faze o sacrifício. Deus te recompensará. Tu, meu filho, trabalha para sustentar tua mãe. Sê sempre um homem honesto e guarda-te de fazer algo que possa desonrar nossa família. Toma esta cruz que vem de minha mãe; não a deixes, e que ela te lembre sempre meus últimos conselhos... Meus filhos, ajudai-vos e sustentai-vos mutuamente, e que a boa harmonia reine entre vós. Não sejais vãos nem orgulhosos; perdoai aos vossos inimigos, se quiserdes que Deus vos perdoe...
Depois, tendo feito os filhos se aproximarem, estendeu as mãos para eles e acrescentou:
─ Meus filhos, eu vos abençoo.
E seus olhos se fecharam, desta vez para sempre, mas seu rosto conservou uma expressão tão imponente que, até o momento em que foi enterrado, numerosa multidão veio contemplá-lo com admiração.
Estes interessantes detalhes, transmitidos por um amigo da família, nos sugeriram uma evocação, que poderia ser instrutiva para todos, ao mesmo tempo que seria útil ao Espírito. Ei-la:
1. Evocação ─ Estou junto de vós.
(Sociedade de Paris - Médium: Sr. Leymarie)
O Sr. Cardon tinha passado parte da vida na marinha mercante, como médico de um baleeiro e havia adquirido hábitos e ideias um pouco materialistas. Retirado para a aldeia de J..., ali exercia a modesta profissão de médico de roça. Há algum tempo ele estava convencido de que sofria uma hipertrofia do coração e, sabendo que era mal incurável, o pensamento da morte o mergulhava em sombria melancolia, de que nada o distraía.
Com cerca de dois meses de antecedência, ele predisse o seu fim, em determinado dia, e quando se viu perto da hora da morte, reuniu a família para lhe dizer o último adeus. A mãe, a esposa, os três filhos e outros parentes estavam reunidos em volta de seu leito. No momento em que a esposa tentou soerguê-lo, ele se abateu, tornou-se de um azul lívido, os olhos fecharam e julgaram-no morto. A esposa colocou-se diante dele, para esconder dos filhos esse espetáculo. Após alguns minutos, ele reabriu os olhos, e com o rosto por assim dizer iluminado, tomou uma expressão de radiosa beatitude e exclamou:
─ Oh! meus filhos, como é belo! Como é sublime! Oh! A morte! Que benefício! Que coisa suave! Eu estava morto e senti minha alma elevar-se bem alto, bem alto, mas Deus me permitiu voltar para vos dizer: Não temais a morte. Ela é a libertação... Não vos posso pintar a magnificência do que vi e as impressões de que me senti penetrado! Mas não poderíeis compreendê-las!... Oh! meus filhos, conduzivos sempre de maneira a merecer essa inefável felicidade, reservada aos homens de bem. Vivei segundo a caridade. Se tiverdes alguma coisa, dai uma parte àqueles a quem falta o necessário... Minha cara mulher, deixo-te numa posição que não é feliz. Devem-nos dinheiro, mas eu te conjuro, não atormentes os que nos devem. Se estiverem
em apuros, espera que possam pagar, e aos que não o puderem, faze o sacrifício. Deus te recompensará. Tu, meu filho, trabalha para sustentar tua mãe. Sê sempre um homem honesto e guarda-te de fazer algo que possa desonrar nossa família. Toma esta cruz que vem de minha mãe; não a deixes, e que ela te lembre sempre meus últimos conselhos... Meus filhos, ajudai-vos e sustentai-vos mutuamente, e que a boa harmonia reine entre vós. Não sejais vãos nem orgulhosos; perdoai aos vossos inimigos, se quiserdes que Deus vos perdoe...
Depois, tendo feito os filhos se aproximarem, estendeu as mãos para eles e acrescentou:
─ Meus filhos, eu vos abençoo.
E seus olhos se fecharam, desta vez para sempre, mas seu rosto conservou uma expressão tão imponente que, até o momento em que foi enterrado, numerosa multidão veio contemplá-lo com admiração.
Estes interessantes detalhes, transmitidos por um amigo da família, nos sugeriram uma evocação, que poderia ser instrutiva para todos, ao mesmo tempo que seria útil ao Espírito. Ei-la:
1. Evocação ─ Estou junto de vós.
2.
─ Contaram-nos os vossos últimos momentos, que
nos encheram de admiração. Teríeis a bondade de descrever, melhor do que o
fizestes, o que vistes no intervalo do que poder-se-ia chamar vossas duas
mortes?
─ Poderíeis compreender o que vi? Não sei, porque não
encontraria expressões capazes de tornar compreensível o que vi durante os
instantes em que foi possível deixar meus despojos mortais.
3.
─ Tendes noção de
onde estivestes? É longe da Terra? Num outro planeta ou no espaço?
─ O Espírito não conhece o valor das distâncias, tais quais
as encarais. Levado não sei por que agente maravilhoso, vi o esplendor de um
céu como só nossos sonhos poderiam vislumbrar. Essa corrida pelo infinito é feita tão
rapidamente que não posso precisar os instantes gastos por meu Espírito.
4.
─ Atualmente desfrutais da felicidade
entrevista?
─ Não. Bem queria poder gozá-la, mas Deus assim não me pode
recompensar. Muitas vezes me revoltei contra os abençoados pensamentos ditados
pelo coração, e a morte me parecia uma injustiça. Médico incrédulo, tinha
adquirido na arte de curar uma aversão contra a segunda natureza, que é o nosso
movimento inteligente, divino. A imortalidade da alma era uma ficção própria
para seduzir naturezas pouco adiantadas, não obstante, o vazio me espantava,
pois maldizia muitas vezes esse agente
misterioso que fere sempre e sempre. A Filosofia me havia desviado, sem me dar
a compreender toda a grandeza do Eterno, que sabe repartir a dor e a alegria
para o ensino da Humanidade.
5.
─ Quando de vossa verdadeira morte, logo vos
reconhecestes?
─ Não; reconheci-me durante a transição feita por meu
Espírito para percorrer lugares etéreos; mas, após a morte real, não; forem
necessários alguns dias para meu despertar. Deus me havia concedido uma graça.
Vou dizer-vos a sua razão:
“Minha incredulidade primeira não mais existia. Antes da
morte eu havia crido, porque, depois de ter cientificamente sondado a matéria
pesada, que me fazia deperecer, eu não tinha, depois
das razões terrenas, encontrado senão a razão divina. Ela me tinha
inspirado, consolado, e minha coragem era mais forte que a dor. Eu bendizia o
que havia amaldiçoado; o fim me parecia a libertação. O pensamento de Deus é
grande como o mundo! Oh! Que suprema consolação na prece que dá enternecimentos
inefáveis; ela é o elemento mais seguro de nossa natureza imaterial; por ela
compreendi, cri firmemente, soberanamente, e é por isso que Deus, escutando
minhas abençoadas ações, quis recompensar-me antes de acabar a minha
encarnação.
6.
─ Poder-se-ia dizer que da primeira vez estáveis
morto?
─ Sim e não. Tendo o Espírito deixado
o corpo, naturalmente a carne se extinguia, mas quando
ele retomou a posse de minha morada terrena, a vida voltou ao corpo que
tinha sofrido uma transição, um sono.
7.
─ Nesse momento sentíeis os laços que vos
prendiam ao corpo?
─ Sem dúvida. O Espírito tem um elo difícil de partir e lhe é
preciso um último abalo da carne para voltar a sua vida natural.
8.
─ Como é que, durante a vossa morte aparente e
durante alguns minutos, o vosso Espírito pôde desprender-se instantaneamente e
sem dificuldade, enquanto que a morte real foi seguida de uma perturbação de
alguns dias? Parece que, no primeiro caso, os laços entre a alma e o corpo,
subsistindo mais que no segundo, o desprendimento deveria ser mais lento, e foi
o contrário que se deu.
─ Muitas vezes fizestes a evocação de um Espírito encarnado e
recebestes respostas reais. Eu estava na situação desses Espíritos. Deus me
chamava e seus servidores me tinham dito: “Vem...” Obedeci e agradeço a Deus a
graça especial que ele teve a bondade de me
fazer. Eu pude ver o infinito de sua grandeza e
dela me dar conta. Agradeço a vós que me permitistes
que antes da morte real eu ensinasse aos meus para que eles tivessem boas e justas encarnações.
9.
─ De onde vinham as belas e boas palavras que,
no vosso retorno à vida, dirigistes à vossa família?
─ Eram o reflexo do que tinha visto e ouvido. Os bons
Espíritos inspiravam-me a voz e animavam-me o rosto.
10.
─ Que impressão julgais que a vossa revelação
tenha feito nos assistentes, e particularmente nos vossos filhos?
─ Chocante, profunda. A morte não é mentirosa. Por mais
ingratos que possam ser, os filhos se inclinam ante a encarnação que se vai. Se
se pudesse sondar o coração dos filhos junto a
um túmulo entreaberto, só se sentiriam batidas de sentimentos verdadeiros,
profundamente tocados pela mão secreta dos Espíritos que a todos ditam estes pensamentos: Tremei se estiverdes em dúvida; a
morte é a reparação, a justiça de Deus; e eu vos asseguro que malgrado os incrédulos, meus amigos e minha família
acreditarão nas palavras que minha voz pronunciou antes de morrer. Eu era o
intérprete de um outro mundo.
11.
─ Dissestes que não gozais da felicidade que
entrevistes. Sois infeliz?
─ Não, pois cria antes de morrer, e isto na alma e na
consciência. A dor aperta aqui embaixo, mas eleva para o futuro espírita. Notai
que Deus soube levar em conta as minhas preces e a minha crença absoluta nele.
Estou no caminho da perfeição e chegarei ao fim que me foi permitido entrever.
Orai, meus amigos, por esse mundo invisível que preside os vossos destinos.
Este intercâmbio fraterno é caridade; é uma poderosa alavanca que põe em
comunicação os Espíritos de todos os mundos.
12.
─ Gostaríeis de
dirigir algumas palavras à vossa esposa e aos vossos filhos?
─ Rogo a todos os meus que creiam em Deus, poderoso, justo,
imutável; na prece que consola e alivia; na caridade, que é o ato mais puro da
encarnação humana. Que eles se lembrem que se
pode dar pouco: o óbolo do pobre é o mais meritório diante de Deus, que sabe
que um pobre dá muito dando pouco. É pre
ciso que o rico dê muito e muitas vezes para
merecer tanto quanto aquele.
O futuro é a caridade, a benevolência em todas as ações; é crer
que todos os Espíritos são irmãos, jamais se prevalecendo de todas as vaidades
pueris.
Família muito amada, terás rudes provas, mas sabe suportá-las
com coragem, pensando que Deus as vê.
Dizei sempre esta prece:
Deus de amor e de bondade, que dás tudo e sempre, concede-nos
essa força que não recua ante nenhuma pena; torna-nos bons, mansos e caridosos,
pequenos pela fortuna, grandes pelo coração; que nosso Espírito seja espírita na Terra, para
melhor te compreendermos e te amarmos.
Que teu nome, ó meu Deus, emblema de liberdade, seja o
objetivo consolador de todos os oprimidos, de todos os que têm necessidade de
amar, perdoar e crer.
CARDON
Dissertações espíritas
(SOCIEDADE ESPÍRITA DE PARIS — MÉDIUM: SRA. COSTEL)
Meus amigos, como esta nova vida é magnífica! Semelhante a uma torrente luminosa, arrasta no seu curso Imenso as almas ébrias do infinito! Após a ruptura dos laços carnais, meus olhos abarcaram horizontes novos, que me cercam, e gozo esplêndidas maravilhas do infinito. Passei das sombras da matéria a aurora brilhante que anuncia o Todo-Poderoso. Estou salvo, não pelo mérito de minhas obras, mas pelo conhecimento do princípio eterno, que me fez evitar as sujeiras impressas pela ignorância na própria humanidade. Minha morte foi abençoada; os biógrafos a julgaram prematura. Que cegos! lamentarão alguns escritos nascidos da poeira e não compreenderão quanto o pouco ruído que se faz em torno de meu túmulo meio fechado é útil para a santa causa do Espiritismo. Minha obra estava terminada; meus antecessores iam na carreira; eu tinha atingido esse ponto culminante em que o homem deu o que tinha de melhor e onde não faz maisque recomeçar. Minha morte reaviva a atenção dos letrados e reconduz sobre minha obra capital, que toca à grande questão espírita, que fingem desconhecer, e que em breve os enlaçará. Glória a Deus! Ajudado pelos Espíritos superiores, que protegem a nova doutrina, vou ser um dos batedores, que balizam a vossa rota.
(NUMA REUNIÃO FAMILIAR — MÉDIUM: SR. CHARLES V...)
Meus amigos, como esta nova vida é magnífica! Semelhante a uma torrente luminosa, arrasta no seu curso Imenso as almas ébrias do infinito! Após a ruptura dos laços carnais, meus olhos abarcaram horizontes novos, que me cercam, e gozo esplêndidas maravilhas do infinito. Passei das sombras da matéria a aurora brilhante que anuncia o Todo-Poderoso. Estou salvo, não pelo mérito de minhas obras, mas pelo conhecimento do princípio eterno, que me fez evitar as sujeiras impressas pela ignorância na própria humanidade. Minha morte foi abençoada; os biógrafos a julgaram prematura. Que cegos! lamentarão alguns escritos nascidos da poeira e não compreenderão quanto o pouco ruído que se faz em torno de meu túmulo meio fechado é útil para a santa causa do Espiritismo. Minha obra estava terminada; meus antecessores iam na carreira; eu tinha atingido esse ponto culminante em que o homem deu o que tinha de melhor e onde não faz maisque recomeçar. Minha morte reaviva a atenção dos letrados e reconduz sobre minha obra capital, que toca à grande questão espírita, que fingem desconhecer, e que em breve os enlaçará. Glória a Deus! Ajudado pelos Espíritos superiores, que protegem a nova doutrina, vou ser um dos batedores, que balizam a vossa rota.
(NUMA REUNIÃO FAMILIAR — MÉDIUM: SR. CHARLES V...)
O Espírito responde a esta reflexão: Vossa morte inesperada, em idade tão pouco avançada, surpreendeu a muita gente.
“Quem vos diz que minha morte não foi um benefício para o Espiritismo, para o seu futuro, para as suas conseqüências? Notastes, meu amigo, a marcha que segue o progresso, a rota que toma a fé espírita? Deus deu, logo de começo, provas materiais: dança das mesas, golpes vibrados e toda sorte de fenômenos; para chamar a atenção; era um prefácio divertido. Para crer os homens necessitam de provas palpáveis. Agora é muito outra coisa! Após os fatos materiais, Deus fala à inteligência, ao bom senso, à razão fria, Não mais são manifestações de força, mas coisas racionais, que devem convencer e unir mesmo os incrédulos mais opiniáticos, E é apenas o começo. Notai bem o que vos digo: toda uma série de fatos inteligentes, irrefutáveis, vão seguir-se, e o número dos adeptos da fé espírita, já tão grande, vai ainda aumentar. Deus vai cuidar das inteligências de escol, das sumidades do espírito, do talento e do saber. Isto vai ser um raio luminoso a espalhar-se por toda a terra, como um fluido magnético irresistível e impelirá os mais recalcitrantes à busca do infinito, ao estudo dessa admirável ciência, que nos ensina máximas tão sublimes. Todos vão grupar-se em torno de vós e, abstração feita do diploma de gênio que lhes havia sido dado, vão fazer-se humildes e pequenos para aprender e se convencerem. Depois, mais tarde, quando estiverem bem instruídos e bem convencidos, servir-se-ão de sua autoridade e da notoriedade de seus nomes para impelir ainda mais longe e atingir os últimos limites do objetivo que todos vos propusestes: a regeneração da espécie humana pelo conhecimento raciocinado e aprofundado das existência passadas e futuras. Eis a minha sincera opinião sobre o estado atual do Espiritismo.”
JEAN REYNAUD
(BORDEAUX – MÉDIUM: SRA. C...)
Rendo-me com prazer ao vosso chamado, senhora. Sim, tendes razão: a perturbação espírita, por assim dizer, não existiu para mim (isto respondia ao pensamento do médium). Exilado voluntariamente em vossa terra, onde tinha que lançar a primeira semente séria das grandes verdades que, neste momento, envolvem o mundo, sempre tive consciência da pátria e logo me reconheci em meio aos meus irmãos.
P.— Agradeço-vos a bondade de ter vindo, Mas não acreditava que meu desejo de conversar tivesse influência sobre vós. Deve haver, necessariamente, tão grande diferença entre nós, que só penso nisto com respeito.
R.— Obrigado, filha, por este bom pensamento. Mas deveis saber também que, seja qual for a distância que, entre nós, possam ser estabelecidas por provas, mais ou menos prontamente, mais ou menos felizmente acabadas, há sempre um laço poderoso, que nos une: a simpatia. E este laço vós o apertastes pelo vosso pensamento constante.
P.— Posto que muitos Espíritos tenham explicado suas primeiras sensações ao despertar, teríeis a bondade de me dizer o que experimentastes ao vos reconhecer, e como a separação foi operada entre o Espírito e o corpo?
R.— Como para todos. Senti o momento da libertação aproximar-se; mais feliz, porém, que muitos, não me causou angústia, pois lhe conhecia os resultados, posto fossem ainda maiores do que eu pensava. O corpo é um entrave às faculdades espirituais e, sejam quais forem as luzes que se tenha conservado, são sempre mais ou menos abafadas pelo contacto da matéria. Adormeci esperando um despertar feliz. O sono foi curto, a admiração imensa! Os esplendores celestes desenrolados aos meus olhos brilharam com toda sua intensidade. Meu olhar maravilhado mergulhava nas imensidades desses mundos, cuja existência e habitabilidade eu afirmava. Era uma miragem que me revelava e me confirmava a verdade de meus sentimentos. Por mais seguro que o homem se julgue, quando fala muitas vezes tem no fundo do coração momentos de dúvida, de incerteza; desconfia, senão da verdade que proclama, pelo menos, às vezes, dos meios imperfeitos que emprega para a demonstrar. Convencido da verdade que queria que admitissem, muitas vezes tive que combater contra mim mesmo, contra o desânimo de ver, de tocar, por assim dizer, a verdade, e de não poder torná-la palpável aos que teriam tanta necessidade de nela crer para marcar com segurança na estrada que devem seguir.
P.— Em vida professáveis o Espiritismo?
R.— Entre professar e praticar há uma grande diferença. Muitos professam uma doutrina que não praticam; eu praticava e não professava. Assim como todo homem que segue as leis do Cristo é cristão, mesmo sem as conhecer, também todo homem pode set Espírita, desde que crê em sua alma imortal, em suas preexistências, em sua incessante marcha progressiva, nas suas provas terrenas, abluções necessárias para se purificar. Eu cria; era, pois, Espírita. Compreendi a erraticidade, este laço intermediário entre as encarnações, esse purgatório onde o Espírito culpado se despoja de suas vestes sujas, para tomar nova roupa, em que o Espírito em progresso tece com cuidado a túnica que vai usar novamente e quer conservar pura. Eu vos disse que compreendi e, sem professar, continuei a praticar.
OBSERVAÇÃO: Estas três comunicações foram obtidas por três médiuns que se desconheciam. Não temos provas materiais da identidade do Espírito que se manifestou; mas pela analogia dos pensamentos, pela forma de linguagem pode, ao menos admitir-se a presunção de identidade. A expressão tece com cuidado a túnica que vai usar novamente é uma encantadora figura que pinta a solicitude com que o Espírito em progresso prepara a nova existência que o deve fazer progredir ainda. Os Espíritos atrasados tomam menos precauções e, por vezes, fazem escolhas infelizes, que os forçam a recomeçar.
“Quem vos diz que minha morte não foi um benefício para o Espiritismo, para o seu futuro, para as suas conseqüências? Notastes, meu amigo, a marcha que segue o progresso, a rota que toma a fé espírita? Deus deu, logo de começo, provas materiais: dança das mesas, golpes vibrados e toda sorte de fenômenos; para chamar a atenção; era um prefácio divertido. Para crer os homens necessitam de provas palpáveis. Agora é muito outra coisa! Após os fatos materiais, Deus fala à inteligência, ao bom senso, à razão fria, Não mais são manifestações de força, mas coisas racionais, que devem convencer e unir mesmo os incrédulos mais opiniáticos, E é apenas o começo. Notai bem o que vos digo: toda uma série de fatos inteligentes, irrefutáveis, vão seguir-se, e o número dos adeptos da fé espírita, já tão grande, vai ainda aumentar. Deus vai cuidar das inteligências de escol, das sumidades do espírito, do talento e do saber. Isto vai ser um raio luminoso a espalhar-se por toda a terra, como um fluido magnético irresistível e impelirá os mais recalcitrantes à busca do infinito, ao estudo dessa admirável ciência, que nos ensina máximas tão sublimes. Todos vão grupar-se em torno de vós e, abstração feita do diploma de gênio que lhes havia sido dado, vão fazer-se humildes e pequenos para aprender e se convencerem. Depois, mais tarde, quando estiverem bem instruídos e bem convencidos, servir-se-ão de sua autoridade e da notoriedade de seus nomes para impelir ainda mais longe e atingir os últimos limites do objetivo que todos vos propusestes: a regeneração da espécie humana pelo conhecimento raciocinado e aprofundado das existência passadas e futuras. Eis a minha sincera opinião sobre o estado atual do Espiritismo.”
JEAN REYNAUD
(BORDEAUX – MÉDIUM: SRA. C...)
Rendo-me com prazer ao vosso chamado, senhora. Sim, tendes razão: a perturbação espírita, por assim dizer, não existiu para mim (isto respondia ao pensamento do médium). Exilado voluntariamente em vossa terra, onde tinha que lançar a primeira semente séria das grandes verdades que, neste momento, envolvem o mundo, sempre tive consciência da pátria e logo me reconheci em meio aos meus irmãos.
P.— Agradeço-vos a bondade de ter vindo, Mas não acreditava que meu desejo de conversar tivesse influência sobre vós. Deve haver, necessariamente, tão grande diferença entre nós, que só penso nisto com respeito.
R.— Obrigado, filha, por este bom pensamento. Mas deveis saber também que, seja qual for a distância que, entre nós, possam ser estabelecidas por provas, mais ou menos prontamente, mais ou menos felizmente acabadas, há sempre um laço poderoso, que nos une: a simpatia. E este laço vós o apertastes pelo vosso pensamento constante.
P.— Posto que muitos Espíritos tenham explicado suas primeiras sensações ao despertar, teríeis a bondade de me dizer o que experimentastes ao vos reconhecer, e como a separação foi operada entre o Espírito e o corpo?
R.— Como para todos. Senti o momento da libertação aproximar-se; mais feliz, porém, que muitos, não me causou angústia, pois lhe conhecia os resultados, posto fossem ainda maiores do que eu pensava. O corpo é um entrave às faculdades espirituais e, sejam quais forem as luzes que se tenha conservado, são sempre mais ou menos abafadas pelo contacto da matéria. Adormeci esperando um despertar feliz. O sono foi curto, a admiração imensa! Os esplendores celestes desenrolados aos meus olhos brilharam com toda sua intensidade. Meu olhar maravilhado mergulhava nas imensidades desses mundos, cuja existência e habitabilidade eu afirmava. Era uma miragem que me revelava e me confirmava a verdade de meus sentimentos. Por mais seguro que o homem se julgue, quando fala muitas vezes tem no fundo do coração momentos de dúvida, de incerteza; desconfia, senão da verdade que proclama, pelo menos, às vezes, dos meios imperfeitos que emprega para a demonstrar. Convencido da verdade que queria que admitissem, muitas vezes tive que combater contra mim mesmo, contra o desânimo de ver, de tocar, por assim dizer, a verdade, e de não poder torná-la palpável aos que teriam tanta necessidade de nela crer para marcar com segurança na estrada que devem seguir.
P.— Em vida professáveis o Espiritismo?
R.— Entre professar e praticar há uma grande diferença. Muitos professam uma doutrina que não praticam; eu praticava e não professava. Assim como todo homem que segue as leis do Cristo é cristão, mesmo sem as conhecer, também todo homem pode set Espírita, desde que crê em sua alma imortal, em suas preexistências, em sua incessante marcha progressiva, nas suas provas terrenas, abluções necessárias para se purificar. Eu cria; era, pois, Espírita. Compreendi a erraticidade, este laço intermediário entre as encarnações, esse purgatório onde o Espírito culpado se despoja de suas vestes sujas, para tomar nova roupa, em que o Espírito em progresso tece com cuidado a túnica que vai usar novamente e quer conservar pura. Eu vos disse que compreendi e, sem professar, continuei a praticar.
OBSERVAÇÃO: Estas três comunicações foram obtidas por três médiuns que se desconheciam. Não temos provas materiais da identidade do Espírito que se manifestou; mas pela analogia dos pensamentos, pela forma de linguagem pode, ao menos admitir-se a presunção de identidade. A expressão tece com cuidado a túnica que vai usar novamente é uma encantadora figura que pinta a solicitude com que o Espírito em progresso prepara a nova existência que o deve fazer progredir ainda. Os Espíritos atrasados tomam menos precauções e, por vezes, fazem escolhas infelizes, que os forçam a recomeçar.
(Sociedade Espírita de Paris, 13 de março de 1863 - Médium: Sra. Costel)
Minha filha, venho dar um ensinamento médico aos espíritas. Aqui a Astronomia e a Filosofia têm eloquentes intérpretes, e a moral conta tantos escritores quantos médiuns. Por que a medicina, em seu lado prático e fisiológico, seria negligenciada? Eu fui o criador da renovação médica, que hoje penetra nas fileiras dos sectários da medicina antiga. Ligados contra a homeopatia, em vão lhe criaram diques sem número, em vão lhe gritaram: “Não irás mais longe!”
A jovem medicina, triunfante, transpôs todos os obstáculos, e o Espiritismo lhe será poderoso auxiliar. Graças a ele, ela abandonará a tradição materialista que por tanto tempo lhe retardou o desenvolvimento. O estudo médico está inteiramente ligado à pesquisa das causas e efeitos espiritualistas; ela disseca os corpos e deve, também, analisar a alma.
Deixai, pois, um velho médico justificar os fins e os meios da doutrina que propagou e que ele vê estranhamente desfigurada aqui em baixo pelos praticantes, e no alto por Espíritos ignorantes que usurpam o seu nome. Gostaria que minha palavra escutada tivesse o poder de corrigir os abusos que alteram a homeopatia e, assim, a impedem de ser útil como deveria.
Se eu falasse num centro prático, onde os conselhos pudessem ser ouvidos com proveito, eu me elevaria contra a negligência de meus colegas terrenos que desconhecem as leis primordiais do Organon, exagerando as doses e, sobretudo, não dando à trituração tão importante dos medicamentos, os cuidados que indiquei. Muitos esquecem que cem, e às vezes duzentos golpes são absolutamente necessários ao desprendimento do princípio médico apropriado a cada uma das plantas ou venenos que formam nosso arsenal curador. Nenhum remédio é indiferente e nenhum medicamento é inofensivo. Quando o diagnóstico mal feito produz um resultado irrelevante, ele desenvolve os germes da moléstia que deveria combater.
Mas eu me deixo arrastar por meu assunto, e eis-me na iminência de dar um curso de homeopatia a um auditório que não pode interessar-se pela questão. Entretanto não julgo inútil iniciar os espíritas nos princípios fundamentais da ciência, a fim de premuni-los contra as decepções que possam sofrer, quer da parte dos homens, quer mesmo da dos Espíritos.
SAMUEL HAHNEMANN
Minha filha, venho dar um ensinamento médico aos espíritas. Aqui a Astronomia e a Filosofia têm eloquentes intérpretes, e a moral conta tantos escritores quantos médiuns. Por que a medicina, em seu lado prático e fisiológico, seria negligenciada? Eu fui o criador da renovação médica, que hoje penetra nas fileiras dos sectários da medicina antiga. Ligados contra a homeopatia, em vão lhe criaram diques sem número, em vão lhe gritaram: “Não irás mais longe!”
A jovem medicina, triunfante, transpôs todos os obstáculos, e o Espiritismo lhe será poderoso auxiliar. Graças a ele, ela abandonará a tradição materialista que por tanto tempo lhe retardou o desenvolvimento. O estudo médico está inteiramente ligado à pesquisa das causas e efeitos espiritualistas; ela disseca os corpos e deve, também, analisar a alma.
Deixai, pois, um velho médico justificar os fins e os meios da doutrina que propagou e que ele vê estranhamente desfigurada aqui em baixo pelos praticantes, e no alto por Espíritos ignorantes que usurpam o seu nome. Gostaria que minha palavra escutada tivesse o poder de corrigir os abusos que alteram a homeopatia e, assim, a impedem de ser útil como deveria.
Se eu falasse num centro prático, onde os conselhos pudessem ser ouvidos com proveito, eu me elevaria contra a negligência de meus colegas terrenos que desconhecem as leis primordiais do Organon, exagerando as doses e, sobretudo, não dando à trituração tão importante dos medicamentos, os cuidados que indiquei. Muitos esquecem que cem, e às vezes duzentos golpes são absolutamente necessários ao desprendimento do princípio médico apropriado a cada uma das plantas ou venenos que formam nosso arsenal curador. Nenhum remédio é indiferente e nenhum medicamento é inofensivo. Quando o diagnóstico mal feito produz um resultado irrelevante, ele desenvolve os germes da moléstia que deveria combater.
Mas eu me deixo arrastar por meu assunto, e eis-me na iminência de dar um curso de homeopatia a um auditório que não pode interessar-se pela questão. Entretanto não julgo inútil iniciar os espíritas nos princípios fundamentais da ciência, a fim de premuni-los contra as decepções que possam sofrer, quer da parte dos homens, quer mesmo da dos Espíritos.
SAMUEL HAHNEMANN
OBSERVAÇÃO: Esta dissertação foi motivada pela presença à sessão de um médico homeopata estrangeiro que desejava a opinião de Hahnemann sobre o estado atual da ciência. Faremos observar que ela foi dada através de uma jovem senhora que não fez estudos médicos, e à qual necessariamente são estranhos muitos termos especiais.
O Sr. T. Jaubert, vice-presidente do tribunal civil de Carcassone, dirige-nos a carta que segue, a propósito do título de membro honorário que lhe conferiu a Sociedade Espírita de Paris.
A Sociedade foi feliz ao dar ao Sr. Jaubert esse testemunho de simpatia, e lhe provar quanto aprecia seu devotamento à causa do Espiritismo, sua modéstia, tanto quanto sua firmeza de caráter. Há posições que realçam ainda mais o mérito da coragem de opinião e qualidades que põem o homem acima da crítica. (Ver a Revista de junho último: Um Espírito coroado pela Academia de Jogos Florais).
Molitg-les-Bains, 21 de julho de 1863.
“Senhor Presidente,
“Vossa carta e a ata constatando a minha admissão entre os membros honorários da Sociedade Espírita Parisiense encontram-me em Molitg, onde, no interesse da saúde, passo umas férias de vinte e nove dias. Devo dar-vos tempestivamente a expressão de toda a minha gratidão.
“Creio na imortalidade da alma, na comunicação dos mortos com os vivos, como creio no Sol. Amo o Espiritismo como a mais legítima afirmação da lei de Deus: a lei do progresso. Confesso-o bem alto, porque confessá-lo é fazer o bem.
“Aceitei a prímula da Academia de Toulouse como uma resposta brilhante aos que não querem ver nos ditados reais dos Espíritos senão percepções erradas ou elucubrações ridículas. Recebo o título de membro honorário da Sociedade, da qual sois o chefe, como o mais honroso entre os que tenho da mão dos homens. Ainda uma vez, senhor, recebei para vós e para todos os membros da Sociedade Parisiense os meus mais sinceros agradecimentos.
“Vosso relato da sessão dos Jogos Florais interpretou fielmente os meus sentimentos e a minha conduta. Declarando que a fábula coroada era obra de meu Espírito familiar, não podia expor-me a chocar o público e os meus juízes. Exprimistes perfeitamente, na vossa Revista, o respeito que devo a mim próprio e à opinião alheia. Agora, se em todo esse caso eu não tomei a iniciativa a vosso respeito, se apenas respondo, é que teria tido que falar de mim, e associar meu nome a um acontecimento pelo qual sem dúvida me sinto feliz, mas que outros se têm dignado considerar como um sucesso.
“Hoje me sinto mais livre e é do mais profundo de meu coração que vos peço, senhor e caro mestre, aceitar a homenagem de meu reconhecimento, de minha simpatia e de minha mais distinta consideração.
T. JAUBERT
Vice-presidente do Tribunal de Carcassone - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
A abundância de matéria nos força a adiar para o próximo número nossa segunda carta ao Sr. Pe. Marouzeau, bem como a resposta à pergunta que nos foi dirigida sobre a distinção a fazer entre expiação e provação.
ALLAN KARDEC
A Sociedade foi feliz ao dar ao Sr. Jaubert esse testemunho de simpatia, e lhe provar quanto aprecia seu devotamento à causa do Espiritismo, sua modéstia, tanto quanto sua firmeza de caráter. Há posições que realçam ainda mais o mérito da coragem de opinião e qualidades que põem o homem acima da crítica. (Ver a Revista de junho último: Um Espírito coroado pela Academia de Jogos Florais).
Molitg-les-Bains, 21 de julho de 1863.
“Senhor Presidente,
“Vossa carta e a ata constatando a minha admissão entre os membros honorários da Sociedade Espírita Parisiense encontram-me em Molitg, onde, no interesse da saúde, passo umas férias de vinte e nove dias. Devo dar-vos tempestivamente a expressão de toda a minha gratidão.
“Creio na imortalidade da alma, na comunicação dos mortos com os vivos, como creio no Sol. Amo o Espiritismo como a mais legítima afirmação da lei de Deus: a lei do progresso. Confesso-o bem alto, porque confessá-lo é fazer o bem.
“Aceitei a prímula da Academia de Toulouse como uma resposta brilhante aos que não querem ver nos ditados reais dos Espíritos senão percepções erradas ou elucubrações ridículas. Recebo o título de membro honorário da Sociedade, da qual sois o chefe, como o mais honroso entre os que tenho da mão dos homens. Ainda uma vez, senhor, recebei para vós e para todos os membros da Sociedade Parisiense os meus mais sinceros agradecimentos.
“Vosso relato da sessão dos Jogos Florais interpretou fielmente os meus sentimentos e a minha conduta. Declarando que a fábula coroada era obra de meu Espírito familiar, não podia expor-me a chocar o público e os meus juízes. Exprimistes perfeitamente, na vossa Revista, o respeito que devo a mim próprio e à opinião alheia. Agora, se em todo esse caso eu não tomei a iniciativa a vosso respeito, se apenas respondo, é que teria tido que falar de mim, e associar meu nome a um acontecimento pelo qual sem dúvida me sinto feliz, mas que outros se têm dignado considerar como um sucesso.
“Hoje me sinto mais livre e é do mais profundo de meu coração que vos peço, senhor e caro mestre, aceitar a homenagem de meu reconhecimento, de minha simpatia e de minha mais distinta consideração.
T. JAUBERT
Vice-presidente do Tribunal de Carcassone - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
A abundância de matéria nos força a adiar para o próximo número nossa segunda carta ao Sr. Pe. Marouzeau, bem como a resposta à pergunta que nos foi dirigida sobre a distinção a fazer entre expiação e provação.
ALLAN KARDEC