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Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1863 > Outubro
Outubro
Há um século a Sociedade era trabalhada pelas ideias materialistas, reproduzidas sob todas as formas, traduzindo-se na maioria das obras literárias e artísticas. A incredulidade estava na moda e era de bom-tom exibir a negação de tudo, mesmo de Deus. A vida presente, eis o positivo; fora disto tudo é quimera e incerteza; vivamos, pois, o melhor possível, porque depois, venha o que vier. Tal era o raciocínio de todos os que pretendiam estar acima dos preconceitos e, por isso, se diziam espíritos fortes. Força é convir que eram o maior número, dos que davam movimento à Sociedade e tinham o encargo de conduzi-la e cujo exemplo necessariamente deveria ter grande influência.
O próprio clero sofria essa influência. A conduta, particular ou pública, de muitos de seus membros, em completo descompasso entre os seus ensinos e os do Cristo, provava que eles não acreditavam no que pregavam, porque, se tivessem acreditado firmemente na vida futura e nos castigos, teriam preterido menos os interesses do Céu pelos da Terra.
Assim, tinham-se buscado todas as bases das instituições humanas na ordem das coisas materiais. Contudo, acabaram reconhecendo que faltava a essas instituições um sólido ponto de apoio, porquanto as que pareciam melhor assentadas se esboroavam num dia de tempestade; visto que as leis repressivas mascaravam os vícios, mas não tornavam os homens melhores.
Qual era esse ponto de apoio? Aí estava a questão, mas buscavam, e alguns acabaram por crer que Deus bem podia servir para alguma coisa no Universo. Depois, alguns Espíritos fortes começaram a ter medo, e para não mais rirem do futuro senão apenas nos lábios, diziam: Pretendem que tudo acaba com a morte, mas, em definitivo, que sabem disso os que o afirmam? Afinal de contas, é apenas a sua opinião. Antes de Cristóvão Colombo também se acreditava que nada houvesse além do oceano. E se houvesse alguma coisa além do túmulo? Contudo, seria interessante sabê-lo, porque, se houver algo, todos temos que passar por isso, porque todos morremos. Como se fica ali? Bem? Mal? A questão é importante e deve ser considerada. Mas se sobrevivemos, certamente não será o nosso corpo. Então temos uma alma? Assim, a alma não seria uma quimera? Então, como é essa alma? De onde vem? Para onde vai?
Daí uma vaga inquietação apoderou-se dos mais fanfarrões diante da morte. Começaram a procurar, a discutir, depois, reconhecendo que, fizessem o que fizessem, nunca estariam bem na Terra, e que por vezes até estariam muito mal, lançaram as vistas e as esperanças em direção ao futuro.
Todas as coisas extremas têm a sua reação, quando não estão de acordo com a verdade, pois só a verdade é imutável. As ideias materialistas haviam chegado ao apogeu. Então perceberam que elas não davam o que delas esperavam; que deixavam o vazio no coração; que elas abriam um abismo insondável, diante do qual recuavam com terror, como diante de um precipício. Daí uma aspiração pelo desconhecido e, em consequência, uma inevitável reação para as ideias espiritualistas, como única saída possível.
É essa reação que se manifesta há alguns anos. Mas o homem chegou às culminâncias da inteligência. Ora, a essa idade, em que a faculdade de compreender está adulta, ele não mais pode ser conduzido como na infância ou na adolescência. O positivismo da vida lhe ensinou a procurar. Dizemos mais, tornou-lhe necessário o porquê e o como de cada coisa, pois em nosso século matemático, há necessidade de termos consciência de tudo, de tudo calcular, de tudo medir, para sabermos onde pomos o pé. Quer-se a certeza, senão material, ao menos moral, até na abstração. Não basta dizer que uma coisa é boa ou má, quer-se saber por que ela é boa ou má, e se se há ou não razão para prescrevê-la ou proibi-la. Eis por que a fé cega não mais tem curso em nosso século raciocinador. Não pedem apenas para ter fé. Hoje desejam-na e sentem sua sede dela, pois ela é uma necessidade. Querem, porém, uma fé raciocinada. Discutir sua crença é uma necessidade da época, à qual, de bom ou de mau grado, é preciso resignar-se.
As ideias espiritualistas respondem bem às aspirações gerais, pois são preferidas ao cepticismo e à ideia do nada, porque se sabe, instintivamente, que estão certas, mas elas só satisfazem imperfeitamente, porque ainda deixam a alma no vago, porque por si sós elas são impotentes para dar a solução de uma porção de problemas.
O simples Espiritualismo está na posição de um homem que percebe o seu objetivo, mas que ainda não sabe qual o caminho para atingi-lo e que encontra escolhos sob seus passos. Eis por que, nestes últimos tempos, um tão grande número de escritores e de filósofos trataram de sondar esses misteriosos arcanos; por que tantos sistemas têm sido criados com o propósito de resolver os inúmeros problemasque continuam insolúveis.
Sejam esses sistemas racionais ou absurdos, nem por isto testemunham menos as tendências espiritualistas da época, tendências das quais não mais se faz mistério; das quais não se procura ocultar, e das quais, ao contrário, se gloriam, como outrora se gloriavam da sua incredulidade.
Se nenhum desses sistemas chegou à verdade completa, é incontestável que vários dela se aproximaram ou a afloraram, e que a discussão que se seguiu preparou o caminho, dispondo os Espíritos para tais estudos.
Foi nessas circunstâncias, eminentemente favoráveis, que chegou o Espiritismo. Um pouco mais cedo, ele ter-se-ia chocado com o materialismo todo-poderoso; em tempo mais recuado, teria sido abafado pelo fanatismo cego. Ele se apresenta no momento em que o fanatismo, morto pela incredulidade que ele mesmo provocou, não mais lhe pode opor uma barreira séria, e em que se está fatigado do vazio deixado pelo materialismo; no momento em que a reação espiritualista, provocada pelos excessos do materialismo, se apodera de todos os Espíritos, quando se está à procura das grandes soluções que interessam ao futuro da Humanidade.
Portanto, é neste momento que ele vem resolver estes problemas, não por hipóteses, mas por provas efetivas, dando ao Espiritismo o caráter positivo, único que convém à nossa época. Aí se encontra o que se busca e que se não encontrou alhures. Eis por que o aceitam tão facilmente. Milhares de órgãos lhe abriram e continuam abrindo caminho, semeando pouco a pouco as ideias que ele professa. Não se deve crer que neste caso haja apenas obras sérias, lidas por um pequeno número de eruditos! Notai quanto, sob a forma leve do romance ou do boletim, abundam no momento os pensamentos espíritas, que penetram em toda parte, até mesmo nos que menos nele pensam. São outros tantos germes latentes que eclodirão quando vier a grande luz, pois estarão familiarizados com as ideias novas.
Um dos mais importantes princípios do Espiritismo é, sem contradita, o da pluralidade das existências corpóreas, isto é, da reencarnação, que os cépticos confundem, voluntariamente ou por ignorância, com o dogma da metempsicose. Sem este princípio a gente se choca com tantas dificuldades insolúveis na ordem moral e psicológica, que muitos filósofos modernos a ele foram conduzidos pela força do raciocínio, como a uma lei necessária da Natureza. Tais são Charles Fourier, Jean Reynaud e muitos outros.
Este princípio, hoje discutido abertamente por homens de grande valor, sem que, por isto, sejam espíritas, tem uma tendência manifesta de introduzir-se na filosofia moderna. Uma vez de posse dessa chave, ele verá abrirem-se à sua frente horizontes novos, e as dificuldades mais árduas serão aplainadas como que por encanto. Ora, ele não pode deixar de atingir esse ponto. Para aí será conduzido pela força das coisas, porque a pluralidade das existências não é um sistema, mas uma lei da Natureza, que ressalta da evidência dos fatos.
Sem ser tão claramente formulado quanto em Fourier e Reynaud, nem erigido em doutrina, o princípio da pluralidade das existências agora se acha numa porção de escritores, e consequentemente em todas as bocas, de sorte que pode-se dizer que está na ordem do dia e tende a tomar lugar entre as crenças religiosas vulgares, posto que, em muitas, ele precede o conhecimento do Espiritismo. É uma consequência natural da reação espiritualista que se opera no momento, e à qual o Espiritismo vem dar forte impulso.
Para as citações, não teríamos senão a dificuldade na escolha. Limitar-nosemos à passagem seguinte, de um dos últimos romances da Sra. George Sand: Mademoseille de la Quintinie, notável obra filosófica, posta no índex pela cúria romana, bem como a Revue des Deux Mondes, que a publicou nos números de 1º e 15 de março, abril e maio de 1863. Nessa passagem, trata-se de um sacerdote muito culpado, levado ao arrependimento, à reparação e à expiação terrenas pelos severos conselhos de um leigo que, entre outras coisas, lhe diz isto:
“Dizeis que passastes a idade das paixões!... Não, porque entrais na das vinganças e perseguições. Cuidado! Contudo, seja qual for a vossa sorte entre nós, vereis claro um dia no além-túmulo, e como não creio mais nos castigos sem fim do que nas provas sem frutos, eu vos anuncio que nos encontraremos nalgum lugar, onde nos entenderemos melhor, e onde nos amaremos, em vez de nos combatermos. Mas, como vós, não creio na impunidade do mal e na eficácia do erro. Creio que expiareis o voluntário endurecimento de vosso coração por grandes dilacerações do coração em outra existência. Só vos cabe entrar na via direta da felicidade progressiva, pois estou certo que tudo pode ser resgatado a partir desta vida. A alma humana é dotada de magníficas forças de arrependimento e de reabilitação. Isto não é contrário aos vossos dogmas, e vossa palavra constrição diz muito”.
Em próximo artigo examinaremos a obra do Sr. Renan sobre a vida de Jesus e mostraremos que, malgrado suas aparências e sem que o autor o saiba, é uma reação espiritualista. O materialismo, por mais que proclame o nada, em vão sacode o círculo da lógica e da consciência universal que o encerra. Seus últimos gritos são abafados pela voz que lhe grita dos quatros cantos do mundo: “Nós temos uma alma imortal”. Mas, em proveito de quem será a reação? É o que nos dirá um futuro que não está distante.
Esperando que falemos da obra do Sr. Renan, recomendamos com insistência aos nossos leitores uma pequena brochura, na qual a questão nos parece encarada de um ponto de vista muito racional, e que contém observações muito preciosas sobre esse delicado problema. Seu título é: “Réflexions d’un orthodoxe de 1’Église grecque sur la vie de Jésus, por M. Renan (Didier e Cia. Preço 50 cêntimos).
O próprio clero sofria essa influência. A conduta, particular ou pública, de muitos de seus membros, em completo descompasso entre os seus ensinos e os do Cristo, provava que eles não acreditavam no que pregavam, porque, se tivessem acreditado firmemente na vida futura e nos castigos, teriam preterido menos os interesses do Céu pelos da Terra.
Assim, tinham-se buscado todas as bases das instituições humanas na ordem das coisas materiais. Contudo, acabaram reconhecendo que faltava a essas instituições um sólido ponto de apoio, porquanto as que pareciam melhor assentadas se esboroavam num dia de tempestade; visto que as leis repressivas mascaravam os vícios, mas não tornavam os homens melhores.
Qual era esse ponto de apoio? Aí estava a questão, mas buscavam, e alguns acabaram por crer que Deus bem podia servir para alguma coisa no Universo. Depois, alguns Espíritos fortes começaram a ter medo, e para não mais rirem do futuro senão apenas nos lábios, diziam: Pretendem que tudo acaba com a morte, mas, em definitivo, que sabem disso os que o afirmam? Afinal de contas, é apenas a sua opinião. Antes de Cristóvão Colombo também se acreditava que nada houvesse além do oceano. E se houvesse alguma coisa além do túmulo? Contudo, seria interessante sabê-lo, porque, se houver algo, todos temos que passar por isso, porque todos morremos. Como se fica ali? Bem? Mal? A questão é importante e deve ser considerada. Mas se sobrevivemos, certamente não será o nosso corpo. Então temos uma alma? Assim, a alma não seria uma quimera? Então, como é essa alma? De onde vem? Para onde vai?
Daí uma vaga inquietação apoderou-se dos mais fanfarrões diante da morte. Começaram a procurar, a discutir, depois, reconhecendo que, fizessem o que fizessem, nunca estariam bem na Terra, e que por vezes até estariam muito mal, lançaram as vistas e as esperanças em direção ao futuro.
Todas as coisas extremas têm a sua reação, quando não estão de acordo com a verdade, pois só a verdade é imutável. As ideias materialistas haviam chegado ao apogeu. Então perceberam que elas não davam o que delas esperavam; que deixavam o vazio no coração; que elas abriam um abismo insondável, diante do qual recuavam com terror, como diante de um precipício. Daí uma aspiração pelo desconhecido e, em consequência, uma inevitável reação para as ideias espiritualistas, como única saída possível.
É essa reação que se manifesta há alguns anos. Mas o homem chegou às culminâncias da inteligência. Ora, a essa idade, em que a faculdade de compreender está adulta, ele não mais pode ser conduzido como na infância ou na adolescência. O positivismo da vida lhe ensinou a procurar. Dizemos mais, tornou-lhe necessário o porquê e o como de cada coisa, pois em nosso século matemático, há necessidade de termos consciência de tudo, de tudo calcular, de tudo medir, para sabermos onde pomos o pé. Quer-se a certeza, senão material, ao menos moral, até na abstração. Não basta dizer que uma coisa é boa ou má, quer-se saber por que ela é boa ou má, e se se há ou não razão para prescrevê-la ou proibi-la. Eis por que a fé cega não mais tem curso em nosso século raciocinador. Não pedem apenas para ter fé. Hoje desejam-na e sentem sua sede dela, pois ela é uma necessidade. Querem, porém, uma fé raciocinada. Discutir sua crença é uma necessidade da época, à qual, de bom ou de mau grado, é preciso resignar-se.
As ideias espiritualistas respondem bem às aspirações gerais, pois são preferidas ao cepticismo e à ideia do nada, porque se sabe, instintivamente, que estão certas, mas elas só satisfazem imperfeitamente, porque ainda deixam a alma no vago, porque por si sós elas são impotentes para dar a solução de uma porção de problemas.
O simples Espiritualismo está na posição de um homem que percebe o seu objetivo, mas que ainda não sabe qual o caminho para atingi-lo e que encontra escolhos sob seus passos. Eis por que, nestes últimos tempos, um tão grande número de escritores e de filósofos trataram de sondar esses misteriosos arcanos; por que tantos sistemas têm sido criados com o propósito de resolver os inúmeros problemasque continuam insolúveis.
Sejam esses sistemas racionais ou absurdos, nem por isto testemunham menos as tendências espiritualistas da época, tendências das quais não mais se faz mistério; das quais não se procura ocultar, e das quais, ao contrário, se gloriam, como outrora se gloriavam da sua incredulidade.
Se nenhum desses sistemas chegou à verdade completa, é incontestável que vários dela se aproximaram ou a afloraram, e que a discussão que se seguiu preparou o caminho, dispondo os Espíritos para tais estudos.
Foi nessas circunstâncias, eminentemente favoráveis, que chegou o Espiritismo. Um pouco mais cedo, ele ter-se-ia chocado com o materialismo todo-poderoso; em tempo mais recuado, teria sido abafado pelo fanatismo cego. Ele se apresenta no momento em que o fanatismo, morto pela incredulidade que ele mesmo provocou, não mais lhe pode opor uma barreira séria, e em que se está fatigado do vazio deixado pelo materialismo; no momento em que a reação espiritualista, provocada pelos excessos do materialismo, se apodera de todos os Espíritos, quando se está à procura das grandes soluções que interessam ao futuro da Humanidade.
Portanto, é neste momento que ele vem resolver estes problemas, não por hipóteses, mas por provas efetivas, dando ao Espiritismo o caráter positivo, único que convém à nossa época. Aí se encontra o que se busca e que se não encontrou alhures. Eis por que o aceitam tão facilmente. Milhares de órgãos lhe abriram e continuam abrindo caminho, semeando pouco a pouco as ideias que ele professa. Não se deve crer que neste caso haja apenas obras sérias, lidas por um pequeno número de eruditos! Notai quanto, sob a forma leve do romance ou do boletim, abundam no momento os pensamentos espíritas, que penetram em toda parte, até mesmo nos que menos nele pensam. São outros tantos germes latentes que eclodirão quando vier a grande luz, pois estarão familiarizados com as ideias novas.
Um dos mais importantes princípios do Espiritismo é, sem contradita, o da pluralidade das existências corpóreas, isto é, da reencarnação, que os cépticos confundem, voluntariamente ou por ignorância, com o dogma da metempsicose. Sem este princípio a gente se choca com tantas dificuldades insolúveis na ordem moral e psicológica, que muitos filósofos modernos a ele foram conduzidos pela força do raciocínio, como a uma lei necessária da Natureza. Tais são Charles Fourier, Jean Reynaud e muitos outros.
Este princípio, hoje discutido abertamente por homens de grande valor, sem que, por isto, sejam espíritas, tem uma tendência manifesta de introduzir-se na filosofia moderna. Uma vez de posse dessa chave, ele verá abrirem-se à sua frente horizontes novos, e as dificuldades mais árduas serão aplainadas como que por encanto. Ora, ele não pode deixar de atingir esse ponto. Para aí será conduzido pela força das coisas, porque a pluralidade das existências não é um sistema, mas uma lei da Natureza, que ressalta da evidência dos fatos.
Sem ser tão claramente formulado quanto em Fourier e Reynaud, nem erigido em doutrina, o princípio da pluralidade das existências agora se acha numa porção de escritores, e consequentemente em todas as bocas, de sorte que pode-se dizer que está na ordem do dia e tende a tomar lugar entre as crenças religiosas vulgares, posto que, em muitas, ele precede o conhecimento do Espiritismo. É uma consequência natural da reação espiritualista que se opera no momento, e à qual o Espiritismo vem dar forte impulso.
Para as citações, não teríamos senão a dificuldade na escolha. Limitar-nosemos à passagem seguinte, de um dos últimos romances da Sra. George Sand: Mademoseille de la Quintinie, notável obra filosófica, posta no índex pela cúria romana, bem como a Revue des Deux Mondes, que a publicou nos números de 1º e 15 de março, abril e maio de 1863. Nessa passagem, trata-se de um sacerdote muito culpado, levado ao arrependimento, à reparação e à expiação terrenas pelos severos conselhos de um leigo que, entre outras coisas, lhe diz isto:
“Dizeis que passastes a idade das paixões!... Não, porque entrais na das vinganças e perseguições. Cuidado! Contudo, seja qual for a vossa sorte entre nós, vereis claro um dia no além-túmulo, e como não creio mais nos castigos sem fim do que nas provas sem frutos, eu vos anuncio que nos encontraremos nalgum lugar, onde nos entenderemos melhor, e onde nos amaremos, em vez de nos combatermos. Mas, como vós, não creio na impunidade do mal e na eficácia do erro. Creio que expiareis o voluntário endurecimento de vosso coração por grandes dilacerações do coração em outra existência. Só vos cabe entrar na via direta da felicidade progressiva, pois estou certo que tudo pode ser resgatado a partir desta vida. A alma humana é dotada de magníficas forças de arrependimento e de reabilitação. Isto não é contrário aos vossos dogmas, e vossa palavra constrição diz muito”.
Em próximo artigo examinaremos a obra do Sr. Renan sobre a vida de Jesus e mostraremos que, malgrado suas aparências e sem que o autor o saiba, é uma reação espiritualista. O materialismo, por mais que proclame o nada, em vão sacode o círculo da lógica e da consciência universal que o encerra. Seus últimos gritos são abafados pela voz que lhe grita dos quatros cantos do mundo: “Nós temos uma alma imortal”. Mas, em proveito de quem será a reação? É o que nos dirá um futuro que não está distante.
Esperando que falemos da obra do Sr. Renan, recomendamos com insistência aos nossos leitores uma pequena brochura, na qual a questão nos parece encarada de um ponto de vista muito racional, e que contém observações muito preciosas sobre esse delicado problema. Seu título é: “Réflexions d’un orthodoxe de 1’Église grecque sur la vie de Jésus, por M. Renan (Didier e Cia. Preço 50 cêntimos).
Um de nossos irmãos em Espiritismo, membro da Sociedade de Paris, o Sr. Costeau, acaba de morrer. Ele foi inumado a 12 de setembro último, no cemitério de Montmartre. Era um homem de coração, que o Espiritismo havia reconduzido a Deus; sua fé no futuro era completa, sincera e profunda; era um simples calceteiro, que praticava a caridade por pensamento, por palavras e por atos, conforme seus parcos recursos, pois sempre achava meios de assistir aos que tinham menos que ele.
Seria erro pensar que a Sociedade de Paris é uma reunião exclusivamente aristocrática, porque ela conta com mais de um proletário em seu seio; ela acolhe todos os devotamentos à causa que sustenta, quer venham das altas, quer das baixas camadas sociais; o grão-senhor e o artífice aí se dão as mãos fraternalmente. Há algum tempo, no casamento de um dos nossos colegas, modesto trabalhador também, estiveram presentes um alto dignitário estrangeiro e a princesa sua esposa, ambos membros da Sociedade, que não se haviam sentido diminuídos, vindo sentarse lado a lado com outros assistentes, posto o luxo da cerimônia, celebrada em obscura capela de opulenta paróquia, tivesse sido reduzido à expressão mais simples. É que o Espiritismo, sem sonhar com uma igualdade quimérica, sem confundir as classes, sem pretender fazer passar todos os homens para um mesmo nível social impossível, os faz apreciar de um ponto de vista diverso do prisma fascinante do mundo. Ele ensina que o pequeno pode ter sido grande na Terra; que o grande pode tornar-se pequeno e que no reino celeste as classes terrenas não são levadas em conta. É assim que, destruindo logicamente os preconceitos sociais de casta e de cor, conduz à verdadeira fraternidade.
Nosso irmão Costeau era pobre e deixa uma viúva necessitada. Assim, foi levado à vala comum, porta que conduz ao Céu, tanto quanto suntuoso mausoléu.
O Sr. d’Ambel, vice-presidente, e o Sr. Canu, secretário da Sociedade, conduziram o enterro. Um e outro pronunciaram sobre a sepultura palavras que causaram viva impressão no auditório e nos coveiros, visivelmente comovidos, posto que insensíveis a tais cerimônias.
Eis a alocução do Sr. Canu:
“Caro irmão Costeau! Há apenas alguns anos, muitos dentre nós, e eu confesso que era o primeiro, não teríamos visto ante este túmulo aberto senão o fim das misérias humanas, e depois o nada, isto é, nada de alma para merecer ou expiar e, consequentemente, nada de Deus para recompensar, castigar ou perdoar. Hoje, graças à nossa divina doutrina, aqui vemos o fim das provas, e para vós, caro irmão, cujos despojos mortais devolvemos à terra, o triunfo em nossos labores e o começo das recompensas que vos mereceu vossa coragem, vossa resignação, vossa caridade, numa palavra as vossas virtudes e, acima de tudo, a glorificação de um Deus sábio, todo-poderoso, justo e bom.
“Levai pois, caro irmão, nossas ações de graças aos pés do Eterno, que quis dissipar em redor de nós as trevas do erro e da incredulidade, porque, ainda há pouco tempo, nesta circunstância, nós vos teríamos dito, com a fronte morna e o coração desencorajado: “Adeus, amigo, para sempre.” Hoje vos dizemos, com a fronte erguida e radiando esperança, e com o coração cheio de coragem e de amor: “Caro irmão, até à vista, e orai por nós.”
Alocução do Sr. d’Ambel:
“Senhoras, senhores e vós, caros colegas da Sociedade de Paris. É a segunda vez que conduzimos um colega à sua última morada. Aquele a quem vimos dizer adeus foi um desses obscuros lutadores que as dificuldades da vida sempre encontraram inamolgável; contudo, a certeza absoluta por muito tempo lhe havia faltado. Assim, desde que o Espiritismo se lhe tornou conhecido, apressou-se em abraçar uma doutrina que lhe trazia a verdade, e cujos ensinamentos são tão próprios a consolar em suas provas os aflitos deste mundo.
“Modesto trabalhador, ele sempre cumpriu sua tarefa com a serenidade do justo, e a adversidade que feriu tão cruelmente, para nosso pesar, os últimos dias de sua vida, lhe abriu, ─ ficai certos, todos que me ouvis ─ uma próxima carreira de prosperidade e ventura.
“Ah! Quanto lamento que nosso mestre venerado não esteja em Paris! Sua voz autorizada teria sido bem mais agradável que a minha ao irmão que perdemos e lhe teria prestado uma homenagem mais considerável que a que lhe pode prestar minha obscuridade.
“Eu teria desejado dar aos funerais de nosso colega uma solenidade maior, mas fui prevenido muito tarde para comunicar a todos os membros da Sociedade presentes em Paris. Mas, por poucos que sejamos aqui, representamos a grande família espírita, que uma fé comum no futuro une, de um extremo ao outro do mundo. Nós somos os delegados de muitos milhões de adeptos, em cujo nome vimos pedir, caro e lamentado colega, que contribuais, de agora em diante, nos limites de vossas novas faculdades, para a propaganda de nossa grande doutrina que, em meio a vossas últimas e cruéis provas, vos sustentou tão energicamente.
“Ah! Como disse tão eloquentemente nosso caro presidente Allan Kardec, no enterro de nosso irmão Sanson, é que a fé espírita dá, nestes momentos supremos, uma força da qual só se pode dar conta aquele que a possui, e essa fé, o Sr. Costeau a possuía no mais alto grau.
“Caro senhor Costeau, sabeis do vivo interesse que a Sociedade Espírita de Paris tinha por vós. Ela sempre vos lembrará como um de seus membros mais assíduos, e é em seu nome, em nome de seu presidente, em nome de vossa esposa e de vossa irmã desoladas que vos venho dizer, como o nosso amigo Sr. Canu, não um adeus, mas até à vista, num mundo mais feliz. Que possais gozar nesse onde agora vos achais a felicidade que mereceis, e vir nos estender a mão, quando chegar a nossa vez de nele entrar.
“Caros Espíritos dos Srs. Jobard e Sanson, eu vos peço que acolhais o nosso colega Sr. Costeau e lhe faciliteis o acesso às vossas serenas regiões.
“Caros Espíritos, orai por ele. Orai por nós. Que assim seja.”
Após esta alocução, o Sr. d’Ambel pronunciou textualmente a prece pelos que acabam de morrer, que foi dita sobre o túmulo do Sr. Sanson. (Revista Espírita de maio de 1862).
O Sr. Vézy, um dos médiuns da Sociedade, nome conhecido dos nossos leitores pelas belas comunicações de Santo Agostinho, desceu à fossa, e o Sr. d’Ambel fez em voz alta a evocação do Sr. Costeau, que deu, pelo Sr. Vézy, a comunicação seguinte, cuja leitura todos os assistentes, inclusive os coveiros, ouviram com a cabeça descoberta e com profunda emoção. Com efeito, ouvir as palavras de um morto, colhidas dentro da própria tumba, era um espetáculo novo e empolgante.
“Obrigado, amigos, obrigado. Minha sepultura ainda não está fechada, e contudo, mais um segundo e a terra vai cobrir meus restos. Mas, vós o sabeis, sob esta poeira minha alma não será enterrada. Ela vai planar no espaço, para subir a Deus.
“Assim, como é consolador poder ainda dizer, malgrado o envoltório aniquilado: Oh não! Não estou morto! Vivo a verdadeira vida, a vida eterna!
“O enterro do pobre não é seguido por um grande número. As orgulhosas manifestações não se dão sobre o seu túmulo, e contudo, amigos, crede-me, aqui não falta a multidão imensa, e bons Espíritos seguiram convosco e com estas mulheres piedosas o corpo que aqui está deitado! Todos vós, pelo menos, acreditais, e amais o bom Deus!
“Oh! Certamente não! Nós não morremos porque o nosso corpo se parte, esposa bem amada! De agora em diante estarei sempre junto a ti, para te consolar e te ajudar a suportar a prova. Ela te será rude, a vida, mas, com a ideia da eternidade e do amor a Deus enchendo teu coração, como te serão leves os sofrimentos!
“Parentes que rodeais minha amada companheira, amai-a, respeitai-a; sede para ela irmãos e irmãs. Não esqueçais que na Terra vós vos deveis assistência, se quiserdes entrar no repouso do Senhor.
“E vós, espíritas! irmãos, amigos, obrigado por terdes vindo dizer-me adeus até esta morada de pó e de lama. Mas vós sabeis, sabeis muito bem que minha alma vive imortal, e que ela irá algumas vezes vos pedir preces, que não me serão recusadas, para me ajudar nesta via magnífica que em vida me abristes.
“Adeus a todos que aqui estais. Poderemos rever-nos noutro lugar que não sobre esta sepultura.
“As almas me chamam ao seu encontro.
“Adeus! Orai por aqueles que sofrem. Até à vista.
“COSTEAU”
Seria erro pensar que a Sociedade de Paris é uma reunião exclusivamente aristocrática, porque ela conta com mais de um proletário em seu seio; ela acolhe todos os devotamentos à causa que sustenta, quer venham das altas, quer das baixas camadas sociais; o grão-senhor e o artífice aí se dão as mãos fraternalmente. Há algum tempo, no casamento de um dos nossos colegas, modesto trabalhador também, estiveram presentes um alto dignitário estrangeiro e a princesa sua esposa, ambos membros da Sociedade, que não se haviam sentido diminuídos, vindo sentarse lado a lado com outros assistentes, posto o luxo da cerimônia, celebrada em obscura capela de opulenta paróquia, tivesse sido reduzido à expressão mais simples. É que o Espiritismo, sem sonhar com uma igualdade quimérica, sem confundir as classes, sem pretender fazer passar todos os homens para um mesmo nível social impossível, os faz apreciar de um ponto de vista diverso do prisma fascinante do mundo. Ele ensina que o pequeno pode ter sido grande na Terra; que o grande pode tornar-se pequeno e que no reino celeste as classes terrenas não são levadas em conta. É assim que, destruindo logicamente os preconceitos sociais de casta e de cor, conduz à verdadeira fraternidade.
Nosso irmão Costeau era pobre e deixa uma viúva necessitada. Assim, foi levado à vala comum, porta que conduz ao Céu, tanto quanto suntuoso mausoléu.
O Sr. d’Ambel, vice-presidente, e o Sr. Canu, secretário da Sociedade, conduziram o enterro. Um e outro pronunciaram sobre a sepultura palavras que causaram viva impressão no auditório e nos coveiros, visivelmente comovidos, posto que insensíveis a tais cerimônias.
Eis a alocução do Sr. Canu:
“Caro irmão Costeau! Há apenas alguns anos, muitos dentre nós, e eu confesso que era o primeiro, não teríamos visto ante este túmulo aberto senão o fim das misérias humanas, e depois o nada, isto é, nada de alma para merecer ou expiar e, consequentemente, nada de Deus para recompensar, castigar ou perdoar. Hoje, graças à nossa divina doutrina, aqui vemos o fim das provas, e para vós, caro irmão, cujos despojos mortais devolvemos à terra, o triunfo em nossos labores e o começo das recompensas que vos mereceu vossa coragem, vossa resignação, vossa caridade, numa palavra as vossas virtudes e, acima de tudo, a glorificação de um Deus sábio, todo-poderoso, justo e bom.
“Levai pois, caro irmão, nossas ações de graças aos pés do Eterno, que quis dissipar em redor de nós as trevas do erro e da incredulidade, porque, ainda há pouco tempo, nesta circunstância, nós vos teríamos dito, com a fronte morna e o coração desencorajado: “Adeus, amigo, para sempre.” Hoje vos dizemos, com a fronte erguida e radiando esperança, e com o coração cheio de coragem e de amor: “Caro irmão, até à vista, e orai por nós.”
Alocução do Sr. d’Ambel:
“Senhoras, senhores e vós, caros colegas da Sociedade de Paris. É a segunda vez que conduzimos um colega à sua última morada. Aquele a quem vimos dizer adeus foi um desses obscuros lutadores que as dificuldades da vida sempre encontraram inamolgável; contudo, a certeza absoluta por muito tempo lhe havia faltado. Assim, desde que o Espiritismo se lhe tornou conhecido, apressou-se em abraçar uma doutrina que lhe trazia a verdade, e cujos ensinamentos são tão próprios a consolar em suas provas os aflitos deste mundo.
“Modesto trabalhador, ele sempre cumpriu sua tarefa com a serenidade do justo, e a adversidade que feriu tão cruelmente, para nosso pesar, os últimos dias de sua vida, lhe abriu, ─ ficai certos, todos que me ouvis ─ uma próxima carreira de prosperidade e ventura.
“Ah! Quanto lamento que nosso mestre venerado não esteja em Paris! Sua voz autorizada teria sido bem mais agradável que a minha ao irmão que perdemos e lhe teria prestado uma homenagem mais considerável que a que lhe pode prestar minha obscuridade.
“Eu teria desejado dar aos funerais de nosso colega uma solenidade maior, mas fui prevenido muito tarde para comunicar a todos os membros da Sociedade presentes em Paris. Mas, por poucos que sejamos aqui, representamos a grande família espírita, que uma fé comum no futuro une, de um extremo ao outro do mundo. Nós somos os delegados de muitos milhões de adeptos, em cujo nome vimos pedir, caro e lamentado colega, que contribuais, de agora em diante, nos limites de vossas novas faculdades, para a propaganda de nossa grande doutrina que, em meio a vossas últimas e cruéis provas, vos sustentou tão energicamente.
“Ah! Como disse tão eloquentemente nosso caro presidente Allan Kardec, no enterro de nosso irmão Sanson, é que a fé espírita dá, nestes momentos supremos, uma força da qual só se pode dar conta aquele que a possui, e essa fé, o Sr. Costeau a possuía no mais alto grau.
“Caro senhor Costeau, sabeis do vivo interesse que a Sociedade Espírita de Paris tinha por vós. Ela sempre vos lembrará como um de seus membros mais assíduos, e é em seu nome, em nome de seu presidente, em nome de vossa esposa e de vossa irmã desoladas que vos venho dizer, como o nosso amigo Sr. Canu, não um adeus, mas até à vista, num mundo mais feliz. Que possais gozar nesse onde agora vos achais a felicidade que mereceis, e vir nos estender a mão, quando chegar a nossa vez de nele entrar.
“Caros Espíritos dos Srs. Jobard e Sanson, eu vos peço que acolhais o nosso colega Sr. Costeau e lhe faciliteis o acesso às vossas serenas regiões.
“Caros Espíritos, orai por ele. Orai por nós. Que assim seja.”
Após esta alocução, o Sr. d’Ambel pronunciou textualmente a prece pelos que acabam de morrer, que foi dita sobre o túmulo do Sr. Sanson. (Revista Espírita de maio de 1862).
O Sr. Vézy, um dos médiuns da Sociedade, nome conhecido dos nossos leitores pelas belas comunicações de Santo Agostinho, desceu à fossa, e o Sr. d’Ambel fez em voz alta a evocação do Sr. Costeau, que deu, pelo Sr. Vézy, a comunicação seguinte, cuja leitura todos os assistentes, inclusive os coveiros, ouviram com a cabeça descoberta e com profunda emoção. Com efeito, ouvir as palavras de um morto, colhidas dentro da própria tumba, era um espetáculo novo e empolgante.
“Obrigado, amigos, obrigado. Minha sepultura ainda não está fechada, e contudo, mais um segundo e a terra vai cobrir meus restos. Mas, vós o sabeis, sob esta poeira minha alma não será enterrada. Ela vai planar no espaço, para subir a Deus.
“Assim, como é consolador poder ainda dizer, malgrado o envoltório aniquilado: Oh não! Não estou morto! Vivo a verdadeira vida, a vida eterna!
“O enterro do pobre não é seguido por um grande número. As orgulhosas manifestações não se dão sobre o seu túmulo, e contudo, amigos, crede-me, aqui não falta a multidão imensa, e bons Espíritos seguiram convosco e com estas mulheres piedosas o corpo que aqui está deitado! Todos vós, pelo menos, acreditais, e amais o bom Deus!
“Oh! Certamente não! Nós não morremos porque o nosso corpo se parte, esposa bem amada! De agora em diante estarei sempre junto a ti, para te consolar e te ajudar a suportar a prova. Ela te será rude, a vida, mas, com a ideia da eternidade e do amor a Deus enchendo teu coração, como te serão leves os sofrimentos!
“Parentes que rodeais minha amada companheira, amai-a, respeitai-a; sede para ela irmãos e irmãs. Não esqueçais que na Terra vós vos deveis assistência, se quiserdes entrar no repouso do Senhor.
“E vós, espíritas! irmãos, amigos, obrigado por terdes vindo dizer-me adeus até esta morada de pó e de lama. Mas vós sabeis, sabeis muito bem que minha alma vive imortal, e que ela irá algumas vezes vos pedir preces, que não me serão recusadas, para me ajudar nesta via magnífica que em vida me abristes.
“Adeus a todos que aqui estais. Poderemos rever-nos noutro lugar que não sobre esta sepultura.
“As almas me chamam ao seu encontro.
“Adeus! Orai por aqueles que sofrem. Até à vista.
“COSTEAU”
Terminadas as últimas formalidades fúnebres, esses senhores foram fazer uma visita espírita, no mesmo cemitério, ao túmulo de Georges, esse eminente Espírito que deu, por intermédio da Sra. Costel, as belas comunicações que nossos leitores por vezes têm admirado.
O Sr. Georges era, em vida, cunhado do Sr. d’Ambel. Lá, por intermédio do Sr. Vézy, recolheram as seguintes palavras:
“Embora não vivamos aqui (no local da inumação), gostamos de vir aqui para vos agradecer pelas preces que vindes fazer por nós, e pelas flores que espalhais sobre os nossos túmulos.
“Como fizeram bem criando estes lugares de repouso e de prece! As almas podem conversar mais à vontade e, nesses impulsos íntimos, melhor permutam os sentimentos que as animam: uma junto a um túmulo, outra, planando acima! “Acabais de dizer adeus a um dos vossos amigos; agradeço por me não terdes esquecido. Eu estava convosco naquela multidão de Espíritos que se comprimiam junto ao túmulo que acaba de abrir-se e me sentia feliz ao ler em vossos corações a convicção e a fé. Misturei às vossas as minhas preces, e os Espíritos bemaventurados as levaram a Deus!
“Meus bons amigos, a fé espírita dará a volta ao redor do mundo e acabará transformando os loucos em sábios. Ela penetrará até no coração desses padres que vistes há pouco sorrindo, e que vos causaram uma dor verdadeira... (alusão à maneira pela qual se realizou a cerimônia religiosa). Seu escândalo fez sangrar os vossos corações, mas superastes a indignação, pensando no bem que íeis derramar na alma do vosso amigo. Ela está aqui, perto de mim, e pede que eu vos agradeça em seu nome.
“Já vos disseram que a tumba é a vida. Vinde algumas vezes à sombra do salgueiro, ao pé da cruz mortuária, e em meio ao silêncio, à calma, ouvireis uma harmonia divina; em meio à brisa ouvireis os concertos de nossas almas, cantando Deus... a eternidade... Depois, alguns de nós destacar-se-ão dos coros sagrados para virem instruir-vos sobre os vossos destinos. Aquilo que, até hoje, ficou em mistério para vós, desvendar-se-á pouco a pouco aos vossos olhos e podereis compreender o vosso começo e as vossas grandezas futuras.
“Então marcai encontros aqui, vós que quereis instruir-vos. Aqui lereis as páginas da eternidade, e o livro da vida estará sempre aberto para vós. Neste lugar de calma e de paz, a voz do Espírito parece fazer ouvir-se melhor para aquele que ela quer instruir; ela toma proporções mágicas e sonoras e seus acentos penetram mais aquele sobre o qual ela quer agir.
“Trabalhai com zelo e fervor na propaganda da ideia nova. Eu vos ajudarei sem cessar, e se a tranquilidade do túmulo amedrontar a uns, que saibam que os bons Espíritos sentem-se felizes instruindo por toda parte.
“Adeus e obrigado! Como eu gostaria de poder transmitir ao mundo inteiro a fé de que estais cheios! Mas, em verdade vos digo, o Espiritismo é a alavanca com a qual Arquimedes levantará o mundo!
“Algumas palavras a vós, meu irmão, particularmente, já que se apresenta a ocasião. Dizei a minha irmã que ame sempre os deveres impostos por Deus, por mais pesados que sejam. Dizei-lhe que ame a nossa mãe e me substitua junto a ela.
Dizei-lhe que vele por minha filha, que sorria para o céu e que encontre
perfume em todas as flores da Terra...
“À vós, meu irmão, aperto as duas mãos.
“GEORGES”
O Sr. Georges era, em vida, cunhado do Sr. d’Ambel. Lá, por intermédio do Sr. Vézy, recolheram as seguintes palavras:
“Embora não vivamos aqui (no local da inumação), gostamos de vir aqui para vos agradecer pelas preces que vindes fazer por nós, e pelas flores que espalhais sobre os nossos túmulos.
“Como fizeram bem criando estes lugares de repouso e de prece! As almas podem conversar mais à vontade e, nesses impulsos íntimos, melhor permutam os sentimentos que as animam: uma junto a um túmulo, outra, planando acima! “Acabais de dizer adeus a um dos vossos amigos; agradeço por me não terdes esquecido. Eu estava convosco naquela multidão de Espíritos que se comprimiam junto ao túmulo que acaba de abrir-se e me sentia feliz ao ler em vossos corações a convicção e a fé. Misturei às vossas as minhas preces, e os Espíritos bemaventurados as levaram a Deus!
“Meus bons amigos, a fé espírita dará a volta ao redor do mundo e acabará transformando os loucos em sábios. Ela penetrará até no coração desses padres que vistes há pouco sorrindo, e que vos causaram uma dor verdadeira... (alusão à maneira pela qual se realizou a cerimônia religiosa). Seu escândalo fez sangrar os vossos corações, mas superastes a indignação, pensando no bem que íeis derramar na alma do vosso amigo. Ela está aqui, perto de mim, e pede que eu vos agradeça em seu nome.
“Já vos disseram que a tumba é a vida. Vinde algumas vezes à sombra do salgueiro, ao pé da cruz mortuária, e em meio ao silêncio, à calma, ouvireis uma harmonia divina; em meio à brisa ouvireis os concertos de nossas almas, cantando Deus... a eternidade... Depois, alguns de nós destacar-se-ão dos coros sagrados para virem instruir-vos sobre os vossos destinos. Aquilo que, até hoje, ficou em mistério para vós, desvendar-se-á pouco a pouco aos vossos olhos e podereis compreender o vosso começo e as vossas grandezas futuras.
“Então marcai encontros aqui, vós que quereis instruir-vos. Aqui lereis as páginas da eternidade, e o livro da vida estará sempre aberto para vós. Neste lugar de calma e de paz, a voz do Espírito parece fazer ouvir-se melhor para aquele que ela quer instruir; ela toma proporções mágicas e sonoras e seus acentos penetram mais aquele sobre o qual ela quer agir.
“Trabalhai com zelo e fervor na propaganda da ideia nova. Eu vos ajudarei sem cessar, e se a tranquilidade do túmulo amedrontar a uns, que saibam que os bons Espíritos sentem-se felizes instruindo por toda parte.
“Adeus e obrigado! Como eu gostaria de poder transmitir ao mundo inteiro a fé de que estais cheios! Mas, em verdade vos digo, o Espiritismo é a alavanca com a qual Arquimedes levantará o mundo!
“Algumas palavras a vós, meu irmão, particularmente, já que se apresenta a ocasião. Dizei a minha irmã que ame sempre os deveres impostos por Deus, por mais pesados que sejam. Dizei-lhe que ame a nossa mãe e me substitua junto a ela.
Dizei-lhe que vele por minha filha, que sorria para o céu e que encontre
perfume em todas as flores da Terra...
“À vós, meu irmão, aperto as duas mãos.
“GEORGES”
Do que se vê acima ressalta um duplo ensinamento. Poderia causar admiração que um Espírito tão vizinho da época da morte tenha podido exprimir-se com tanta lucidez, mas deve-se lembrar que o Sr. Sanson foi evocado na câmara mortuária, antes de ser levado o corpo, e que ele deu, nesse momento, a bela comunicação que todos puderam ler na Revista. Sua perturbação tinha durado apenas algumas horas, e sabe-se, aliás, que o desprendimento é rápido nos Espíritos moralmente adiantados.
Por outro lado, por que o Sr. Vézy desceu à cova? Havia utilidade ou era simples encenação? Afastemos logo o segundo motivo, pois os espíritas sérios agem seriamente e religiosamente e não fazem encenações. Em tal momento teria sido uma profanação. Certamente a utilidade não era absoluta. Deve haver um testemunho mais especial de simpatia, em razão mesmo de que o morto estava na vala comum. Aliás, sabe-se que o acesso a essas valas é mais fácil do que ao das covas particulares, cuja entrada é estreita, e o Sr. Vézy aí se achava mais comodamente para escrever.
Isto, entretanto, poderia ter sua razão de ser, de um outro ponto de vista que provavelmente não veio à mente do Sr. Vézy. Sabe-se que a evocação facilita o desprendimento do Espírito e pode abreviar a duração da perturbação. Também se sabe que os laços que unem o Espírito ao corpo nem sempre são partidos inteiramente logo após a morte. Eis um notável exemplo:
Um jovem tinha morrido acidentalmente de maneira horrível. Sua vida tinha sido a de muitos jovens ricos, desocupados, isto é, muito vinculada à matéria. Ele comunicou-se espontaneamente com um médium de nosso conhecimento, que o tinha conhecido em vida, pedindo que o evocassem e orassem em seu sepulcro, para ajudar a romper os laços que o prendiam ao corpo, do qual ele não conseguia desembaraçar-se. Evidentemente deve haver no caso uma ação magnética facilitada pela proximidade do corpo, e aí talvez esteja uma das causas que, instintivamente, levam os amigos do defunto a irem orar no lugar onde se encontra o corpo.
Por outro lado, por que o Sr. Vézy desceu à cova? Havia utilidade ou era simples encenação? Afastemos logo o segundo motivo, pois os espíritas sérios agem seriamente e religiosamente e não fazem encenações. Em tal momento teria sido uma profanação. Certamente a utilidade não era absoluta. Deve haver um testemunho mais especial de simpatia, em razão mesmo de que o morto estava na vala comum. Aliás, sabe-se que o acesso a essas valas é mais fácil do que ao das covas particulares, cuja entrada é estreita, e o Sr. Vézy aí se achava mais comodamente para escrever.
Isto, entretanto, poderia ter sua razão de ser, de um outro ponto de vista que provavelmente não veio à mente do Sr. Vézy. Sabe-se que a evocação facilita o desprendimento do Espírito e pode abreviar a duração da perturbação. Também se sabe que os laços que unem o Espírito ao corpo nem sempre são partidos inteiramente logo após a morte. Eis um notável exemplo:
Um jovem tinha morrido acidentalmente de maneira horrível. Sua vida tinha sido a de muitos jovens ricos, desocupados, isto é, muito vinculada à matéria. Ele comunicou-se espontaneamente com um médium de nosso conhecimento, que o tinha conhecido em vida, pedindo que o evocassem e orassem em seu sepulcro, para ajudar a romper os laços que o prendiam ao corpo, do qual ele não conseguia desembaraçar-se. Evidentemente deve haver no caso uma ação magnética facilitada pela proximidade do corpo, e aí talvez esteja uma das causas que, instintivamente, levam os amigos do defunto a irem orar no lugar onde se encontra o corpo.
Já falamos do outro retiro instalado em Cempuis, perto de Grandvilliers, no departamento de Oise, pelo Sr. Prévost, membro da Sociedade Espírita de Paris.
A construção está hoje terminada, bem como as instalações internas. Anexa ao estabelecimento, posto que formando uma construção isolada, há uma capela em estilo gótico, de aspecto monumental. A inauguração da capela ocorreu domingo, 19 de julho último, dia de São Vicente de Paulo, a quem é dedicada, numa cerimônia de caridade, isto é, por uma distribuição de pão, vinho e carne aos pobres da paróquia. O Sr. Prévost pronunciou a respeito o discurso seguinte, que temos a satisfação de reproduzir:
“Senhores,
“Conheceis o motivo desta reunião, assim, não me alongarei sobre detalhes inúteis e que nada informam que não saibais. A obra material está hoje praticamente realizada, graças à evidente proteção do Todo-Poderoso, que se dignou secundar os meus esforços. Estamos aqui em família, todos, e não o duvido, animados pelos mesmos sentimentos por sua divina bondade. Unamo-nos, pois, no mesmo impulso de gratidão, e peçamos que ele continue nos assistindo e nos dando as luzes que nos faltam.
“Deus do Céu e da Terra, soberano senhor de todas as coisas, tem piedade de nossa fraqueza! Eleva nossos corações para ti, a fim de que aprendamos a cumprir nossos deveres segundo tua vontade, e para que todas as nossas ações estejam em relação com a tua lei universal. Senhor, faze que nossa alma se encha de teu amor; que ela se apaixone pelo fogo sagrado da convicção e que prove sua fé por atos de verdadeira caridade. Todas as palavras, por melhores que sejam, se não forem seguidas de efeitos de benevolência para com as tuas criaturas, assemelham-se a uma bonita árvore sem frutos.
“Ajuda-nos, pois, Poder Infinito, a superar os obstáculos que poderiam erguerse ante os nossos passos e entravar o nosso desejo de nos tornarmos úteis na missão para a qual nos escolheste. Dá-nos a força necessária para a realizarmos com amor e sinceridade.
“A boa assistência dada à velhice te é agradável, meu Deus, porque é um ato de justiça. Eles nos precederam no caminho. Os sulcos que eles abriram foram regados com seu suor, e nós lhe recolhemos os frutos. Hoje sua experiência é um campo já ceifado, mas onde ainda temos o que colher. É justo, portanto, que recompensemos o seu sacrifício, assegurando-lhes o repouso após o trabalho. É um dever para nós, pois queríamos que o mesmo fosse feito conosco, mas para realizá-lo dignamente, énos necessária a tua assistência, pois temos consciência de nossa fraqueza.
“É também em teu nome, Senhor, que aqui o órfão encontrará uma nova família. O menino abandonado crescerá entre nós ao suave calor do fogo divino com que favoreceste São Vicente de Paulo, a quem pedimos nos assista, para que possamos realizar este ato, a seu exemplo.
“Espírito infinito, tudo está em ti, tudo é por ti, nada está fora de ti. Os castigos, como as recompensas, nos vêm de tua mão abençoada. Conheces as nossas necessidades. Somos teus filhos e nos remetemos à tua divina Providência.
“Os bons Espíritos que sob teu olhar paternal presidem os destinos da Terra, os anjos de guarda dos homens, mereceram tua confiança, Senhor. Esperamos que, por ti, eles nos ajudem a conservar intacto o sublime código de moral promulgado pelo Cristo, teu filho bem-amado. ─ Amai a Deus, disse-nos ele do alto da cruz, há dezoito séculos; amai-vos uns aos outros; amai o vosso próximo como a vós mesmos; praticai a caridade para com todos, em todas as coisas. Eis a sua lei, Senhor, e essa lei é a tua. Possa ela gravar-se em nossos corações e fazer-nos ver como irmãos todos os nossos semelhantes, que, como nós, são teus filhos. Assim seja.
“Meus amigos, meus irmãos, sigamos este grande exemplo, e tenhamos uma sincera fé em Deus. Ele nos ajudará a suportar as consequências da má direção que o esquecimento desses deveres imprimiu à Sociedade, em tempos já distantes. Hoje muitas coisas entram na ordem prescrita pelo Criador. Malgrado o egoísmo que ainda domina um grande número de pessoas, o amor fraterno é melhor compreendido; os preconceitos de casta, da seita e de nacionalidade se apagam pouco a pouco; a tolerância, uma das filhas da caridade evangélica, faz pouco a pouco desaparecerem os antagonismos que por tanto tempo dividiram os filhos de um mesmo Deus; os sentimentos de humanidade se infiltram no coração das massas e já realizaram grandes coisas em diversos pontos da Terra.
“Na França, numerosas fábricas que ficaram sem trabalho experimentaram há pouco tempo os suaves efeitos deste amor do próximo. Esse élan para o sofrimento fala bem alto em favor de nosso país; é preciso ver aí a mão de Deus. É com alegria que vemos a primeira nação do mundo civilizado levar até as plagas mais distantes os frutos desse amor à Humanidade, que só a verdadeira grandeza dá e que ela colheu no centro radiante da cruz, ajudada pela luz do progresso, que obriga o homem a ser melhor para com seu semelhante e a tornar-se melhor, ele próprio.
“Meus amigos, com o concurso de homens instruídos e benevolentes, espero formar futuramente uma biblioteca moral e instrutiva, anexa a este estabelecimento, onde cada um poderá colher os meios de se melhorar, tanto em relação ao espírito quanto em relação ao coração.
“Agradeço-vos muito sinceramente, a vós todos que atendestes ao meu apelo, vindo oferecer, em comum, ação de graças à Divindade, em reconhecimento da inspiração da fundação deste estabelecimento.
“A partir de hoje, 19 de julho de 1863, esta capela, dedicada a São Vicente de Paulo, cuja suave e imortal imagem retrata em seus vitrais, lhe é publicamente consagrada por seu fundador, que deseja que doravante seja ela considerada um lugar santo, um lugar de prece. Aqui Deus deve ser adorado, e diante do símbolo de seu amor pelos homens; ante essa venerável e grande figura de apóstolo da caridade cristã, todos deverão compenetrar-se de que o amor ao próximo deve ser praticado por atos e deve estar no coração e não nos lábios.
“Antes de nos separarmos, vamos fazer a oração dominical.
“Pai nosso, que estais no Céu, santificado seja o vosso nome, venha a nós o vosso reino, seja feita a vossa vontade, assim na Terra como no Céu. O pão nosso de cada dia dai-nos hoje. Perdoai nossas ofensas, como perdoamos àqueles que nos ofenderam. Não nos deixeis sucumbir à tentação, mas livrai-nos do mal. Que assim seja.”
Nessa ocasião, o Sr. Prévost teve a bondade de pessoalmente remeter-nos a soma de 200 francos para as obras de beneficência, cujo emprego, infelizmente, não é difícil de encontrar.
A Sociedade Espírita de Paris, a propósito do discurso acima, votou por unanimidade e por aclamação, a seguinte carta, que lhe foi dirigida:
“Senhor e caríssimo colega,
“A Sociedade Espírita de Paris, da qual fazeis parte, ouviu com o maior interesse a leitura do discurso que fizestes na inauguração da capela do retiro que fundastes em vossa propriedade em Cempuis. O discurso é a expressão dos nobres sentimentos que vos animam; é digno daquele que fez tão bom uso da fortuna adquirida pelo trabalho e que não espera, para fazer com que ela beneficie os infelizes, que a morte a tenha tornado inútil, porque é em vida que vos impondes privações para aumentar a parte deles.
A Sociedade sente-se honrada em contar entre os seus membros um adepto que faz uma aplicação tão cristã dos princípios da Doutrina Espírita. Ela decidiu, por unanimidade, transmitir-vos oficialmente a expressão de sua viva e fraterna simpatia pela obra humanitária que empreendestes, e por vossa pessoa em particular.
“Recebei, etc.”
A fortuna do Sr. Prévost é fruto inteiramente de suas obras, o que tem maior mérito. Depois de ter sofrido o contragolpe das revoluções que lhe fizeram perdê-la, ele reedificou-a por sua coragem e perseverança. Hoje, que chegou à idade do repouso; que ele poderia largamente dar-se ao luxo dos prazeres da vida, ele se contenta com o estritamente necessário e, ao contrário de muitos outros, não espera não precisar de mais nada para que seus irmãos em Jesus Cristo participem do seu supérfluo. Assim, sua recompensa será bela, e ele desfruta das suas primícias pelo prazer proporcionado pelo bem que faz.
Aos olhos de certas pessoas, entretanto, o Sr. Prévost está muito errado, porque é espírita e professa a doutrina do demônio. No entanto, seu discurso não é o de um ateu, nem mesmo de um deísta, mas de um cristão. Sua própria moderação é uma prova de caridade, pois ele se absteve de falar mal de seu próximo e até mesmo de fazer qualquer alusão àqueles que vinculam sua ajuda a condições que sua consciência não lhe permitia aceitar.
A construção está hoje terminada, bem como as instalações internas. Anexa ao estabelecimento, posto que formando uma construção isolada, há uma capela em estilo gótico, de aspecto monumental. A inauguração da capela ocorreu domingo, 19 de julho último, dia de São Vicente de Paulo, a quem é dedicada, numa cerimônia de caridade, isto é, por uma distribuição de pão, vinho e carne aos pobres da paróquia. O Sr. Prévost pronunciou a respeito o discurso seguinte, que temos a satisfação de reproduzir:
“Senhores,
“Conheceis o motivo desta reunião, assim, não me alongarei sobre detalhes inúteis e que nada informam que não saibais. A obra material está hoje praticamente realizada, graças à evidente proteção do Todo-Poderoso, que se dignou secundar os meus esforços. Estamos aqui em família, todos, e não o duvido, animados pelos mesmos sentimentos por sua divina bondade. Unamo-nos, pois, no mesmo impulso de gratidão, e peçamos que ele continue nos assistindo e nos dando as luzes que nos faltam.
“Deus do Céu e da Terra, soberano senhor de todas as coisas, tem piedade de nossa fraqueza! Eleva nossos corações para ti, a fim de que aprendamos a cumprir nossos deveres segundo tua vontade, e para que todas as nossas ações estejam em relação com a tua lei universal. Senhor, faze que nossa alma se encha de teu amor; que ela se apaixone pelo fogo sagrado da convicção e que prove sua fé por atos de verdadeira caridade. Todas as palavras, por melhores que sejam, se não forem seguidas de efeitos de benevolência para com as tuas criaturas, assemelham-se a uma bonita árvore sem frutos.
“Ajuda-nos, pois, Poder Infinito, a superar os obstáculos que poderiam erguerse ante os nossos passos e entravar o nosso desejo de nos tornarmos úteis na missão para a qual nos escolheste. Dá-nos a força necessária para a realizarmos com amor e sinceridade.
“A boa assistência dada à velhice te é agradável, meu Deus, porque é um ato de justiça. Eles nos precederam no caminho. Os sulcos que eles abriram foram regados com seu suor, e nós lhe recolhemos os frutos. Hoje sua experiência é um campo já ceifado, mas onde ainda temos o que colher. É justo, portanto, que recompensemos o seu sacrifício, assegurando-lhes o repouso após o trabalho. É um dever para nós, pois queríamos que o mesmo fosse feito conosco, mas para realizá-lo dignamente, énos necessária a tua assistência, pois temos consciência de nossa fraqueza.
“É também em teu nome, Senhor, que aqui o órfão encontrará uma nova família. O menino abandonado crescerá entre nós ao suave calor do fogo divino com que favoreceste São Vicente de Paulo, a quem pedimos nos assista, para que possamos realizar este ato, a seu exemplo.
“Espírito infinito, tudo está em ti, tudo é por ti, nada está fora de ti. Os castigos, como as recompensas, nos vêm de tua mão abençoada. Conheces as nossas necessidades. Somos teus filhos e nos remetemos à tua divina Providência.
“Os bons Espíritos que sob teu olhar paternal presidem os destinos da Terra, os anjos de guarda dos homens, mereceram tua confiança, Senhor. Esperamos que, por ti, eles nos ajudem a conservar intacto o sublime código de moral promulgado pelo Cristo, teu filho bem-amado. ─ Amai a Deus, disse-nos ele do alto da cruz, há dezoito séculos; amai-vos uns aos outros; amai o vosso próximo como a vós mesmos; praticai a caridade para com todos, em todas as coisas. Eis a sua lei, Senhor, e essa lei é a tua. Possa ela gravar-se em nossos corações e fazer-nos ver como irmãos todos os nossos semelhantes, que, como nós, são teus filhos. Assim seja.
“Meus amigos, meus irmãos, sigamos este grande exemplo, e tenhamos uma sincera fé em Deus. Ele nos ajudará a suportar as consequências da má direção que o esquecimento desses deveres imprimiu à Sociedade, em tempos já distantes. Hoje muitas coisas entram na ordem prescrita pelo Criador. Malgrado o egoísmo que ainda domina um grande número de pessoas, o amor fraterno é melhor compreendido; os preconceitos de casta, da seita e de nacionalidade se apagam pouco a pouco; a tolerância, uma das filhas da caridade evangélica, faz pouco a pouco desaparecerem os antagonismos que por tanto tempo dividiram os filhos de um mesmo Deus; os sentimentos de humanidade se infiltram no coração das massas e já realizaram grandes coisas em diversos pontos da Terra.
“Na França, numerosas fábricas que ficaram sem trabalho experimentaram há pouco tempo os suaves efeitos deste amor do próximo. Esse élan para o sofrimento fala bem alto em favor de nosso país; é preciso ver aí a mão de Deus. É com alegria que vemos a primeira nação do mundo civilizado levar até as plagas mais distantes os frutos desse amor à Humanidade, que só a verdadeira grandeza dá e que ela colheu no centro radiante da cruz, ajudada pela luz do progresso, que obriga o homem a ser melhor para com seu semelhante e a tornar-se melhor, ele próprio.
“Meus amigos, com o concurso de homens instruídos e benevolentes, espero formar futuramente uma biblioteca moral e instrutiva, anexa a este estabelecimento, onde cada um poderá colher os meios de se melhorar, tanto em relação ao espírito quanto em relação ao coração.
“Agradeço-vos muito sinceramente, a vós todos que atendestes ao meu apelo, vindo oferecer, em comum, ação de graças à Divindade, em reconhecimento da inspiração da fundação deste estabelecimento.
“A partir de hoje, 19 de julho de 1863, esta capela, dedicada a São Vicente de Paulo, cuja suave e imortal imagem retrata em seus vitrais, lhe é publicamente consagrada por seu fundador, que deseja que doravante seja ela considerada um lugar santo, um lugar de prece. Aqui Deus deve ser adorado, e diante do símbolo de seu amor pelos homens; ante essa venerável e grande figura de apóstolo da caridade cristã, todos deverão compenetrar-se de que o amor ao próximo deve ser praticado por atos e deve estar no coração e não nos lábios.
“Antes de nos separarmos, vamos fazer a oração dominical.
“Pai nosso, que estais no Céu, santificado seja o vosso nome, venha a nós o vosso reino, seja feita a vossa vontade, assim na Terra como no Céu. O pão nosso de cada dia dai-nos hoje. Perdoai nossas ofensas, como perdoamos àqueles que nos ofenderam. Não nos deixeis sucumbir à tentação, mas livrai-nos do mal. Que assim seja.”
Nessa ocasião, o Sr. Prévost teve a bondade de pessoalmente remeter-nos a soma de 200 francos para as obras de beneficência, cujo emprego, infelizmente, não é difícil de encontrar.
A Sociedade Espírita de Paris, a propósito do discurso acima, votou por unanimidade e por aclamação, a seguinte carta, que lhe foi dirigida:
“Senhor e caríssimo colega,
“A Sociedade Espírita de Paris, da qual fazeis parte, ouviu com o maior interesse a leitura do discurso que fizestes na inauguração da capela do retiro que fundastes em vossa propriedade em Cempuis. O discurso é a expressão dos nobres sentimentos que vos animam; é digno daquele que fez tão bom uso da fortuna adquirida pelo trabalho e que não espera, para fazer com que ela beneficie os infelizes, que a morte a tenha tornado inútil, porque é em vida que vos impondes privações para aumentar a parte deles.
A Sociedade sente-se honrada em contar entre os seus membros um adepto que faz uma aplicação tão cristã dos princípios da Doutrina Espírita. Ela decidiu, por unanimidade, transmitir-vos oficialmente a expressão de sua viva e fraterna simpatia pela obra humanitária que empreendestes, e por vossa pessoa em particular.
“Recebei, etc.”
A fortuna do Sr. Prévost é fruto inteiramente de suas obras, o que tem maior mérito. Depois de ter sofrido o contragolpe das revoluções que lhe fizeram perdê-la, ele reedificou-a por sua coragem e perseverança. Hoje, que chegou à idade do repouso; que ele poderia largamente dar-se ao luxo dos prazeres da vida, ele se contenta com o estritamente necessário e, ao contrário de muitos outros, não espera não precisar de mais nada para que seus irmãos em Jesus Cristo participem do seu supérfluo. Assim, sua recompensa será bela, e ele desfruta das suas primícias pelo prazer proporcionado pelo bem que faz.
Aos olhos de certas pessoas, entretanto, o Sr. Prévost está muito errado, porque é espírita e professa a doutrina do demônio. No entanto, seu discurso não é o de um ateu, nem mesmo de um deísta, mas de um cristão. Sua própria moderação é uma prova de caridade, pois ele se absteve de falar mal de seu próximo e até mesmo de fazer qualquer alusão àqueles que vinculam sua ajuda a condições que sua consciência não lhe permitia aceitar.
“O proprietário de uma casa na Rua do Cherche-Midi tinha permitido anteontem que o inquilino se mudasse sem saldar a conta, entretanto, mediante um reconhecimento de seu débito. Mas, enquanto carregavam os móveis, o proprietário arrependeu-se e quis ser pago antes da retirada dos móveis. O locatário se desesperava, sua mulher chorava, e dois filhos em tenra idade imitavam a mãe. Um cavalheiro, condecorado com a Legião de Honra, passava no momento por aquela rua. Ele parou. Tocado por esse espetáculo desolador, aproximou-se do infeliz devedor, e, sabedor do montante devido pelo aluguel, entregou-lhe duas notas e desapareceu, acompanhado pelas bênçãos daquela família que ele salvava do desespero.”
“O Opinion du Midi, jornal de Nîmes, em julho relatava outro caso do mesmo gênero:
“Acaba de passar-se um fato tão estranho, pelo mistério com que se realizou, quão tocante por seu objetivo e pela delicadeza do procedimento do seu autor.
“Há três dias noticiamos que um violento incêndio tinha consumido quase que inteiramente a loja e as oficinas de um tal Sr. Marteau, marceneiro em Nîmes. Contamos a dor desse infeliz em presença de um sinistro que consumava a sua ruína, pois o seguro que tinha feito era infinitamente inferior ao valor das mercadorias destruídas.
“Soubemos hoje que três carretas contendo madeira de várias qualidades e instrumentos de trabalho foram levadas à frente da casa do Sr. Marteau e descarregadas em suas oficinas meio devoradas pelo fogo.
“O encarregado do transporte respondeu às interpelações, alegando a ignorância em que se achava relativamente ao nome do doador cuja vontade executava. Alegou não conhecer a pessoa que o havia encarregado de transportar a madeira e os utensílios ao Sr. Marteau, e nada saber além dessa incumbência. Retirou-se após ter descarregado as três viaturas.
“A alegria e a felicidade substituíram no Sr. Marteau o abatimento de que era impossível tirá-lo desde o dia do incêndio.
“Que o generoso desconhecido que tão nobremente veio em socorro de um infortúnio que, sem ele, talvez tivesse sido irreparável, receba aqui os agradecimentos e as bênçãos de uma família que desde hoje lhe deve a mais doce consolação e que em breve talvez lhe deva a prosperidade.”
O coração fica novamente sereno ao se ler fatos semelhantes, que vêm, de vez em quando, fazer a contrapartida aos relatos de crimes e torpezas que os jornais exibem em suas colunas.
Fatos como os acima relatados provam que a virtude não está inteiramente banida da Terra, como julgam certos pessimistas. Sem dúvida o mal ainda domina, mas quando se procura na sombra, verifica-se que sob a erva daninha há mais violetas, isto é, maior número de boas almas do que se espera. Se elas aparecem tão esparsas, é que a verdadeira virtude não se põe em evidência, por ser humilde. Ela se contenta com os prazeres do coração e com a aprovação da consciência, ao passo que o vício se manifesta afrontosamente, em plena luz. Ele faz barulho, porque é orgulhoso. O orgulho e a humildade são os dois polos do coração humano. Um atrai todo o bem, o outro, todo o mal. Um tem calma, o outro, tempestade. A consciência é a bússola que indica a rota conducente a cada um deles.
O benfeitor anônimo, como aquele que não espera a morte para dar aos que não têm, é, sem contradita, o tipo do homem de bem por excelência; é a personificação da virtude modesta, aquela que não busca aplausos dos homens.
Fazer o bem sem ostentação é um sinal inconteste de grande superioridade moral, porque é necessária uma fé viva em Deus e no futuro. É necessário fazer abstração da vida presente e identificar-se com a vida futura para esperar a aprovação de Deus e renunciar à satisfação proporcionada pelo testemunho atual dos homens.
O obsequiado abençoa de coração a mão generosa e desconhecida que o socorreu, e essa bênção sobe ao Céu mais que os aplausos da multidão. Aquele que preza mais o sufrágio dos homens que o de Deus prova ter mais fé nos homens do que em Deus e que para ele a vida presente tem mais valor que a vida futura. Se disser o contrário, age como quem não crê no que diz.
Quanta gente que não faz obséquios senão com a esperança de ver o obsequiado proclamar o benefício do alto dos telhados; que em plena luz daria uma grande soma, mas na obscuridade não daria uma simples moeda! Eis por que disse Jesus: “Os que fazem o bem com ostentação já receberam sua recompensa.” Com efeito, àquele que busca sua recompensa na Terra, Deus nada deve. Só lhe resta receber o preço de seu orgulho.
Talvez certos críticos perguntem: Que relação tem isto com o Espiritismo? Quantos casos não contareis, mais divertidos do que esta moral enfadonha! (Jugement de la morale spirite, do Sr. Figuier, vol. IV, pág. 369). Isto tem relação com o Espiritismo, no sentido que o Espiritismo, proporcionando uma fé inabalável na bondade de Deus e na vida futura, e graças a ele, fazendo os homens o bem pelo bem, eles serão um dia menos esparsos do que hoje. Então os jornais terão menos crimes e suicídios a registrar, e mais atos da natureza dos que deram lugar a estas reflexões.
“O Opinion du Midi, jornal de Nîmes, em julho relatava outro caso do mesmo gênero:
“Acaba de passar-se um fato tão estranho, pelo mistério com que se realizou, quão tocante por seu objetivo e pela delicadeza do procedimento do seu autor.
“Há três dias noticiamos que um violento incêndio tinha consumido quase que inteiramente a loja e as oficinas de um tal Sr. Marteau, marceneiro em Nîmes. Contamos a dor desse infeliz em presença de um sinistro que consumava a sua ruína, pois o seguro que tinha feito era infinitamente inferior ao valor das mercadorias destruídas.
“Soubemos hoje que três carretas contendo madeira de várias qualidades e instrumentos de trabalho foram levadas à frente da casa do Sr. Marteau e descarregadas em suas oficinas meio devoradas pelo fogo.
“O encarregado do transporte respondeu às interpelações, alegando a ignorância em que se achava relativamente ao nome do doador cuja vontade executava. Alegou não conhecer a pessoa que o havia encarregado de transportar a madeira e os utensílios ao Sr. Marteau, e nada saber além dessa incumbência. Retirou-se após ter descarregado as três viaturas.
“A alegria e a felicidade substituíram no Sr. Marteau o abatimento de que era impossível tirá-lo desde o dia do incêndio.
“Que o generoso desconhecido que tão nobremente veio em socorro de um infortúnio que, sem ele, talvez tivesse sido irreparável, receba aqui os agradecimentos e as bênçãos de uma família que desde hoje lhe deve a mais doce consolação e que em breve talvez lhe deva a prosperidade.”
O coração fica novamente sereno ao se ler fatos semelhantes, que vêm, de vez em quando, fazer a contrapartida aos relatos de crimes e torpezas que os jornais exibem em suas colunas.
Fatos como os acima relatados provam que a virtude não está inteiramente banida da Terra, como julgam certos pessimistas. Sem dúvida o mal ainda domina, mas quando se procura na sombra, verifica-se que sob a erva daninha há mais violetas, isto é, maior número de boas almas do que se espera. Se elas aparecem tão esparsas, é que a verdadeira virtude não se põe em evidência, por ser humilde. Ela se contenta com os prazeres do coração e com a aprovação da consciência, ao passo que o vício se manifesta afrontosamente, em plena luz. Ele faz barulho, porque é orgulhoso. O orgulho e a humildade são os dois polos do coração humano. Um atrai todo o bem, o outro, todo o mal. Um tem calma, o outro, tempestade. A consciência é a bússola que indica a rota conducente a cada um deles.
O benfeitor anônimo, como aquele que não espera a morte para dar aos que não têm, é, sem contradita, o tipo do homem de bem por excelência; é a personificação da virtude modesta, aquela que não busca aplausos dos homens.
Fazer o bem sem ostentação é um sinal inconteste de grande superioridade moral, porque é necessária uma fé viva em Deus e no futuro. É necessário fazer abstração da vida presente e identificar-se com a vida futura para esperar a aprovação de Deus e renunciar à satisfação proporcionada pelo testemunho atual dos homens.
O obsequiado abençoa de coração a mão generosa e desconhecida que o socorreu, e essa bênção sobe ao Céu mais que os aplausos da multidão. Aquele que preza mais o sufrágio dos homens que o de Deus prova ter mais fé nos homens do que em Deus e que para ele a vida presente tem mais valor que a vida futura. Se disser o contrário, age como quem não crê no que diz.
Quanta gente que não faz obséquios senão com a esperança de ver o obsequiado proclamar o benefício do alto dos telhados; que em plena luz daria uma grande soma, mas na obscuridade não daria uma simples moeda! Eis por que disse Jesus: “Os que fazem o bem com ostentação já receberam sua recompensa.” Com efeito, àquele que busca sua recompensa na Terra, Deus nada deve. Só lhe resta receber o preço de seu orgulho.
Talvez certos críticos perguntem: Que relação tem isto com o Espiritismo? Quantos casos não contareis, mais divertidos do que esta moral enfadonha! (Jugement de la morale spirite, do Sr. Figuier, vol. IV, pág. 369). Isto tem relação com o Espiritismo, no sentido que o Espiritismo, proporcionando uma fé inabalável na bondade de Deus e na vida futura, e graças a ele, fazendo os homens o bem pelo bem, eles serão um dia menos esparsos do que hoje. Então os jornais terão menos crimes e suicídios a registrar, e mais atos da natureza dos que deram lugar a estas reflexões.
Certas pessoas imaginam que os Espíritos só vêm ao apelo que se lhes faz. É um erro em que não incorrem os que conhecem o Espiritismo, pois sabem que muitas vezes eles se apresentam espontaneamente, sem serem chamados, o que nos leva a dizer que se nos proíbem de chamar os Espíritos, não podem impedir que eles venham. Entretanto, dirão, eles vêm porque se pratica a mediunidade e porque outros são chamados. Se vos abstivésseis, eles não viriam. É outro grave erro, e os fatos provam quantas vezes os Espíritos se manifestaram pela visão, pela audição ou por qualquer outra meio, a pessoas que jamais tinham ouvido falar de Espiritismo. Não é, pois, contra os médiuns que se deve lançar a proibição, mas contra os Espíritos, para que não se comuniquem, nem mesmo com a permissão de Deus.
Essas comunicações espontâneas têm um interesse muito mais atraente quando são de Espíritos que não eram esperados nem conhecidos, e cuja identidade mais tarde pode ser verificada. Citamos um exemplo notável na história de Simon Louvet, contada na Revista de março de 1863.
Eis outro fato não menos instrutivo, obtido por um médium de nosso conhecimento:
Apresenta-se um Espírito com o nome de François Franckowski e dita o seguinte:
“O amor a Deus é o sentimento que resume todos os amores, todas as abnegações. O amor à pátria é um raio desse sublime sentimento. Ó meu pobre país! Ó infeliz Polônia! Quantas desgraças vieram desabar sobre ti! Como são horrorosos os crimes dos que se julgam civilizados, e como serão castigados os infelizes que querem entravar a liberdade! Ó Deus! Lança um olhar sobre este desgraçado país e perdoa aos que, inteiramente voltados à vingança, não pensam que tu os punirás no outro lado da vida!
“A Polônia é uma terra abençoada, porque engendra grandes devotamentos e nenhum de seus filhos é covarde. Deus ama os que se esquecem de si mesmos pelo bem de todos. É em recompensa ao devotamento dos poloneses que ele perdoará, e seu jugo será quebrado.
“Morri vítima de nossos opressores, execrados por todos os nossos. Eu era jovem, tinha vinte e quatro anos, e minha pobre mãe está morrendo de dor por ter perdido tudo o que amava no mundo: seu filho. Orai por ela, eu vos peço, para que ela esqueça e perdoe o meu carrasco, pois sem esse perdão ela estará para sempre separada de mim...
“Pobre mãe! Eu a revi apenas na manhã de minha morte, e era tão horrível sentirmo-nos separados!... Deus teve piedade de mim, e eu não a deixo desde o momento em que pude desembaraçar-me do resto de vitalidade que ligava meu Espírito a meu corpo...
“Venho a vós, porque sei que orareis por ela, tão boa e ordinariamente tão resignada, e tão revoltada contra Deus desde que não estou mais lá!...
“É preciso que ela perdoe. Orai para que esse sublime perdão de uma mãe ao carrasco de seu filho venha acabar uma vida tão gloriosamente começada. Adeus! Orareis, não?
“FRANÇOIS FRANCKOWSKI”
Essas comunicações espontâneas têm um interesse muito mais atraente quando são de Espíritos que não eram esperados nem conhecidos, e cuja identidade mais tarde pode ser verificada. Citamos um exemplo notável na história de Simon Louvet, contada na Revista de março de 1863.
Eis outro fato não menos instrutivo, obtido por um médium de nosso conhecimento:
Apresenta-se um Espírito com o nome de François Franckowski e dita o seguinte:
“O amor a Deus é o sentimento que resume todos os amores, todas as abnegações. O amor à pátria é um raio desse sublime sentimento. Ó meu pobre país! Ó infeliz Polônia! Quantas desgraças vieram desabar sobre ti! Como são horrorosos os crimes dos que se julgam civilizados, e como serão castigados os infelizes que querem entravar a liberdade! Ó Deus! Lança um olhar sobre este desgraçado país e perdoa aos que, inteiramente voltados à vingança, não pensam que tu os punirás no outro lado da vida!
“A Polônia é uma terra abençoada, porque engendra grandes devotamentos e nenhum de seus filhos é covarde. Deus ama os que se esquecem de si mesmos pelo bem de todos. É em recompensa ao devotamento dos poloneses que ele perdoará, e seu jugo será quebrado.
“Morri vítima de nossos opressores, execrados por todos os nossos. Eu era jovem, tinha vinte e quatro anos, e minha pobre mãe está morrendo de dor por ter perdido tudo o que amava no mundo: seu filho. Orai por ela, eu vos peço, para que ela esqueça e perdoe o meu carrasco, pois sem esse perdão ela estará para sempre separada de mim...
“Pobre mãe! Eu a revi apenas na manhã de minha morte, e era tão horrível sentirmo-nos separados!... Deus teve piedade de mim, e eu não a deixo desde o momento em que pude desembaraçar-me do resto de vitalidade que ligava meu Espírito a meu corpo...
“Venho a vós, porque sei que orareis por ela, tão boa e ordinariamente tão resignada, e tão revoltada contra Deus desde que não estou mais lá!...
“É preciso que ela perdoe. Orai para que esse sublime perdão de uma mãe ao carrasco de seu filho venha acabar uma vida tão gloriosamente começada. Adeus! Orareis, não?
“FRANÇOIS FRANCKOWSKI”
O médium jamais tinha ouvido falar de tal pessoa, e talvez pensasse que tinha sido vítima de uma mistificação, quando, alguns dias depois, recebeu diversos objetos de linho que tinha comprado, enrolados num fragmento do Petit Journal de 7 de julho último. Maquinalmente o percorreu e, sob o título de Execuções Capitais, leu um artigo que começava assim:
“Achamos curiosos detalhes sobre a execução de um jovem polonês, prisioneiro dos Russos. Franckowski era um jovem de vinte e quatro anos. Ele ainda tem seus pais, que tinham até recebido licença para visitá-lo na prisão. Como não tinha sido preso com armas na mão, foi pelo conselho de guerra condenado à forca. Assisti à execução e não posso pensar sem emoção nesse acontecimento terrível...”
Segue-se o relato detalhado da execução e dos últimos momentos da vítima, morta com a coragem do heroísmo.
Aos que negam as manifestações ─ e seu número diminui dia a dia ─ aos que atribuem as comunicações mediúnicas à imaginação, ao reflexo do pensamento, mesmo inconsciente, perguntaremos de onde podia vir ao médium a intuição do nome de Franckowski, de vinte e quatro anos de idade; da mãe vindo ver o filho na prisão; do fato, numa palavra, do qual absolutamente não tinha conhecimento, do qual até duvidava, e cuja confirmação foi encontrar num pedaço de jornal que envolvia um pacote? E é preciso que aquele pedaço de jornal seja precisamente o que contém o relato. Direis: “Sim, foi o acaso”. Seja para vós, que não vedes em tudo senão o acaso. Mas... e o resto?
Aos que pretendem proibir as comunicações sob o pretexto de que procedem do diabo, ou qualquer outro, perguntamos se existe algo de mais belo, de mais nobre, de mais evangélico que a alma desse filho que perdoa ao seu carrasco; que suplica à sua mãe que também perdoe, que dê esse perdão como condição de salvação! E por que vem ele a esse médium que não conhece, mas a quem, mais tarde, dá irrecusável prova de identidade? Para lhe pedir que ore para que sua mãe perdoe. E dizeis que isto é linguagem do demônio? Quem dera, então, que todos os que falam em nome de Deus falassem desse modo! Eles tocariam mais os corações do que com o anátema e a maldição.
“Achamos curiosos detalhes sobre a execução de um jovem polonês, prisioneiro dos Russos. Franckowski era um jovem de vinte e quatro anos. Ele ainda tem seus pais, que tinham até recebido licença para visitá-lo na prisão. Como não tinha sido preso com armas na mão, foi pelo conselho de guerra condenado à forca. Assisti à execução e não posso pensar sem emoção nesse acontecimento terrível...”
Segue-se o relato detalhado da execução e dos últimos momentos da vítima, morta com a coragem do heroísmo.
Aos que negam as manifestações ─ e seu número diminui dia a dia ─ aos que atribuem as comunicações mediúnicas à imaginação, ao reflexo do pensamento, mesmo inconsciente, perguntaremos de onde podia vir ao médium a intuição do nome de Franckowski, de vinte e quatro anos de idade; da mãe vindo ver o filho na prisão; do fato, numa palavra, do qual absolutamente não tinha conhecimento, do qual até duvidava, e cuja confirmação foi encontrar num pedaço de jornal que envolvia um pacote? E é preciso que aquele pedaço de jornal seja precisamente o que contém o relato. Direis: “Sim, foi o acaso”. Seja para vós, que não vedes em tudo senão o acaso. Mas... e o resto?
Aos que pretendem proibir as comunicações sob o pretexto de que procedem do diabo, ou qualquer outro, perguntamos se existe algo de mais belo, de mais nobre, de mais evangélico que a alma desse filho que perdoa ao seu carrasco; que suplica à sua mãe que também perdoe, que dê esse perdão como condição de salvação! E por que vem ele a esse médium que não conhece, mas a quem, mais tarde, dá irrecusável prova de identidade? Para lhe pedir que ore para que sua mãe perdoe. E dizeis que isto é linguagem do demônio? Quem dera, então, que todos os que falam em nome de Deus falassem desse modo! Eles tocariam mais os corações do que com o anátema e a maldição.
Alguns membros da Igreja apoiam-se na proibição de Moisés para proscrever as comunicações com os Espíritos, mas se sua lei deve ser rigorosamente observada nesse ponto, deve sê-lo igualmente em todos os outros. Por que seria boa em relação às evocações e má em outras partes? Há que ser consequente. Se se reconhece que sua lei não mais está em harmonia com os nossos costumes e a nossa época para certas coisas, não há razão para que assim não ocorra com a proibição das evocações.
Aliás, é necessário nos reportarmos aos motivos que o levaram a fazer tal proibição, motivos que então tinham sua razão de ser, mas que seguramente não mais existem.
Quanto à pena de morte, que devia decorrer da infração dessa lei, é preciso considerar que nisto ele era muito pródigo, e que na sua legislação draconiana, a severidade do castigo nem sempre era um indício da gravidade da falta.
O povo hebreu era turbulento, difícil de conduzir, e não podia ser domado senão pelo terror. Ademais, Moisés não tinha grande escolha nos meios de repressão, pois ele não tinha prisões nem casas de correção e seu povo não era de natureza a ter medo de penas puramente morais. Assim, ele não podia graduar sua penalidade como nos nossos dias. Ora, pelo respeito à sua lei, seria preciso manter a pena de morte para todos os casos em que ele a aplicava? Além disso, por que fazem reviver tal artigo com tanta insistência, quando se passa em silêncio o começo do capítulo, que proíbe aos sacerdotes a posse dos bens da Terra e ter parte em qualquer herança, porque o próprio Senhor é a sua herança? (Deuteronômio, Cap. XVIII).
Há duas partes distintas na lei de Moisés: a lei de Deus propriamente dita, promulgada no Monte Sinai e a lei civil ou disciplinar, apropriada aos costumes e ao caráter do povo. Uma é invariável, a outra se modifica conforme o tempo, e não pode vir à cabeça de ninguém que possamos ser governados pelos mesmos meios que os Hebreus no deserto, assim como a legislação da Idade Média não poderia aplicar-se à França do século dezenove. Quem sonharia, por exemplo, em reviver hoje este artigo da lei mosaica: “Se um boi fere com o chifre um homem ou uma mulher, e a pessoa morrer, o boi será lapidado sem remissão, e não será comida a sua carne, e o dono do boi será absolvido”.
Ora, que diz Deus em seus mandamentos? “Não terás outro Deus senão eu; não tomarás o nome de Deus em vão; honra a teu pai e à tua mãe; não matarás; não cometerás adultério; não roubarás; não dirás falso testemunho; não cobiçarás o bem de teu próximo.” Eis uma lei que é de todos os tempos e de todos os países, e que, por isto mesmo, tem um caráter divino, mas ela não trata da proibição de evocar os mortos, de onde é necessário concluir que tal proibição era simples medida disciplinar e de circunstância.
Mas Jesus não veio modificar a lei mosaica, e sua lei não é o código dos cristãos? Ele não disse: “Ouvistes que foi dito aos Antigos esta e aquela coisa, e eu vos digo outra coisa? Ora, em parte alguma do Evangelho se faz menção à proibição de evocar os mortos. É um ponto muito grave para que o Cristo o tivesse omitido de suas instruções, quando tratou de questões de ordem muito mais secundária. Ou se deve pensar como um sacerdote a quem tal objeção foi feita, que “Jesus esqueceu-se de falar nisso.”
Sendo inadmissível o pretexto da proibição de Moisés, apoiam-se em que a evocação é uma falta de respeito aos mortos, cujas cinzas não devem ser perturbadas. Quando essa evocação é feita religiosamente e com recolhimento, não se vê nada de desrespeitoso, mas há uma resposta peremptória a dar a tal objeção. É que os Espíritos vêm de boa vontade quando chamados, e mesmo espontaneamente, sem serem chamados; que testemunham sua satisfação de se comunicarem com os homens, e às vezes se lamentam do esquecimento em que por vezes são deixados. Se eles fossem perturbados em sua quietude ou ficassem descontentes com o nosso chamado, ou o diriam ou não viriam. Se eles vêm, é porque isto lhes convém, pois não sabemos de ninguém que tenha o poder de obrigar Espíritos, seres impalpáveis, a se incomodarem, se não o querem, pois não lhes podemos apreender o corpo.
Alegam outra razão, dizendo que as almas estão no inferno ou no paraíso. As que estão no inferno dali não podem sair. As que estão no paraíso estão na sua inteira beatitude e muito acima dos mortais para se ocuparem com eles. Restam as que estão no purgatório, mas essas são sofredoras e devem pensar antes de tudo em sua salvação. Ora, se nem umas nem outras podem vir, é apenas o diabo que vem em seu lugar. No primeiro caso, seria muito racional supor que o diabo, autor e instigador da primeira revolta contra Deus, em rebelião perpétua, que nem experimenta arrependimento nem pesar pelo que faz, seja mais rigorosamente punido que as pobres almas que arrasta ao mal e que muitas vezes são apenas culpadas de uma falta temporária, de que sentem amargo arrependimento. Longe disso, o que acontece é exatamente o contrário. Essas almas infelizes são condenadas a sofrimentos atrozes, sem trégua nem mercê durante a eternidade, sem um só instante de alívio, e, durante esse tempo, o diabo, autor de todo esse mal, goza de plena liberdade, corre o mundo recrutando vítimas, toma todas as formas, se permite todas as alegrias, faz malandragens, diverte-se até interrompendo o curso das leis de Deus, porque pode até fazer milagres. Na verdade as almas culpadas deveriam invejar a sorte do diabo. E Deus o deixa agir, sem nada dizer, sem lhe opor nenhum freio, sem permitir que os bons Espíritos ao menos venham contrabalançar suas ações criminosas! De boa-fé, isto é lógico? E os que professam tal doutrina podem jurar, com a mão na consciência, que a poriam no fogo para sustentar que é a verdade?
O segundo caso levanta uma dificuldade igualmente grande. Se as almas que estão na beatitude não podem deixar o seu feliz repouso para virem em socorro aos mortais, o que, diga-se de passagem, seria uma felicidade muito egoística, por que a Igreja invoca a assistência dos santos, que devem gozar da maior soma possível de beatitude? Por que diz ela aos fiéis que os invoquem nas doenças, nas aflições e para preservá-los dos flagelos? Por que, segundo ela, os santos e a própria Virgem vêm mostrar-se aos homens e fazer milagres? Então eles deixam o Céu para virem à Terra? Se eles podem deixá-lo, por que outros não poderiam?
Como todos os motivos alegados para justificar a proibição de se comunicar com os Espíritos não podem suportar um exame sério, é preciso que haja outro, não confessado. Esse motivo bem poderia ser o medo que os Espíritos, muito clarividentes, viessem esclarecer os homens sobre certos pontos, e lhes dar a conhecer, ao justo, como são as coisas no outro mundo e as verdadeiras condições para ser feliz ou infeliz. Eis por que, da mesma maneira que se diz a uma criança: “Não vá lá, porque lá tem um lobo mau”, aos homens se diz: “Não chame os Espíritos porque é o diabo que vem.” Mas será em vão. Se proíbem aos homens de chamar os Espíritos, não impedirão que os Espíritos venham aos homens, para retirar a lâmpada debaixo do alqueire.
Aliás, é necessário nos reportarmos aos motivos que o levaram a fazer tal proibição, motivos que então tinham sua razão de ser, mas que seguramente não mais existem.
Quanto à pena de morte, que devia decorrer da infração dessa lei, é preciso considerar que nisto ele era muito pródigo, e que na sua legislação draconiana, a severidade do castigo nem sempre era um indício da gravidade da falta.
O povo hebreu era turbulento, difícil de conduzir, e não podia ser domado senão pelo terror. Ademais, Moisés não tinha grande escolha nos meios de repressão, pois ele não tinha prisões nem casas de correção e seu povo não era de natureza a ter medo de penas puramente morais. Assim, ele não podia graduar sua penalidade como nos nossos dias. Ora, pelo respeito à sua lei, seria preciso manter a pena de morte para todos os casos em que ele a aplicava? Além disso, por que fazem reviver tal artigo com tanta insistência, quando se passa em silêncio o começo do capítulo, que proíbe aos sacerdotes a posse dos bens da Terra e ter parte em qualquer herança, porque o próprio Senhor é a sua herança? (Deuteronômio, Cap. XVIII).
Há duas partes distintas na lei de Moisés: a lei de Deus propriamente dita, promulgada no Monte Sinai e a lei civil ou disciplinar, apropriada aos costumes e ao caráter do povo. Uma é invariável, a outra se modifica conforme o tempo, e não pode vir à cabeça de ninguém que possamos ser governados pelos mesmos meios que os Hebreus no deserto, assim como a legislação da Idade Média não poderia aplicar-se à França do século dezenove. Quem sonharia, por exemplo, em reviver hoje este artigo da lei mosaica: “Se um boi fere com o chifre um homem ou uma mulher, e a pessoa morrer, o boi será lapidado sem remissão, e não será comida a sua carne, e o dono do boi será absolvido”.
Ora, que diz Deus em seus mandamentos? “Não terás outro Deus senão eu; não tomarás o nome de Deus em vão; honra a teu pai e à tua mãe; não matarás; não cometerás adultério; não roubarás; não dirás falso testemunho; não cobiçarás o bem de teu próximo.” Eis uma lei que é de todos os tempos e de todos os países, e que, por isto mesmo, tem um caráter divino, mas ela não trata da proibição de evocar os mortos, de onde é necessário concluir que tal proibição era simples medida disciplinar e de circunstância.
Mas Jesus não veio modificar a lei mosaica, e sua lei não é o código dos cristãos? Ele não disse: “Ouvistes que foi dito aos Antigos esta e aquela coisa, e eu vos digo outra coisa? Ora, em parte alguma do Evangelho se faz menção à proibição de evocar os mortos. É um ponto muito grave para que o Cristo o tivesse omitido de suas instruções, quando tratou de questões de ordem muito mais secundária. Ou se deve pensar como um sacerdote a quem tal objeção foi feita, que “Jesus esqueceu-se de falar nisso.”
Sendo inadmissível o pretexto da proibição de Moisés, apoiam-se em que a evocação é uma falta de respeito aos mortos, cujas cinzas não devem ser perturbadas. Quando essa evocação é feita religiosamente e com recolhimento, não se vê nada de desrespeitoso, mas há uma resposta peremptória a dar a tal objeção. É que os Espíritos vêm de boa vontade quando chamados, e mesmo espontaneamente, sem serem chamados; que testemunham sua satisfação de se comunicarem com os homens, e às vezes se lamentam do esquecimento em que por vezes são deixados. Se eles fossem perturbados em sua quietude ou ficassem descontentes com o nosso chamado, ou o diriam ou não viriam. Se eles vêm, é porque isto lhes convém, pois não sabemos de ninguém que tenha o poder de obrigar Espíritos, seres impalpáveis, a se incomodarem, se não o querem, pois não lhes podemos apreender o corpo.
Alegam outra razão, dizendo que as almas estão no inferno ou no paraíso. As que estão no inferno dali não podem sair. As que estão no paraíso estão na sua inteira beatitude e muito acima dos mortais para se ocuparem com eles. Restam as que estão no purgatório, mas essas são sofredoras e devem pensar antes de tudo em sua salvação. Ora, se nem umas nem outras podem vir, é apenas o diabo que vem em seu lugar. No primeiro caso, seria muito racional supor que o diabo, autor e instigador da primeira revolta contra Deus, em rebelião perpétua, que nem experimenta arrependimento nem pesar pelo que faz, seja mais rigorosamente punido que as pobres almas que arrasta ao mal e que muitas vezes são apenas culpadas de uma falta temporária, de que sentem amargo arrependimento. Longe disso, o que acontece é exatamente o contrário. Essas almas infelizes são condenadas a sofrimentos atrozes, sem trégua nem mercê durante a eternidade, sem um só instante de alívio, e, durante esse tempo, o diabo, autor de todo esse mal, goza de plena liberdade, corre o mundo recrutando vítimas, toma todas as formas, se permite todas as alegrias, faz malandragens, diverte-se até interrompendo o curso das leis de Deus, porque pode até fazer milagres. Na verdade as almas culpadas deveriam invejar a sorte do diabo. E Deus o deixa agir, sem nada dizer, sem lhe opor nenhum freio, sem permitir que os bons Espíritos ao menos venham contrabalançar suas ações criminosas! De boa-fé, isto é lógico? E os que professam tal doutrina podem jurar, com a mão na consciência, que a poriam no fogo para sustentar que é a verdade?
O segundo caso levanta uma dificuldade igualmente grande. Se as almas que estão na beatitude não podem deixar o seu feliz repouso para virem em socorro aos mortais, o que, diga-se de passagem, seria uma felicidade muito egoística, por que a Igreja invoca a assistência dos santos, que devem gozar da maior soma possível de beatitude? Por que diz ela aos fiéis que os invoquem nas doenças, nas aflições e para preservá-los dos flagelos? Por que, segundo ela, os santos e a própria Virgem vêm mostrar-se aos homens e fazer milagres? Então eles deixam o Céu para virem à Terra? Se eles podem deixá-lo, por que outros não poderiam?
Como todos os motivos alegados para justificar a proibição de se comunicar com os Espíritos não podem suportar um exame sério, é preciso que haja outro, não confessado. Esse motivo bem poderia ser o medo que os Espíritos, muito clarividentes, viessem esclarecer os homens sobre certos pontos, e lhes dar a conhecer, ao justo, como são as coisas no outro mundo e as verdadeiras condições para ser feliz ou infeliz. Eis por que, da mesma maneira que se diz a uma criança: “Não vá lá, porque lá tem um lobo mau”, aos homens se diz: “Não chame os Espíritos porque é o diabo que vem.” Mas será em vão. Se proíbem aos homens de chamar os Espíritos, não impedirão que os Espíritos venham aos homens, para retirar a lâmpada debaixo do alqueire.
Dissertações espíritas
Tendo Moisés proibido evocar os mortos, é permitido fazê-lo?
(Bordeaux - Médium: Sra. Collignon)
(Bordeaux - Médium: Sra. Collignon)
NOTA: Esta comunicação foi dada num grupo espírita de Bordeaux, em resposta à pergunta acima. Antes de a conhecer, tínhamos escrito o artigo precedente, sobre o mesmo assunto. Apesar disto nós a publicamos, precisamente por causa da concordância das ideias. Muitas outras, em vários lugares, foram obtidas no mesmo sentido, o que prova o acordo dos Espíritos a este respeito. Esta objeção não sendo mais sustentável do que todas as que opõem às relações com os Espíritos, cairá por si.
Então, o homem é tão perfeito que julga inútil medir suas forças? E sua inteligência é tão desenvolvida que possa suportar toda a luz?
Então, o homem é tão perfeito que julga inútil medir suas forças? E sua inteligência é tão desenvolvida que possa suportar toda a luz?
Quando Moisés trouxe aos hebreus uma lei que pudesse tirá-los do estado de escravização em que viviam e reavivar neles a lembrança de seu Deus, que haviam esquecido, foi obrigado a dosar a luz à capacidade de visão e a ciência à capacidade de entendimento deles.
Por que também não perguntais: Por que Jesus se permitiu refazer a lei?
Por que disse ele: “Moisés vos disse: Dente por dente, olho por olho, e eu vos digo: Fazei o bem aos que vos querem mal; bendizei aos que vos amaldiçoam; perdoai aos que vos perseguem.”
Por que disse Jesus: “Moisés disse: Aquele que quiser deixar sua mulher lhe dê carta de divórcio, mas eu vos digo: Não separeis o que Deus uniu.”
Por que? É que Jesus falava a Espíritos mais adiantados do que na encarnação em que estavam ao tempo de Moisés. É que é preciso adequar a lição à capacidade de compreensão do aluno. É que vós, que perguntais, que duvidais, ainda não chegastes ao ponto em que deveis estar e ainda não sabeis o que sabereis um dia.
Por quê? Mas, então, perguntai a Deus por que ele criou a erva do campo, da qual o homem civilizado chegou a fazer seu alimento; por que fez árvores que só deveriam crescer em certos climas, em certas latitudes, e que o homem conseguiu aclimatar por toda parte.
Moisés disse aos Hebreus: “Não evoqueis os mortos!” como se diz às crianças: “Não toqueis no fogo!”
Não foi a evocação que, pouco a pouco, tinha degenerado em idolatria entre os egípcios, os caldeus, os moabitas e todos os povos da Antiguidade? Eles não tinham tido a força de suportar a ciência, tinham-se queimado, e o Senhor tinha querido preservar alguns homens, a fim de que pudessem servir e perpetuar seu nome e sua fé.
Os homens eram pervertidos e dispostos a evocações perigosas. Moisés preveniu o mal. O progresso deveria ser feito entre os Espíritos, como entre os homens, mas a evocação ficou conhecida e praticada pelos príncipes da Igreja. A vaidade, o orgulho são tão velhos quanto a Humanidade, assim, os chefes da sinagoga usavam a evocação, e frequentemente usavam-na mal, por isso muitas vezes sobre eles abateu-se a cólera do Senhor.
Eis por que disse Moisés: “Não evoqueis os mortos.” Mas a própria proibição prova que a evocação era usual entre o povo, e foi ao povo que ele a proibiu.
Deixai, pois, que falem os que perguntam por quê. Abri-lhes a história do globo, que eles cobrem com seus passos miúdos, e perguntai-lhes por que, após tantos séculos acumulados, eles marcam passos para avançar tão pouco? É que sua inteligência não está bastante desenvolvida; é que a rotina os constringe; é que eles querem fechar os olhos malgrado os esforços feitos para lhos abrir.
Perguntai-lhes: Por que Deus é Deus? Por que o Sol os ilumina?
Que estudem, que busquem, e na história da Antiguidade verão por que Deus quis que tal conhecimento em parte desaparecesse, para reviver com mais brilho, quando os Espíritos encarregados de trazê-lo tivessem mais força e não vergassem ao seu peso.
Não vos inquieteis, meus amigos, com as perguntas ociosas, com as objeções sem nexo que vos fazem. Fazei sempre o que acabais de fazer: perguntai, e nós vos responderemos com prazer. A ciência é de quem a busca; então, ela vem se mostrar. A luz ilumina os que abrem os olhos, mas as trevas se adensam para os que querem fechá-los. Não é aos que perguntam que se há de recusar, mas aos que fazem objeções com o fito único de extinguir a luz ou que não ousam fitá-la.
Coragem, meus amigos! Estamos prontos para vos responder todas as vezes que forem necessárias.
SIMEÃO, por MATEUS
(Reunião particular, 10 de março de 1863, Sra. Costel)
Minha lembrança acaba de ser evocada por meu retrato e meus versos; duas vezes tocada, na vaidade feminina e em meu amor-próprio de poetisa, venho reconhecer vossa benevolência, esboçando em largos traços a silhueta dos falsos devotos, que são para a religião o que é para a Sociedade a mulher falsamente honesta. O assunto entra no quadro de meus estudos literários, cuja nuança Lady Tartufe exprimia.
Os falsos devotos sacrificam à aparência e traem o verdadeiro; eles têm o coração seco e os olhos úmidos, a bolsa fechada e a mão aberta; falam de boa vontade do próximo, criticando-lhe as ações de uma maneira adocicada que exagera o mal e apequena o mérito. Muito ardentes para a conquista dos bens materiais e mundanos, agarram-se a tesouros imaginários que a morte dispersa, e negligenciam os verdadeiros bens, que servem aos objetivos do homem e são a riqueza da eternidade.
Os hipócritas da devoção são os répteis da natureza moral. Vis, baixos, eles evitam as faltas castigadas pela vindita pública, e na sombra cometem atos sinistros. Quantas famílias desunidas e espoliadas! Quanta confiança traída! Quantas lágrimas e, até, quanto sangue!...
A comédia é o inverso da tragédia. Atrás do celerado marcha o bufão, e os falsos devotos têm por acólitos seres ineptos, que só agem por imitação: à maneira dos espelhos, eles refletem a fisionomia dos vizinhos. Tomam-se a sério; enganamse a si próprios; ridicularizam, por timidez, aquilo em que acreditam; exaltam o de que duvidam; comungam com ostentação e acendem às escondidas pequenas velas, às quais atribuem muito mais virtude do que à santa hóstia.
Os falsos devotos são os verdadeiros ateus da virtude, da esperança, da Natureza e de Deus. Eles negam o verdadeiro e afirmam o falso. Contudo, a morte os levará besuntados de arrebiques e cobertos com os ouropéis que os disfarçavam, e os lançará ofegantes em plena luz.
DELPHINE DE GIRARDIN
Os falsos devotos sacrificam à aparência e traem o verdadeiro; eles têm o coração seco e os olhos úmidos, a bolsa fechada e a mão aberta; falam de boa vontade do próximo, criticando-lhe as ações de uma maneira adocicada que exagera o mal e apequena o mérito. Muito ardentes para a conquista dos bens materiais e mundanos, agarram-se a tesouros imaginários que a morte dispersa, e negligenciam os verdadeiros bens, que servem aos objetivos do homem e são a riqueza da eternidade.
Os hipócritas da devoção são os répteis da natureza moral. Vis, baixos, eles evitam as faltas castigadas pela vindita pública, e na sombra cometem atos sinistros. Quantas famílias desunidas e espoliadas! Quanta confiança traída! Quantas lágrimas e, até, quanto sangue!...
A comédia é o inverso da tragédia. Atrás do celerado marcha o bufão, e os falsos devotos têm por acólitos seres ineptos, que só agem por imitação: à maneira dos espelhos, eles refletem a fisionomia dos vizinhos. Tomam-se a sério; enganamse a si próprios; ridicularizam, por timidez, aquilo em que acreditam; exaltam o de que duvidam; comungam com ostentação e acendem às escondidas pequenas velas, às quais atribuem muito mais virtude do que à santa hóstia.
Os falsos devotos são os verdadeiros ateus da virtude, da esperança, da Natureza e de Deus. Eles negam o verdadeiro e afirmam o falso. Contudo, a morte os levará besuntados de arrebiques e cobertos com os ouropéis que os disfarçavam, e os lançará ofegantes em plena luz.
DELPHINE DE GIRARDIN
(Sociedade Espírita de Paris, 11 de julho de 1863 - Médium: Sr. A. Didier)
Que vos importa a idade dos patriarcas em geral, e a de Matusalém em particular? A Natureza, sabei-o bem, jamais tem tido contrassensos e irregularidades, e se a máquina humana alguma vez variou, jamais repeliu por tanto tempo a destruição material: a morte.
Como já vos disse, a Bíblia é um magnífico poema oriental, onde as paixões humanas são divinizadas, como as paixões que os gregos idealizavam, como as grandes colônias da Ásia Menor.
Não há razão para casar a concisão com a ênfase, a clareza com a difusão, a frieza do raciocínio e da lógica moderna com a exaltação oriental. Os querubins da Bíblia tinham seis asas, como sabeis: quase monstros! O Deus dos judeus banhavase em sangue; sabeis e quereis que vossos anjos sejam os mesmos anjos e que o vosso Deus, soberanamente bom e soberanamente justo, seja o mesmo Deus? Não alieis, pois, vossa análise poética moderna com a poesia mentirosa dos antigos judeus ou pagãos. A idade dos patriarcas é uma figura moral e não uma realidade. A autoridade, a lembrança desses grandes nomes, desses verdadeiros pastores de povos, enriquecidas de mistérios e de lendas que fizeram irradiar em torno deles, existiam entre esses nômades supersticiosos e idólatras das lembranças. É provável que Matusalém tenha vivido muito tempo no coração de seus descendentes.
Notai que na poesia oriental toda ideia moral é incorporada, encarnada, revestida de uma forma brilhante, radiante, esplêndida, contrariamente à poesia moderna que desencarna, que quebra o envoltório para deixar escapar a ideia até o céu. A poesia moderna não só é expressa pelo brilho e a cor da imagem, mas também pelo desenho firme e correto da lógica, numa palavra, pela ideia.
Como quereis aliar esses dois grandes princípios tão contrários? Quando ledes a Bíblia aos raios do Oriente, em meio às imagens douradas, nos horizontes intermináveis e difusos dos desertos, das estepes, fazei correr a eletricidade, que atravessa todos os abismos, todas as trevas, isto é, servi-vos da razão e julgai sempre a diferença do tempo, das formas e das compreensões.
LAMENNAIS
Como já vos disse, a Bíblia é um magnífico poema oriental, onde as paixões humanas são divinizadas, como as paixões que os gregos idealizavam, como as grandes colônias da Ásia Menor.
Não há razão para casar a concisão com a ênfase, a clareza com a difusão, a frieza do raciocínio e da lógica moderna com a exaltação oriental. Os querubins da Bíblia tinham seis asas, como sabeis: quase monstros! O Deus dos judeus banhavase em sangue; sabeis e quereis que vossos anjos sejam os mesmos anjos e que o vosso Deus, soberanamente bom e soberanamente justo, seja o mesmo Deus? Não alieis, pois, vossa análise poética moderna com a poesia mentirosa dos antigos judeus ou pagãos. A idade dos patriarcas é uma figura moral e não uma realidade. A autoridade, a lembrança desses grandes nomes, desses verdadeiros pastores de povos, enriquecidas de mistérios e de lendas que fizeram irradiar em torno deles, existiam entre esses nômades supersticiosos e idólatras das lembranças. É provável que Matusalém tenha vivido muito tempo no coração de seus descendentes.
Notai que na poesia oriental toda ideia moral é incorporada, encarnada, revestida de uma forma brilhante, radiante, esplêndida, contrariamente à poesia moderna que desencarna, que quebra o envoltório para deixar escapar a ideia até o céu. A poesia moderna não só é expressa pelo brilho e a cor da imagem, mas também pelo desenho firme e correto da lógica, numa palavra, pela ideia.
Como quereis aliar esses dois grandes princípios tão contrários? Quando ledes a Bíblia aos raios do Oriente, em meio às imagens douradas, nos horizontes intermináveis e difusos dos desertos, das estepes, fazei correr a eletricidade, que atravessa todos os abismos, todas as trevas, isto é, servi-vos da razão e julgai sempre a diferença do tempo, das formas e das compreensões.
LAMENNAIS
(Sociedade Espírita de Paris, 11 de Julho de 1862 - Médium: Sr. Flammarion)
Escutastes o ruído confuso do mar, retumbando quando o aquilão enche as vagas ou quando quebra, rugindo suas ondas argênteas sobre a praia?
Escutastes o estalo sonoro do raio nas nuvens sombrias ou o murmúrio da floresta ao sopro do vento da tarde?
Escutastes do fundo da alma essa múltipla harmonia, que não fala aos sentidos senão para atravessá-los e chegar até o ser pensante e amante?
Se, pois, não escutastes e entendestes estas mudas palavras, não sois filhos da revelação e ainda não credes.
A esses direi: “Saí da cidade à hora silenciosa em que os raios estrelados descem do céu, e colhendo em vós mesmos os pensamentos íntimos, contemplai o espetáculo que vos cerca e chegareis antes da aurora a partilhar a fé dos vossos irmãos”.
Aos que já creem na grande voz da Natureza eu direi: “Filhos da nova aliança, é a voz do Criador e do conservador dos seres que fala no tumulto das ondas e no ribombar do trovão; é a voz de Deus que fala no sopro do vento. Amigos, escutai de novo, escutai várias vezes, escutai muito tempo, escutai sempre, e o Senhor vos receberá de braços abertos”.
Ó vós que já escutastes sua voz potente aqui embaixo, vós a compreendereis melhor no outro mundo.
GALILEU
Escutastes o estalo sonoro do raio nas nuvens sombrias ou o murmúrio da floresta ao sopro do vento da tarde?
Escutastes do fundo da alma essa múltipla harmonia, que não fala aos sentidos senão para atravessá-los e chegar até o ser pensante e amante?
Se, pois, não escutastes e entendestes estas mudas palavras, não sois filhos da revelação e ainda não credes.
A esses direi: “Saí da cidade à hora silenciosa em que os raios estrelados descem do céu, e colhendo em vós mesmos os pensamentos íntimos, contemplai o espetáculo que vos cerca e chegareis antes da aurora a partilhar a fé dos vossos irmãos”.
Aos que já creem na grande voz da Natureza eu direi: “Filhos da nova aliança, é a voz do Criador e do conservador dos seres que fala no tumulto das ondas e no ribombar do trovão; é a voz de Deus que fala no sopro do vento. Amigos, escutai de novo, escutai várias vezes, escutai muito tempo, escutai sempre, e o Senhor vos receberá de braços abertos”.
Ó vós que já escutastes sua voz potente aqui embaixo, vós a compreendereis melhor no outro mundo.
GALILEU
(Thionville, 5 de janeiro de 1863 - Médium: Dr. R...)
Há uma grande lei que domina tudo no Universo: a lei do progresso. É em virtude dessa lei que o homem, criatura essencialmente imperfeita, deve, como tudo quanto existe em nosso globo, percorrer todas as fases que o separam da perfeição. Sem dúvida Deus sabe quanto tempo cada um levará para chegar ao fim. Porém, como todo progresso deve resultar de um esforço tentado para realizá-lo, não haveria nenhum mérito se o homem não tivesse a liberdade de tomar este ou aquele caminho. Com efeito, o verdadeiro mérito não pode resultar senão de um trabalho operado pelo Espírito para vencer uma resistência mais ou menos considerável.
Como cada um ignora o número de existências que consagrou ao seu adiantamento moral, ninguém pode prejulgar nesta grande questão, e é sobretudo aí que brilha de maneira admirável a infinita bondade de nosso Pai Celeste que, ao lado do livre-arbítrio que nos conferiu, nada obstante semeou em nosso caminho marcos indicadores que iluminam os desvios. É, pois, por um resto de predomínio da matéria que muitos homens se obstinam em ficar surdos às advertências que lhes chegam de todos os lados, e preferem gastar em prazeres enganadores e efêmeros uma vida que lhe havia sido concedida para o avanço de seu Espírito.
Não se poderia afirmar sem blasfêmia que Deus tenha querido a infelicidade de suas criaturas, pois os infelizes expiam sempre, tanto uma vida anterior mal empregada quanto sua recusa a seguir o bom caminho, quando este lhe era mostrado claramente.
Assim, depende de cada um abreviar a prova que deve sofrer. Por isso, guias seguros bastante numerosos lhe são concedidos para que seja inteiramente responsável por sua recusa de seguir seus conselhos, e ainda, neste caso, existe um meio certo de abrandar uma punição merecida, dando sinais de sincero arrependimento e recorrendo à prece, que jamais deixa de ser atendida, quando feita com fervor. O livre-arbítrio existe, pois, efetivamente, no homem, mas com um guia: a consciência.
Vós todos que tendes acesso ao grande foco da nova ciência, não negligencieis de vos penetrar das eloquentes verdades que ela vos revela, e dos admiráveis princípios que são a sua consequência. Segui-os fielmente, pois é aí, sobretudo, que brilha o vosso livre-arbítrio.
Pensai, por um lado, nas consequências fatais que para vós arrastaria a recusa de seguir o bom caminho, como nas magníficas recompensas que vos aguardam caso obedeçais às instruções dos bons Espíritos. É aí que brilhará, por sua vez, a presciência divina.
Em vão se esforçam os homens em busca da verdade por todos os meios que julgam ter na Ciência. Esta verdade, que lhes parece escapar, segue sempre ao seu lado, e os cegos não a percebem.
Espíritos sábios de todos os países, aos quais é dado levantar uma ponta do véu, não negligencieis os meios que vos são oferecidos pela Providência! Provocai nossas manifestações; fazei que delas aproveitem todos os vossos irmãos menos bem aquinhoados que vós; inculcai em todos os preceitos que vos chegam do mundo espírita, e tereis bem merecido, porque tereis contribuído em larga parte para a realização dos desígnios da Providência.
ESPÍRITO FAMILIAR
Como cada um ignora o número de existências que consagrou ao seu adiantamento moral, ninguém pode prejulgar nesta grande questão, e é sobretudo aí que brilha de maneira admirável a infinita bondade de nosso Pai Celeste que, ao lado do livre-arbítrio que nos conferiu, nada obstante semeou em nosso caminho marcos indicadores que iluminam os desvios. É, pois, por um resto de predomínio da matéria que muitos homens se obstinam em ficar surdos às advertências que lhes chegam de todos os lados, e preferem gastar em prazeres enganadores e efêmeros uma vida que lhe havia sido concedida para o avanço de seu Espírito.
Não se poderia afirmar sem blasfêmia que Deus tenha querido a infelicidade de suas criaturas, pois os infelizes expiam sempre, tanto uma vida anterior mal empregada quanto sua recusa a seguir o bom caminho, quando este lhe era mostrado claramente.
Assim, depende de cada um abreviar a prova que deve sofrer. Por isso, guias seguros bastante numerosos lhe são concedidos para que seja inteiramente responsável por sua recusa de seguir seus conselhos, e ainda, neste caso, existe um meio certo de abrandar uma punição merecida, dando sinais de sincero arrependimento e recorrendo à prece, que jamais deixa de ser atendida, quando feita com fervor. O livre-arbítrio existe, pois, efetivamente, no homem, mas com um guia: a consciência.
Vós todos que tendes acesso ao grande foco da nova ciência, não negligencieis de vos penetrar das eloquentes verdades que ela vos revela, e dos admiráveis princípios que são a sua consequência. Segui-os fielmente, pois é aí, sobretudo, que brilha o vosso livre-arbítrio.
Pensai, por um lado, nas consequências fatais que para vós arrastaria a recusa de seguir o bom caminho, como nas magníficas recompensas que vos aguardam caso obedeçais às instruções dos bons Espíritos. É aí que brilhará, por sua vez, a presciência divina.
Em vão se esforçam os homens em busca da verdade por todos os meios que julgam ter na Ciência. Esta verdade, que lhes parece escapar, segue sempre ao seu lado, e os cegos não a percebem.
Espíritos sábios de todos os países, aos quais é dado levantar uma ponta do véu, não negligencieis os meios que vos são oferecidos pela Providência! Provocai nossas manifestações; fazei que delas aproveitem todos os vossos irmãos menos bem aquinhoados que vós; inculcai em todos os preceitos que vos chegam do mundo espírita, e tereis bem merecido, porque tereis contribuído em larga parte para a realização dos desígnios da Providência.
ESPÍRITO FAMILIAR
(Sociedade Espírita de Paris - Médium: Sra. Costel)
O panteísmo, ou a encarnação do Espírito na matéria, da ideia na forma, é o primeiro passo do paganismo para a lei do amor, que foi revelada e pregada por Jesus.
Ávida de prazeres, empolgada pela beleza exterior, a Antiguidade quase não olhava além do que via. Sensual e ardente, ela ignorava as melancolias que nascem da dúvida inquieta e das ternuras recalcadas. Ela temia os deuses, cuja imagem suavizada colocava na sala de estar de suas residências. A escravidão e a guerra a roíam por dentro e a esgotavam por fora. Em vão a Natureza sonora e magnífica convidava os homens a compreender o seu esplendor, mas eles a temiam ou a adoravam, como aos deuses. Os bosques sagrados participavam do terror dos oráculos, e nenhum mortal separava os benefícios de sua solidão das ideias religiosas que faziam palpitar a árvore e fremir a pedra.
O panteísmo tem duas faces, sob as quais convém estudá-lo. Primeiro, a separação infinita da natureza divina, dividida em todas as partes da criação e se reencontrando nos mais ínfimos detalhes, assim como na sua magnificência, isto é, uma confusão flagrante entre a obra e o obreiro. Em segundo lugar, a assimilação da Humanidade, ou antes, sua absorção na matéria. O panteísmo antigo encarnava as divindades; o moderno panteísmo assimila o homem ao reino animal e faz surgirem as moléculas criadoras do forno ardente onde se elabora a vegetação, confundindo os resultados com o princípio.
Deus é a ordem, que a confusão humana não poderia perturbar. Tudo vem a propósito: a seiva para as árvores e o pensamento para os cérebros. Nenhuma ideia, filha do tempo, é abandonada ao acaso. Ela tem a sua fieira, um estreito parentesco que lhe dá a razão de ser, a liga ao passado e a convida ao futuro. A história das crenças religiosas é a prova dessa verdade absoluta, pois não houve nenhuma idolatria, nenhum sistema, nenhum fanatismo que não tivesse tido sua poderosa e imperiosa razão de existir. Todos avançavam para a luz, todos convergiam para o mesmo objetivo e todos virão confundir-se, como as águas dos rios longínquos, no vasto e profundo mar da unidade espírita.
Assim, o panteísmo, precursor do Catolicismo, levava em si o germe da universalidade de Deus. Ele inspirava aos homens a fraternidade para com a Natureza, essa fraternidade que Jesus lhes devia ensinar a praticar uns para com os outros, fraternidade sagrada, reforçada hoje pelo Espiritismo, que vitoriosamente religa os seres terrenos ao mundo espiritual.
Em verdade eu vo-lo digo, a lei de amor desenrola lentamente, e de maneira contínua, suas espirais infinitas. É ela que, nos ritos misteriosos das religiões da Índia, diviniza o animal, sagrando-o por sua fraqueza e por seus serviços humildes. É ela que povoava de deuses familiares os lares purificados. É ela que, em cada uma das crenças diversas, faz com que as gerações soletrem uma palavra do alfabeto divino.
Mas estava reservado a Jesus proclamar a ideia universal que as resume todas. O Salvador anunciou o amor e o tornou mais forte que a morte. Ele disse aos homens: “Amai-vos uns aos outros; amai-vos na dor, na alegria, no opróbrio; amai a Natureza, vossa primeira iniciadora; amai os animais, vossos humildes companheiros; amai o que começa, amai o que acaba.”
O Verbo do Eterno chama-se amor e abraça, numa inextinguível ternura, a Terra onde passais e os Céus onde entrareis, purificados e triunfantes.
LÁZARO
Ávida de prazeres, empolgada pela beleza exterior, a Antiguidade quase não olhava além do que via. Sensual e ardente, ela ignorava as melancolias que nascem da dúvida inquieta e das ternuras recalcadas. Ela temia os deuses, cuja imagem suavizada colocava na sala de estar de suas residências. A escravidão e a guerra a roíam por dentro e a esgotavam por fora. Em vão a Natureza sonora e magnífica convidava os homens a compreender o seu esplendor, mas eles a temiam ou a adoravam, como aos deuses. Os bosques sagrados participavam do terror dos oráculos, e nenhum mortal separava os benefícios de sua solidão das ideias religiosas que faziam palpitar a árvore e fremir a pedra.
O panteísmo tem duas faces, sob as quais convém estudá-lo. Primeiro, a separação infinita da natureza divina, dividida em todas as partes da criação e se reencontrando nos mais ínfimos detalhes, assim como na sua magnificência, isto é, uma confusão flagrante entre a obra e o obreiro. Em segundo lugar, a assimilação da Humanidade, ou antes, sua absorção na matéria. O panteísmo antigo encarnava as divindades; o moderno panteísmo assimila o homem ao reino animal e faz surgirem as moléculas criadoras do forno ardente onde se elabora a vegetação, confundindo os resultados com o princípio.
Deus é a ordem, que a confusão humana não poderia perturbar. Tudo vem a propósito: a seiva para as árvores e o pensamento para os cérebros. Nenhuma ideia, filha do tempo, é abandonada ao acaso. Ela tem a sua fieira, um estreito parentesco que lhe dá a razão de ser, a liga ao passado e a convida ao futuro. A história das crenças religiosas é a prova dessa verdade absoluta, pois não houve nenhuma idolatria, nenhum sistema, nenhum fanatismo que não tivesse tido sua poderosa e imperiosa razão de existir. Todos avançavam para a luz, todos convergiam para o mesmo objetivo e todos virão confundir-se, como as águas dos rios longínquos, no vasto e profundo mar da unidade espírita.
Assim, o panteísmo, precursor do Catolicismo, levava em si o germe da universalidade de Deus. Ele inspirava aos homens a fraternidade para com a Natureza, essa fraternidade que Jesus lhes devia ensinar a praticar uns para com os outros, fraternidade sagrada, reforçada hoje pelo Espiritismo, que vitoriosamente religa os seres terrenos ao mundo espiritual.
Em verdade eu vo-lo digo, a lei de amor desenrola lentamente, e de maneira contínua, suas espirais infinitas. É ela que, nos ritos misteriosos das religiões da Índia, diviniza o animal, sagrando-o por sua fraqueza e por seus serviços humildes. É ela que povoava de deuses familiares os lares purificados. É ela que, em cada uma das crenças diversas, faz com que as gerações soletrem uma palavra do alfabeto divino.
Mas estava reservado a Jesus proclamar a ideia universal que as resume todas. O Salvador anunciou o amor e o tornou mais forte que a morte. Ele disse aos homens: “Amai-vos uns aos outros; amai-vos na dor, na alegria, no opróbrio; amai a Natureza, vossa primeira iniciadora; amai os animais, vossos humildes companheiros; amai o que começa, amai o que acaba.”
O Verbo do Eterno chama-se amor e abraça, numa inextinguível ternura, a Terra onde passais e os Céus onde entrareis, purificados e triunfantes.
LÁZARO
Este livro notável e consciencioso é obra de um distinto cientista, que se propôs tirar da própria Ciência e da observação dos fatos a demonstração da realidade das ideias espiritualistas. É mais uma peça em apoio à tese que sustentamos acima. É mais ainda, porque é um primeiro passo, quase oficial, da Ciência, na via espírita; aliás, em breve será seguido ─ e disto temos certeza ─ por outras adesões mais ressonantes ainda, que levarão os negadores e adversários de todas as escolas a refletir seriamente. Bastará citar o fragmento seguinte para mostrar em que espírito a obra é concebida. Acha-se à página 331.
“Vê-se ─ e é sem sombra de dúvida um sinal dos tempos ─ a seita espiritista, que já tive ocasião de mencionar no § 15, tomar uma rápida extensão entre pessoas de todas as classes e as mais esclarecidas, sem contar o lamentável e lamentado Jobard, de Bruxelas, que se havia tornado um dos mais alertas campeões da nova doutrina.
“O fato é que se se examinar esta doutrina, não seria, como fiz de princípio, na pequena brochura do Sr. Allan Kardec Que é o Espiritismo? É impossível não notar quanto sua moral é clara, homogênea, consequente com ela mesma, e quanto de satisfação ela dá ao espírito e ao coração. Se lhe tirassem a realidade das comunicações com o mundo invisível, restar-lhe-ia sempre isto, e é muito, é o bastante para arrastar numerosas adesões e explicar seu sucesso crescente.
“Quanto às comunicações com o mundo invisível, creio ter demonstrado cientificamente que não só eram possíveis, mas que deveriam ocorrer diariamente no sono. A inspiração em vigília, cuja autenticidade ou natureza é impossível pôr em dúvida, de acordo com o que eu disse, é aliás uma comunicação desse gênero, posto possa haver casos em que não seja senão o resultado de um maior grau de atividade do Espírito.
Agora, se se verificar onde essa comunicação se traduz por noções estranhas ao médium que as recebe, nada vejo aí que não seja eminentemente provável, e é, em todos os casos, uma questão que pode ser resolvida na ausência dos sábios, que cada médium, que tem a medida de seus conhecimentos no estado normal, ─ e as pessoas de sua família e de seu convívio podem julgar melhor que ninguém, de sorte que se o Espiritismo diariamente faz prosélitos fora da questão moral, ─ é que aparentemente ele produz médiuns em quantidade suficiente para fornecer a prova de seu estado particular a quem quer que deseje examiná-los sem ideias preconcebidas.
“A moral, tal qual a compreendo e a deduzi de noções científicas ─ não temo reconhecê-lo ─ tem numerosos pontos de contacto com aquela transmitida pelos médiuns do Sr. Allan Kardec. Também não estou longe de admitir que se nas páginas por eles escritas muitas há que não ultrapassam o alcance ordinário do espírito humano, inclusive o deles, deve havê-las, e as há, de um tal alcance que lhes seria impossível escrever outras idênticas nos seus momentos ordinários.
Tudo isto não me leva menos a desejar que uma doutrina que não oferece o menor perigo, e que, ao contrário, eleva o espírito e o coração tanto quanto é possível desejá-lo, no interesse da Sociedade, se expanda todos os dias de mais a mais. Porque, segundo o que tenho lido, calculo que é impossível ser um bom espírita sem ser um homem de bem e um bom cidadão. Não conheço muitas religiões das quais se possa dizer o mesmo.”
“Vê-se ─ e é sem sombra de dúvida um sinal dos tempos ─ a seita espiritista, que já tive ocasião de mencionar no § 15, tomar uma rápida extensão entre pessoas de todas as classes e as mais esclarecidas, sem contar o lamentável e lamentado Jobard, de Bruxelas, que se havia tornado um dos mais alertas campeões da nova doutrina.
“O fato é que se se examinar esta doutrina, não seria, como fiz de princípio, na pequena brochura do Sr. Allan Kardec Que é o Espiritismo? É impossível não notar quanto sua moral é clara, homogênea, consequente com ela mesma, e quanto de satisfação ela dá ao espírito e ao coração. Se lhe tirassem a realidade das comunicações com o mundo invisível, restar-lhe-ia sempre isto, e é muito, é o bastante para arrastar numerosas adesões e explicar seu sucesso crescente.
“Quanto às comunicações com o mundo invisível, creio ter demonstrado cientificamente que não só eram possíveis, mas que deveriam ocorrer diariamente no sono. A inspiração em vigília, cuja autenticidade ou natureza é impossível pôr em dúvida, de acordo com o que eu disse, é aliás uma comunicação desse gênero, posto possa haver casos em que não seja senão o resultado de um maior grau de atividade do Espírito.
Agora, se se verificar onde essa comunicação se traduz por noções estranhas ao médium que as recebe, nada vejo aí que não seja eminentemente provável, e é, em todos os casos, uma questão que pode ser resolvida na ausência dos sábios, que cada médium, que tem a medida de seus conhecimentos no estado normal, ─ e as pessoas de sua família e de seu convívio podem julgar melhor que ninguém, de sorte que se o Espiritismo diariamente faz prosélitos fora da questão moral, ─ é que aparentemente ele produz médiuns em quantidade suficiente para fornecer a prova de seu estado particular a quem quer que deseje examiná-los sem ideias preconcebidas.
“A moral, tal qual a compreendo e a deduzi de noções científicas ─ não temo reconhecê-lo ─ tem numerosos pontos de contacto com aquela transmitida pelos médiuns do Sr. Allan Kardec. Também não estou longe de admitir que se nas páginas por eles escritas muitas há que não ultrapassam o alcance ordinário do espírito humano, inclusive o deles, deve havê-las, e as há, de um tal alcance que lhes seria impossível escrever outras idênticas nos seus momentos ordinários.
Tudo isto não me leva menos a desejar que uma doutrina que não oferece o menor perigo, e que, ao contrário, eleva o espírito e o coração tanto quanto é possível desejá-lo, no interesse da Sociedade, se expanda todos os dias de mais a mais. Porque, segundo o que tenho lido, calculo que é impossível ser um bom espírita sem ser um homem de bem e um bom cidadão. Não conheço muitas religiões das quais se possa dizer o mesmo.”
Pregados na Catedral de Metz, a 27, 28 e 29 de maio de 1863, pelo rev. Pe. Letierce, da Companhia de Jesus. Refutados por um Espírita de Metz e precedidos de considerações sobre a loucura espírita. *
Sentimo-nos sempre felizes ao ver adeptos sérios entrando na liça quando à lógica da argumentação aliam a calma e a moderação, das quais nunca nos devemos afastar, mesmo contra os que não usam os mesmos processos a nosso respeito. Felicitamos o autor deste opúsculo por ter sabido reunir essas duas qualidades em seu trabalho muito interessante e muito consciencioso, que será, não temos dúvida, acolhido com a consideração que merece. A carta inserida na introdução da brochura é um testemunho de simpatia que não poderíamos reconhecer melhor do que a transcrevendo textualmente, pois é uma prova da maneira pela qual ele compreende a doutrina, bem como os pensamentos seguintes, que toma por epígrafe:
“Cremos que há fatos que não são visíveis ao olho nem tangíveis à mão; que nem o escalpelo nem o microscópio podem atingir, por mais perfeitos que os suponhamos; que igualmente escapam ao gosto, ao olfato e ao ouvido e que entretanto são susceptíveis de constatação com uma certeza absoluta. (Ch. Jouffroy. Prefácio das Esquisses de philosophie morale, pág. 5).
“Não creiais em todo Espírito, mas ponde-os à prova, para ver se são de Deus.” (Evangelho).
“Senhor e caro mestre,
“Dignar-vos-íeis aceitar a dedicatória desta modesta defesa do Espiritismo, deste grito de indignação contra os ataques dirigidos contra nossa sublime moral?
“Seria para mim o mais evidente testemunho de que estas páginas são ditadas com o mesmo espírito de moderação que diariamente admiramos em vossos escritos, e que deveria guiar-nos em todas as nossas lutas. Aceitai-o como o ingênuo ensaio de um dos vossos recentes adeptos; como a profissão de fé de um verdadeiro crente.
“Se meus esforços forem felizes, atribuirei o seu sucesso ao vosso alto patrocínio; se minha voz inábil não encontrar eco, ao Espiritismo não faltarão outros defensores, e eu terei para mim, com a satisfação da minha consciência, a felicidade de ter sido aprovado pelo apóstolo imortal de nossa filosofia.”
Extraímos da brochura a passagem seguinte, de um dos sermões do Rev. Pe. Letierce, a fim de dar uma ideia da força de sua lógica.
“Nada há de chocante para a razão em admitir, num certo limite, a comunicação dos Espíritos dos mortos com os vivos. Tal comunicação é perfeitamente compatível com a natureza da alma humana, do que numerosos exemplos seriam encontrados no Evangelho e na Vida dos Santos. Mas eles eram santos, eram apóstolos.
“Para nós, pobres pecadores que, na rampa escorregadia da corrupção, muitas vezes só teríamos necessidade de uma mão socorrista para nos reconduzir ao bem, não é um sacrilégio, um insulto à justiça divina ir pedir aos bons Espíritos que Deus espalhou em redor de nós, conselhos e preceitos para a nossa instrução moral e filosófica? Não é uma audácia ímpia pedir ao Criador que nos envie anjos guardiães para incessantemente nos lembrarem a observação de suas leis, a caridade, o amor aos nossos semelhantes e nos ensinar o que devemos fazer, na medida de nossas forças, para chegar o mais rapidamente possível a esse grau de perfeição que eles próprios atingiram?
“Esse apelo que fazemos às almas dos justos, em nome da bondade de Deus, só é ouvido pelas almas dos maus, em nome das potências infernais. Sim, os Espíritos se comunicam conosco, mas são os Espíritos dos condenados. Suas comunicações e seus preceitos são, é verdade, tais que nos poderiam ditar os anjos mais puros. Todos os seus discursos respiram as mais sublimes virtudes, das quais as menores devem ser para nós um ideal de perfeição que dificilmente podemos atingir nesta vida, mas é apenas uma cilada para melhor nos atrair; um o mel cobrindo o veneno com que o demônio quer matar nossa alma.
“Com efeito, as almas dos mortos, segundo Allan Kardec, são de três classes: as que chegaram ao estado de puros Espíritos, as que estão no caminho da perfeição e as almas dos maus.
“As primeiras, por sua própria natureza, não podem vir ao nosso apelo. Seu estado de pureza impossibilita qualquer comunicação com as dos homens, encerradas em tão grosseiro envoltório. Aliás, que viriam fazer na Terra? Pregar exortações que não poderíamos compreender?
“As segundas têm muito que trabalhar o seu aperfeiçoamento moral para perder tempo vindo conversar conosco. Também não são elas que nos assistem em nossas reuniões.
“O que resta, então, para nós? Como eu disse, restam as almas dos condenados, e estas pelo menos não se fazem de rogadas para vir. Inteiramente dispostas a aproveitar o nosso erro e a nossa necessidade de instrução, elas vêm em multidão junto a nós, para nos arrastar com elas ao abismo onde as mergulhou a justa punição de Deus.”
“Cremos que há fatos que não são visíveis ao olho nem tangíveis à mão; que nem o escalpelo nem o microscópio podem atingir, por mais perfeitos que os suponhamos; que igualmente escapam ao gosto, ao olfato e ao ouvido e que entretanto são susceptíveis de constatação com uma certeza absoluta. (Ch. Jouffroy. Prefácio das Esquisses de philosophie morale, pág. 5).
“Não creiais em todo Espírito, mas ponde-os à prova, para ver se são de Deus.” (Evangelho).
“Senhor e caro mestre,
“Dignar-vos-íeis aceitar a dedicatória desta modesta defesa do Espiritismo, deste grito de indignação contra os ataques dirigidos contra nossa sublime moral?
“Seria para mim o mais evidente testemunho de que estas páginas são ditadas com o mesmo espírito de moderação que diariamente admiramos em vossos escritos, e que deveria guiar-nos em todas as nossas lutas. Aceitai-o como o ingênuo ensaio de um dos vossos recentes adeptos; como a profissão de fé de um verdadeiro crente.
“Se meus esforços forem felizes, atribuirei o seu sucesso ao vosso alto patrocínio; se minha voz inábil não encontrar eco, ao Espiritismo não faltarão outros defensores, e eu terei para mim, com a satisfação da minha consciência, a felicidade de ter sido aprovado pelo apóstolo imortal de nossa filosofia.”
Extraímos da brochura a passagem seguinte, de um dos sermões do Rev. Pe. Letierce, a fim de dar uma ideia da força de sua lógica.
“Nada há de chocante para a razão em admitir, num certo limite, a comunicação dos Espíritos dos mortos com os vivos. Tal comunicação é perfeitamente compatível com a natureza da alma humana, do que numerosos exemplos seriam encontrados no Evangelho e na Vida dos Santos. Mas eles eram santos, eram apóstolos.
“Para nós, pobres pecadores que, na rampa escorregadia da corrupção, muitas vezes só teríamos necessidade de uma mão socorrista para nos reconduzir ao bem, não é um sacrilégio, um insulto à justiça divina ir pedir aos bons Espíritos que Deus espalhou em redor de nós, conselhos e preceitos para a nossa instrução moral e filosófica? Não é uma audácia ímpia pedir ao Criador que nos envie anjos guardiães para incessantemente nos lembrarem a observação de suas leis, a caridade, o amor aos nossos semelhantes e nos ensinar o que devemos fazer, na medida de nossas forças, para chegar o mais rapidamente possível a esse grau de perfeição que eles próprios atingiram?
“Esse apelo que fazemos às almas dos justos, em nome da bondade de Deus, só é ouvido pelas almas dos maus, em nome das potências infernais. Sim, os Espíritos se comunicam conosco, mas são os Espíritos dos condenados. Suas comunicações e seus preceitos são, é verdade, tais que nos poderiam ditar os anjos mais puros. Todos os seus discursos respiram as mais sublimes virtudes, das quais as menores devem ser para nós um ideal de perfeição que dificilmente podemos atingir nesta vida, mas é apenas uma cilada para melhor nos atrair; um o mel cobrindo o veneno com que o demônio quer matar nossa alma.
“Com efeito, as almas dos mortos, segundo Allan Kardec, são de três classes: as que chegaram ao estado de puros Espíritos, as que estão no caminho da perfeição e as almas dos maus.
“As primeiras, por sua própria natureza, não podem vir ao nosso apelo. Seu estado de pureza impossibilita qualquer comunicação com as dos homens, encerradas em tão grosseiro envoltório. Aliás, que viriam fazer na Terra? Pregar exortações que não poderíamos compreender?
“As segundas têm muito que trabalhar o seu aperfeiçoamento moral para perder tempo vindo conversar conosco. Também não são elas que nos assistem em nossas reuniões.
“O que resta, então, para nós? Como eu disse, restam as almas dos condenados, e estas pelo menos não se fazem de rogadas para vir. Inteiramente dispostas a aproveitar o nosso erro e a nossa necessidade de instrução, elas vêm em multidão junto a nós, para nos arrastar com elas ao abismo onde as mergulhou a justa punição de Deus.”
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* Brochura in-18. – Preço 1 franco; pelo correio 1,10 franco – Paris: Didier & Cia., Ledoyen; - Metz: Linden, Verronnais, livrarias.