Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1867

Allan Kardec

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Novembro

Impressões de um médium inconsciente a propósito do romance do futuro

(Pelo Sr. Eug. Bonnemère)

O Sr. Bonnemère teve a gentileza de nos transmitir, sobre o jovem bretão de que se trata no prefácio do interessante livro que publicou, sob o título de Roman de l’Avenir, detalhes circunstanciados que completam os que demos a respeito na Revista de julho de 1867. Estes novos informes são do mais alto interesse e os nossos leitores serão gratos ao autor, como nós também, por havê-los posto à nossa disposição. Faremos, a respeito, algumas observações oportunas.

Senhor,

Um amigo me envia, com muito atraso, o número da Revista Espírita no qual noticiais o Roman de l’Avenir, que assinei com o meu nome. Permiti que vos dê alguns esclarecimentos a respeito de uma passagem desse artigo, na qual se acha esta reflexão: “Disseram-nos que quando escreveu este livro, o autor não conhecia o Espiritismo; isto parece difícil, etc.”

Entretanto, isto é rigorosamente exato. Confesso-o com toda sinceridade e humildade, senhor, ter cometido o erro de não vos oferecer este volume; jamais fui à vossa casa; eu nem mesmo conhecia o título da Revista Espírita, e minha biblioteca não possui nenhuma obra sobre as questões que aí são tratadas; eis por que chamei o meu jovem bretão de extático natural, ao passo que para vós é um médium.

Contei, no prefácio do Roman de l’Avenir, em consequência daquela estranha aventura, que eu, que fui um historiador na minha maturidade, ia tornar-me um romancista depois de haver ultrapassado os cinquenta anos. Os leitores aí não viram mais que um desses processos familiares aos autores para dar algo de picante ao seu relato. Atesto sob palavra que, com exceção de um detalhe que nada tem a ver com o caso, e que não me é ainda permitido revelar, tudo o que afirmo nesse prefácio é verdadeiro e, longe de exagerar, não digo tudo.

Meu jovem bretão explica em vinte passagens de seus volumosos manuscritos (perto de 18.000 páginas) as causas e os efeitos dessa espécie de condenação aos trabalhos forçados que sofreu, maldizendo-a.

“Todas as noites, escreveu ele a 24 de agosto de 1864, deito-me muito fatigado, após um dia de trabalho; adormeço; uma hora depois desperto; estou triste, parece que me envolve um crepe negro; estou sem palavras, mas não sofro. Algo de vago está em meu cérebro; é sob essa impressão que meus olhos por vezes se fecham com lágrimas no coração. Depois, pela manhã, desperto com um mutismo persistente, isto é, com intoleráveis sofrimentos no lado esquerdo e no coração, que não me permitem conciliar o sono. Experimento um estado de angústia intolerável que me força a levantar-me. Sufoco, pois há muita coisa em mim que é preciso despejar.

Então vou à minha mesa e lá sou constrangido a trabalhar.

“Quanto mais sofro, mais e melhor trabalho. Tenho então uma extrema expansão da imaginação. Quando uma obra está completa e não mais necessita senão ser passada para o papel, invento outra, sem jamais buscar, e sempre escrevendo mecanicamente aquela que chegou à maturação.

“Quando devo servir de instrumento a algum dos amigos desaparecidos, seu nome ressoa em meu ouvido. Quando escrevo, esse nome não me deixa, e experimento, mesmo em meio aos meus sofrimentos físicos, por vezes agudos, sobretudo no coração, uma espécie de doçura em escrever o que ele põe em mim. É como uma inspiração, mas involuntária. Todas as fibras de meu ser moral são postas em alerta. Então sinto mais vivamente; parece que vibro; todos os ruídos são mais fortes, mais perceptíveis; vivo vibrações intelectuais e morais ao mesmo tempo.

“Quando estou nesse estado de mutismo, sinto-me como que envolto numa rede, que estabelece uma separação entre o meu ser intelectual e a massa dos objetos materiais ou das pessoas que me rodeiam. É um isolamento absoluto em meio à multidão; minha palavra e meu espírito estão alhures. O ser inspirador que vem em mim não me deixa mais. É uma espécie de penetração íntima dele em mim; sou como uma esponja embebida de seu pensamento. Eu a pressiono e dela sai a quintessência de sua inteligência, desprendida de todas as mesquinharias de nossa vida aqui embaixo.

“Por vezes, mesmo sem mutismo, quer esteja só, quer com outros, pouco importa, converso, rio, percebo tudo na conversação dos outros, e contudo trabalho; as ideias se acumulam, mas fugidias; eu ali estou mas não estou mais; volto a mim e não tenho mais lembrança de nada; mas o estado de mutismo faz reviver as imagens apagadas.

“Se for um romance que devo escrever, inicialmente me vem o título, depois vêm os acontecimentos; às vezes é questão de um ou dois dias para compô-lo inteirinho. Se se trata de coisas mais sérias, o título igualmente me é ditado, depois os pensamentos superabundam, até mesmo quando pareço mais distraído. A elaboração se faz a seu tempo, até o instante em que o acúmulo se derrama sobre o papel.

“Muitas vezes, depois de ter concluído um longo romance, e quando não tinha nada pronto para escrever nos meus cadernos, me aconteceu de experimentar uma estranha sensação, como se em meu cérebro houvesse um vazio. Então sofro muito mais; é um estado de completa atonia, até o momento em que a cabeça se enche de outra coisa.

“Geralmente, desde a tarde, ou de manhã, na cama, elaboro algum novo plano. Por vezes, entretanto, levanto-me sem pensar em nada do que vou fazer e sem ter nada elaborado de antemão. Acesa a vela, ponho-me diante do papel. Então escuto do lado esquerdo, no ouvido esquerdo, um nome, uma palavra, um assunto de romance em duas ou três palavras. Isto basta. As palavras se sucedem sem interrupção; os acontecimentos vêm alinhar-se por si mesmos sob a pena, sem um instante de interrupção, até que a história fique terminada. Quando as coisas se passam assim, é que não se trata senão de uma novela muito curta, que será terminada numa sessão.

“Há ainda em meu estado uma particularidade muito singular. É quando me inquieto pela saúde de alguém de quem gosto. Verdadeiramente isto se torna para mim uma doença atroz, e creio que sofro mais que o próprio doente. Durante alguns instantes sou tomado na cabeça, no estômago, no coração e nas entranhas por uma pressão cheia de angústias que vai até a dor extrema. Há um momento em que só a cabeça sofre. Então um ou vários nomes de remédios estão em mim. Não quero falar, porque duvido e temo agir mal, quando tanto gostaria de aliviar! Mas essas palavras voltam sem cessar; capitulo, cedo e as digo com esforço, ou as escrevo.

Então está acabado, não penso mais nisto e tudo se apaga.”

Não sei se me engano, mas me parece aí encontrar todos os caracteres da possessão de outrora, e creio mesmo que outrora queimaram muitos possessos que não eram mais feiticeiros do que o meu jovem extático. Evidentemente ele vive uma dupla vida, das quais nenhuma tem relação com a outra. Vi-o muitas vezes, quando uma das pessoas que a ele se confiavam vinha dizer-lhe que ela sofria; o olhar fixo, as pálpebras afastadas, a pupila dilatada, ele parecia escutar, procurar. ─ “Sim, sim!” murmurava ele como se repetisse para si mesmo o que lhe dizia uma voz interior. Então ele indicava o remédio necessário, conversava um momento sobre a natureza e a causa do mal, depois, pouco a pouco, tudo se dissipava, e ele não tinha consciência nem do instante em que começara o êxtase, nem do momento em que havia terminado. Esse rápido momento de ausência para ele não existia, e evitava-se de falar com ele sobre o caso.

“Quero e devo viver na sombra, escreveu ele alhures. Dizem-me: Estais numa sociedade desviada, devido à má direção. O bem que se faz sem interesse, emanando de uma fonte natural, mas um pouco extraordinária, parece culposo, ridículo, pelo menos indiscreto. Não é necessário expor-se à zombaria, por vezes ao desprezo, devido a uma boa ação. Conforme o velho provérbio: “Falta confessada é meio perdoada”, pode-se dizer que uma boa ação oculta está meio perdoada. Então há que fazer o bem aos outros sem que o suspeitem. É a verdadeira caridade, que dá sem esperar retribuição.”

Tudo isto não se realiza sem lutas. Por vezes ele se revolta contra essa obsessão tirânica. Vi-o resistir, debater-se com cólera, depois, dominado por uma vontade superior à sua, entregar-se ao trabalho.

Ele tinha anunciado um grande e extenso trabalho sobre a liberdade. Declaravase incapaz de fazê-lo, e protestava que não o faria. Uma manhã escreveu:

“Não, quero lutar ainda hoje. Sinto que a forma ainda não veio bastante clara... Quando, pois, me deixareis em repouso?... Estou arrebentado!... Ah! Chamais a isto uma liberdade de pensamento, que infundis em mim! Mas é a escravidão aos vossos pensamentos, que se devia dizer! Pretendeis que eu tenha o seu germe, e que é prestar-me um imenso serviço desenvolvê-la, a ela ajuntando o que podeis incluir! “Começarei por esta questão já tratada: “Que é a vida?”

Uma espécie de anúncio de programa a ser desenvolvido continuava por dez páginas de sua escrita, e era escrito em quarenta minutos.

Todas essas coisas, que me pareceram muito estranhas, sê-lo-ão menos para vós, Senhor. Em suma, tenho fé em seu poder misterioso, porque ele me curou de mais de uma afecção que talvez tivesse embaraçado a Faculdade. Jamais alguém está doente junto a ele, sem que ele escreva sua receitazinha. Muitas vezes o faz a despeito de sua vontade, percebendo que não ligarão para as suas prescrições. Um dia ele terminava por estas linhas uma consulta a propósito de uma pessoa doente do peito e da qual cuidavam mal, em sua opinião, e que ele acreditava que ainda poderia salvar:

“Eis o que posso dizer. Façam o que julgarem conveniente. Estas são as minhas observações, eis tudo. Não terei que me censurar por tê-las deixado dormir em mim.

Nada deve ser feito sem o conselho do médico. Com naturezas como são todos, isto só pode servir como indicação. Que ninguem fale comigo sobre isso; que ninguem me agradeca. Eu não sou um homem, mas uma alma que desperta ao grito do sofrimento, e que não mais se recorda, depois que chegou o alívio.”

Quando ele não tinha doentes à mão, prescrevia remédios gerais para afecções que a ciência oficial ainda não sabe curar. Que valor têm essas prescrições? Ignoro. Contudo, o que vi, o que pude experimentar, me leva a crer que talvez pudessem abrir caminho para novos processos curativos.

Se um indivíduo que jamais abriu um livro de medicina prescreve, sem ter consciência disso, remédios que podem curar, em muitos casos, a maioria dos males atualmente considerados incuráveis, parece-me incontestável que tais coisas lhe são reveladas por uma força desconhecida e misteriosa. Em presença de semelhante fato, a questão me parece resolvida. Deve-se aceitar como demonstrado que existem sensitivos aos quais é concedido servir de intermediários dos amigos desaparecidos que, não mais tendo órgãos ao serviço de sua vontade, vêm usar a voz ou a mão desses seres privilegiados, quando querem curar o nosso corpo ou firmar a nossa alma, esclarecendo-a sobre coisas que lhes é permitido nos dar a conhecer.

É possível arriscar uma experiência in anima vili, sobre os bichos da seda, por exemplo, que quase não servem mais senão para serem atirados aos vermes dos túmulos, tão doentes que eles estão. A questão é séria, porque as perdas causadas pela moléstia que os afeta eleva-se anualmente a centenas de milhões de francos. O resultado a obter vale a pena que se tente esta primeira experiência que, em todo caso, se não der resultado, não agravará a situação.

Aqui pode haver um mistério, mas afirmo que não há mistificação. Se sou mistificado, restar-me-ão sempre os cento e tantos romances e novelas desse romancista sem o saber, cuja publicação vai ocupar agradavelmente os lazeres dos últimos anos de minha vida, e dos quais deixarei a maior parte para outros depois de mim.

Neste inverno publicarei outro romance de meu jovem extático bretão. No prefácio transcreverei textualmente tudo quanto ele escreveu sobre a cura dos bichos da seda; acrescentarei até mesmo, se quiserem, suas receitas para prevenir e para curar a cólera e as doenças do peito.

Pouco importa que riam de mim durante alguns dias, mas é muito importante que esses segredos dos quais o acaso me faz depositário, não morram comigo, se contiverem algo de sério, e que se saiba se existem relações possíveis entre as inteligências superiores do outro lado da vida e as inteligências dóceis deste lado de cá. Creio que seria muito importante para nós estabelecer relações cada vez mais seguidas com esses mortos de boa vontade que parecem dispostos a prestar-nos semelhantes serviços.

Aceitai, etc...

E. BONNEMÈRE


O quadro das impressões desse jovem, traçado por ele próprio, é tanto mais notável quanto, tendo sido escrito na ausência de qualquer conhecimento espírita, não pode ser o reflexo de ideias colhidas num estudo qualquer, que lhe tivesse exaltado a imaginação. É a impressão espontânea de suas sensações, de onde ressaltam, com a maior evidência, todos os caracteres de uma mediunidade inconsciente; a intervenção de inteligências ocultas ai é expressa sem ambiguidades; a resistência que ele opõe, a própria contrariedade que ele sente, provam sobejamente que ele age sob o império de uma vontade que não é a sua. Esse jovem é, pois, um médium em toda a acepção da palavra, e, além disto, dotado de faculdades múltiplas, porquanto é ao mesmo tempo médium escrevente, falante, vidente, auditivo, mecânico, intuitivo, inspirado, impressivo, sonâmbulo, médico, literato, filósofo, moralista, etc. Mas, nos fenômenos descritos, não há nenhum dos caracteres do êxtase. É, pois, impropriamente que o Sr. Bonnemère o qualifica de extático, pois é precisamente uma das faculdades que lhe faltam. O êxtase é um estado particular bem definido, que não se apresentou no caso de que se trata. Também não parece dotado da mediunidade de efeitos físicos, nem da mediunidade curadora.

Há médiuns naturais, como há sonâmbulos naturais, que agem espontaneamente e inconscientemente; em outros, nos quais os fenômenos mediúnicos são provocados pela vontade, a faculdade é desenvolvida pelo exercício, como em certos indivíduos o sonambulismo é provocado e desenvolvido pela ação magnética.

Há, pois, os médiuns inconscientes e os médiuns conscientes. A primeira categoria, à qual pertence o jovem bretão, é a mais numerosa; é quase geral e podemos dizer, sem exagero, que em cem indivíduos, noventa são dotados dessa aptidão em graus mais ou menos ostensivos. Se cada um se estudasse, encontrar-seia neste gênero de mediunidade, que reveste as mais diversas aparências, a razão de uma porção de efeitos que não se explicam por nenhuma das leis conhecidas da matéria.

Esses efeitos, quer sejam materiais ou não, aparentes ou ocultos, para ter essa origem, não são menos naturais. O Espiritismo nada admite de sobrenatural nem de maravilhoso; segundo ele, tudo entra na ordem das leis da Natureza. Quando a causa de um efeito é desconhecida, há que buscá-la na realização dessas leis, e não em sua perturbação provocada pelo ato de uma vontade qualquer, o que seria o verdadeiro milagre. Um homem investido do dom de milagres teria o poder de suspender o curso das leis que Deus estabeleceu, o que não é admissível. Mas sendo o elemento espiritual uma das forças ativas da Natureza, dá lugar a fenômenos especiais que não parecem naturais senão porque se obstinam em buscar a sua causa apenas nas leis da matéria. Eis por que os espíritas não fazem milagres, e jamais tiveram a pretensão defazê-los. A qualificação de taumaturgos, que a crítica lhes dá por ironia, prova que ela fala de uma coisa da qual ignora a primeira palavra, pois que chama de fazedores de milagres àqueles mesmos que vêm destruí-los.

Outro fato que ressalta das explicações dadas na carta acima é que o Roman de l’Avenir é efetivamente uma obra mediúnica do jovem bretão, e não podemos deixar de ser grato ao Sr. Bonnemère por ter declinado a sua paternidade. Pensamentos tão elevados e tão profundos nada tinham que pudessem causar-nos admiração, vindos de sua parte, por isso não tínhamos hesitado em atribuí-los a ele, e estimamos ainda mais seu caráter e seu talento de escritor, que já era de nosso conhecimento. No entanto, eles haurem uma importância particular da fonte de onde emanam. Por mais estranha que pareça essa fonte, à primeira vista, ela nada tem de surpreendente para quem quer que conheça o Espiritismo. Fatos desse gênero se veem frequentemente, e não há um só espírita um pouco esclarecido que deles não se dê conta perfeitamente, sem recorrer aos milagres.

Assim, atribuindo a obra ao Sr. Bonnemère, e aí encontrando fatos e pensamentos que parecem hauridos da própria Doutrina, parecia-nos difícil que o autor a ignorasse. Considerando-se que ele afirma o contrário, acreditamo-lo sem esforço e encontramos em seu próprio desconhecimento a confirmação do fato, tantas vezes repetido em nossos escritos, que as ideias espíritas de tal modo estão na Natureza, que elas germinam fora do ensinamento do Espiritismo, e que uma multidão de criaturas são ou se tornam espíritas sem o saber e por intuição. Às suas ideias apenas falta o nome. O Espiritismo é como essas plantas cujas sementes são levadas pelo vento e brotam sem cultivo. Ele nasce espontaneamente no pensamento, sem estudo prévio. O que podem, então, contra ele aqueles que sonham com o seu aniquilamento, ferindo o tronco materno?

Assim, eis um médium completo, notável, e um observador, que não temem, nem um nem outro, o que seja o Espiritismo, e o observador, por uma dedução lógica do que vê, chega por si mesmo a todas as consequências do Espiritismo. O que ele constata, de saída, é que os fatos que ele tem sob os olhos lhe apresentam, no mesmo indivíduo, uma dupla vida, da qual uma não tem qualquer relação com a outra. Evidentemente, essas duas vidas, nas quais se manifestam pensamentos divergentes, estão submetidas a condições diferentes. Elas não podem ambas provir da matéria; é a constatação da vida espiritual; é a alma que se vê agir fora do organismo. Este fenômeno é muito vulgar; produz-se diariamente durante o sono do corpo, nos sonhos, no sonambulismo natural ou provocado, na catalepsia, na letargia, na dupla vista, no êxtase. O princípio inteligente isolado do organismo é um fato capital, porque é a prova de sua individualidade. A existência, a independência e a individualidade da alma podem, assim, ser resultado da observação. Se, durante a vida do corpo, a alma pode agir sem o concurso dos órgãos materiais, é porque ela tem existência própria; a extinção da vida corpórea não arrasta, pois, forçosamente, a da vida espiritual. Vemos, por aí, onde se chega, de consequência em consequência, por uma dedução lógica.

O Sr. Bonnemère não chegou a esse resultado por uma teoria preconcebida, mas pela observação. O Espiritismo não procedeu de modo diverso. O estudo dos fatos precedeu a Doutrina, e os princípios não foram formulados, como em todas as ciências de observação, senão à medida que eram deduzidas da experiência. O Sr. Bonnemère fez o que pode fazer todo observador sério, porque os fenômenos espontâneos que ressaltam do mesmo princípio são numerosos e vulgares. Apenas, não tendo o Sr. Bonnemère visto senão um ponto, só pôde chegar a uma conclusão parcial, ao passo que o Espiritismo, tendo abarcado o conjunto desses fenômenos tão complexos e tão variados, pôde analisá-los, compará-los, controlar uns pelos outros, e aí encontrar a solução de um maior número de problemas.

Levando-se em conta que o Espiritismo é um resultado de observações, quem tivesse olhos para ver, razão para raciocinar, paciência e perseverança para ir até o fim, poderia chegar a constituir o Espiritismo, assim como poder-se-ão reconstituir todas as ciências; mas, estando feito o trabalho, é tempo ganho e esforço poupado. Se fosse necessário recomeçar incessantemente, não haveria progresso possível.

Como os fenômenos espíritas estão na Natureza, eles ocorreram em todas as épocas, e precisamente porque tocam a espiritualidade de maneira mais direta, eles estão misturados em todas as teogonias. Vindo numa época menos acessível aos preconceitos, esclarecido pelo progresso das ciências naturais que faltavam aos primeiros homens, e por uma razão mais desenvolvida, o Espiritismo pôde observar melhor do que se fazia outrora. Ele vem hoje separar o que é verdadeiro da mistura introduzida pelas crenças supersticiosas, filhas da ignorância.

O Sr. Bonnemère se felicita pelo acaso, que lhe pôs em mãos os documentos fornecidos pelo jovem bretão. O Espiritismo não admite o acaso mais do que o sobrenatural nos acontecimentos da vida. O acaso, que por sua natureza é cego, mostrar-se-ia por vezes singularmente inteligente. Então, pensamos que foi intencionalmente que tais documentos vieram à sua posse, depois que ele foi posto em condições de constatar a sua origem. Nas mãos de um jovem, teriam ficado perdidos, e é sem dúvida o que não devia acontecer. Era preciso, pois, que alguém se encarregasse de tirá-los da obscuridade, e parece que coube ao Sr. Bonnemère essa missão.

Quanto ao valor desses documentos, a julgar pela amostra dos pensamentos contidos no Roman de l’Avenir, certamente ali deve haver coisas excelentes. Serão todas boas? É outra questão. Sob este ponto de vista, sua origem não é uma garantia de infalibilidade, visto que os Espíritos, não passando de almas dos mortos, não têm a ciência soberana. Sendo seu adiantamento relativo, há uns mais esclarecidos que outros; se há uns que sabem mais que os homens, também há homens que sabem mais que certos Espíritos. Até hoje os Espíritos foram considerados como seres fora da Humanidade, e dotados de faculdades excepcionais. Eis um erro capital, que gerou tantas superstições e que o Espiritismo veio retificar. Os Espíritos fazem parte da Humanidade, e até que tenham atingido o ponto culminante da perfeição, para o qual gravitam, estão sujeitos a enganar-se. Eis por que jamais se deve fazer abnegação do livre-arbítrio e do raciocínio, mesmo em relação ao que vem do mundo dos Espíritos. Jamais devemos aceitar qualquer coisa de olhos fechados e sem o controle severo da lógica. Sem nada prejulgar sobre os documentos em questão, eles poderiam conter coisas boas e más, verdadeiras e falsas, e, por consequência, teríamos que fazer uma escolha judiciosa, para a qual os princípios da Doutrina podem fornecer úteis indicações.

Entre esses princípios, há um que importa não perder de vista: é o objetivo providencial da manifestação dos Espíritos. Eles vêm para atestar a sua existência e para provar ao homem que nem tudo acaba para ele com a vida corporal; vêm instruí-lo sobre sua condição futura, excitá-lo a adquirir o que é útil ao seu futuro e o que ele pode levar, isto é, as qualidades morais, mas não para lhe dar meios de se enriquecer. O cuidado de sua fortuna e da melhoria de seu bem-estar material deve ser coisa de sua própria inteligência, de sua atividade, de seu trabalho e de suas buscas. Se assim não fosse, o preguiçoso e o ignorante poderiam enriquecer-se sem esforço, pois bastaria dirigir-se aos Espíritos para obter uma invenção lucrativa, descobrir tesouros, ganhar na bolsa ou na loteria. Assim, todas as esperanças de fortuna baseadas no concurso dos Espíritos falharam deploravelmente.

É o que nos inspira algumas dúvidas sobre a eficácia do processo para os bichos da seda, processo que teria por efeito fazer ganhar milhões, e endossar a ideia que os Espíritos podem dar os meios de enriquecer, ideia que perverteria a própria essência do Espiritismo. Seria, pois, imprudente criar quimeras a esse respeito, porque poderia aqui se dar como com certas receitas que deviam fazer correr o Pactolo em certas mãos, e que só conseguiram ridículas mistificações. Não é, entretanto, uma razão para calar o processo e para desprezá-lo. Se o sucesso deve ter um resultado mais importante e mais sério que a fortuna, talvez semelhante revelação seja permitida. Mas, na incerteza, é bom não embalar esperanças que poderiam ser desfeitas. Aprovamos, pois, o projeto do Sr. Bonnemère de publicar as receitas que foram dadas ao seu jovem bretão, porque entre elas podemos encontrar algumas úteis, sobretudo para as doenças.


O cura Gassner - Médium curador

No jornal l’Exposition populaire illustrée, número 24, encontramos num artigo intitulado Correspondência sobre os taumaturgos, uma interessante notícia sobre o cura Gassner, quase tão conhecido em seu tempo quanto o príncipe Hohenlohe, por seu poder curador.

“Gassner (Jean-Joseph) nasceu a 20 de agosto de 1727, em Bratz, perto de Bludens (Suábia); fez seus primeiros estudos em Insbruck e em Praga; recebeu as ordens sacerdotais e, em 1758, foi nomeado cura de Kloesterle, no cantão dos Grisons.

“Após quinze anos de vida solitária, revelou-se ao mundo como dotado de um poder excepcional, o de curar todas as doenças pela simples imposição das mãos, e sem empregar nenhum remédio nem exigir remuneração. Os doentes afluíram logo de toda parte, e em tão grande número que, para se pôr em melhores condições de socorrê-los, Gassner solicitou e obteve permissão para se ausentar do curato, e foi sucessivamente a Wolfegg, a Weingarten, a Ravensperg, a Detland, a Kirchberg, a Morspurg e a Constança. Os infelizes lhe faziam cortejo; o corpo médico ergueu-se contra ele. Uns proclamavam suas curas maravilhosas, outros o contestavam.

“O bispo de Constança o constrangeu a um inquérito, feito pelo diretor do seminário. Gassner declarou jamais ter tido o pensamento de fazer milagres e ter-se limitado a aplicar o poder que a ordenação confere a todos os padres de exorcizar, em nome de Jesus Cristo, os demônios que são uma das causas mais frequentes de nossas doenças. Declarou dividir todas as doenças em doenças naturais ou lesões, em doenças de obsessões e em doenças complicadas de obsessões. Dizia que não tinha poder sobre as primeiras e fracassava nas da terceira categoria, quando a doença natural era superior à doença de obsessão.

“O bispo não ficou convencido e ordenou a Gassner que voltasse ao curato, mas pouco depois o autorizou a continuar seus exorcismos. O cura apressou-se em aproveitar a autorização e surpreendeu os habitantes de Elwangen, de Sulzbach e de Ratisbona, pela imensa multidão de doentes que seu renome atraía da Suíça, da Alemanha e da França. O duque de Wurtemberg declarou-se abertamente seu admirador e seu protetor; seus sucessos lhe atraíram poderosos adversários. O célebre Haen e o tiatino Sterzingen atacaram-no com perseverança e paixão; vários bispos prestaram apoio ao fogoso tiatino e proibiram-no de exorcizar em suas dioceses. Enfim Joseph II lançou um rescrito determinando que Gassner deixasse Ratisbona. Mas, fortalecido pela proteção do príncipe bispo dessa cidade, que lhe havia conferido o título de conselheiro eclesiástico, com a função de capelão da corte, ele persistiu. Tal resistência prolongou-se até 1777, época na qual Gassner foi lotado no curato de Bondorf, para onde se retirou e onde morreu a 4 de abril de 1779, com 52 anos.”

OBSERVAÇÃO: O Espiritismo protesta contra a qualificação de taumaturgo dada ao curadores, porque não admite que nada se faça fora das leis naturais. Os fenômenos que pertencem à ordem dos fatos espirituais não são mais miraculosos que os fatos materiais, tendo em vista que o elemento espiritual é uma das forças da Natureza, do mesmo modo que o elemento material. O cura Gassner, portanto, não fazia mais milagres que o príncipe de Hohenlohe e que o zuavo Jacob, e podemos ver singulares semelhanças entre o que se passava então a seu respeito e o que hoje se passa.


Pressentimentos e prognóticos

Extraímos do mesmo artigo do jornal acima citado os fatos abaixo, que acompanham a notícia sobre o cura Gassner, porque o Espiritismo deles pode tirar um útil assunto para instrução. O autor do artigo faz, na sequência do artigo, algumas reflexões dignas de nota nestes tempos de ceticismo em relação a causas extramateriais.

“Gassner tinha desfrutado de grande consideração junto à imperatriz Maria Tereza, que o consultava muitas vezes, tendo alguma fé em suas inspirações. Contase (Vide as Memórias de Madame Campan) que na época em que tinha sido concebida a ideia de unir a filha de Maria Tereza ao neto de Luís XV, a grande imperatriz chamou Gassner e lhe perguntou: “Minha Antonieta será feliz?”

“Depois de haver refletido longamente, Gassner empalideceu estranhamente e persistiu em guardar silêncio.

“Premido de novo pela imperatriz, e então procurando dar uma expressão geral à ideia com a qual parecia muito ocupado, respondeu: “Senhora, há cruzes para todos os ombros.”

“O casamento ocorreu a 16 de maio de 1770; o delfim e Maria Antonieta receberam a bênção nupcial na capela de Versalhes (Maria Antonieta havia chegado a Compiègne no dia 14). Às três horas da tarde o céu cobriu-se de nuvens; torrentes de chuva inundaram Versalhes; violentos trovões ribombaram e a multidão de curiosos que enchia o jardim foi obrigada a se retirar.

“A chegada de Maria Antonieta no palácio dos reis de França (leiamos a Vida pública e privada de Luís XVI, por M. A... e de Salex; Paris, 1814, pg. 340), foi assinalada por um desses prognósticos dos quais ordinariamente só se lembra quem os viu realizar-se no correr dos tempos.

“No momento em que essa princesa, entrando pela primeira vez nos pátios do castelo de Versalhes, pôs os pés no pátio de mármore, um violento trovão abalou o castelo: Presságio de desgraça! exclamou o marechal de Richelieu.

“A noite foi triste na cidade e a iluminação não produziu nenhum efeito.

“Acrescentai a isto o terrível acidente ocorrido a 30 de maio na Rua Royale, no dia da festa que a cidade de Paris deu na Praça Luís XV, pelo casamento do Delfim e da Delfina. Anquetil estima em 300 o número de mortos na praça e em 1.200 o dos que sucumbiram nos hospícios ou em domicílio poucos dias depois, ou que ficaram estropiados.

“‘Em 1757 (ver os Affiches de Tours, 25º ano, n º 14. ─ Quinta-feira 5 de abril de 1792) madame Pompadour mandou vir à presença de Luís XV um astrólogo que, depois de ter calculado a posição dos astros na sua data de nascimento, lhe disse: “Senhor, vosso reino é célebre por grandes acontecimentos, e o que o seguirá sê-lo-á por grandes desastres.”

“No dia da morte de Luís XV houve em Versalhes uma horrorosa tempestade.

“Que acúmulo de prognósticos!

“Durante oito anos o casamento da rainha foi estéril. ─ A 19 de dezembro de 1778 nasceu uma filha, Maria Tereza Carlota (mais tarde chamada pelo título de seu esposo, Senhora Delfina, Duquesa de Angoulême). Três anos mais tarde, a 22 de outubro de 1781, Maria Antonieta deu um herdeiro à coroa. A cidade de Paris ofereceu à rainha, nessa ocasião, uma festa na qual foi exibida a mais suntuosa munificência.

“Essa festa se deu a 21 de janeiro de 1782. Onze anos mais tarde a comuna de Paris dava ao povo o espetáculo da morte do rei. A rainha estava presa, esperando que se realizasse a visão de Gassner.

“Considerando-se que tocamos nestas questões causticantes, escutai ainda as revelações da senhora Campan. ─ Estávamos em maio de 1789; os dias 4 e 5 tinham impressionado diversamente os Espíritos; quatro velas iluminavam o gabinete da rainha, que narrava alguns acidentes notáveis que haviam ocorrido naquele dia. ─ “Uma vela apagou-se por si mesma; eu a reacendi, disse a senhora Campan; logo a segunda, depois a terceira também se apagaram; então a rainha, apertando-lhe a mão num movimento de pavor, lhe disse: ‘A desgraça pode tornar supersticiosa; se esta quarta vela se apagar como as outras, nada poderá impedir-me de olhar este sinal como um sinistro presságio...’ A quarta vela apagou-se!!!

“Poucas noites antes a rainha tinha tido, dizia ela, um sonho horroroso, pelo qual tinha ficado profundamente afetada.

“Sem dúvida os espíritos fortes riem de todos esses prognósticos, de todas essas profecias, desse dom de visão anterior. Eles não creem nisto, ou fingem não crer! Mas, por que, então, em todas as épocas, houve personagens de algum valor, de alguma importância que, sem um interesse qualquer, confirmaram fatos deste gênero, que declararam absolutos, positivos.

“Citemos alguns exemplos:

“Théodore-Agrippa d’Aubigné, avô da Sra. de Maintenon, relata em suas Memórias ter tido a seu serviço, em Poitou, um surdo-mudo de nascença dotado do dom da adivinhação:

“Um dia, dizia-me ele, as moças da casa lhe tendo perguntado quantos anos ainda viveria o rei Henrique IV, o tempo e as circunstâncias de sua morte, ele lhe deu três anos e meio e designou a cidade, a rua e o carro com as duas facadas que receberia no coração.”

“Algumas palavras ainda sobre este mesmo Henrique IV:

“Que opinião teremos dos negros pressentimentos muito frequentes que esse infeliz príncipe teve de seu cruel destino? pergunta Sully em suas Memórias, livro XXVII. ─ Elas são de uma singularidade que tem algo de apavorante. Já mencionei com que repugnância ele tinha permitido que a cerimônia do coroamento da rainha se fizesse antes de sua partida; quanto mais ele via aproximar-se o momento, mais sentia o medo e o horror redobrarem em seu coração. Ele vinha abri-lo inteiramente a mim, nesse estado de amargura e de abatimento do qual eu o tirava como de uma fraqueza imperdoável. Suas próprias palavras darão uma impressão completamente diversa das que eu poderia dizer: ‘Ah! meu amigo, dizia-me ele, como esta sagração me desagrada; não sei o que é, mas o coração me diz que me acontecerá alguma desgraça.’ Ele sentava-se numa cadeira baixa que eu tinha mandado fazer especialmente para ele, dizendo-me essas palavras, e, entregue a todas as negruras de suas ideias, tamborilava com os dedos no estojo de seus óculos, sonhando profundamente.

“Se ele saía desse devaneio, era para se levantar bruscamente, batendo as mãos nas coxas e para gritar: ‘Por Deus, morrerei nesta cidade, dela não sairei mais; eles me matarão; vejo claramente que eles põem seu último recurso na minha morte! Ah! Maldita sagração, tu serás a causa de minha morte!’

“─ Meu Deus, senhor, disse-lhe eu um dia, a que ideia vos entregais? Se ela continua, sou de opinião que deveis cancelar esta sagração e coroamento, viagem e guerra. Vós o quereis? Imediatamente será feito.

“─ ‘Sim ─ disse-me ele enfim, depois de eu ter repetido essas coisas duas ou três vezes ─ sim, suspendei a sagração, e que eu não ouça mais falar dela; por este meio terei o espírito curado das impressões que alguns avisos aí deixaram; sairei desta cidade e nada mais temerei.

“Por que sinal reconheceriam esse grito secreto e imperioso do coração, se desconhecessem estes que ele me dizia: ‘Não quero esconder-vos que me disseram que eu deveria ser morto na primeira magnificência que eu fizesse, e que morreria num carro, e é isto que me deixa temeroso.’

“─ Parece que vós jamais me havíeis dito isto, senhor, respondi-lhe eu; várias vezes me admirei vendo-vos gritar num carro, ver-vos tão sensível a um pequeno perigo, depois vos ter visto tantas vezes intrépido em meio a tiros de canhão e de mosquete e entre lanças e espadas nuas; mas já que esta opinião vos perturba a este ponto, em vosso lugar, senhor, eu partiria amanhã mesmo; deixaria fazer a sagração sem vós, ou a adiaria e por muito tempo não voltaria a Paris, nem entraria num carro. Quereis que eu mande tudo agora a Notre-Dâme e a SaintDenis, suspenda tudo e despeça os operários?

“─ Quero sim, disse-me o príncipe, mas, que dirá minha mulher? Ela tem essa sagração como um sonho em sua mente.

“─ Ela dirá o que quiser, redargui, vendo quanto minha proposta tinha agradado ao rei. Mas eu não poderia crer que quando ela souber da vossa convicção de que isto deve ser a causa de muito mal ela continue mantendo sua opinião.”

“Não esperei outra ordem para mandar interromper os preparativos da coroação. É com verdadeiro pesar que me vejo obrigado a dizer que por mais esforços que fizesse, jamais pude induzir a rainha a dar esta satisfação a seu esposo.

“Passo em silêncio as solicitações, as preces e as contestações que empreguei durante três dias inteiros para tentar dobrá-la. O príncipe teve que ceder. Mas Henrique não voltou menos fortemente às suas primeiras apreensões, que ordinariamente me exprimia por estas palavras que ele trazia frequentemente em sua boca: ─ Ah! meu amigo, jamais sairei desta cidade; eles me matarão aqui! Ó maldita sagração, tu serás a causa de minha morte!”



“Essa sagração foi feita em Saint-Denis, quinta-feira, 13 de maio, e a rainha devia, no domingo, 16 do mesmo mês, fazer sua entrada em Paris.

“A 14, o rei quis visitar Sully, visita que lhe tinha anunciado para a manhã de sábado, 15. Tomou seu carro e saiu, modificando várias vezes o seu itinerário no caminho, etc. etc.

“Seu historiador Péréfixe faz observar que ‘O céu e a terra não tinham dado senão muitos prognósticos do que lhe aconteceu.’

“O Bispo de Rhodez põe no elenco desses prognósticos um eclipse do Sol, a aparição de um terrível cometa, tremores de terra, monstros nascidos em diversas regiões da França, chuvas do sangue que caíram em diversos lugares, uma grande peste que havia afligido Paris em 1606, aparições de fantasmas e vários outros prodígios (ver a História de Henrique o Grande por Hardouin de Péréfixe, bispo de Rhodez, Vie du duc d’Epernon, Mercure français, Mathieu, l’Estoile, etc.) “Paremos! Escreveríamos um volume, volumes, tão abundantes são os fatos. Mas é necessário recorrer aos relatos dos outros? Que cada um pergunte a si mesmo; que cada um chame as suas próprias recordações e responda com lealdade e franqueza, e cada um dirá: Há em mim um desconhecido que somos nós, que ao mesmo tempo comanda o meu eu matéria e lhe obedece. ─ Esse desconhecido, espírito, alma, o que é? Como é? Por que é? Mistério; série de mistérios; inexplicável mistério. Como tudo na Natureza, no organismo, na vida, a vida e a morte não são dois impenetráveis mistérios? O sono, este ensaio da morte, não é um inexplicável mistério? A assimilação dos alimentos, que se tornam nós: inexplicável, incompreensível mistério! A geração: misteriosa obscuridade! Essa obediência passiva de meus dedos que traçam estas linhas e obedecem à minha vontade: trevas cuja profundidade só Deus sonda e que se iluminam, só por ele, com a luz da verdade!

“Baixai a cabeça, filhos da ignorância e da dúvida; humilhai essa orgulhosa que chamais razão; livres-pensadores, sofrei as cadeias que constringem a vossa inteligência; dobrai os joelhos: só Deus sabe!”

Nestes fatos há que considerar duas coisas bem distintas: os pressentimentos e os fenômenos considerados como prognósticos de acontecimentos futuros.

Não poderíamos negar os pressentimentos, dos quais há poucas pessoas que não tenham tido exemplos. É um desses fenômenos cuja explicação tão somente a matéria é impotente para dar, porque se a matéria não pensa, ela também não pode pressentir. É assim que o materialismo a cada momento se choca contra as coisas mais vulgares que vêm desmenti-lo.

Para ser advertido de maneira oculta sobre aquilo que acontece à distância e de que não podemos ter conhecimento senão num futuro mais ou menos próximo pelos meios ordinários, é preciso que algo se desprenda de nós, veja e ouça o que não podemos perceber pelos olhos e pelos ouvidos, para transmitir a intuição ao nosso cérebro. Esse algo deve ser inteligente, porque compreende e muitas vezes de um fato atual prevê consequências futuras. É assim que por vezes temos o pressentimento do futuro. Esse algo não é outra coisa senão nós mesmos, nosso ser espiritual, que não está confinado no corpo, como um pássaro numa gaiola, mas que, semelhante a um balão cativo, afasta-se momentaneamente da Terra, sem deixar de estar a ela ligado.

É sobretudo nos momentos em que o corpo repousa, durante o sono, que o Espírito, aproveitando o descanso que lhe deixa o cuidado de seu envoltório, em parte recobra a liberdade e vai colher no espaço, entre outros Espíritos, encarnados como ele, ou desencarnados, e naquilo que ele vê, ideias cuja intuição ele traz ao despertar.

Essa emancipação da alma por vezes se dá no estado de vigília, nos momentos de absorção, de meditação e de devaneio, em que a alma parece não mais preocupada com a Terra. Ele ocorre, sobretudo de maneira mais efetiva e mais ostensiva, nas pessoas dotadas do que se chama dupla vista ou visão espiritual.

Ao lado das intuições pessoais do Espírito, há que colocar as que lhe são sugeridas por outros Espíritos, quer em vigília, quer no sono, pela transmissão de pensamentos de alma a alma. É assim que muitas vezes se é advertido de um perigo, solicitado a tomar tal ou qual direção, sem que por isto o Espírito deixe de ter o seu livre-arbítrio. São conselhos e não ordens, porque ele sempre fica livre de agir à sua vontade.

Os pressentimentos têm, pois, a sua razão de ser, e encontram a sua explicação natural na vida espiritual, que não cessamos um instante de viver, porque é a vida normal.

Já não é o mesmo com os fenômenos físicos considerados como prognósticos de acontecimentos felizes ou infelizes. Em geral esses fenômenos não têm nenhuma ligação com as coisas que parecem pressagiar. Eles podem ser precursores de efeitos físicos que são a sua consequência, como um ponto negro no horizonte pode ao marinheiro pressagiar uma tempestade, ou certas nuvens anunciar o granizo, mas a significação desses fenômenos para as coisas de ordem moral deve ser posta entre as crenças supersticiosas, que nunca seriam combatidas com demasiada energia.

Essa crença, que absolutamente não repousa sobre nada de racional, faz com que, quando chega um acontecimento, nos lembremos de algum fenômeno que o precedeu, e ao qual o espírito chocado o liga, sem se inquietar com a impossibilidade de relações que só existem na imaginação. Não pensamos que os mesmos fenômenos se repetem diariamente, sem que daí resulte nada de aborrecido, e que os mesmos acontecimentos chegam a cada instante, sem serem precedidos por nenhum pretenso sinal precursor. Se se trata de acontecimentos que dizem respeito a interesses gerais, narradores crédulos, ou, o mais das vezes, oficiosos, para lhes exaltar a importância aos olhos da posteridade, amplificam os prognósticos que eles se esforçam por tornar mais sinistros e mais terríveis, adicionando-lhes supostas perturbações da Natureza, das quais os tremores de Terra e os eclipses são os acessórios obrigatórios, como fez o bispo de Rodez a propósito da morte de Henrique IV. Esses relatos fantásticos, que muitas vezes tinham sua fonte nos interesses dos partidos, foram aceitos sem exame pela credulidade popular que viu, ou à qual queriam fazer ver milagres nesses estranhos fenômenos.

Quanto aos acontecimentos vulgares, o mais das vezes o homem é a sua primeira causa. Não querendo reconhecer suas próprias fraquezas, busca uma desculpa pondo à conta da Natureza as vicissitudes que são quase sempre o resultado de sua imprevidência e de sua imperícia. É em suas paixões, em seus defeitos pessoais que se deve buscar os verdadeiros prognósticos de suas misérias, e não na Natureza, que não se desvia da rota que Deus lhe traçou por toda a eternidade.

Explicando por uma lei natural a verdadeira causa dos pressentimentos, o Espiritismo demonstra, por isso mesmo, o que há de absurdo na crença nos prognósticos. Longe de dar crédito à superstição, ele lhe tira seu último refúgio: o sobrenatural.


O zuavo Jacob

(Segundo artigo - vide o nº de outubro)

O Sr. Jacob é um charlatão? Seu desinteresse material é um fato constatado, e talvez um dos que mais têm desorientado a crítica. Como acusar de charlatanismo um homem que nada pede e nada quer, nem mesmo agradecimentos?

Qual seria, pois, o seu móvel? Dizem que o amor-próprio. Sendo o desinteresse moral absoluto a sublimação da abnegação, seria preciso ter a virtude dos anjos para não experimentar uma certa satisfação quando se vê a multidão se comprimir subitamente em redor de si, quando na véspera se era desconhecido. Ora, como o Sr. Jacob não tem pretensão de ser anjo, supondo, o que ignoramos, tenha exaltado um pouco a sua importância aos seus próprios olhos, não se lhe poderia disso fazer um grande crime, nem isto destruiria os fatos, se fatos houver. Preferimos crer que os que lhe imputam esse defeito estão muito acima das coisas terrenas para ter, a esse respeito, a menor censura a se fazer.

Mas, em todo caso, esse sentimento não podia ser senão consecutivo e não preconcebido. Se o Sr. Jacob tivesse premeditado o desígnio de se popularizar dando-se como curador emérito, sem poder provar algo mais que a sua impotência, em vez de aplausos ele teria recolhido, desde o primeiro dia, apupos, o que não lhe teria sido muito lisonjeiro. Para se orgulhar de alguma coisa é preciso uma causa preexistente. Assim, era preciso que ele curasse, antes de se envaidecer.

Acrescentam que ele queria que falassem dele. Que seja. Se tal foi o seu objetivo, convenhamos que graças à imprensa ele foi servido à vontade. Mas qual é o jornal que pode dizer que o Sr. Jacob foi implorar a menor propaganda, o menor artigo; que ele tenha pago uma única linha? Ele foi procurar algum jornalista? Não, os jornalistas é que foram a ele, e nem sempre puderam vê-lo facilmente. A imprensa falou dele espontaneamente quando viu a multidão, e a multidão só veio quando os fatos se deram. Ele foi cortejar grandes personagens? A estes mostrou-se mais acessível, mais atencioso, mas previdente? Todo mundo sabe que, nesse ponto, ele levou o rigorismo ao excesso. Contudo, seu amor-próprio teria encontrado mais elementos de satisfação na alta sociedade do que entre obscuros indigentes.

Portanto, logicamente temos que afastar toda imputação de intriga e de charlatanismo.

Ele cura todas as doenças? Não só não as cura todas, mas de dois indivíduos atingidos pelo mesmo mal muitas vezes cura um e nada faz pelo outro. Ele nunca sabe de antemão se curará um doente, por isso nunca promete nada. Ora, sabe-se que os charlatães não são avaros em promessas. A cura é devida às afinidades fluídicas que se manifestam instantaneamente, como um choque elétrico, e que não podem ser predeterminadas.

É ele dotado de poder sobrenatural? Voltamos ao tempo dos milagres? Perguntai a ele mesmo e ele vos responderá que em suas curas nada há de sobrenatural nem de miraculoso; que ele é dotado de um poder fluídico independente de sua vontade, que se manifesta com mais ou menos energia, conforme as circunstâncias e o meio onde ele se encontra; que o fluido que ele emite, cura certas doenças em certas pessoas, sem que ele saiba por que e como.

Quanto àqueles que pretendem que essa faculdade é um presente do diabo, podemos responder-lhes que, considerando-se que ela só se exerce para o bem, é preciso admitir que o diabo tem bons momentos, dos quais é bom tirar proveito. Também se lhes pode perguntar que diferença existe entre as curas do príncipe de Hohenlohe e as do zuavo Jacob, para que umas sejam reputadas santas e milagrosas e as outras diabólicas. Passemos sobre esta questão, que nestes tempos já não pode ser levada a sério.

A questão do charlatanismo prejulgava todas as outras, razão pela qual nela insistimos. Afastada essa questão, vejamos que conclusões podem ser tiradas da observação.

O Sr. Jacob curou instantaneamente doenças consideradas incuráveis; é um fato positivo. A questão do número de doentes curados aqui é secundária; se houvesse apenas um caso em cem, o fato não deixaria de existir. Ora esse fato tem uma causa.

A faculdade curadora levada a esse grau de força, achando-se num soldado que, por mais honesto que seja, não tem o caráter nem os hábitos nem a linguagem ou as atitudes dos santos; que é exercida fora de toda forma ou aparato místico, nas mais vulgares e nas mais prosaicas condições; que, além disto, achando-se em diferentes graus numa porção de outras pessoas, nos heréticos como nos muçulmanos, nos indus, nos budistas, etc., exclui a ideia de milagres no sentido litúrgico da palavra. É, pois, uma faculdade inerente ao indivíduo, e como não é um fato isolado, é que depende de uma lei, como todo efeito natural.

A cura é obtida sem o emprego de qualquer remédio, portanto é devida a uma influência oculta, e porque se trata de um resultado efetivo, material, e que o nada não pode produzir alguma coisa, essa influência necessariamente deve ser alguma coisa material. Então, não pode ser senão um fluido material, embora impalpável e invisível. O Sr. Jacob, não tocando no doente, não fazendo mesmo nenhum passe magnético, o fluido não pode ter por motor e propulsor senão a vontade. Ora, não sendo a vontade um atributo da matéria, só pode emanar do espírito. É, pois, o fluido que age sob o impulso do espírito. Sendo a maioria das doenças curadas por esse meio, aquelas contra as quais a Ciência é impotente, há, então, agentes curativos mais poderosos que os da medicina ordinária. Esses fenômenos são, por consequência, a revelação de leis desconhecidas pela Ciência. Em presença de fatos patentes, é mais prudente duvidar do que negar. Tais são as conclusões a que forçosamente chega todo observador imparcial.

Qual é a natureza desse fluido? É eletricidade ou magnetismo? Provavelmente tem um e outro e talvez algo mais; em todo caso, é uma modificação deles, porquanto os efeitos são diferentes. A ação magnética é evidente, embora mais poderosa que a do magnetismo ordinário, de que esses fatos são a confirmação e ao mesmo tempo a prova que ele não disse a última palavra.

Não faz parte do propósito deste artigo explicar o modo de ação desse agente curador, já descrito na teoria da mediunidade curadora. Besta ter demonstrado que o exame dos fatos conduz ao reconhecimento da existência de um princípio novo, e que esse princípio, por mais estranhos que sejam os seus efeitos, não sai do domínio das leis naturais.

Nos fatos concernentes o Sr. Jacob, por assim dizer, não foi mencionado o Espiritismo, ao passo que toda a atenção foi concentrada no Magnetismo. Isto tinha sua razão de ser e sua utilidade. Embora o concurso dos Espíritos desencarnados seja um fato constatado nessa espécie de fenômenos, aqui a sua ação não é evidente, razão por que dela fazemos abstração. Pouco importa que os fatos sejam explicados com ou sem a intervenção de Espíritos estranhos; o Magnetismo e o Espiritismo se dão as mãos; são duas partes de um mesmo todo, dois ramos de uma mesma ciência, que se completam e se explicam um pelo outro. Dar crédito ao Magnetismo é abrir caminho para o Espiritismo, e vice-versa.

A crítica não poupou o Sr. Jacob. Na falta de boas razões, ela, como de hábito, prodigalizou-lhe troças e injúrias grosseiras, com o que ele não se preocupou de maneira nenhuma. Ele desprezou umas e outras, e as pessoas sensatas ficaram gratas por sua moderação.

Alguns chegaram a solicitar a sua prisão como impostor, por abuso da credulidade pública. Entretanto, impostor é aquele que promete e não cumpre. Ora, como o Sr. Jacob nunca prometeu nada, ninguém pode queixar-se de ter sido enganado. O que lhe podiam censurar? Em que estava ele em contravenção legal? Ele não exercia a Medicina, nem mesmo ostensivamente o Magnetismo. Qual é a lei que proíbe de curar as pessoas olhando-as?

Fizeram-lhe um agravo porque a multidão de doentes que vinham a ele perturbavam a circulação, mas foi ele que chamou a multidão? Ele a convocou por anúncios? Qual o médico que se lamentaria se tivesse uma semelhante multidão à sua porta? E se um deles tivesse essa boa sorte, mesmo à custa de anúncios caros, o que diria ele se quisessem inquietá-lo por isso? Disseram que a mil e quinhentas pessoas por dia, durante um mês ter-se-iam quarenta e cinco mil doentes que se haviam apresentado e que desse modo, se os tivesse curado, não deveria mais haver coxos nem estropiados nas ruas de Paris. Seria supérfluo responder a esta singular objeção, mas diremos que quanto mais aumentarmos o número dos doentes que, curados ou não, se acotovelavam no beco sem saída da Rua Roquette, mais provaremos quanto é grande o número daqueles que a Medicina não pode curar, porque é evidente que se esses doentes tivessem sido curados pelos médicos, não teriam vindo ao Sr. Jacob.

Como, malgrado as negações, havia fatos patentes de curas extraordinárias, quiseram explicá-los dizendo que o Sr. Jacob agia, mesmo pela rudeza de suas palavras, sobre a imaginação dos doentes. Que seja, mas então, se reconheceis à influência da imaginação um tal poder sobre as paralisias, a epilepsia, os membros anquilosados, por que não empregais esse meio, em vez de deixar sofrer tanto os infelizes enfermos, ou lhes dar drogas que sabeis inúteis?

Disseram que a prova de que o Sr. Jacob não tinha o poder que se atribuía é que ele se recusou ir curar num hospital, sob as vistas de pessoas competentes para apreciar a realidade das curas.

Duas razões devem ter motivado a recusa. Primeiro, não se podia dissimular que a oferta que lhe era feita não era ditada pela simpatia, mas um desafio que lhe propunham. Se, numa sala de trinta doentes, ele não tivesse levantado ou aliviado senão três ou quatro, não teriam deixado de dizer que isto nada provava e que ele havia fracassado.

Em segundo lugar, há que levar em consideração circunstâncias que podem favorecer ou paralisar sua ação fluídica. Quando ele está rodeado de doentes que lhe vêm voluntariamente, a confiança que trazem os predispõe. Não admitindo nenhum estranho atraído pela curiosidade, ele se acha num meio simpático que a si mesmo predispõe; ele é senhor de si; seu espírito se concentra livremente, e sua ação tem toda a sua força. Numa sala de hospital, desconhecido dos doentes habituados aos cuidados de seus médicos, onde acreditar em alguma coisa além de sua medicação seria suspeitar de sua habilidade, sob os olhares inquisidores e zombeteiros de criaturas prevenidas, interessadas em denegrir; que, em vez de apoiá-lo pelo concurso de intenções benevolentes, temeriam mais do que desejariam vê-lo triunfar, porque o sucesso de um zuavo ignorante seria um desmentido dado ao seu saber, é evidente que, sob o império dessas impressões e desses eflúvios antipáticos, sua faculdade achar-se-ia neutralizada. O erro desses senhores, nisto como quando se tratou do sonambulismo, sempre foi crer que esses tipos de fenômenos seriam manobrados à vontade, como uma pilha elétrica.

As curas desse gênero são espontâneas, imprevistas e não podem ser premeditadas nem submetidas a um concurso. Acrescentemos a isto que o poder curador não é permanente; aquele que hoje o possui, pode vê-lo cessar no momento em que menos espera. Essas intermitências provam que ele depende de uma causa independente da vontade do curador e destroça os cálculos do charlatanismo.

NOTA: O Sr. Jacob ainda não retomou o curso de suas curas. Ignoramos o motivo, e parece que nada há de fixado quanto à época em que recomeçará, se isto tiver que se dar. Enquanto se espera, informam-nos que a mediunidade curadora se propaga em diversas localidades, com aptidões diversas.


Notícias bibliográficas

A razão do Espiritismo *
(Por Michel Bonnamy)

POR MICHEL BONNAMY Juiz de instrução; membro dos congressos científicos de França; antigo membro do conselho geral de Tarn-et-Garonne.

Quando apareceu o romance Mirette, os Espíritos disseram estas palavras notáveis na Sociedade de Paris:

"O ano de 1866 apresenta a filosofia nova sob todas as formas; mas ainda é a haste verde que encerra a espiga de trigo, e para mostrá-la espera que o calor da primavera a tenha feito amadurecer e entreabrir-se. 1866 preparou, 1867 amadurecerá e realizará. O ano se inicia sob os auspícios de Mirette e não se escoará sem ver aparecerem novas publicações do mesmo gênero, e ainda mais sérias, no sentido que o romance far-se-á Filosofia e a Filosofia far-se-á História." (Revista, fevereiro de 1867).

Antes já haviam dito que se preparavam diversas obras sérias sobre a filosofia do Espiritismo, nas quais o nome da Doutrina não seria timidamente dissimulado, mas em altas vozes confessado e proclamado por homens cujo nome e posição social dariam peso à sua opinião; e acrescentaram que o primeiro apareceria provavelmente pelo fim do corrente ano.

A obra que anunciamos realiza completamente esta previsão. É a primeira publicação deste gênero na qual a questão é encarada em todas as suas partes e em toda a sua grandeza. Pode-se dizer, então, que ela inaugura uma das fases da existência do Espiritismo. O que a caracteriza é que não é uma adesão banal aos princípios da Doutrina, uma simples profissão de fé, mas uma demonstração rigorosa, onde os adeptos, eles próprios, encontrarão novas ideias. Lendo essa argumentação densa, levada, se assim se pode dizer, até a minúcia, e por um encadeamento lógico das ideias, perguntaremos, por certo, por que estranha extensão do vocábulo poderíamos aplicar ao autor o epíteto de louco. Se ele é um louco que assim discute, poderemos dizer que às vezes os loucos tapam a boca dos que se dizem sábios. É uma defesa em regra, onde se reconhece o advogado que quer reduzir a réplica aos seus últimos limites; mas aí reconhecemos, também, aquele que estudou sua causa seriamente e a perscrutou nos seus mais minuciosos detalhes. O autor não se limita a emitir a sua opinião: ele a fundamenta e dá a razão de ser de cada coisa. É justamente por isso que ele intitulou seu livro A Razão do Espiritismo.

Publicando essa obra, sem disfarçar a sua personalidade com o menor véu, o autor prova que tem a verdadeira coragem de sua opinião, e o exemplo que dá é um tributo ao reconhecimento de todos os espíritas. O ponto de vista em que se colocou é principalmente o das consequências filosóficas, morais e religiosas, aquelas que constituem o objetivo essencial do Espiritismo e dele fazem uma obra humanitária.

Ademais, eis como ele se expressa no prefácio.

"Está nas vicissitudes das coisas humanas, ou melhor, parece fatalmente reservado a toda ideia nova, ser mal acolhida ao seu aparecimento. Como, na maioria das vezes, ela tem por missão derrubar ideias que a precederam, encontra uma resistência muito grande da parte do entendimento humano."

"O homem que viveu com os preconceitos não acolhe senão com desconfiança a recém-chegada, que tende a modificar, mesmo a destruir combinações e ideias estratificadas em seu espírito, a forçá-lo, numa palavra, a novamente pôr mãos à obra, para correr atrás da verdade. Além disto, ele se sente humilhado em seu orgulho, por ter vivido no erro."

"A repulsa que a ideia nova inspira é muito mais acentuada ainda quando traz consigo obrigações, deveres; quando impõe uma linha de conduta mais severa."

"Ela encontra, enfim, ataques sistemáticos, ardentes, encarniçados, quando ameaça posições estabelecidas, e sobretudo quando se acha em face do fanatismo ou de opiniões profundamente arraigadas na tradição dos séculos."

"As doutrinas novas, assim, têm sempre numerosos detratores; muitas vezes elas têm mesmo que sofrer perseguição, o que levou Fontenelle a dizer que ‘se tivesse todas as verdades na mão, teria o cuidado de não abri-la.’"

"Tais eram o desfavor e os perigos que esperavam o Espiritismo ao seu aparecimento no mundo das ideias. Os insultos, a troça, a calúnia não lhe foram poupados, e talvez venha também o dia da perseguição. Os adeptos do Espiritismo foram chamados iluminados, alucinados, simplórios, loucos, e a esse fluxo de epítetos que, entretanto, pareciam contradizer-se e excluir-se, acrescentaram os de impostores, de charlatães, de emissários de Satã, enfim."

"A qualificação de louco é a que parece mais especialmente reservada a todo promotor ou propagador de ideias novas. É assim que trataram de louco o primeiro que disse que a Terra gira em torno do Sol."

"Também era louco o célebre navegador que descobriu um novo mundo. Ainda era louco, para o areópago da Ciência, aquele que descobriu a força do vapor. E a douta assembleia acolheu com um sorriso desdenhoso a sábia dissertação de Franklin sobre as propriedades da eletricidade e a teoria do para-raios."

"Ele também não foi tratado de louco, o divino regenerador da Humanidade, o reformador autorizado da lei de Moisés? Não expiou por um suplício ignominioso a inoculação na Terra dos benefícios da moral divina?"

"Galileu não expiou como herético, num sequestro cruel e pelas mais amargas perseguições morais, a glória de ter sido o primeiro a ter a iniciativa do sistema planetário cujas leis Newton devia promulgar?"

"São João Batista, o precursor do Cristo, também tinha sido sacrificado por vingança dos culpados cujos crimes verberava."

"Os apóstolos, depositários dos ensinamentos do divino Messias, tiveram que selar com sangue a santidade de sua missão. E a religião reformada, por sua vez, não foi perseguida e, após os massacres de São Bartolomeu, não teve que sofrer as dragonadas?"

"Enfim, remontando até o ostracismo inspirado por outras paixões, vemos Aristides exilado e Sócrates condenado a beber cicuta."

"Sem dúvida, graças aos costumes suaves que caracterizam o nosso século, sob o império de nossas instituições e das luzes que freiam a intolerância fanática, as fogueiras não mais se erguerão para purificar com suas chamas as doutrinas espíritas, cuja paternidade pretendem fazer remontar a Satã. Mas elas devem esperar, também elas, um levante dos mais hostis e ataques de ardentes adversários."

"Contudo, este estado militante não poderia enfraquecer a coragem daqueles que são animados por uma convicção profunda, dos que têm a certeza de ter nas mãos uma dessas verdades fecundas que constituem, em seus desdobramentos, um grande benefício para a Humanidade."

"Mas, seja qual for o antagonismo às ideias ou às doutrinas que o Espiritismo suscitar; sejam quais forem os perigos que ele deva abrir sob os passos dos adeptos, o espírita não poderia deixar essa luz sob o alqueire e se recusar a dar-lhe todo o brilho que ela comporta, o apoio de suas convicções e o testemunho sincero de sua consciência."

"O Espiritismo, revelando ao homem a economia de sua organização, iniciando-o no conhecimento de seu destino, abre um campo imenso às suas meditações. Assim, o filósofo espírita chamado a levar suas investigações a esses novos e esplêndidos horizontes, só tem por limite o infinito. De certo modo, ele assiste ao conselho supremo do Criador. Mas o entusiasmo é o escolho que ele deve evitar, sobretudo quando lança suas vistas sobre o homem, que se tornou tão grande e que, entretanto, orgulhosamente se faz tão pequeno. Não é senão esclarecido pelas luzes de uma prudente razão e tomando como guia a fria e severa lógica que ele deve dirigir as peregrinações no domínio da ciência divina, cujo véu foi erguido pelos Espíritos."

"Este livro é o resultado de nossos próprios estudos e de nossas meditações sobre este assunto que desde o princípio nos pareceu de uma importância capital, e de consequências da mais alta gravidade. Reconhecemos que estas ideias têm raízes profundas e nelas entrevimos a aurora de uma era nova para a Sociedade. A rapidez com que elas se propagam é um indício de sua próxima admissão entre as crenças aceitas. Em razão de sua própria importância, não nos contentamos com afirmações e argumentos da doutrina; não só nos asseguramos da realidade dos fatos, mas perscrutamos com minuciosa atenção os princípios deles decorrentes. Buscamos a sua razão com uma fria imparcialidade, sem negligenciar o estudo não menos consciencioso das objeções que opõem os antagonistas. Como um juiz que escuta as duas partes, pesamos maduramente os pró e os contra. É, pois, depois de haver adquirido a convicção que as alegações contrárias nada destroem; que a Doutrina repousa em bases sérias, numa lógica rigorosa, e não em devaneios quiméricos; que ela contém o gérmen de uma renovação salutar do estado social surdamente minado pela incredulidade; que é, enfim, uma poderosa barreira contra a invasão do materialismo e da desmoralização, que julgamos dever dar nossa apreciação pessoal, e as deduções que tiramos de um estudo atento."

"Assim, tendo encontrado uma razão de ser para os princípios desta nova ciência que vem tomar um lugar entre os conhecimentos humanos, intitulamos nosso livro A Razão do Espiritismo. Este título é justificado pelo ponto de vista sob o qual encaramos o assunto, e aqueles que nos lerem reconhecerão sem esforço que este trabalho não é produto de um entusiasmo inconsiderado, mas um exame refletido maduramente e friamente."

"Estamos convictos que qualquer pessoa sem ideia preconcebida de oposição sistemática que fizer, como nós fizemos, um estudo consciencioso da Doutrina Espírita, considerá-la-á como uma das coisas que interessam no mais alto grau ao futuro da Humanidade."

"Dando a nossa adesão a essa doutrina, usamos do direito de liberdade de consciência que a ninguém pode ser contestado, seja qual for a sua crença. Com mais forte razão, esta liberdade deve ser respeitada quando tem por objetivo princípios da mais alta moralidade, que conduzem os homens à prática dos ensinamentos do Cristo e, por isso mesmo, são a salvaguarda da ordem social."

"O escritor que consagra sua pena a traçar a impressão que tais ensinamentos deixaram no santuário de sua consciência, deve guardar-se bem de confundir as elucubrações brotadas no seu horizonte terrestre com os raios luminosos que partiram do Céu. Se ele limitar-se aos pontos obscuros ou ocultos às suas explicações, pontos que ainda não lhe é dado conhecer, é que, aos olhos da sabedoria divina, eles ficam reservados para um grau superior na escala ascendente de sua depuração progressiva e de sua perfectibilidade."

"Não obstante, apressemo-nos em dizê-lo, todo homem convicto e consciencioso, consagrando suas meditações à difusão de uma verdade profunda para a felicidade da Humanidade, molha a pena na atmosfera celeste, onde nosso globo está imerso, e recebe incontestavelmente a centelha da inspiração."

A indicação do título dos capítulos dará a conhecer o quadro abarcado pelo autor.

"1. Definição do Espiritismo. ─ 2. Princípio do bem e do mal. 3. União da alma com o corpo. ─ 4. Reencarnação. ─ 5. Frenologia. ─ 6. Do pecado original. ─ 7. O inferno. ─ 8. Missão do Cristo. ─ 9. O purgatório. ─ 10. O Céu. ─ 11. Pluralidade dos globos habitados. ─ 12. A caridade. ─ 13. Deveres do homem. ─ 14. Perispírito. ─ 15. Necessidade da revelação. ─ 16. Oportunidade da revelação. ─ 17. Os anjos e os demônios. ─ 18. Os tempos preditos. ─ 19. A prece. ─ 20. A fé. ─ 21. Resposta aos insultadores. ─ 22. Resposta aos incrédulos, ateus e materialistas. ─ 23. Apelo ao clero."

Lamentamos que a falta de espaço não nos permita reproduzir tantas passagens quantas desejaríamos. Limitar-nos-emos a algumas citações.

Cap. III, pág. 41.
"A utilidade recíproca e indispensável da alma e do corpo para sua cooperação respectiva constitui, pois, a razão de ser de sua união. Ela constitui a mais, para o espírito, as condições militantes na via do progresso, onde está chamado a conquistar sua personalidade intelectual e moral."

"Como esses dois princípios realizam normalmente, no homem, o fim de sua destinação? Quando o espírito é fiel às suas aspirações divinas, restringe os instintos animais e sensuais do corpo e os reduz à sua ação providencial na obra do Criador; desenvolve-se, cresce. É a perfeição da própria obra que se realiza. Ela chega à felicidade, cujo último termo é inerente ao grau supremo da perfectibilidade."

"Se, ao contrário, abdicando a soberania que é chamado a exercer sobre o corpo, ele cede ao arrastamento dos sentidos, e se aceita suas condições de prazeres terrestres como único objetivo de suas aspirações, falseia a razão de ser de sua existência e, longe de realizar os seus destinos, fica estacionário; ligado a esta vida terrestre que, entretanto, não deveria ter sido para ele senão uma condição acessória, porquanto não poderia ser o seu fim, o Espírito, de chefe que era, torna-se subordinado; como insensato, aceita a felicidade terrena que os sentidos lhe permitem experimentar e que lhe propõem satisfazer, assim nele abafando a intuição da felicidade verdadeira que lhe está reservada. Eis a sua primeira punição."

No capítulo XII, do inferno, pág. 99, encontramos esta notável apreciação da morte e dos flagelos destruidores:

"Seria enumerando os flagelos que espalham sobre a Terra o terror e o espanto, o sofrimento e a morte, que acreditariam poder dar a prova das manifestações da cólera divina?"

"Sabei, pois, temerários evocadores das vinganças celestes, que os cataclismos que assinalais, longe de ter o caráter exclusivo de um castigo infligido à Humanidade, são, ao contrário, um ato da misericórdia divina, que fecha a esta o abismo onde a precipitavam suas desordens, e lhe abre as vias do progresso que deve levá-la ao caminho que ela deve seguir para assegurar a sua regeneração."

"Que são esses cataclismos, senão uma nova fase na existência do homem, uma era feliz, marcando para os povos e a Humanidade inteira o ponto providencial de seu adiantamento?"

"Sabei, pois, que a morte não é um mal. Farol da existência do Espírito, ela é sempre, porquanto vem de Deus, o sinal de sua misericórdia e de sua assistência benevolente. A morte não é senão o fim do corpo, o termo de uma encarnação, e nas mãos de Deus, é o aniquilamento de um meio corruptor e vicioso, a interrupção de uma corrente funesta, à qual, num momento solene, a Providência arranca o homem e os povos."

"A morte não é senão um tempo de interrupção na prova terrestre. Longe de prejudicar o homem, ou melhor, o Espírito, ela o chama para recolher-se no mundo invisível, quer para reconhecer suas faltas e lamentá-las, quer para esclarecer-se e se preparar, por firmes e salutares resoluções, para retomar a prova da vida terrestre."

"A morte não gela o homem de pavor, a não ser que, muito identificado à Terra, ele não tenha fé em seu augusto destino, do qual a Terra não é senão a dolorosa oficina onde se deve realizar a sua depuração."

"Cessai, pois, de crer que a morte seja um instrumento de cólera e de vingança nas mãos de Deus; sabei, ao contrário, que ela é ao mesmo tempo a expressão de sua misericórdia e de sua justiça, seja detendo o mau na via da iniquidade, seja abreviando o tempo de provas ou de exílio do justo sobre a Terra."

"E vós, ministros do Cristo, que do alto da cátedra da verdade proclamais a cólera e a vingança de Deus, e pareceis, por vossas eloquentes descrições da fantástica fornalha, atiçar as suas chamas inextinguíveis para devorar o infeliz pecador; vós que, de vossos lábios tão autorizados, deixais cair esta aterradora epígrafe: ‘Jamais! ─ Sempre!’ esquecestes as instruções de vosso divino Mestre?"

Citaremos, ainda, as passagens seguintes, extraídas do capítulo sobre o pecado original:

"Em vez de criar a alma perfeita, quis Deus que não fosse senão por longos e constantes esforços que ela chegasse a se desprender deste estado de inferioridade nativa, e gravitar para seus augustos destinos."

"Para chegar a esses fins, tem ela, pois, que romper os laços que a prendem à matéria, resistir ao arrastamento dos sentidos, com a alternativa de sua supremacia sobre o corpo, ou da obsessão exercida sobre ela pelos instintos animais."

"É desses laços terrestres que cabe a ela libertar-se, e que nela constituem as condições de sua inferioridade. Eles não são outra coisa além do pretenso pecado original, o alvéolo que cobre a sua essência divina. O pecado original constitui, assim, o ascendente primitivo que os instintos animais devem ter exercido, de início, sobre as aspirações da alma. Tal é o estado do homem que o Gênesis quis representar sob a figura simples da árvore da ciência do bem e do mal. A intervenção da serpente tentadora não é outra coisa senão os desejos da carne e a solicitação dos sentidos. O Cristianismo consagrou esta alegoria como um fato real, ligando-se à existência do primeiro homem, e é sobre esse fato que baseou o dogma da redenção."

"Colocado neste ponto de vista, é preciso reconhecê-lo, o pecado original deve ter sido, e com efeito foi, o de toda a posterioridade do primeiro homem, e assim o será durante uma longa série de séculos, até a libertação completa do Espírito da constrição da matéria, libertação que sem dúvida tende a se realizar, mas que ainda não se fez em nossos dias."

"Numa palavra, o pecado original constitui as condições da natureza humana carregando os primeiros elementos de sua existência, com todos os vícios que ela engendrou."

"O pecado original é o egoísmo e o orgulho, que presidem a todos os atos da vida do homem;
É o demônio da inveja e do ciúme, que roem o seu coração;
É a ambição que perturba o seu sono;
É a cupidez, que não pode saciar a avidez de lucro;
É o amor e a sede de ouro, este elemento indispensável para dar satisfação a todas as exigências do luxo, do conforto, do bem-estar, que persegue o século com tanto ardor."

"Eis o pecado original proclamado pelo Gênesis, que o homem sempre ocultou em si; ele não será apagado senão no dia em que, compenetrado de seus altos destinos, o homem abandonar, conforme a lição do bom La Fontaine, a sombra pela presa; no dia em que renunciar à miragem da felicidade terrena, para voltar todas as suas aspirações para a felicidade real que lhe está reservada."

"Que o homem aprenda, pois, a se tornar digno de seu título de chefe entre todos os seres criados, e da essência etérea emanada do próprio seio de seu criador, da qual ele foi forjado. Que seja forte para lutar contra as tendências de seu envoltório terreno, cujos instintos são estranhos às suas aspirações divinas e não poderiam constituir sua personalidade espiritual; que seu objetivo único seja sempre gravitar para a perfeição de seu último fim, e o pecado original não mais existirá para ele."

O Sr. Bonnamy já é conhecido de nossos leitores, que puderam apreciar a firmeza e a independência de seu caráter, bem como a elevação de seus sentimentos, por sua notável carta que publicamos na Revista de março de 1866, no artigo intitulado: O Espiritismo e a Magistratura. Ele vem hoje, por um trabalho de alto alcance, emprestar resolutamente o apoio e a autoridade de seu nome a uma causa que, na sua consciência, considera como a da Humanidade.

Entre os adeptos já numerosos que o Espiritismo conta na magistratura, o Sr. Jaubert, vice-presidente do tribunal de Carcassone, e o Sr. Bonnamy, juiz de instrução em Villeneuve-sur-Lot, são os primeiros que abertamente arvoraram a bandeira. E o fizeram, não no dia seguinte à vitória, mas no momento da luta, quando a Doutrina está exposta aos ataques de seus adversários e quando seus adeptos ainda estão sob os golpes da perseguição. Os espíritas atuais e os do futuro saberão apreciá-lo e não o esquecerão. Quando uma doutrina recebe os sufrágios de homens tão justamente considerados, é a melhor resposta às diatribes de que ela pode ser objeto.

A obra do Sr. Bonnamy deixará sua marca nos anais do Espiritismo, não só como primeira no seu gênero, cronologicamente, mas sobretudo por sua importância filosófica. O autor aí examina a Doutrina em si mesma, discute os seus princípios, dos quais tira a quintessência, fazendo abstração completa de toda personalidade, o que exclui qualquer pensamento de camarilha.


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* Um volume in-12; preço 3 francos; pelo correio 3,35 francos. Livraria Internacional, Boulevard Montmartre, 15 – Paris.


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NO PRELO PARA APARECER EM DEZEMBRO
A GÊNESE, OS MILAGRES E AS PREDIÇÕES SEGUNDO O ESPIRITISMO
POR ALLAN KARDEC
1 volume in-12, de 500 páginas
Aviso

Resposta ao Sr. S. B. de Marselha

Resposta ao Sr. S. B., de Marselha Não foram levadas em consideração as cartas que não estão ostensivamente assinadas, ou que não trazem endereço certo, quando o nome é desconhecido. Elas são postas na cesta.

Esta resposta se dirige igualmente a uma série de cartas com o carimbo de estrada de Besançon e vindas quotidianamente, durante um certo tempo. Se este aviso chegar ao autor das mesmas, ele será informado que, pelo motivo acima, e dada a sua extensão, elas nem mesmo foram lidas à medida que chegavam; a pessoa encarregada da correspondências as pôs de lado, como todas as que são cercadas de mistério e que, por esta razão, não consideramos bastante sérias para ocupar o tempo, com prejuízo dos trabalhos de importância real e para os quais apenas nos bastamos.

ALLAN KARDEC.


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